Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo n. 181.889-0/8-00

Requerente: Prefeito do Município de Iperó

Objeto: art. 16, XIV, da Lei Orgânica do Município de Iperó

 

Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Orgânica do Município de Iperó (art. 16, XIV). Viola a separação dos poderes submeter assunto da gestão administrativa, consistente na celebração de convênio, acordo ou contrato pelo Poder Executivo, à autorização ou aprovação do Poder Legislativo. Procedência da ação. Arts. 5º, 47, II, XIV e XIX, a, 111 e 115, II e V, Constituição Estadual.

 

Colendo Órgão Especial:

 

1.                 Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade impugnando o inciso XIV do art. 16 da Lei Orgânica do Município de Iperó que estabelece a competência da Câmara Municipal para “autorizar ou aprovar convênios, acordos ou contratos de que resultem, para o Município, encargos não previstos na lei orçamentária”, sob alegação de ofensa ao art. 5º da Constituição Estadual (fls. 02/11). Concedida liminar (fl. 68), o douto Procurador-Geral do Estado declinou de sua intervenção na lide (fls. 78/80) e decorreu in albis o prazo de manifestação da Câmara Municipal (fl. 81).

2.                É o relatório.

3.                A ação é procedente.

4.                Com efeito, emana do princípio da separação dos poderes a proibição de interferência de um Poder sobre o outro. Pelo desenho normativo-constitucional exposto, a celebração de convênio, acordo ou contrato é típico ato de gestão administrativa, elementar às funções reservadas ao Poder Executivo, e imune da participação do Poder Legislativo. Corolário do princípio da separação dos poderes é que as interferências recíprocas entre os Poderes da República são aquelas expressamente consignadas e previstas na Constituição.

5.                Portanto, a lei local impugnada é inconstitucional no que tange ao seu art. 16, XIV, por manifesta incompatibilidade vertical com os arts. 5º e 47, II, XIV e XIX, a, da Constituição Estadual, incidentes na espécie, por obra de seu art. 144.

6.                Neste sentido, pronuncia iterativa jurisprudência:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 60, XXVI, DA LEI ORGÂNICA DO DISTRITO FEDERAL. ALEGADA INCOMPATIBILIDADE COM OS ARTS. 18, E 25 A 28, TODOS DA CARTA DA REPÚBLICA. Dispositivo que, ao submeter à Câmara Legislativa distrital a autorização ou aprovação de convênios, acordos ou contratos de que resultem encargos não previstos na lei orçamentária, contraria a separação de poderes, inscrita no art. 2.º da Constituição Federal. Precedentes. Ação julgada procedente” (STF, ADI 1.166-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ilmar Galvão, 05-09-2002, v.u., DJ 25-10-2002, p. 24).

“CONSTITUCIONAL. CONVÊNIOS, ACORDOS, CONTRATOS, AJUSTES E INSTRUMENTOS CONGÊNERES. APROVAÇÃO DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA: INCONSTITUCIONALIDADE. I. - Normas que subordinam convênios, ajustes, acordos e instrumentos congêneres celebrados pelo Poder Executivo estadual à aprovação da Assembléia Legislativa: inconstitucionalidade. II. - Suspensão cautelar da Lei nº l0.865/98, do Estado de Santa Catarina”(STF, ADI-MC 1.865-SC, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 04-09-1999, v.u., DJ 12-03-1999, p. 02).

“Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 20, inciso III do artigo 40 e a expressão ‘ad referendum da Assembléia Legislativa’ contida no inciso XIV do artigo 71, todos da Constituição do Estado de Santa Catarina. Pedido de Liminar. - Normas que subordinam convênio, ajustes, acordos e instrumentos congêneres celebrados pelo Poder Executivo estadual à aprovação da Assembléia Legislativa. Alegação de ofensa ao princípio da independência e harmonia dos Poderes (art. 2º da Constituição Federal). Liminar deferida para suspender, ‘ex nunc’ e até julgamento final, a eficácia dos dispositivos impugnados” (STF, ADI-MC 1.857-SC, Tribunal Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, 27-08-1998, v.u., DJ 23-10-1998, p. 02).

“Ação direta de inconstitucionalidade. Incisos XIII, XXIX e XXX do artigo 71 e § 1º do artigo 15, todos da Constituição do Estado da Bahia, promulgada em 05 de outubro de 1989. - Os incisos XIII e XIX do artigo 71 da Constituição do Estado da Bahia são ofensivos ao princípio da independência e harmonia dos Poderes (artigo 2º da Constituição Federal) ao darem à Assembléia Legislativa competência privativa para a autorização de convênios, convenções ou acordos a ser celebrados pelo Governo do Estado ou a aprovação dos efetivados sem autorização por motivo de urgência ou de interesse público, bem como para deliberar sobre censura a Secretaria de Estado. - Violam o mesmo dispositivo constitucional federal o inciso XXX do artigo 71 (competência privativa à Assembléia Legislativa para aprovar previamente contratos a ser firmados pelo Poder Executivo e destinados a concessão e permissão para exploração de serviços públicos) e a expressão ‘dependerá de prévia autorização legislativa e’ do § 1º do artigo 25 (relativa à concessão de serviços públicos), ambos da Constituição do Estado da Bahia. Ação julgada procedente em parte, para declarar a inconstitucionalidade dos incisos XIII, XXIX e XXX do artigo 71 e a expressão ‘dependerá de prévia autorização legislativa e’ do § 1º do artigo 25, todos da Constituição do Estado da Bahia, promulgada em 05 de outubro de 1989” (STF, ADI 462-BA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, 20-08-1997, v.u., DJ 18-02-2000, p. 54).

“CONSTITUCIONAL. CONVÊNIOS, ACORDOS, CONTRATOS E ATOS DE SECRETÁRIOS DE ESTADO. APROVAÇÃO DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA: INCONSTITUCIONALIDADE. I. - Norma que subordina convênios, acordos, contratos e atos de Secretários de Estado à aprovação da Assembléia Legislativa: inconstitucionalidade, porque ofensiva ao princípio da independência e harmonia dos poderes. C.F., art. 2º. II. - Inconstitucionalidade dos incisos XX e XXXI do art. 99 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro. III. - Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente” (STF, ADI 676-RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 01-07-1996, v.u., DJ 29-11-1996, p. 47.155).

7.                Em harmonia ao exposto, opino pela procedência da ação para declaração da inconstitucionalidade do inciso XIV do art. 16 da Lei Orgânica do Município de Iperó.              

                   São Paulo, 01 de dezembro de 2009.

 

 

        Maurício Augusto Gomes

        Subprocurador-Geral de Justiça

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