Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Autos nº. 173.216-0/4-00

Requerente: Prefeito Municipal de São José do Rio Preto

Objeto: Lei nº 10.245/2008, do Município de São José do Rio Preto

 

Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada por Prefeito, da Lei Municipal nº 10.245, de 14 de novembro de 2008, que regula procedimento para a substituição de medidores de água (hidrômetro). Projeto de Vereador. Vício de iniciativa, que macula o processo legislativo, vez que cabe exclusivamente ao chefe do Poder Executivo a iniciativa de leis que regulam o serviço público. Parecer pela procedência da ação direta de inconstitucionalidade.

 

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

 

 

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito Municipal de São José do Rio Preto, tendo por objeto a Lei Municipal nº 10.245, de 14 de novembro de 2008, que “estabelece procedimento para a substituição de medidores de água (hidrômetro), no Município de São José do Rio Preto”.

Sustenta o autor que a lei versa sobre a organização de serviço afeto à autarquia municipal e que, por isso, não poderia, como foi, ter nascido no Poder Legislativo. Aponta vício de iniciativa e violação do art. 5º da Constituição do Estado.

A Lei teve a vigência e eficácia suspensas ex nunc, atendendo-se ao pedido liminar (fls. 22/25).

O Presidente da Câmara Municipal prestou informações sobre o processo legislativo (fls. 33/55).

A Procuradoria-Geral do Estado declinou da defesa do ato impugnado, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 60/62).

Este é o breve resumo do que consta dos autos.

A lei impugnada tem o seguinte teor:

LEI nº 10.245, de 14 de novembro de 2008.

Estabelece procedimento para a substituição de medidores de água (hidrômetros), no Município de São José do Rio Preto.

Ver. ADNEY SECCHES, Presidente da Câmara Municipal de São José do Rio Preto, Estado de São Paulo, usando das atribuições que me são conferidas por Lei;

FAÇO SABER que a Câmara Municipal manteve e eu promulgo, nos termos do § 6º do artigo 44 da Lei Orgânica do Município, a seguinte Lei:

Art. 1° - A substituição de medidores de volume de água (hidrômetro) feita pela Administração Direta e Indireta nos imóveis residenciais, comerciais, industriais e congêneres, somente será permitida com a expressa autorização do proprietário.

Art. 2°- Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Câmara Municipal de São José do Rio Preto, 14 de novembro de 2008.

Ver. ADNEY SECCHES

Presidente da Câmara

Cuida-se, como se vê, de norma destinada a estabelecer o procedimento para a substituição dos medidores de água (hidrômetros) no âmbito do Município, condicionando-a à expressa autorização do proprietário.

A inicial esposa a tese de que a lei deveria decorrer de projeto do chefe do Poder Executivo.

E, de fato, esse argumento procede.

Leis de iniciativa da Câmara ou, mais propriamente, de seus vereadores são todas aquelas não reservadas pela Constituição Federal (arts. 61, § 1º, e 165) à iniciativa do prefeito.

São de iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo, portanto, “os projetos de leis que disponham sobre a criação, estruturação e atribuição das secretarias, órgãos e entes da Administração Pública Municipal; matéria de organização administrativa e planejamento de execução de obras e serviços públicos; criação de cargos, funções ou empregos públicos na Administração direta, autárquica e fundacional do Município; o regime jurídico e previdenciário dos servidores municipais, fixação e aumento de sua remuneração; o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias, o orçamento anual e os créditos suplementares e especiais” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro, 16ª. ed., São Paulo: Malheiros, 2008, p. 620).

Na dicção desse Sodalício:

“Ao Executivo haverá de caber sempre o exercício de atos que impliquem no gerir as atividades municipais. Terá, também, evidentemente, a iniciativa das leis que lhe propiciem a boa execução dos trabalhos que lhe são atribuídos. Quando a Câmara Municipal, o órgão meramente legislativo, pretende intervir na forma pela qual se dará esse gerenciamento, está a usurpar funções que são de incumbência do Prefeito” (ADIN nº 53.583-0, rel. Des. FONSECA TAVARES).

O desrespeito às normas do processo legislativo, incluindo a infração ao ato que o deflagra (a iniciativa), conduz à inconstitucionalidade formal do ato produzido, que poderá sofrer o controle repressivo difuso ou concentrado por parte do Poder Judiciário.

A lei impugnada originou-se, como deflui dos autos, de projeto de autoria do ilustre Vereador Pedro Roberto Gomes (fls. 33), o que se constitui em evidente ofensa ao princípio constitucional da separação dos Poderes, vez que cabe exclusivamente ao Chefe do Poder Executivo projetar a normatização destinada a organizar, superintender e dirigir os serviços públicos.

Desta feita, em que pesem os elevados propósitos que inspiraram o Parlamentar, “não é dado aos vereadores resolver todos os assuntos por meio de lei. A Câmara Municipal somente pode estabelecer programas gerais, com base na Constituição se não criar atribuições para órgãos públicos ou determinar seu modo de execução, incumbências do Prefeito Municipal” (ADIN nº 104.747-0/7, rel. Des. Denser de Sá, DJ de 10.03.04).

Invadiu-se, portanto, a seara da administração pública, da alçada exclusiva do Prefeito, violando-se a prerrogativa deste em analisar a conveniência e oportunidade das providências que a lei quis determinar.

No panorama dos autos, divisa-se como solução a declaração de inconstitucionalidade, pois,

“se a Câmara, desatendendo à privatividade do Executivo para esses projetos, votar e aprovar leis sobre tais matérias, caberá ao prefeito vetá-las, por inconstitucionais. Sancionadas e promulgadas que sejam, nem por isso se nos afigura que convalesçam do vício inicial, porque o Executivo não pode renunciar prerrogativas institucionais, inerentes às suas funções, como não pode delegá-las ou aquiescer que o Legislativo as exerça” (Hely Lopes Meirelles. Direito Municipal Brasileiro, 16ª. ed., São Paulo: Malheiros, 2008,  p. 748).

Diante do exposto, nosso parecer é no sentido da integral procedência desta ação direta, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 10.245, de 14 de novembro de 2008, que “estabelece procedimento para a substituição de medidores de água (hidrômetro), no Município de São José do Rio Preto.

 

São Paulo, 25 de março de 2009.

 

 

        Maurício Augusto Gomes

        Subprocurador-Geral de Justiça

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