Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Autos n. 168.945.0/9-00

Autor: Prefeito Municipal de Catanduva

Objeto de impugnação: Lei Complementar Municipal n. 446, de 9 de junho de 2008, do Município de Catanduva

 

 

 

 

 

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator

 

 

 

Colendo Órgão Especial

 

 

 

                   Cuida-se de ação proposta pelo Prefeito Municipal de Catanduva na qual se questiona a validade jurídico-constitucional da Lei Complementar Municipal n. 446, de 9 de junho de 2008, que é derivada de projeto de lei de iniciativa parlamentar, em face do art. 5º, 25 e 144, todos da Constituição do Estado de São Paulo.

 

                   A lei impugnada ao acrescentar um segundo parágrafo ao art. 9º da Lei Complementar 315, de 24 de março de 2006, excluiu os templos religiosos ou atividades de organização religiosa da renovação anual de licença de funcionamento.

 

                  Ao despachar a inicial (fls. 31), sua Excelência, o Desembargador Relator, Dr. RENATO NALINI, deferiu o pedido de suspensão liminar ao concluir que ter razão o Chefe do Poder Executivo ao alegar vício de iniciativa.

 

                   Citado para os fins do § 2.º do art. 90 da Constituição Paulista, o Procurador Geral do Estado defendeu a exegese que condiciona a sua intervenção nos processos de fiscalização abstrata à existência de interesse estadual na preservação do texto normativo impugnado, ausente neste caso (fls. 40/42).

 

                   O Presidente da Câmara de Vereadores de Catanduva prestou informações a fls. 45/48, juntando documentos.

 

                   É o breve relato.

                  

                   A presente ação direta é procedente.

 

                   A lei editada pela Câmara de Vereadores de Catanduva, ao excluiu os templos religiosos ou atividades de organização religiosa da renovação anual de licença de funcionamento, afrontou o princípio da separação de poderes.

 

                   De fato, trata-se de diploma legislativo verticalmente incompatível com a regra da iniciativa reservada e com o princípio da independência e harmonia entre os Poderes.

                   Na organização político-administrativa brasileira, o governo municipal apresenta funções divididas. O Prefeito é o responsável pela função administrativa, que compreende, dentre outras coisas, o planejamento, a organização e a direção de serviços públicos, enquanto que a função básica da Câmara é a legislativa, ou seja, a edição de normas gerais e abstratas de conduta, que devem pautar toda atuação administrativa. 

 

                   Como essas atribuições foram preestabelecidas pela Constituição, de modo a prevenir conflitos, qualquer tentativa de um Poder de exercer as atribuições de outro Poder tipifica nítida violação do princípio da independência e harmonia entre os Poderes.

 

                   Ao editar a lei impugnada, a Câmara de Vereadores de Catanduva invadiu a esfera de atribuições próprias do Poder Executivo, donde caracterizada a violação do art. 5º da Constituição do Estado de São Paulo.

 

                   Ora, à vista do princípio da independência e harmonia entre os Poderes (CE., art. 5.º), a Câmara não está legitimada a deflagrar processo legislativo para excluir os templos religiosos ou atividades de organização religiosa da renovação anual de licença de funcionamento, providência que depende da apresentação de projeto de lei que é de iniciativa reservada ao Prefeito.      

 

                   Como se sabe, os municípios, embora tenham autonomia política, legislativa, administrativa e financeira, devem, em função do princípio da simetria, observar os princípios estabelecidos na Constituição Federal.

 

                   E a Lei Maior deixa claro, em seu art. 61, § 1º, II, “b”, que compete ao Executivo a iniciativa legislativa em matéria de organização administrativa:

 

Art. 61 – A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

§ 1º - São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

II - disponham sobre:

b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios;

 

                  

                   Em tais circunstâncias, aguardo o julgamento de procedência da presente ação direta a fim de que seja declarada a inconstitucionalidade formal da Lei Complementar Municipal n. 446, de 9 de junho de 2008, do Município de Catanduva.

 

                            São Paulo, 18 de novembro de 2008.

 

 

 

MAURÍCIO AUGUSTO GOMES

PROCURADOR DE JUSTIÇA,

no exercício de função delegada

pelo Procurador-Geral de Justiça