Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Autos nº.  994.08.007953-7 (164.499-0/3-00)

Requerente: Prefeito Município de Americana

Objeto: Art. 4º , da Resolução do Secretário de Estado de Meio Ambiente, n. 14, de 13 de março de 2008 e a sua nova redação constituída pelo art. 3º , da Resolução n. 30, emanada da mesma autoridade em 24 de abril de 2008.

 

Ementa: Ação Direta de Inconstitucionalidade, promovida por Prefeito, do Art. 4º , da Resolução do Secretário de Estado de Meio Ambiente, n. 14, de 13 de março de 2008 e a sua nova redação constituída pelo art. 3º, da Resolução n. 30, emanada da mesma autoridade em 24 de abril de 2008, que impõe o índice urbanístico de 20% (vinte por cento) de áreas verdes em projetos de loteamentos e condomínios em áreas urbanas, superiores a 30.000 (trinta mil) metros quadrados e desprovidas de vegetação nativa.  2) Inconstitucionalidade, se existente, indireta ou reflexa. Precedentes do STF. 3)Parecer no sentido da improcedência da ação.

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

 

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito do Município de Americana, tendo por objeto o Art. 4º , da Resolução do Secretário de Estado de Meio Ambiente, n. 14, de 13 de março de 2008 e a sua nova redação constituída pelo art. 3º, da Resolução n. 30, emanada da mesma autoridade em 24 de abril de 2008, que impõe o índice urbanístico de 20% (vinte por cento) de áreas verdes em projetos de loteamentos e condomínios em áreas urbanas, superiores a 30.000 metros quadrados e desprovidas de vegetação nativa.

Sustenta que referida resolução fere o princípio constitucional da legalidade, eis que uma resolução jamais poderia criar obrigação; A exigência nela contida acabou por determinar uma inovação na fixação de diretrizes municipais; As áreas verdes uma vez contempladas em planos de loteamento ou condomínios passam pelo processo legal de afetação automática prevista na legislação federal, constituindo-se em áreas públicas municipais, por imposição da citada resolução, o que acarreta ao Município um ônus não previsto em seu Plano Diretor e uma forte e grave interferência na autonomia legislativa das cidades; Afronta o princípio da segurança jurídica ao criar um requisito urbanístico para planejamento urbano municipal por meio de resolução, que poderá, a qualquer momento, ser modificada; Interferiu na competência privativa dos Municípios; A política urbana é de responsabilidade do Poder Público Municipal. O Plano Diretor Municipal, que deve traçar as diretrizes específicas para a matéria, sempre respeitando àquelas estabelecidas pelo Estatuto da Cidade; Excluiu o necessário debate com a comunidade e, nem mesmo, se submeteu a debate parlamentar; Impôs uma exigência de constituição de área verde em áreas desprovidas de qualquer vegetação nativa, ou seja, em áreas não protegidas pela legislação ambiental; Como não especifica o tipo de loteamento ou condomínio, existe, também afronta ao art. 183 e seu parágrafo único da Constituição Bandeirante, na medida em que nos loteamentos industriais é o Município que tem competência para fixar as Diretrizes, cabendo ao Estado, mediante lei, fixar as normas gerais; A Lei n. 9.146, de 09 de março de 1995, regulamenta o art. 200 da Constituição Federal. Desta feita, somente lei em sentido formal poderia instituir a constituição compulsória de áreas verdes e, assim, para a cobertura constitucional, garantir ao Município a adequada compensação financeira.

 Após a interposição de agravos regimentais, tanto por parte do Prefeito do Município de Americana, como pela Procuradoria Geral do Estado,  foi revogada a medida liminar concedida, fls. 942/946.

O Secretário de Estado do Meio Ambiente prestou informações, defendendo a constitucionalidade do dispositivo legal impugnado, fls. 900/906, sendo as mesmas ratificadas pela Procuradoria Geral do Estado, fls. 1019/1020.

É a síntese do necessário.

O dispositivo legal impugnado, nos termos da Resolução – SMA n. 14/2008, dispunha, inicialmente:

Art. 4º - Nos processos de licenciamento em propriedades desprovidas de vegetação nativa deverá ser constituída Área Verde correspondente a, no mínimo, 20% (vinte por cento) da área total do imóvel.

Parágrafo único: Inexistindo área recoberta com vegetação nativa no percentual previsto no caput, será exigida assinatura de termo de compromisso para recomposição florestal da área verde mediante o plantio de espécies exóticas como pioneiras”.

