Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Autos nº.  179. 422. 0/8-00

Requerente: Prefeito Município  de Bauru

Objeto: Lei nº 5.636, de 02 de setembro de 2008, do Município de Bauru.

 

Ementa:

Ação Direta de Inconstitucionalidade, promovida por Prefeito, da Lei n.º 5.636, de 02 de setembro de 2008, do Município de Bauru, que impõe às instituições bancárias e financeiras o dever de colocar á disposição dos usuários, pessoal suficiente no setor de caixas para que o atendimento seja efetivado em tempo razoável e atribui o ônus decorrentes do dever de fiscalizar à Administração. Projeto de lei de iniciativa parlamentar. Ofensa ao princípio federativo por versar matéria da competência legislativa da União, e da separação dos poderes. Criação de despesa, ademais, sem indicação dos recursos disponíveis. Ofensa aos artigos 1º, 5º, 25, 47 II, e 144, da Constituição do Estado. Parecer pela procedência da ação.

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

1)    Relatório.

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito do Município de Bauru, tendo por objeto a Lei Municipal n. 5.636, de 02 de setembro de 2008, do Município de Bauru, que “obriga as agências bancárias, no âmbito do Município, a colocar a disposição dos usuários, pessoal suficiente no setor de caixas para que o atendimento seja efetivado em tempo razoável”.

Sustenta que refira lei  viola o princípio da isonomia, haja vista não contemplar outros estabelecimentos comerciais privados ou públicos como hospitais, supermercados, entre outros, e, por isso, seria inconstitucional à luz do artigo 144 da Carta Bandeirante.

O pedido liminar foi deferido, pelo r. Despacho de fls. 33/35.

A Procuradoria-Geral do Estado declinou da defesa do ato normativo, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 194/196).

O Presidente da Câmara Municipal, citado por via postal, prestou as informações, defendendo a constitucionalidade da lei questionada  (fls. 37 e ss.).

2) Mérito.

A lei em análise, que obriga as agências bancárias, no âmbito do Município a colocar a disposição dos usuários, pessoal suficiente no setor de caixas para que o atendimento seja efetivado em tempo razoável, tem a seguinte redação:

“Art. 1º - Ficam as Agências Bancárias, no âmbito do Município de Bauru, obrigadas a colocar à disposição dos usuários, pessoal suficiente no setor de Caixas para que o atendimento seja efetivado em tempo razoável.

 

Art. 2º - Para efeito desta lei, entende-se como tempo razoável para atendimento:

I-                   Até 15 (quinze) minutos em dias normais;

II-                 Até 30 (trinta) minutos em dias que antecedem ou sucedem feriados prolongados;

III-               Até 30 (trinta) minutos em dias de pagamento dos funcionários públicos municipais, estaduais e federais.

§1º - As Instituições Bancárias ou suas entidades representativas informarão ao órgão encarregado de fazer cumprir esta lei, as datas mencionadas nos incisos II e III.

§2º - O tempo máximo de atendimento referido nos incisos I, II e III, leva em consideração a manutenção do turno normal dos serviços essenciais à atividade bancária, como energia, telefonia e transmissão de dados.

Art. 3º - As Agências Bancárias tem o prazo máximo de 60 (sessenta) dias, a contar da data da publicação desta lei oara adaptarem-se às suas disposições.

Art.4º - O não cumprimento das disposições desta lei sujeitará o infrator às seguintes punições:

I-                   Multa de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais), na primeira reclamação;

 

 

II-                 Cassação do Alvará de Funcionamento, expedido pelo Município, na reincidência.

Art. 5º - Os Munícipes deverão fazer as denúncias diretamente ao órgão municipal competente, encarregado de zelar pelo cumprimento desta lei, utilizando-se de todos os meios de prova admitidos pela legislação pátria.

Art.6º - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário, em especial as Leis ns. 4585/00, 4742/01 e 5034/03.

 

Deflui dos autos que a Lei em análise decorre de projeto de autoria do Vereador José Carlos de Souza Pereira e tem por escopo obrigar os estabelecimentos bancários a atender seus usuários em até 15 ou 30 minutos, sob pena de multa e cassação do alvará expedido pelo Município.

É sabido, no entanto, que compete à União legislar sobre os serviços bancários e que esse E. Tribunal de Justiça já declarou inconstitucionalidade de lei municipal que tratava da matéria, divisando a violação do Princípio Federativo, reproduzido nos artigos 1º. e 144 da Constituição do Estado:

INCONSTITUCIONALIDADE - Lei Municipal que dispõe sobre o funcionamento de

                                                              bancos, marcando prazo para que os caixas atendam os usuários, sob pena de serem penalizados os estabelecimentos - Ação Direta julgada procedente, por ofensa aos artigos 1º. e 144 da Constituição Estadual - É inválida a lei municipal que dispõe sobre matéria da competência exclusiva da União, visto contrariar frontalmente o Princípio Federativo, contemplado expressamente na Carta paulista (ADIN - 74.304-0/4).

De outro giro, há vício de iniciativa da lei impugnada.

É que somente ao Chefe do Poder Executivo assiste a iniciativa de leis que criem – como é o caso – obrigações e deveres para órgãos municipais (art. 47, inc. II da Constituição Estadual, de aplicação extensível aos municípios por força do art. 144 da mesma Carta).

Note-se que a lei em análise, concebida na Câmara dos Vereadores, impõe à Administração o ônus de manter servidores para constatar as irregularidades denunciadas.

Invade-se, à evidência, a seara da administração pública, da alçada exclusiva do Prefeito, violando-se sua prerrogativa de analisar a conveniência e oportunidade das providências que a lei quis determinar.

Bem por isso, a matéria somente poderia objeto de tramitação legislativa por proposta do próprio Chefe do Poder Executivo.

 

 

Ofendeu-se, igualmente, o princípio basilar da separação de poderes, pois, na dicção desse Sodalício:

“Ao Executivo haverá de caber sempre o exercício de atos que impliquem no gerir as atividades municipais. Terá, também, evidentemente, a iniciativa das leis que lhe propiciem a boa execução dos trabalhos que lhe são atribuídos. Quando a Câmara Municipal, o órgão meramente legislativo, pretende intervir na forma pela qual se dará esse gerenciamento, está a usurpar funções que são de incumbência do Prefeito” (ADIN n. 53.583-0, rel. Des. FONSECA TAVARES).

 

No caso dos autos, existe outro fundamento, igualmente relevante (embora também não mencionado na inicial), que, por si só, demandaria o reconhecimento da inconstitucionalidade.

A regra do art. 25 da Constituição do Estado, fortemente influenciada pela noção de responsabilidade fiscal, exige que o projeto de lei que implique criação ou aumento de despesa pública contenha a previsão dos recursos disponíveis para o atendimento dos novos encargos.

Na hipótese em análise é intuitivo que a atividade de fiscalização instituída gera despesas. E a lei não contém nenhum elemento indicador de sua provisão, do que decorre sua incompatibilidade com o texto constitucional.

3) Conclusão.

Diante do exposto,  somos pela procedência desta ação direta, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei nº 5.636, de 02 de setembro de 2008, do Município de Bauru.

 

São Paulo, 16 de novembro de 2009.

 

        Maurício Augusto Gomes

        Subprocurador-Geral de Justiça

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