Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Autos n. 169.244.0/7-00

Autor: Prefeito Municipal de São José do Rio Preto

Objeto de impugnação: Lei Complementar Municipal n. 9.959, de 21 de setembro de 2007, do Município de São José do Rio Preto

 

 

 

 

 

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator

 

 

 

Colendo Órgão Especial

 

 

 

                   Cuida-se de ação proposta pelo Prefeito Municipal de São José do Rio Preto na qual se questiona a validade jurídico-constitucional da Lei Complementar Municipal n. 9.959, de 21 de setembro de 2007, que é derivada de projeto de lei de iniciativa parlamentar, em face do art. 5º, 25 e 144, todos da Constituição do Estado de São Paulo.

 

                   A lei impugnada acrescenta um segundo parágrafo ao art. 16 da Lei Municipal n. 5.979/95, e dispõe que:

 

§ 2º - As taxas originárias da utilização dos velórios dos Cemitérios Municipais e outras decorrentes do sepultamento poderão ser recolhidas aos cofres municipais dentro do prazo de 30 (trinta) dias, a contar da data do sepultamento, em valor fixo.

 

                  Ao despachar a inicial (fls. 105/107), sua Excelência, o Desembargador Relator, Dr. GUERRIERI REZENDE, deferiu o pedido de suspensão liminar ao concluir que, “a princípio, neste exame preliminar, a lei está eivada de vício formal de inconstitucionalidade, por desvio de poder legislativo. Com efeito, se a competência que disciplina a organização administrativa, a ordem tributária e outras é de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, a iniciativa do Legislativo importa em violação frontal ao texto constitucional que consagra a separação dos poderes estatais. O art. 24, § 2º, I e IV da Constituição Bandeirante e a própria Lei Orgânica do Município, em seu art. 41, inciso III, impedem tal usurpação”.

 

                   Citado para os fins do § 2.º do art. 90 da Constituição Paulista, o Procurador Geral do Estado defendeu a exegese que condiciona a sua intervenção nos processos de fiscalização abstrata à existência de interesse estadual na preservação do texto normativo impugnado, ausente neste caso (fls. 188/190).

 

                   O Presidente da Câmara de Vereadores de São José do Rio Preto prestou informações a fls. 115/117, juntando documentos.

 

                   É o breve relato.

                  

                   A presente ação direta é procedente.

 

                   A lei editada pela Câmara de Vereadores de São José do Rio Preto, ao dispor sobre prazos e formas de recolhimento da taxa de velório e sepultamento afronto o princípio da separação de poderes.

 

                   De fato, trata-se de diploma legislativo verticalmente incompatível com a regra da iniciativa reservada e com o princípio da independência e harmonia entre os Poderes.

                   Na organização político-administrativa brasileira, o governo municipal apresenta funções divididas. O Prefeito é o responsável pela função administrativa, que compreende, dentre outras coisas, o planejamento, a organização e a direção de serviços públicos, enquanto que a função básica da Câmara é a legislativa, ou seja, a edição de normas gerais e abstratas de conduta, que devem pautar toda atuação administrativa. 

 

                   Como essas atribuições foram preestabelecidas pela Constituição, de modo a prevenir conflitos, qualquer tentativa de um Poder de exercer as atribuições de outro Poder tipifica nítida violação do princípio da independência e harmonia entre os Poderes.

 

                   Ao editar a lei impugnada, a Câmara de Vereadores de São José do Rio Preto invadiu a esfera de atribuições próprias do Poder Executivo, donde caracterizada a violação do art. 5º da Constituição do Estado de São Paulo.

 

                   Ora, à vista do princípio da independência e harmonia entre os Poderes (CE., art. 5.º), a Câmara não está legitimada a deflagrar processo legislativo sobre formas e prazos de recolhimento de taxas, providência que depende da apresentação de projeto de lei que é de iniciativa reservada ao Prefeito.          

 

                   Como se sabe, os municípios, embora tenham autonomia política, legislativa, administrativa e financeira, devem, em função do princípio da simetria, observar os princípios estabelecidos na Constituição Federal.

 

                   E a Lei Maior deixa claro, em seu art. 61, § 1º, II, “b”, que compete ao Executivo a iniciativa legislativa em matéria tributária e orçamentária:

 

Art. 61 – A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

§ 1º - São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que:

II - disponham sobre:

b) organização administrativa e judiciária, matéria tributária e orçamentária, serviços públicos e pessoal da administração dos Territórios;

 

                   Em tais circunstâncias, aguardo o julgamento de procedência da presente ação direta a fim de que seja declarada a inconstitucionalidade formal da Lei Complementar Municipal n. 9.959, de 21 de setembro de 2007, do Município de São José do Rio Preto.

 

                            São Paulo, 18 de novembro de 2008.

 

 

 

MAURÍCIO AUGUSTO GOMES

PROCURADOR DE JUSTIÇA,

no exercício de função delegada

pelo Procurador-Geral de Justiça