Posteriormente, o mesmo foi modificado pelo art. 3º, da           Resolução –SMA n. 30/2009, passando a ter a seguinte redação:

“ Art. 4º - Nos processos de licenciamento de loteamentos ou de condomínios acima de 30.000 m2 (trinta mil metros quadrados) com áreas desprovidas de vegetação nativa deverá ser constituída Área Verde correspondente a no mínimo 20% (vinte por cento) da área total do imóvel.

§1º- Será exigida a recomposição florestal da Área Verde com o plantio de espécies nativas, admitindo-se o plantio de espécies exóticas como pioneiras, mediante a assinatura do respectivo termo de compromisso.

§2º - Na Área Verde será admitida a inclusão de equipamentos esportivos e de lazer desde que compatíveis e, quando localizada em área de preservação permanente, com o que determina o art. 8º , da Resolução do CONAM n. 369, de 28 de março de 2006”.

Feitas essas considerações iniciais, é oportuno ressaltar que não é viável, na hipótese, o controle concentrado de constitucionalidade do dispositivo legal em questão.

Trata-se de ato normativo regulamentar expedido através de Resoluções da Secretária do Meio Ambiente, por intermédio de seu Secretário.

 

 Citado órgão administrativo, conforme se depreende do Decreto Estadual n. 54.653, de 06 de agosto de 2009, que a reorganizou, além de coordenar a formulação, aprovação, execução, avaliação e atualização da Política Estadual de Meio Ambiente, também é responsável por analisar e acompanhar as políticas públicas setoriais que tenham impacto ao meio ambiente.

Entre as diversas atribuições legais da Secretaria do Meio Ambiente, está a definição da Política Estadual do Meio Ambiente e a elaboração de normas que regulem o licenciamento e a fiscalização ambiental do Estado de São Paulo, que deverão ser, obrigatoriamente seguidas por todos os órgãos e entidades executores do Sistema Estadual de Administração da Qualidade Ambiental, Proteção, Controle e Desenvolvimento do Meio Ambiente, de que trata a Lei n. 9.509, de 20 de março de 1997 (Art.2º , letra “c”).

Deste modo, como o ato normativo impugnado é ato regulamentar, de cunho secundário, torna-se inviável a instauração da jurisdição constitucional. Isso decorre da verificação de que, ainda que em tese existisse densidade na alegação de eventual inconstitucionalidade, o vício seria indireto ou reflexo.

Em outras palavras, o processo objetivo não se presta ao controle de inconstitucionalidades indiretas, mas apenas das afrontas diretas e imediatas do texto da Constituição.

Nesse sentido já decidiu o E. STF:

"É incabível a ação direta de inconstitucionalidade quando destinada a examinar atos normativos de natureza secundária que não regulem diretamente dispositivos constitucionais, mas sim normas legais. Violação indireta que não autoriza a aferição abstrata de conformação constitucional." (ADI 2.714, Rel. Min. Maurício Corrêa,  julgamento em 13-3-03, DJ de 27-2-04).

“(...). Ação direta e ofensa frontal a Constituição. - O controle normativo abstrato, para efeito de sua válida instauração, supõe a ocorrência de situação de litigiosidade constitucional que reclama a existência de uma necessária relação de confronto imediato entre o ato estatal de menor positividade jurídica e o texto da Constituição Federal. - Revelar-se-á processualmente inviável a utilização da ação direta, quando a situação de inconstitucionalidade - que sempre deve transparecer imediatamente do conteúdo material do ato normativo impugnado - depender, para efeito de seu reconhecimento, do prévio exame comparativo entre a regra estatal questionada e qualquer outra espécie jurídica de natureza infraconstitucional (...).” (ADI-MC 1347 /DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, j. 05/09/1995, Tribunal Pleno, DJ 01-12-1995, p.41685, EMENT  VOL-01811-02, p.00241, g.n.).

Este mesmo raciocínio serve para casos como o presente, pois se eventual inconstitucionalidade não decorre diretamente do texto da lei, mas de atos da Administração Pública - ainda que no exercício de seu poder regulamentar - a ofensa à Constituição é reflexa, e não autoriza a instauração do processo de controle abstrato da norma.

De todo modo, a inviabilidade do controle concentrado não impedirá, em casos concretos, a realização do controle difuso de constitucionalidade, de forma incidental, perante órgãos jurisdicionais aos quais seja apresentada qualquer demanda, para cujo deslinde seja oportuna a aplicação ou não de dispositivo das aludidas Resoluções.

Diante do exposto,  somos pela improcedência desta ação direta.

 

São Paulo, 02 de fevereiro de 2010.

 

        Maurício Augusto Gomes

        Subprocurador-Geral de Justiça

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