Parecer
Autos nº. 170.475.0/3-00
Requerente: Prefeito do Município de Guarulhos
Objeto: Lei nº 6.413, de 11 de setembro de 2008, do Município de Guarulhos
Ementa: Ação
direta de inconstitucionalidade movida por Prefeito em face da Lei nº 6.413/08,
do Município de Guarulhos, que “estabelece desconto de 50% no pagamento do
ISPPTU – Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana dos imóveis
localizados nas vias públicas onde se realizam as feiras-livres e comboios”. Lei tributária benéfica, de iniciativa de
Vereador, que implica em diminuição de receita, com impacto no orçamento.
Alegada usurpação da competência privativa do Chefe do Poder Executivo, por
ofensa aos artigos 5º e 144 da Constituição do Estado. Precedentes do Supremo
Tribunal Federal no sentido de que, em matéria tributária, a iniciativa das
leis, inclusive benéficas, é concorrente. Parecer pela improcedência da ação.
Colendo Órgão Especial
Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente
Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito Municipal de Guarulhos, tendo por objeto a Lei nº 6.413/08, do Município de Guarulhos, que “estabelece desconto de 50% no pagamento do ISPPTU – Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana dos imóveis localizados nas vias públicas onde se realizam as feiras-livres e comboios”.
Sustenta o autor que o benefício instituído pela lei compromete o orçamento a cargo do Poder Executivo. É norma tributária benéfica, cuja iniciativa é reservada ao Prefeito. Divisa ofensa ao princípio da separação dos poderes e violação dos art. 5º e 144 da Constituição do Estado (fls. 2/20).
A Lei teve a vigência e eficácia suspensas ex nunc, atendendo-se ao pedido liminar (fls. 69).
O Presidente da Câmara Municipal se manifestou a fls. 91/98, em defesa da lei impugnada. Sustentou que a matéria versada na lei não se encontra entre aquelas cuja iniciativa é privativa do Alcaide e requereu a improcedência da ação .
A Procuradoria-Geral do Estado declinou da defesa do ato impugnado, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 85/87).
Este é o breve resumo do que consta dos autos.
A lei questionada tem a seguinte redação:
LEI Nº 6.413, DE 11 DE SETEMBRO DE 2008.
Autor: Vereador Edmilson Americano.
ESTABELECE DESCONTO DE 50% (CINQÜENTA POR CENTO) NO PAGAMENTO DO ISPPTU - IMPOSTO SOBRE A PROPRIEDADE PREDIAL E TERRITORIAL URBANA DOS IMÓVEIS LOCALIZADOS NAS VIAS PÚBLICAS ONDE SE REALIZAM AS FEIRAS-IVRES E COMBOIOS, NO ÂMBITO DO MUNICÍPIO DE GUARULHOS.
O Presidente da Câmara Municipal de Guarulhos, Senhor PAULO CARVALHO, nos termos do § 7º do art. 44 da Lei Orgânica do Município de Guarulhos, promulgada em 05 de abril de 1990, FAZ SABER que, em decorrência do silêncio do Senhor Prefeito Municipal em relação ao comunicado de rejeição, na Sessão Ordinária de 04 de setembro de 2008, do Veto Total aposto pelo Senhor Chefe do Executivo ao Autógrafo nº 060/08, referente ao Projeto de Lei nº 158/03, de autoria do Vereador Edmilson Americano, promulga a seguinte Lei:
Art. 1º Fica estabelecido o desconto de 50% (cinqüenta por cento) no pagamento do ISPPTU - Imposto Sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana dos imóveis localizados nas vias públicas, onde são realizadas feiras-livres e comboios, no âmbito do Município de Guarulhos. Parágrafo único. A municipalidade independente do pedido do contribuinte, deverá proceder ao desconto à época do lançamento do ISPPTU.
Art. 2º Fará jus ao desconto ora estabelecido os imóveis diretamente afetados pelas feiras-livres e comboios, cujo endereço esteja no trecho que compreende à instalação das barracas. Parágrafo único. Excetuam-se desta Lei, as áreas que não possuam imóveis edificados.
Art. 3º A Rua Bezerra de Menezes, localizada no Jardim Tranquilidade, onde eventualmente realiza-se feira-livre, devido à ocupação do pátio de estacionamento da Associação Atlética Flamengo, também será contemplada pelo benefício instituído por esta Lei.
Art. 4º No caso de mudança ou alteração de local da feira-livre e comboio, o benefício será suspenso, passando o mesmo aos moradores do novo local, observado o disposto no art. 2º desta Lei.
Art. 5º As despesas decorrentes da execução da presente Lei, correrão por conta de verbas próprias, consignadas em Orçamento, suplementadas se necessário.
Art. 6º Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogando-se a Lei Municipal nº 4.859 de 12 de dezembro de 1996 e as disposições em contrário.
Câmara Municipal de Guarulhos, em 11 de setembro de 2008.
PAULO CARVALHO Presidente
VADINHO MOREIRA 1º Secretário
Sua natureza é, nitidamente, tributária.
