AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

Processo número 168.566-0/9-00

Requerente: Prefeito Municipal de Guatapara

Objeto: Lei n. 578, de 08 de julho de 2008, de Guatapará

 

 

 

 

                                                        

Ementa: 1) Ação Direta visando à declaração da inconstitucionalidade da Lei Municipal n. 578, de 08 de julho de 2008, do Município de Guatapará, de iniciativa parlamentar que concede casa e custeio de apoio a idosos na Cidade de Guatapará; 2) Violação dos artigos 5º , 24,§ 2º , 1, 25, 37, 47 incisos  II e XIV  e 144, todos da Constituição do Estado de São Paulo). 3) Inconstitucionalidade constatada. 

 

 

 

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente,

 

 

 

 

                                                           Trata-se de ação ajuizada pelo Prefeito Municipal de Guatapará, visando à declaração de inconstitucionalidade da Lei n. 578, de 08 de julho de 2008, do Município de Guatapará, que “concede casa e custeio de apoio a idosos na Cidade de Guatapará, como específica”.  Argumenta o autor que a lei em questão padece de vício de iniciativa ao determinar que o administrador deverá disponibilizar casa e custeio de apoio a idosos do Município, com o conseqüente aumento no quadro de servidores municipais, na medida em que criou novas atribuições  na organização administrativa, violando o princípio de independência e separação dos poderes. Ademais, ocasionou aumento de despesas, sem qualquer indicação da fonte de custeio.

 

                                                           O pedido liminar foi deferido, consoante decisão de fl. 38. O Procurador Geral do Estado não quis enfrentar o mérito da demanda, sob a alegação de que a matéria é de interesse local (fls. 48/50). A Câmara Municipal prestou informações às fls. 52/62, onde pleiteou a improcedência da demanda..

 

                                                           É o relato do necessário.

                       

                                                           O pedido merece ser julgado inteiramente procedente.

 

                                                           Como é sabido a legislação impugnada é fruto de iniciativa parlamentar, em que pese o autográfo ter sido vetado pelo Chefe do Poder Executivo

 

                                                           Inicialmente, cumpre lembrar que gerenciamento da prestação de serviços públicos, bem como a criação de cargos de servidores públicos no município é competência do Poder Executivo, único dos poderes que detém instrumentos e recursos próprios para avaliar a conveniência e oportunidade da administração pública.  Assim sendo,  ao possibilitar a locação, construção ou a aquisição de um imóvel na Cidade de Guatapará, destinado a alojar e manter em tempo integral as pessoas com idade igual ou superior a 60 anos que necessitem, bem como contratando vários profissionais para as respectivas áreas, o legislativo acabou por invadir a competência privativa  de administração do prefeito, e por conseguinte violou o princípio da separação dos poderes.

 

                                                         Ao Legislativo cabe a função de editar atos normativos de caráter geral e abstrato. Ao Executivo cabe o exercício da função de gestão administrativa, que envolve atos de planejamento, direção, organização e execução.

 

                                                         Atos que, na prática, representam invasão da esfera executiva pelo legislador, devem ser invalidados em sede de controle concentrado de normas, na medida em que representam quebra do equilíbrio assentado nos art. 5º, art. 37 e art. 47 incisos II e XIV, todos da Constituição do Estado de São Paulo, aplicáveis aos Municípios por força do art.144 da referida Carta.

 

                                                         Cumpre recordar aqui o ensinamento de Hely Lopes Meirelles, anotando que “a Prefeitura não pode legislar, como a Câmara não pode administrar. Cada um dos órgãos tem missão própria e privativa: a Câmara estabelece regra para a Administração; a Prefeitura a executa, convertendo o mandamento legal, genérico e abstrato, em atos administrativos, individuais e concretos. O Legislativo edita normas; o          Executivo pratica atos segundo as normas. Nesta sinergia de funções é que residem a harmonia e independência dos Poderes, princípio constitucional (art.2º) extensivo ao governo local. Qualquer atividade, da Prefeitura ou Câmara, realizada com usurpação de funções é nula e inoperante”. Sintetiza, ademais, que “todo ato do Prefeito que infringir prerrogativa da Câmara – como também toda deliberação da Câmara que invadir ou retirar atribuição da Prefeitura ou do Prefeito – é nulo, por ofensivo ao princípio da separação de funções dos órgãos do governo local (CF, art.2º c/c o art.31), podendo ser invalidado pelo Poder Judiciário” (Direito municipal brasileiro, 15ªed., atualizada por Márcio Schneider Reis e Edgard Neves da Silva, São Paulo, Malheiros, 2006, p.708 e 712).

 

                                                         Deste modo, quando a pretexto de legislar, o Poder Legislativo administra, editando leis de efeitos concretos, ou que equivalem na prática a verdadeiros atos de administração, viola a harmonia e independência que deve existir entre os Poderes. Essa é exatamente a hipótese verificada nos autos.

 

                                                         Mutatis mutandis, já proclamou esse Egrégio Plenário que:

 

“Ao executivo haverá de caber sempre o exercício de atos que impliquem no gerir as atividades municipais. Terá, também, evidentemente, a iniciativa das leis que lhe propiciem a boa execução dos trabalhos que lhe são            

 

 

 

 atribuídos. Quando a Câmara Municipal, o órgão meramente legislativo, pretende intervir na forma pela qual se dará esse gerenciamento, está a usurpar funções que são de incumbência do Prefeito” (Adin n. 53.583-0, rel. Des. FONSECA TAVARES).

 

                                                         Um último aspecto, relevante para o deslinde do caso merece destaque.

 

                                                         Em casos similares esse E. Tribunal de Justiça tem reconhecido a inconstitucionalidade de leis por violação ao art. 25 da Constituição Estadual, em razão da ausência de indicação de recursos disponíveis para o pagamento da despesa criada (ADINs ns. 18.628-0, 13.796-0, 38.249-0, 36.805.0/2, 38.977.0/0), já que, de toda forma, foi determinada a obrigação de locação, construção ou aquisição de imóvel na Cidade de Guatapará, destinado a alojar e manter em tempo integral as pessoas com idade igual ou superior a 60 anos que necessitem, bem como da contratação de vários profissionais para as respectivas áreas.

                                                         Assim sendo, a lei impugnada viola  os artigos 5º, 24,§2º 1, 25, 37 , 47 incisos II e XIV , todos da Constituição do Estado de São Paulo, aplicáveis aos Municípios por força do art.144 da referida Carta.

 

 

                                                         Diante do exposto, nosso parecer é no sentido da procedência da presente ação direta, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 578, de 08 de julho de 2008, de  Guatapará.

São Paulo, 06 de novembro de 2008.

 

MAURÍCIO AUGUSTO GOMES

PROCURADOR DE JUSTIÇA,

no exercício de função delegada pelo

Procurador-Geral de Justiça