Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

Autos nº. 9032621-82.2009.8.26.0000 (994.09.231056-8)

Requerente: Prefeito Municipal de Franca

Objeto: Inconstitucionalidade da Lei Municipal 7296, de 21 de setembro de 2009, de Franca

 

 

 

Ementa:

1)      Ação direta de inconstitucionalidade.  Lei Municipal 7296, de 21 de setembro de 2009, de Franca, que “acrescenta dispositivos na Lei 5724/2002, que autoriza o parcelamento de multa de trânsito de competência do município, permitindo o parcelamento da taxa de estadia de veículo recolhido no pátio municipal”.

2)      Constitucionalidade reconhecida. Lei que não concede isenção tributária, apenas admitindo o parcelamento de determinada espécie de dívida fiscal. Inexistência de reserva de iniciativa nessa matéria. Posicionamento pacífico do Col. STF. Precedentes. Entendimento diverso que significaria contrariedade ao art. 2º e ao art. 61, caput da CR.

3)      Parecer pela constitucionalidade do ato normativo e improcedência da ação direta.

 

 

 

 

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator

 

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Senhor Prefeito Municipal de Franca, tendo como objeto a Lei Municipal 7296, de 21 de setembro de 2009, de Franca, fruto de iniciativa parlamentar que “acrescenta dispositivos na Lei 5724/2002, que autoriza o parcelamento de multa de trânsito de competência do município, permitindo o parcelamento da taxa de estadia de veículo recolhido no pátio municipal”.

Alega o requerente que: (a) houve violação da regra da separação de poderes (art. 5º, bem como art. 47, II e XIV da Constituição do Estado); (b) nessa matéria (concessão de isenções ou parcelamentos tributários) a competência para o início do processo legislativo é privativa do Poder Executivo (art. 174 da Constituição do Estado).

O requerente juntou cópia de acórdãos do Col. Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo em apoio à sua tese (fls. 47 e ss.).

Foi deferida a liminar, determinando-se a suspensão do ato normativo impugnado (fls. 104).

Foram prestadas informações pela Câmara Municipal de Franca (fls. 120/124).

O Senhor Procurador-Geral do Estado, citado, declinou de oferecer defesa do ato normativo (fls. 127/129).

É o relato do essencial.

A Lei Municipal 7296, de 21 de setembro de 2009, de Franca, fruto de iniciativa parlamentar que “acrescenta dispositivos na Lei 5724/2002, que autoriza o parcelamento de multa de trânsito de competência do município, permitindo o parcelamento da taxa de estadia de veículo recolhido no pátio municipal” tem a seguinte redação:

“(...)

Art. 1º. Fica acrescentado na Lei 5724, de 28 de junho de 2002, que autoriza o parcelamento de multa de trânsito, o seguinte art. 3º, renumerando-se os demais posteriores:

‘art. 3º. Se o veículo for apreendido e recolhido ao Pátio Municipal, sob responsabilidade do município, o valor total da taxa de estadia poderá ser dividido para pagamento em até 6 (seis) parcelas.

§ 1º. Para o parcelamento de que trata esse artigo, o valor da taxa deverá ser superior a 3 (três) Unidades Fiscais do Município de Franca (UMF).

§ 2º. A inadimplência em relação ao parcelamento das taxas de estadia incorrerá na inscrição do proprietário do veículo na Dívida Ativa do Município.’

Art. 2º. As despesas para a consecução desta lei correm à conta de dotações orçamentárias próprias.

(...)”

Com o devido respeito relativamente aos argumentos apresentados pelo autor, bem como pelos precedentes por ele coligidos, referentes a julgados do Col. Órgão Especial do TJ, nosso entendimento, amparado pelo posicionamento pacífico do Col. STF nessa matéria é no sentido de que não existe reserva de iniciativa em matéria tributária, bem como que não há falar-se em quebra do princípio da separação de poderes na hipótese aqui considerada.

Assim, a lei de iniciativa parlamentar que concede isenções ou permite o parcelamento de dívidas tributárias mostra-se constitucionalmente legítima.

Confira-se o entendimento pacífico do Col. STF:

"(...)