Cuida-se, aliás, de norma benéfica porque institui descontos de ISPPTU aos proprietários de imóveis existentes nas cercanias de onde houver feira livre ou comboios.
De forma majoritária, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo tem declarado a inconstitucionalidade de leis de iniciativa parlamentar que instituem benefícios fiscais. Tem prevalecido o entendimento de que as normas da espécie, porque diminuem a receita, somente poderiam ser concebidas pelo Poder Executivo, que é o encarregado da execução do Orçamento.
Colhe-se,
“Este Órgão Especial, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 144.748.0/4-00, julgada em 12 de setembro de 2007, sendo relator o Des. MARCO CÉSAR, à unanimidade reconheceu a inconstitucionalidade por vício de iniciativa de lei tributária benéfica de Ribeirão Preto, que instituiu incentivo fiscal para apoio de projetos culturais. Também na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 135.071.0/3-00, julgada em 26 de setembro de 2007, sendo relator o Des. MOHAMED AMARO, contra os votos dos Des. ROBERTO VALLIM BELLOCCHI e IVAN SARTORI reconheceu a inconstitucionalidade por vício de iniciativa de lei que instituiu a isenção tributária aos portadores dede deficiência ou seus responsáveis, no Município de Jundiaí. E mais recentemente, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 148.312.4/0-00, julgada em 3 de outubro de 2007, sendo relator o des. MARCO CÉSAR, também contra os votos dos Des. ROBERTO VALLIM BELLOCCHI e IVAN SARTORI reconheceu a inconstitucionalidade por vício de iniciativa de lei que isentou do pagamento de taxas entidades beneficiadas pela imunidade”[1].
Essa orientação tem apoio em Carraza.
O autor, depois de anotar que a iniciativa das leis que criam e aumentam tributos é ampla, cabendo, portanto, a qualquer membro do Legislativo, ao chefe do Executivo, aos cidadãos etc., afirma que o raciocínio não vale para as leis benéficas, cuja iniciativa está reservada ao chefe do Executivo (Presidente, Governador, Prefeito). Leis benéficas, de acordo com sua lição, são aquelas que, quando aplicadas, acarretam diminuição de receita, como as que concedem isenções tributárias, parcelam débitos fiscais, aumentem prazos para o normal recolhimento de tributos, etc.[2]
A orientação contrária, no entanto, apóia-se no fato de que, em matéria tributária, a competência legislativa é concorrente (art. 61 da CF e art. 24 da CE).
Desse modo, não haveria inconstitucionalidade por vício de iniciativa na lei que institui incentivo fiscal, pois a norma não estaria versando sobre matéria orçamentária, nem aumentando a despesa do Município.
E essa é a tese que prevalece no Supremo Tribunal Federal.
O texto normativo impugnado dispõe sobre matéria de caráter tributário, isenções, matéria que, segundo entendimento dessa Corte, é de iniciativa comum ou concorrente; não há, no caso, iniciativa [parlamentar] reservada ao Chefe do Poder Executivo. Tem-se por superado, nesta Corte, o debate a propósito de vício de iniciativa referente à matéria tributária[3].
Os seguintes julgados (citados no v. Acórdão destacado) comprovam essa assertiva:
EMENTA: I. Ação direta de inconstitucionalidade: L. est.
2.207/00, do Estado do Mato Grosso do Sul (redação do art. 1º da L. est.
2.417/02), que isenta os aposentados e pensionistas do antigo sistema estadual
de previdência da contribuição destinada ao custeio de plano de saúde dos
servidores Estado: inconstitucionalidade declarada. II. Ação direta de
inconstitucionalidade: conhecimento. 1. À vista do modelo dúplice de controle
de constitucionalidade por nós adotado, a admissibilidade da ação direta não está
condicionada à inviabilidade do controle difuso.
EMENTA: CONSTITUCIONAL. LEI DE ORIGEM PARLAMENTAR QUE FIXA MULTA
AOS ESTABELECIMENTOS QUE NÃO INSTALAREM OU NÃO UTILIZAREM EQUIPAMENTO EMISSOR
DE CUPOM FISCAL. PREVISÃO DE REDUÇÃO E ISENÇÃO DAS MULTAS
É inequívoco que, ao instituir o desconto de ISPPTU aos proprietários de determinados imóveis, a lei impugnada redimensionou para menos a receita.
Toda política pública, entretanto, tem impacto no orçamento, realidade que não pode ser levada em conta para caracterizar como orçamentária a norma que a estabelece.
Desse modo, curvando-me à orientação do Supremo Tribunal Federal, não vislumbro a inconstitucionalidade da lei impugnada.
Diante do exposto, nosso parecer é no sentido da improcedência desta ação direta de inconstitucionalidade da Lei nº 6.413/08, do Município de Guarulhos, que “estabelece desconto de 50% no pagamento do ISPPTU – Imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana dos imóveis localizados nas vias públicas onde se realizam as feiras-livres e comboios”.
São Paulo, 16 de março de 2009.
Maurício Augusto Gomes
Subprocurador-Geral de Justiça
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