Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

 

Autos nº.  173.326-0/6-00

Requerente: Prefeito do Município de Lins

Requerido: Presidente da Câmara Municipal

Objeto: Emenda  n. 87/08 à Lei Orgânica do Município de Lins.

 

Ementa. 1) Ação Direta de Inconstitucionalidade em face da Emenda n. 87/08 à Lei Orgânica do Município de Lins. 2) Fixação de valor mínimo a ser aplicado nas áreas de Saúde, Educação, Assistência Social e Cultura. 3) Violação dos arts. 5º  e 144, ambos da Constituição do Estado de São Paulo. 4) Parecer pela procedência da ação.

 

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator:

 

O Prefeito Municipal de Lins formulou a presente ação direta objetivando a declaração de inconstitucionalidade  decorrente da Emenda n.87/08 à Lei Orgânicado Município de Lins. A inicial da presente ação direta argumentou, em síntese, que o dispositivo trazido pela referida emenda, fere o princípio da Separação dos Poderes, pois disciplina o orçamento financeiro e a destinação das verbas auferidas pela Administração Pública, matéria esta, cuja iniciativa é exclusiva do Poder Executivo.

Como parâmetro para o controle de constitucionalidade, a inicial indicou o art. 5º e 150 da Constituição do Estado de São Paulo e 2º e 31, da Constituição Federal.

 

A Emenda n. 87/08 à Lei Orgânica do Município de Lins teve a vigência e a eficácia suspensas por força da decisão interlocutória de fls. 20v., subscrita pelo Excelentíssimo Desembargador Relator, Dr. JOSÉ REYNALDO.

A fls. 24/28 estão as informações da Câmara Municipal.

Devidamente citado, o Procurador-Geral do Estado manifestou-se a fls. 50/52.

É o breve relato.

A presente ação direta é procedente, pois a Emenda  impugnada, de fato, extrapolou os limites estabelecidos pela Constituição do Estado de São Paulo. Vejamos.

A Emenda n. 87/08 à Lei Orgânica do Município de Lins, inseriu o art. 151-A, por meio do art. 1º da citada emenda que apresenta a seguinte redação:

“Art. 151-A – na execução do orçamento, as verbas destinadas à Saúde, Educação, Assistência Social e Cultura, nunca serão inferiores aos recursos utilizados no exercício anterior, somada a eles a inflação divulgada pelo Índice Geral de Preços de Mercado (IGPM), referente ao mesmo período”.

Consoante tem entendido esse Colendo Órgão Especial, ao Legislativo não é dado emendar leis nas matérias em que a iniciativa é reservada, pena de invasão de competência e violação ao Princípio da Separação dos Poderes.

 

A respeito, Hely Lopes Meirelles afirmou:

“Não nos parece que o direito ampare essas atitudes radicais. A nosso sentir a razão está com os que atenuam as posições extremadas para admitir a emenda dentro dos limites da proposição do Executivo. O monopólio da iniciativa não exclui, por si só, o poder de emenda. A iniciativa diz respeito ao impulso criador da proposição, o que não se confunde, nem afasta a possibilidade de modificações pelo Legislativo, durante o processo de formação da lei, desde que não desnature a proposta inicial.

A exclusividade da iniciativa de certas leis destina-se a circunscrever   (não a anular)    a  discussão e votação do projeto às matérias propostas pelo Executivo. Nessa conformidade, pode o Legislativo apresentar emendas supressivas e restritivas, não lhe sendo permitido, porém, oferecer emendas ampliativas, que importem em aumento da despesa prevista, ressalvadas as emendas aos projetos que dispõem sobre matéria orçamentária. ...Negar sumariamente o direito de emenda à Câmara é reduzir esse órgão a mero homologador da lei proposta pelo Prefeito, o que nos parece incompatível com a função legislativa que lhe é própria”.

Tal posicionamento permite-nos afirmar que: Não são vedadas emendas a projetos de lei de iniciativa reservada do Executivo, como o são as matérias relativas à criação de cargos, funções ou empregos públicos na administração pública municipal.

 

No entanto, o  poder de emenda deve ser restrito a matérias que não venham a transformar a proposição inicial, a ponto de representar verdadeira usurpação da iniciativa reservada do Executivo.

Oportuna a seguinte transcrição:

“Dentro do círculo da proposta do Executivo poder-se-á exercer o direito de emenda, inclusive para suprimir as omissões ou deficiências verificadas no curso da elaboração legislativa. O que repugna ao espírito da regra constitucional é a aceitação de que, vencido o obstáculo inicial da proposta do Governo, possa o Legislativo modificá-la com absoluta liberdade de criação, transmudando-lhe o alcance e a substância para estabelecer situações que, explícita ou implicitamente, não se continham na iniciativa governamental”. (cf. CAIO TÁCITO, em “Poder de iniciativa e poder de emenda”, em RDA 28/51).

Feitas tais considerações, voltemos ao texto legal para saber se o Legislativo invadiu competência do Executivo no processo de iniciativa das leis. E, a resposta é afirmativa.

De fato, a emenda aqui combatida configura clara ofensa ao Princípio da Separação dos Poderes, inscrito no artigo 5º da Constituição do Estado de São Paulo.

E tal conclusão é inevitável em face do modelo adotado pela Constituição Federal para a relação entre os Poderes. Não há, nesse modelo, previsão de que o Poder Legislativo possa regulamentar a destinação das verbas auferidas pelo Município, estabelecendo um piso para os valores a serem destinados nas áreas da Saúde, Educação, Assistência Social e Cultura, que no caso em concreto, não poderá ser inferior aos valores gastos no exercício anterior, acrescido de correção monetária.

Isto porque, trata-se de matéria referente à administração pública, cuja gestão é de competência exclusiva do Prefeito, que atuará nesse campo com absoluta independência.

Em conclusão: a emenda impugnada é inconstitucional porque, afrontando a separação entre os Poderes, interfere na esfera de atuação exclusivamente administrativa, contrariando os artigos 5º e 144, todos da Constituição do Estado.

Nestes termos, opino pela procedência do pedido para que seja declarada inconstitucional a Emenda n. 87/08 à Lei Orgânica do Município de Lins, que inseriu o art. 151-A, por meio do art. 1º, da citada Emenda.

                     São Paulo,  15 de abril de 2009.

Maurício Augusto Gomes

Subprocurador-Geral de Justiça

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