Ação Direta de
Inconstitucionalidade
Autos n. 164.267.0/5-00
Autor: Prefeito Municipal de Catanduva
Objeto de impugnação: Lei Municipal n. 4.551, de 28 de
abril de 2008
Excelentíssimo Desembargador
Relator
Colendo
Órgão Especial
O Prefeito Municipal de Catanduva ajuizou a presente ação pleiteando a
declaração de inconstitucionalidade da Lei Municipal n. 4.551, de 28 de abril
de 2008, que autoriza pessoas jurídicas a manter e conservar viadutos
localizados no município e a neles inserir frases alusivas à segurança no
trânsito em troca de propaganda em bens municipais. A lei está reproduzida, na
íntegra, a fls. 15/16.
A causa de pedir principal consiste na violação ao princípio da
harmonia e independência dos poderes, consagrado no art. 5º da Lei Maior
paulista, bem como no vício de iniciativa legislativa.
Registre-se que a iniciativa legislativa foi parlamentar.
A liminar foi deferida pelo Nobre Desembargador Relator, Dr. José
Reynaldo, conforme se vê da R. Decisão de fls. 20.
Citado, o Procurador-Geral do Estado, a fls. 46/48, alegou falta de
interesse na defesa do ato impugnado, sob o argumento de que se trata de
matéria exclusivamente local.
A Câmara Municipal prestou informações a fls. 26/43, sustentando a
constitucionalidade da lei municipal sindicada.
É o breve relatório.
A presente ação direta deve ser julgada procedente, conforme será demonstrado.
O art. 1º da Lei Municipal n. 4.551, de 28 de abril de 2008, revela a
inconstitucionalidade ao dispor que:
Fica permitido
às pessoas jurídicas manter e conservar viadutos localizados no Município de
Catanduva e neles inserir frases alusivas à segurança no trânsito.
Acresce o art. 2º que:
Às pessoas
jurídicas que mantiverem e conservarem os viadutos e neles inscreverem as
frases a suas expensas e sem nenhum ônus para o Município será permitida
utilização de parte do espaço neles disponível para a inserção gratuita de
publicidade de seus bens, produtos ou serviços.
A lei municipal ora questionada afeta a administração do patrimônio
público municipal.
Por isso, apenas o Prefeito Municipal tem iniciativa para deflagrar
processo legislativo para aprovação de lei com o conteúdo da que se pretende
ver declarada como inconstitucional, sob pena de indevida interferência de um
Poder sobre o outro.
A Constituição Estadual estabelece, em seu art. 5º, que:
São Poderes
do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o
Judiciário.
Por sua vez, o art. 47, II, da Carta Constitucional paulista veicula
princípio de observância obrigatória aos municípios:
Compete
privativamente ao Governador, além de outras atribuições previstas nesta
Constituição (...) exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção
superior da administração estadual (...).
As normas que tratam da reserva de iniciativa, longe de normas de
direito estrito, ou de exceção, refletem com sutileza as nuances e a evolução
do principio da separação de poderes. As regras de fixação de competência para
a iniciativa do processo legislativo têm como corolário o princípio da
separação dos poderes, que nada mais é do que o mecanismo jurídico que serve à
organização do Estado, definindo órgãos, estabelecendo competências e marcando
as relações recíprocas entre esses mesmos órgãos[1].
Ao Poder Legislativo, como se sabe, é vedada a administração da cidade,
tarefa que incumbe, no Município, ao Prefeito, ou ao que, modernamente,
chama-se de 'Governo', que tem na lei um dos seus mais relevantes instrumentos.
O poder de iniciativa neste campo - administração da cidade - é do Executivo
(melhor, do 'Governo'), participando o Poder Legislativo, quando assim
determinar a Constituição, apenas a qualidade de aprovar-desaprovar os atos. A
hipótese é de administração ordinária, cabendo ao Legislativo apenas o
estabelecimento de normas gerais, diretrizes globais, jamais atos pontuais e
específicos.
Para Hely Lopes Meirelles[2],
após dizer que “todo o patrimônio municipal fica sob a administração do
prefeito”:
“A atribuição típica e predominante da Câmara é a normativa, isto é, a
de regular a administração do Município e a conduta dos munícipes no que afeta
aos interesses locais. A Câmara não administra o Município; estabelece, apenas,
normas de administração. Não executa obras e serviços públicos; dispõe,
unicamente, sobre sua execução. Não compõe nem dirige o funcionalismo da
Prefeitura; edita, tão-somente, preceitos para sua organização e direção. Não
arrecada nem aplica as rendas locais; apenas institui ou altera tributos e
autoriza sua arrecadação e aplicação. Não governa o Município; mas regula e
controla a atuação governamental do Executivo, personalizado no prefeito.
Eis aí a distinção marcante entre a missão normativa da Câmara e a
função executiva do prefeito; o Legislativo delibera e atua com caráter
regulatório, genérico e abstrato; o Executivo consubstancia os mandamentos da
norma legislativa em atos específicos e concretos de administração”.
A lei sindicada na presente ação, de iniciativa parlamentar, não contém
proposição geral e abstrata e, bem analisada, representa ingerência nas
prerrogativas do Prefeito Municipal ao dispor sobre a administração dos bens
públicos municipais.
Portanto, é flagrante a inconstitucionalidade da lei municipal de Catanduva.
Assim sendo, manifesto-me pela procedência
desta ação objetivando a declaração de inconstitucionalidade da Lei Municipal
n. 4.551, de 28 de abril de 2008, do Município de Catanduva.
São Paulo, 17 de julho de 2008.
MAURÍCIO AUGUSTO GOMES
PROCURADOR DE JUSTIÇA,
no exercício de função delegada
pelo Procurador-Geral de Justiça