Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Autos nº. 994.09.228383-3 (181.196-0)

Requerente: Prefeito do Município de São Paulo

Objeto: Lei nº 14.638, de 18 de dezembro de 2007, do Município de São Paulo

 

Ementa: Ação Direta de Inconstitucionalidade, promovida por Prefeito, da Lei nº 14.638, de 18 de dezembro de 2007, do Município de São Paulo, que “proíbe o ato de fumar ao volante e dá outras providências”. Iniciativa parlamentar. Ato normativo que cria ônus para a Administração decorrente do dever de fiscalizar. Violação ao princípio da separação dos poderes. Criação de despesas, ademais, sem indicação dos recursos disponíveis. Ofensa aos artigos 5º, 25, 47 II, e 144, da Constituição do Estado. Parecer pela procedência da ação

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

 

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito Municipal de Atibaia, tendo por objeto Lei nº 14.638, de 18 de dezembro de 2007, do Município de São Paulo, que “proíbe o ato de fumar ao volante e dá outras providências”.

Sustenta o autor que o Município não tem competência legislativa para legislar sobre trânsito e transporte. Ademais,  a lei impugnada foi concebida na Câmara Municipal. Haveria, nesse aspecto, violação ao princípio da separação dos poderes (art. 5º, CE), eis que a norma diz respeito à gestão administrativa.

Por outro lado, referida legislação cria não só despesas para a Administração, sem indicação dos recursos disponíveis, como também exige a criação de um departamento para a fiscalização e aplicação de multa, contrariando, também, os arts. 24,§2º, I e 25, da Constituição Estadual.

A Lei teve a vigência e eficácia suspensas ex nunc, atendendo-se ao pedido liminar (fls. 17/18).

Contra essa decisão, a Câmara Municipal de São Paulo interpôs Agravo Regimental, (fls.24/41).

No entanto a r. decisão recorrida foi mantida, (fls. 62/66).

O Presidente da Câmara Municipal  prestou informações, defendendo a constitucionalidade da legislação impugnada, (fls. 74/82).

Este é o breve resumo do que consta dos autos.

Preliminarmente, mostra-se necessária a citação do Senhor Procurador-Geral do Estado para a defesa do ato normativo impugnado (art. 90, § 2º da Constituição do Estado de São Paulo).

No mérito, deflui dos autos que a Lei em análise decorre de projeto de autoria parlamentar e proíbe, sob pena de multa, o ato de fumar no volante.

Em que pese o elevado propósito do Legislador, é de se dar razão ao Alcaide acerca do vício de iniciativa.

É que somente ao Chefe do Poder Executivo assiste a iniciativa de leis que criem – como é o caso – obrigações e deveres para órgãos municipais (art. 47, inc. II da Constituição Estadual, de aplicação extensível aos municípios por força do art. 144 da mesma Carta).

Note-se que, instituindo uma proibição para o munícipe, a lei impõe à Administração o correspondente dever de fiscalizá-lo. Desse modo, está criando serviço público.

Como a lei foi concebida no Poder Legislativo, a iniciativa acabou invadindo a seara da administração pública, da alçada exclusiva do Prefeito, violando sua prerrogativa de analisar a conveniência e oportunidade da providência que a lei quis determinar.

Bem por isso, a matéria somente poderia objeto de tramitação legislativa por proposta do próprio Chefe do Poder Executivo.

Ofendeu-se, igualmente, o princípio basilar da separação de poderes, pois, na dicção desse Sodalício:

“Ao Executivo haverá de caber sempre o exercício de atos que impliquem no gerir as atividades municipais. Terá, também, evidentemente, a iniciativa das leis que lhe propiciem a boa execução dos trabalhos que lhe são atribuídos. Quando a Câmara Municipal, o órgão meramente legislativo, pretende intervir na forma pela qual se dará esse gerenciamento, está a usurpar funções que são de incumbência do Prefeito” (ADIN n. 53.583-0, rel. Des. FONSECA TAVARES).

No caso dos autos, existe outro fundamento, igualmente relevante, que, por si só, demandaria o reconhecimento da inconstitucionalidade.

A regra do art. 25 da Constituição do Estado, fortemente influenciada pela noção de responsabilidade fiscal, exige que o projeto de lei que implique criação ou aumento de despesa pública contenha a previsão dos recursos disponíveis para o atendimento dos novos encargos.

Na hipótese em análise é intuitivo que a atividade de apuração e fiscalização instituída gera despesas. E a lei não contém nenhum elemento indicador de sua provisão, sendo também sob esse aspecto incompatível com o texto constitucional.

Diante do exposto, opino pela procedência desta ação direta, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei nº 14.638, de 18 de dezembro de 2007, do Município de São Paulo.

 

São Paulo, 24 de junho de 2010.

 

   Sérgio Turra Sobrane

         Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

vlcb