Parecer
Autos nº. 177.980.0/9-00
Requerente: Prefeito do Município de Suzano
Objeto: Lei Complementar nº 171, de 26 de junho de 2008, do Município de Suzano
Ementa: Ação
direta de inconstitucionalidade, movida por Prefeito, da Lei Complementar nº 171/08,
do Município de Suzano, que “altera a redação e acrescenta parágrafo único ao
art. 207 da Lei Complementar nº 39/07”, isentando do IPTU os contribuintes
aposentados, pensionistas ou beneficiários da prestação continuada que atendam
a determinados requisitos. Lei tributária benéfica, de iniciativa de Vereador,
que implica em diminuição de receita, com impacto no orçamento. Alegada
usurpação da competência privativa do Chefe do Poder Executivo, por ofensa aos
artigos 5º e 144 da Constituição do Estado. Precedentes do Supremo Tribunal
Federal no sentido de que, em matéria tributária, a iniciativa das leis,
inclusive benéficas, é concorrente. Parecer pela improcedência da ação.
Colendo Órgão Especial
Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente
Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito Municipal de Suzano, tendo por objeto a Lei Complementar nº 171/08, do mesmo município, que “altera a redação e acrescenta parágrafo único ao art. 207 da Lei Complementar nº 39/07”, isentando do IPTU os contribuintes aposentados, pensionistas ou beneficiários da prestação continuada que atendam a determinados requisitos.
Sustenta o autor que a lei foi concebida por Vereador e que a isenção por ela criada compromete a execução do orçamento pelo Poder Executivo. Aponta ofensa ao princípio da separação dos poderes e violação dos art. 5º e 144 da Constituição do Estado, além da incompatibilidade da iniciativa com a Lei de Responsabilidade Fiscal (fls. 2/10).
A Lei teve a vigência e eficácia suspensas ex nunc, atendendo-se ao pedido liminar (fls. 27/28).
O Presidente da Câmara Municipal prestou informações sobre o processo legislativo (fls. 42/97).
A Procuradoria-Geral do Estado declinou da defesa do ato impugnado, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 38/40).
Este é o breve resumo do que consta dos autos.
A lei questionada tem a seguinte redação:
LEI COMPLEMENTAR Nº 171/08
Altera a redação e acrescenta parágrafo único ao artigo 207 da Lei Complementar nº 39/97.
Projeto de Lei Complementar nº 028-07/08
Autoria: Ver. Jorge Eduardo Lordello Silva
GERSON MAMEDE RODRIGUES, Presidente da Câmara Municipal de Suzano, no uso de suas atribuições legais e conforme o disposto no artigo 45, § 5º, da Lei Orgânica do Município;
Faz saber que a Câmara Municipal de Suzano aprova e ele promulga a seguinte Lei:
Art. 1º - O artigo 207 da Lei Complementar nº 39/97 passa a ter a seguinte redação:
“Art. 207 – Ficam isentos do Imposto Predial e Territorial Urbano os imóveis pertencentes aos contribuintes que sejam aposentados, pensionistas ou beneficiários da prestação continuada e que atendam aos seguintes requisitos:
I – tenham um único imóvel, com uma única edificação e nele residam;
II – a área do terreno não poderá ser superior ao lote-padrão do loteamento em que residam e a área construída não ultrapassar a 150 (cento e cinqüenta) metros quadrados;
III – tenham renda familiar mensal, a qualquer título, não superior a 4 (quatro) salários mínimos”.
Art. 2º - Fica acrescentado o parágrafo único ao artigo 207 da Lei Complementar nº 39/97 com a seguinte redação:
“Parágrafo único – Considera-se prestação continuada o benefício previsto no artigo 20 da Lei Federal nº 8742/93, que institui a Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS”.
Art. 3º - As despesas decorrentes da execução da presente Lei Complementar correrão por conta das dotações orçamentárias próprias, suplementadas, se necessário.
Art. 4º - Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário, em especial o artigo 2º da Lei Complementar nº 48/98.
Sala da Presidência da Câmara Municipal de Suzano, em 26 de junho de 2008.
Vereador GERSON MAMEDE RODRIGUES, Presidente
ADILSON DE CASTRO REIS, Secretário Diretor Geral
Cuida-se de norma tributária benéfica, porque cria isenções de IPTU para as hipóteses nela contempladas.
De forma majoritária, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo tem declarado a inconstitucionalidade de leis de iniciativa parlamentar que instituem benefícios fiscais.
Tem prevalecido o entendimento de que as normas da espécie, porque diminuem a receita, somente poderiam ser concebidas pelo Poder Executivo, que é o encarregado da execução do Orçamento.
