Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Autos nº. 990.09.365484-9

Requerente: Prefeito do Município de Mogi Guaçu

Objeto: Lei nº 4.563, de 13 de outubro de 2009, do Município de Mogi Guaçu

 

 

 

Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade, movida por Prefeito, da Lei nº 4.563/09, do Município de Mogi Guaçu, que “autoriza o Poder Público a criar a Guarda Municipal Ambiental”. Violação do art. 147 da Constituição do Estado. Corporação municipal destinada exclusivamente a proteger bens, serviços e instalações municipais. Parecer pela declaração de inconstitucionalidade.

 

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

 

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito Municipal de Mogi Guaçu, tendo por objeto a Lei nº 4.563/09, do mesmo Município, que “autoriza o Poder Público a criar a Guarda Municipal Ambiental”.

O autor noticia que o projeto que a antecedeu iniciou-se na Câmara Municipal e que, depois de aprovado, foi inteiramente vetado pelo Poder Executivo. O veto foi derrubado e, afinal, a lei foi promulgada pelo Presidente da Câmara Municipal.

Sustenta que cabe exclusivamente à guarda municipal a proteção dos bens, serviços e instalações do Município. Além do que, a guarda municipal não pode exercer função de guarda ambiental, de competência da polícia militar.

Por fim, a criação de uma guarda municipal implica aumento de despesa, sendo que, não foi indicado recursos para seu subsídio.

A Lei teve a vigência e eficácia suspensas ex nunc, atendendo-se ao pedido liminar (fls. 68/71).

O Presidente da Câmara Municipal apesar de ter sido devidamente notificado, quedou-se inerte (fls. 89).

A Procuradoria-Geral do Estado defendeu a constitucionalidade da legislação impugnada (fls. 82/86).

Este é o breve resumo do que consta dos autos.

A Lei nº 4.653/09, do Município de Mogi Guaçu,  autoriza a criação da Guarda Municipal Ambiental.

Estabelece que caberá à Guarda Municipal Ambiental a fiscalização dos parques públicos, ações de desmatamento, invasões de áreas verdes, loteamentos irregulares, mananciais de água, construções irregulares, degradações ao meio ambiente, bem como educação ambiental (art. 2º ).

No entanto, referida legislação não é compatível com o art. 147 da Constituição do Estado, in verbis:

Artigo 147 - Os Municípios poderão, por meio de lei municipal, constituir guarda municipal, destinada à proteção de seus bens, serviços e instalações, obedecidos os preceitos da lei federal.

Conforme a previsão constitucional, a Guarda Civil não realiza a atividade de polícia preventiva. Sua missão, de acordo com o parâmetro de controle, restringe-se à proteção dos próprios municipais.

Essa limitação fica mais evidente quando nos atemos à letra do art. 141 da Carta Paulista. Nesse dispositivo está definido que competem à Polícia Militar – e não a qualquer outra Corporação – as atividades de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública.

Desse modo, quando a lei local confere à Guarda Civil atribuições que se enquadram no conceito de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública – como o patrulhamento preventivo, o exercício de poder de polícia sobre determinadas atividades de munícipes, a lavratura de autuações e atos de interdição, o registro de ocorrências ilegais, etc. – deve ser reconhecida como inconstitucional.

Daí que a lei  traduz, pelo rol de atividades que definem o serviço criado, a usurpação das funções constitucionais de outro órgão, no caso, a Polícia Militar do Estado, demandando a declaração da insubsistência daquela, pela incompatibilidade com a Constituição Paulista.

 A matéria não é nova para esse C. Órgão Especial, que já teve oportunidade de declarar a inconstitucionalidade lei do  município de Catanduva, que conferia ao guarda civil a função de fiscalizar o trânsito. Na ocasião, a função foi considerada típica de polícia administrativa:

Ação direta de inconstitucionalidade - Lei n° 352/18.12.2006, do Município de Catanduva, de iniciativa do alcaide e por este sancionada e promulgada, que "DISPÕE SOBRE A CRIAÇÃO DO SERVIÇO DE FISCALIZAÇÃO DE TRÂNSITO NO MUNICÍPIO DE CATANDUVA, CRIA A FUNÇÃO DE "AGENTE FISCALIZADOR DE TRÂNSITO" E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS", para tanto prevendo que o efetivo para o exercício daquela atividade será extraído do Quadro da Guarda Civil Municipal e inclusive criando, junto ao Departamento Municipal de Trânsito - DEMUTRAN, 15 (quinze) funções de "Agente Fiscalizador de Trânsito - AFT", de livre designação e destituição, a critério e mediante ato próprio do Chefe do Executivo Municipal, que "recairá sobre os Servidores ocupantes do cargo efetivo de "Guarda Civil Municipal Masculino e Feminino" – a guarda municipal é apenas um corpo de vigilantes adestrados e armados para a proteção do patrimônio do Município, do seu quadro não podendo ser extraído o efetivo de agentes fiscalizadores do trânsito da urbe, menos ainda sem concurso, por policial não ser e por conseguinte não poder exercer típica atribuição da polícia - violação aos artigos 115, II, e 147 da Constituição Estadual - ação procedente (ADIN 147983-0/8 – grifo nosso).

Em outro caso, esse E. Tribunal, pelo voto do em. Des. PAULO FRANCO, reconheceu que as atividades relacionadas com a segurança da população, com o policiamento ostensivo, com a polícia administrativa, judiciária e preventiva e com os serviços de multa e apreensão de veículos “competem, com exclusividade, à Polícia Militar ou à Polícia Civil, no âmbito estadual, conforme preceitua a Constituição do Estado (arts. 139 e 140), podendo o Município constituir guardas municipais apenas para a proteção de seus bens, serviços e instalações, tal como resulta de norma da própria Constituição Estadual (art. 147) e também da Constituição da República (art. 144, § 8º), cuja observância é obrigatória no âmbito Municipal (Constituição Estadual, art. 144)” (ADIN 78.746-0/0, j. 3.04.2002, m.v.).

Em julgado mais recente, esse Sodalício reafirmou essa orientação:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - art. 1º, inc. I, da Lei n. 13.866/2004, do Município de São Paulo, que fixa atribuições da Guarda Civil Metropolitana - Art. 147 da Constituição Estadual - Proteção dos bens, serviços e instalações municipais - Matéria debatida é atinente à segurança pública - Preservação da ordem pública - Competência das polícias, no âmbito do Estado - Atividade que não pode ser exercida pelas guardas municipais - Extrapolação dos limites constitucionais - Ação direta julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade do dispositivo (ADIN 154.743-0/0, rel. Des. Maurício Ferreira Leite, j. 10.12.08).

Diante do exposto, opino pela procedência desta ação direta, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei n. 4.653, de 13 de outubro de 2009, do Município de Mogi Guaçu.

 

São Paulo, 09 de setembro de 2010.

 

 

 

         Sérgio Turra Sobrane

         Subprocurador-Geral de Justiça

         -Jurídico -

vlcb