Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Autos n. 994.09.229242-6 (188.190-0/9)

Autor: Sindicato do Comércio Varejista de Campinas e Região (SINDIVAREJISTA)

Objeto de impugnação: Lei Municipal n. 4.224, de 30 de novembro de 2009, do Município de Itatiba

 

 

 

Ementa:

 

1) Lei Municipal n. 4.224, de 30 de novembro de 2009, do município de Itatiba, de iniciativa parlamentar, que obriga a manutenção de um empacotador para cada caixa de hipermercados, supermercados e estabelecimentos similares.

 

2) Violação dos arts. 21, I e 24 da Constituição Federal e dos arts. 1º e 144, da Constituição do Estado de São Paulo.

 

3) Parecer pela procedência.

 

 

 

 

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator

 

Colendo Órgão Especial

 

 

O Sindicato do Comércio Varejista de Campinas e região (SINDIVAREJISTA) ingressou com a presente ação direta objetivando a declaração de inconstitucionalidade da Lei Municipal n. 4.224, de 30 de novembro de 2009, do Município de Itatiba, que  obriga a manutenção de um empacotador para cada caixa de hipermercados, supermercados e estabelecimentos similares.

A inicial indica a violação dos arts. 21, I, e 24 da Constituição Federal e dos arts. 1º e 144, da Constituição do Estado de São Paulo.

O pedido de medida liminar foi deferido (fls. 46 e vº).

 Notificados, o Município de Itatiba e a Câmara Municipal prestaram informações (fls. 59/61 e 69/71) e sustentaram a constitucionalidade da lei.

O Procurador-Geral do Estado, por sua vez, defendeu a exegese segundo a qual a sua intervenção nos feitos desta natureza não é obrigatória, mas sim condicionada à verificação prévia da existência de interesse estadual na preservação da norma impugnada (fls. 87/89).

É o breve relato.

O pedido declaratório de inconstitucionalidade é procedente, pois a Câmara Municipal de Itatiba, ao legislar, acabou por invadir o campo de competências da União.

 Com efeito, ao exigir dos hipermercados, supermercados e estabelecimentos similares, nas condições que especifica, a presença de empacotadores, dita legislação acabou por invadir o campo de competência legislativa da União, a quem cabe legislar sobre Direito Comercial e do Trabalho (art. 22, I, da CF).

 Sobre o tema, Alexandre de Moraes afirma que “a Constituição Federal prevê a chamada competência suplementar dos municípios consistente na autorização de regulamentar as normas legislativas federais ou estaduais, para ajustar sua execução a peculiaridades locais, sempre em concordância com aquelas e desde que presente o requisito primordial de fixação de competência desse ente federativo: interesse local”.

 É evidente que a exigência para que tais empresas passem a contratar empacotadores não é um problema que deva ser resolvido em um ou outro Município. É medida que pertine ao interesse geral, cabendo somente à União legislar a respeito.

 Além disso, a lei sindicada na presente ação não trata de matéria relativa ao direito do consumidor, ainda que reflexamente ele  possa ser atingido. Essa legislação, na verdade, está restringindo a livre iniciativa e a livre concorrência. Leciona José Afonso da Silva que: “A liberdade de iniciativa envolve a liberdade de indústria e comércio ou liberdade de empresa e a liberdade de contrato. Consta do art. 170, como um dos esteios da ordem econômica, assim como de seu parágrafo único que assegura a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo casos previstos em lei”.

 Com efeito, as atividades econômicas atingidas pela legislação impugnada estarão em desvantagem em relação a outros municípios que não adotaram idêntica exigência.

 Sobre o tema, o C. Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de examinar legislação semelhante do Estado do Rio de Janeiro, e à época, em sede cautelar, decidiu:

 “Argüição de inconstitucionalidade de norma estadual que obriga ‘as organizações de supermercados e congêneres a manterem pelo menos um funcionário, por cada máquina registradora, cuja atribuição seja o acondicionamento de compras ali efetuadas’ (Lei nº 1.914/91, do Rio de Janeiro).

 Relevância da fundamentação do pedido, deduzida perante os artigos 22, I e parágrafo único e 24, § 3º, da Constituição Federal.

 Perigo da demora caracterizado pelo elevado montante da multa estipulada para o caso de descumprimento da obrigação.”

 Nem se diga se está adotando como objeto paradigma, a Constituição Federal.

 É que, nos termos do art. 144, da Carta Paulista, os municípios têm autonomia legislativa, mas ficam compelidos a atender os princípios estabelecidos na Constituição Federal e na Constituição Estadual

 Esse Colendo Órgão Especial tem reiteradamente aplicado tal dispositivo como suporte exclusivo e necessário para a eliminação de regras que hostilizam o texto fundamental federal.

 Nesse sentido, caminhou decisão relatada pelo eminente Desembargador Oliveira Ribeiro, em parte aqui transcrita: “Além disso, é de se ver que em abono do propósito declaratório da inconstitucionalidade do artigo discrepante, a Constituição do Estado de São Paulo, sem repetir expressamente a fixação de ‘quorum’ de dois terços previsto na Constituição da República, não deixou de especificar o seu entendimento no sentido de impor observância desta exigência, fazendo-o com clareza posto que de modo indireto.

 Eis o texto do seu artigo 144: ‘Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.

 O mesmo posicionamento foi adotado na decisão proferida por esse Colendo Colegiado, na Adin nº 108.578-0/4, em que foi relator o eminente Desembargador Denser de Sá, julgada em 23/3/2005.

 Em assim sendo, a lei examinada é inconstitucional, por afronta aos arts. 1º e 144, da Constituição Bandeirante como, aliás, já se decidiu, em situação idêntica, nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 123.776-0/8.

Posto isso, aguardo o julgamento de procedência da presente ação direta a fim de que seja declarada a inconstitucionalidade da Lei Municipal n. 4.224, de 30 de novembro de 2009, do Município de Itatiba que  obriga a manutenção de um empacotador para cada caixa de hipermercados, supermercados e estabelecimentos similares.

São Paulo, 20 de maio de 2010.

 

 

 

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

 

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