Colhe-se,
“Este Órgão Especial, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 144.748.0/4-00, julgada em 12 de setembro de 2007, sendo relator o Des. MARCO CÉSAR, à unanimidade reconheceu a inconstitucionalidade por vício de iniciativa de lei tributária benéfica de Ribeirão Preto, que instituiu incentivo fiscal para apoio de projetos culturais. Também na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 135.071.0/3-00, julgada em 26 de setembro de 2007, sendo relator o Des. MOHAMED AMARO, contra os votos dos Des. ROBERTO VALLIM BELLOCCHI e IVAN SARTORI reconheceu a inconstitucionalidade por vício de iniciativa de lei que instituiu a isenção tributária aos portadores de deficiência ou seus responsáveis, no Município de Jundiaí. E mais recentemente, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 148.312.4/0-00, julgada em 3 de outubro de 2007, sendo relator o des. MARCO CÉSAR, também contra os votos dos Des. ROBERTO VALLIM BELLOCCHI e IVAN SARTORI reconheceu a inconstitucionalidade por vício de iniciativa de lei que isentou do pagamento de taxas entidades beneficiadas pela imunidade” (ADIN nº 149.269-0/4-00, de 20 de fevereiro de 2008, r. Des. Boris Kauffmann).
Essa orientação tem apoio em Carraza.
O autor, depois de anotar que a iniciativa das leis que criam e aumentam tributos é ampla, cabendo, portanto, a qualquer membro do Legislativo, ao chefe do Executivo, aos cidadãos etc., afirma que o raciocínio não vale para as leis benéficas, cuja iniciativa está reservada ao chefe do Executivo (Presidente, Governador, Prefeito). Leis benéficas, de acordo com sua lição, são aquelas que, quando aplicadas, acarretam diminuição de receita, como as que concedem isenções tributárias, parcelam débitos fiscais, aumentem prazos para o normal recolhimento de tributos, etc. (Roque Antonio Carrazza. Curso de Direito Constitucional Brasileiro. 23a ed , 2007, São Paulo: Malheiros Editores, p. 303-304).
A orientação contrária, no entanto, apóia-se no fato de que, em matéria tributária, a competência legislativa é concorrente (art. 61 da CF e art. 24 da CE).
Desse modo, não haveria inconstitucionalidade por vício de iniciativa na lei que institui incentivo fiscal, pois a norma não estaria versando sobre matéria orçamentária, nem aumentando a despesa do Município.
E essa é a tese que prevalece no Supremo Tribunal Federal.
O texto normativo impugnado dispõe sobre matéria de caráter tributário, isenções, matéria que, segundo entendimento dessa Corte, é de iniciativa comum ou concorrente; não há, no caso, iniciativa [parlamentar] reservada ao Chefe do Poder Executivo. Tem-se por superado, nesta Corte, o debate a propósito de vício de iniciativa referente à matéria tributária (ADI 3.809/ES, j. 14.6.07. Disponível em www.stf.gov.br. Acesso em 15 out. 2008, g.n.).
Os seguintes julgados (citados no v. Acórdão destacado) comprovam essa assertiva:
EMENTA: I. Ação direta de inconstitucionalidade: L. est.
2.207/00, do Estado do Mato Grosso do Sul (redação do art. 1º da L. est.
2.417/02), que isenta os aposentados e pensionistas do antigo sistema estadual
de previdência da contribuição destinada ao custeio de plano de saúde dos
servidores Estado: inconstitucionalidade declarada. II. Ação direta de inconstitucionalidade:
conhecimento. 1. À vista do modelo dúplice de controle de constitucionalidade
por nós adotado, a admissibilidade da ação direta não está condicionada à
inviabilidade do controle difuso.
EMENTA: CONSTITUCIONAL. LEI DE ORIGEM PARLAMENTAR QUE FIXA MULTA
AOS ESTABELECIMENTOS QUE NÃO INSTALAREM OU NÃO UTILIZAREM EQUIPAMENTO EMISSOR
DE CUPOM FISCAL. PREVISÃO DE REDUÇÃO E ISENÇÃO DAS MULTAS
É inequívoco que, ao isentar determinados proprietários de imóveis do IPTU, a lei impugnada redimensionou para menos a receita.
Toda política pública, entretanto, tem impacto no orçamento, realidade que não pode ser levada em conta para caracterizar como orçamentária a norma que a estabelece.
Desse modo, curvando-me à orientação do Supremo Tribunal Federal, não vislumbro a inconstitucionalidade da lei impugnada.
Diante do exposto, nosso parecer é no sentido da improcedência desta ação direta de inconstitucionalidade.
São Paulo, 7 de agosto de 2009.
Maurício Augusto Gomes
Subprocurador-Geral de Justiça
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