Autos n. 994.09.224.643-8 (184.534.0/0-00)
Autor: Prefeito do
Município de Reginópolis
Objeto de impugnação: Inciso XXVI, do artigo 63, da Lei Orgânica do Município de
Reginópolis
Ementa: Ação Direta de
Inconstitucionalidade, movida por Prefeito, do inciso XXVI, da Lei Orgânica
Municipal, impondo ao Chefe do Executivo local o encaminhamento à Câmara e
publicação de relatórios discriminando nomes e cargos dos servidores admitidos
e demitidos, assim como despesas com propaganda
e publicidade, abrangendo os órgãos da administração direta e indireta,
obrigatoriamente , até o dia dez (10) de
cada mês, referente ao mês anterior. Alegada ofensa ao princípio da separação
de poderes. Parecer pela procedência.
Excelentíssimo
Senhor Desembargador Relator:
O
Prefeito Municipal de Reginópolis formulou a presente ação direta objetivando a
declaração de inconstitucionalidade do inciso XXVI, do art. 63, da Lei Orgânica
Municipal, que determina a remessa
obrigatória, até o dia 10 (dez) de cada mês, de relatórios discriminando nomes
e cargos dos servidores admitidos e demitidos, assim como despesas com
propaganda e publicidade, abrangendo órgãos da administração direta e
indireta.
Segundo
alega, a lei orgânica traz flagrante inconstitucionalidade, pois há quebra do
princípio da harmonia e independência, previsto no art.2º, da Constituição
Federal e art.5º, da Constituição Estadual.
Pleiteada
a liminar, ficou a mesma concedida a fls.47/48.
Solicitadas
informações, a Câmara Municipal prestou-as a fls.62/64. Citado, o Procurador
Geral do Estado manifestou-se a fls. 67/69.
É
a síntese do necessário.
A
norma questionada impõe ao Prefeito Municipal a remessa obrigatória, até o dia
dez (10) de cada mês, de relatórios discriminando nomes e cargos dos servidores
admitidos e demitidos, assim como despesas com propaganda e publicidade,
abrangendo órgãos da administração direta e indireta. Ainda que seja dever do Prefeito prestar
contas de sua gestão, tanto financeira e orçamentária, quanto administrativa,
tal imposição não pode se afastar do parâmetro constitucional. Aliás, o parágrafo único do art.11, do Ato as
Disposições Constitucionais Transitórias, diz caber à Câmara Municipal votar a
Lei Orgânica, respeitada o disposto na Constituição Federal e na Constituição
Estadual. Portanto, o parâmetro para o
legislador municipal, na elaboração da Lei Orgânica municipal, é a Constituição
Federal e a Estadual.
A
Constituição Federal dispõe sobre a obrigatoriedade da prestação de contas pelo
Chefe do Executivo, no art.49, inciso IX, prescrevendo competir,
exclusivamente, ao Congresso Nacional julgar anualmente as contas prestadas
pelo Presidente da República e apreciar os relatórios sobre a execução dos
planos de governo. Esse controle a cargo do Congresso é exercido com o auxílio
do Tribunal de Contas da União (art.71, I e II, CF), ao qual compete apreciar
as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República. Já a fiscalização
do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle
externo (art.31, caput, CF), com o auxílio dos Tribunais de contas do Estado ou
do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde
houver (art.31, § 1º). Também menciona o
parágrafo 2º, do citado artigo
No
plano estadual, o art.150, da Carta Paulista, ao tratar da fiscalização
contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Município e de
todas as entidades da administração direta e indireta, determina que a mesma
seja exercida pela Câmara Municipal, mediante controle externo, e pelos
sistemas de controle interno de cada Poder, na forma da respectiva lei
orgânica, em conformidade com o disposto no artigo 31 da Constituição Federal. A fiscalização das contas do Governador do
Estado, a cargo da Assembléia Legislativa (art.32, Constituição do Estado de
São Paulo), se dará anualmente, sempre mediante parecer prévio do Tribunal de
Contas (art.33, I, CE). Ainda, prevê a
Constituição Estadual a obrigação do Poder Executivo publicar e enviar a
Assembléia Legislativa, até trinta dias após o encerramento de cada trimestre,
relatório resumido da execução orçamentária (art.170, CE).
O
dispositivo de lei impugnado provoca verdadeiro estado de submissão
institucional do Chefe do Poder Executivo ao Poder Legislativo municipal, sem
qualquer correspondência com o modelo positivado nas Constituições Federal e
Estadual, rompendo com o postulado da separação de poderes. Acresce que o
controle externo a cargo Legislativo municipal deve ser feito com o auxílio do
Tribunal de Contas, o que na hipótese em comento está totalmente descartado,
recaindo sobre o texto viciado mais essa falta.
Verifica-se,
assim, que o preceito impugnado afasta-se dos limites constitucionais, impondo,
por isso, a declaração de sua inconstitucionalidade.
Por
sinal, em recente pronunciamento deste Egrégio Órgão Especial, em ADIN idêntica
a esta, a de nº 144.543-0/9-00, da Comarca de São Paulo, em que foi requerente
o Prefeito de Reginópolis, ficou decidido o que segue:
“Não há a menor dúvida da
inconstitucionalidade do dispositivo enfocado, ao impor ao chefe do Executivo e
órgãos que lhe são subordinados contas de suas gestões que vão além do controle
constitucional previsto no art. 31 e parágrafos da Constituição Federal, de
periodicidade anual.
Obrigar o Prefeito e
dirigentes dos órgãos aludidos a publicar e informar à edilidade, mensalmente,
toda e qualquer admissão ou demissão de servidor, bem como o valor gasto com
publicidade, extrapola, em muito, a fiscalização legislativa natural, para
instituir-se verdadeira tutela do Legislativo sobre o Executivo, cerceando-lhe
o raio de ação insculpido na Carta Bandeirante.
Flagrante, portanto, a ofensa
aos arts.37 e 47, II e XIV, desse diploma, sem falar no princípio
constitucional que diz com a independência dos Poderes (art.5º, “caput”)”.
Nessa
linha, já decidiu este Órgão Especial na Adin 135.843.0/7-
“A Câmara, induvidosamente,
detém o poder de fiscalização da atividade da Administração. Tal, contudo, deve
obedecer determinados limites. Não pode extravasar sua área de atuação, nem
mesmo nessa condição de ente fiscalizador, para impor obrigações aos
particulares que contratam com a Administração, menos ainda, aos próprios
órgãos públicos, subordinados ao Executivo.(...). Importa, na hipótese, isto
sim, obstar a quebra da estrutura funcional diferenciada dos órgãos do Poder,
permitindo a invasão de atribuição exclusiva do Executivo pelo Legislativo
(art.5º, da Constituição Estadual). Louvável a atitude do Poder Legislativo no
sentido de buscar uma melhor fiscalização do exercício das atividades e da
aplicação do dinheiro público no Município. Inviável, contudo, a fórmula
encontrada pela Câmara Municipal, por fraturar o sistema jurídico
constitucional do Estado (art.144, da Constituição Estadual)”.”
Conclui-se,
pois, que é inconstitucional a lei municipal impugnada.
Posto
isso, aguarda-se seja a presente ação direta julgada procedente, declarando-se
a inconstitucionalidade do inciso XXVI, do art. 63, da Lei Orgânica do
Município de Reginópolis.
São Paulo, 22 de janeiro de 2010.
Maurício Augusto Gomes
Subprocurador-Geral de Justiça
- Assuntos Jurídicos –
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