Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Autos nº. 990.10.157582-5

Requerente: Prefeito Municipal da Estância Balneária de Ubatuba

Objeto: Lei nº 3.252, de 11 de novembro de 2009, do Município de Ubatuba

 

Ementa: Lei n. 3.252, de 11 de novembro de 2009, do Município de Ubatuba de iniciativa parlamentar que “cria a “Semana Olímpica do Trabalhador”. Imposição de condutas à Prefeitura Municipal. Matéria afeta à administração pública. Exclusividade de iniciativa do Prefeito Municipal. Inconstitucionalidade reconhecida.

 

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

 

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, movida pelo Prefeito Municipal da Estância Balneária de Ubatuba, tendo por objeto a Lei Municipal n.º 3.252, de 11 de novembro de 2009, do Município de Ubatuba, que cria a “Semana Olímpica do Trabalhador”, no Município de Ubatuba.

Segundo constou da vestibular, a referida lei originou-se de projeto de autoria parlamentar. Encaminhado o respectivo autógrafo ao Prefeito, o mesmo apôs veto total, que foi rejeitado pelo Legislativo, seguindo-se sua promulgação pelo Vereador-Presidente.

 

A Lei teve a vigência e eficácia suspensas ex nunc, atendendo-se ao pedido liminar (fls. 13/17).

O Presidente da Câmara Municipal deixou de prestar informações (fls. 30).

A Procuradoria-Geral do Estado declinou da defesa do ato impugnado, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 27/29).

Este é o breve resumo do que consta dos autos.

Entendemos que a ação deva ser julgada procedente.

Há que se aduzir desde logo que a Lei em questão é de iniciativa de Vereador. Vislumbramos afronta aos artigos 5.º, 47, incs. I, II e XIX, alínea “a”, e 144, da Constituição do Estado de São Paulo, a saber:

"Art. 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Art. 47 - Compete privativamente ao Governador, além de outras atribuições previstas nesta Constituição:

I - representar o Estado nas suas relações jurídicas, políticas e administrativas;

II - exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção superior da administração estadual;

XIX – dispor, mediante decreto, sobre:

a) organização e funcionamento da administração estadual, quando não implicar aumento de despesa, nem criação ou extinção de órgãos públicos.

Art. 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição."(g.n.)

         A administração da cidade incumbe ao que, modernamente, chama-se de 'Governo', e que tem na lei seu mais relevante instrumento,  participando sempre o Poder Legislativo na função de aprovar-desaprovar os atos. Na hipótese de administração ordinária, cabe ao Legislativo o estabelecimento de normas gerais, diretrizes globais, jamais atos pontuais e específicos.

Enfatizamos que também o gerenciamento das atividades administrativas no município é competência do Poder Executivo, único dos poderes que detém instrumentos e recursos próprios para avaliar a conveniência e oportunidade da administração pública.  Assim sendo, por inserir vício de iniciativa, a lei é inconstitucional por ofender dispositivos da Constituição do Estado de São Paulo.

Com efeito, a lei impugnada cria a “Semana Olímpica do Trabalhador” e compele a Secretaria de Esporte e Lazer do Município de Ubatuba organizá-la, elaborando cronogramas e tabelas de jogos de todas as modalidades esportivas, informando as empresas e atletas participantes, local e horário dos jogos.

Determina, ainda, que os torneios deverão ser organizados com no mínimo três modalidades esportivas, nas categorias masculino e feminino.

Trata-se evidentemente de matéria referente à administração pública, cuja gestão é de competência exclusiva do Prefeito, que atuará nesse campo com absoluta independência.

Sobre o tema ensina Hely Lopes Meirelles:

“Em princípio, o prefeito pode praticar os atos de administração ordinária independentemente de autorização especial da Câmara. Por atos de administração ordinária entendem-se todos aqueles que visem à conservação, ampliação ou aperfeiçoamento dos bens, rendas ou serviços públicos. (...)

Advirta-se, ainda, que, para atividades próprias e privativas da função executiva, como realizar obras e serviços municipais, para prover cargos e movimentar o funcionalismo da Prefeitura e demais atribuições inerentes à chefia do governo local, não pode a Câmara condicioná-las à sua aprovação, nem estabelecer normas aniquiladoras dessa faculdade administrativa, sob pena de incidir em inconstitucionalidade, por ofensa a prerrogativas do prefeito.” (MEIRELLES. Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, pág. 519).

Demais disso, a Constituição Estadual compete ao Executivo, por decreto, a tarefa de organizar a Administração na hipótese de não haver aumento da despesa, como é o caso. Esse modelo constitucional é de observância obrigatória pelos municípios, por força do disposto no art. 144, da Constituição Estadual.

Assim sendo, e por entender que ao Legislativo não é dada a iniciativa de lei na matéria de organização de serviços públicos, cometida ao Executivo, o parecer é pela procedência da ação, para que seja declarada inconstitucional da Lei Municipal n.º 3.252, de 11 de novembro de 2009, do Município de Ubatuba.

 

São Paulo, 26 de agosto de 2010.

 

         Sérgio Turra Sobrane

         Subprocurador-Geral de Justiça

         -Jurídico-

vlcb