Ação direta de inconstitucionalidade. Lei 553/2000, do Estado do Amapá. Desconto no pagamento antecipado do IPVA e parcelamento do valor devido. Benefícios tributários. Lei de iniciativa parlamentar. Ausência de vício formal. Não ofende o art. 61, § 1º, II, b, da CF, lei oriunda de projeto elaborado na Assembleia Legislativa estadual que trate sobre matéria tributária, uma vez que a aplicação deste dispositivo está circunscrita às iniciativas privativas do chefe do Poder Executivo Federal na órbita exclusiva dos territórios federais. Precedentes: ADI 2.724, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 2-4-04, ADI 2.304, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 15-12-2000 e ADI 2.599-MC, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 13-12-2002. A reserva de iniciativa prevista no art. 165, II, da Carta Magna, por referir-se a normas concernentes às diretrizes orçamentárias, não se aplica a normas que tratam de direito tributário, como são aquelas que concedem benefícios fiscais. Precedentes: ADI 724-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 27-4-2001 e ADI 2.659, Rel. Min. Nelson Jobim, DJ de 6-2-2004. Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido se julga improcedente. (ADI 2.464, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 11-4-2007, Plenário, DJ de 25-5-2007.) g.n.

(...)

Ação direta de inconstitucionalidade: Lei estadual 2.207/2000, do Estado do Mato Grosso do Sul (redação do art. 1º da Lei estadual 2.417/2002), que isenta os aposentados e pensionistas do antigo sistema estadual de previdência da contribuição destinada ao custeio de plano de saúde dos servidores Estado (...) Processo legislativo: matéria tributária: inexistência de reserva de iniciativa do Executivo, sendo impertinente a invocação do art. 61, § 1º, II, b, da Constituição, que diz respeito exclusivamente aos Territórios Federais. (ADI 3.205, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgamento em 19-10-2006, Plenário, DJ de 17-11-2006.) No mesmo sentido: RE 328.896, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 9-10-2009, DJE de 5-11-2009; ADI 2.392-MC, Rel. Min. Moreira Alves, julgamento em 28-3-2001, Plenário, DJ de 1º-8-2003; ADI 2.474, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 19-3-2003, Plenário, DJ de 25-4-2003; ADI 2.638, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 15-2-2006, Plenário, DJ de 9-6-2006. (g.n.)

(...)”

Também não modifica esse quadro o argumento, contido na inicial, de que a reserva de iniciativa estaria assentada no art. 174 da Constituição do Estado de São Paulo.

Este dispositivo trata da reserva de iniciativa para matéria orçamentária, e não para matéria tributária, sendo norma de repetição do art. 165 da Constituição da República.

E a respeito do art. 165 da CR o Col. STF pacificou a interpretação, acima consignada, no sentido de não servir de suporte à afirmação de que induziria reserva de iniciativa legislativa em matéria tributária (ADI 724-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 27-4-2001 e ADI 2.659, Rel. Min. Nelson Jobim, DJ de 6-2-2004).

Mas não é só.

Entendimento diverso, sob a alegação de que haveria ofensa ao princípio da separação de poderes (art. 5º, e art. 47, II e XIV da Constituição do Estado), ou mesmo que há aumento de despesa sem a indicação da fonte das respectivas receitas (art. 25 da Constituição do Estado) não merecerá acolhimento.

Note-se que, inexistindo reserva de iniciativa nessa matéria, o entendimento de que há, na hipótese, violação da separação de poderes implica contrariedade ao disposto no art. 2º, e art. 61, caput, ambos da CR/88.

Acrescente-se que a lei nem mesmo hipoteticamente provocará aumento de despesa sem indicação de receitas, sendo inaplicável o art. 25 da Constituição do Estado. A lei não isentou o pagamento de dívidas decorrentes do valor da estadia em pátio, quanto a veículos apreendidos, tendo apenas autorizado o seu parcelamento em até seis vezes.

Portanto, reitere-se que solução diversa significaria contrariedade ao art. 2º, e art. 61, caput, ambos da CR/88.

Diante do exposto, nosso parecer é no sentido da improcedência da presente ação, reconhecendo-se a constitucionalidade da Lei Municipal 7296, de 21 de setembro de 2009, de Franca.

São Paulo, 17 de maio de 2011.

 

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

 

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