Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo nº 0072441-28.2013.8.26.0000

Requerente: PTC - Partido Trabalhista Cristão, com representação na Câmara de Vereadores do Município de Santa Isabel

Requerido: Prefeito do Município de Santa Isabel

 

 

 

Ementa:

1)      Ação direta de inconstitucionalidade. Art. 4º da Lei nº 2.697 de 07 de março de 2013, do Município de Santa Isabel, que "Dispõe sobre revisão dos valores da Tabela Básica de Vencimentos e Salários dos servidores do Poder Executivo.”

2)      Impossibilidade de análise de questões de fato no julgamento da ação direta. Não se extrai do confronto direto do ato impugnado violação à garantia da irredutibilidade de vencimentos (art. 37, XV da CF e 115, XVII da CE).

3)      Ausência de redução efetiva de vencimentos constatada.

4)      Improcedência da ação.

 

Colendo Órgão Especial

Senhor Desembargador Relator

 

 

Tratam estes autos de ação direta de inconstitucionalidade, tendo como alvo o Art. 4º da Lei nº 2.697, de 07 de março de 2013, do Município de Santa Isabel, que "Dispõe sobre revisão dos valores da Tabela Básica de Vencimentos e Salários dos servidores do Poder Executivo.

Sustenta o requerente que o dispositivo normativo é inconstitucional porque acarreta redução dos vencimentos, garantia prevista no art. 37, XV da Constituição Federal, repetida no art. 115, XVII da Constituição Estadual.

Não foi deferida a liminar, cujo pedido foi postergado para apreciação após a juntada das informações (fl. 38).

O Município de Santa Isabel apresentou informações às fls. 58/60, afirmando que não houve qualquer redução dos vencimentos dos médicos do município.

A Procuradoria Geral do Estado declinou da defesa do ato impugnado, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 182/183).

É o breve relato do ocorrido nos autos.

Preliminarmente, no controle concentrado de constitucionalidade das leis, promovido por meio da ação direta, a discussão a respeito da legitimidade constitucional da norma é relativamente limitada.

Inconstitucionalidades indiretas ou reflexas, ou mesmo decorrentes de questões de fato (v.g. se o reenquadramento dos médicos do Município acarreta ou não redução de vencimentos, partindo de premissas situadas no contexto fático) não podem ser aferidas. O único exame que se faz, no processo objetivo, decorre do confronto direto entre o ato normativo impugnado e o parâmetro constitucional (na hipótese, apenas estadual) adotado para fins de controle (STF, ADI 2.714, Rel. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 13-3-03, DJ de 27-2-04; ADI-MC 1347 /DF, Rel. Min. Celso de Mello, j. 05/09/1995, Tribunal Pleno, DJ 01-12-1995, p.41685, EMENT VOL-01811-02, p.00241, g.n.; ADI-MC n.º 842 - DF, RTJ 147/545-546).

A esse propósito, é oportuno averbar a advertência feita pelo i. Min. Celso de Mello, do E. STF:

“A ação direta não pode ser degradada em sua condição jurídica de instrumento básico de defesa objetiva da ordem normativa inscrita na Constituição. A válida e adequada utilização desse meio processual exige que o exame ‘in abstracto’ do ato estatal impugnado seja realizado exclusivamente à luz do texto constitucional. Desse modo, a inconstitucionalidade deve transparecer diretamente do texto do ato estatal impugnado. A prolação desse juízo de desvalor não pode e nem deve depender, para efeito de controle normativo abstrato, da prévia análise de outras espécies jurídicas infraconstitucionais, para, somente a partir desse exame e num desdobramento exegético ulterior, efetivar-se o reconhecimento da ilegitimidade constitucional do ato questionado” (ADI-MC n.º 842 - DF, RTJ 147/545-546, g.n.).

No processo objetivo a questão sobre a qual o Tribunal se debruça é essencialmente jurídica (dúvida ou controvérsia sobre a legitimidade do direito positivo infraconstitucional, em sua perspectiva de confronto imediato com determinado parâmetro constitucional).

Dessa forma, o processo deve ser extinto sem resolução do mérito por falta de interesse de agir, uma vez que a Ação Direta de Inconstitucionalidade não é o meio adequado para satisfação da pretensão do autor.

NO MÉRITO

Na hipótese de afastamento da preliminar, o pedido deve ser julgado improcedente.

O art. 4º da Lei nº 2.697 de 07 de março de 2013, do Município de Santa Isabel estabelece que:

         “Art. 4º - Os empregos públicos enquadrados na referência 20, conforme Lei nº 2.635, de 30 de março de 2011, ficam reenquadrados com os vencimentos da referência 19 do Anexo Único desta Lei”.

Pois bem. Os vencimentos da referência 19 são da ordem de R$ 3.660,74, conforme o Anexo Único, acostado à fl. 16.

Portanto, os médicos, que estavam enquadrados na Referência 20 e passaram para a referência 19, tem os seus vencimentos fixados em R$ 3.660,74.

E, os vencimentos que eram pagos para aqueles que se encontravam enquadrados na referência 20, de acordo com a Lei nº 2.635, de 30 de março de 2011, no caso os médicos, eram da ordem de R$ 3.000,00, conforme o Anexo II, da Lei nº 2.000, de 30 de julho de 2011 (fl. 20).

Como conclusão, em virtude do reenquadramento, os médicos não tiveram redução de vencimentos, mas verdadeiro e comprovado acréscimo de remuneração.

Não se verifica, portanto, qualquer violação a regra estabelecida no art. 37, inc. XI da Constituição Federal, repetida no art. 115, XVII da Constituição Paulista, que proíbe a redução de vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos.

Mas lembre-se que o exame de questões de fato é vedado em sede de ação direta de inconstitucionalidade, inclusive no caso do processo objetivo de controle no plano estadual.

Isso, na medida em que o art. 125, § 2º, da CR, apenas autoriza o constituinte estadual a instituir “representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual”.

A Constituição da República não autorizou, entretanto, que, para examinar a inconstitucionalidade de leis locais, o Tribunal de Justiça examine questões de fato.

Aliás, nem ao Col. STF foi concedida tal autorização, pois o que a Constituição permite, no art. 102, I, a, é que seja examinada, apenas, a “ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal”.

A Constituição da República, por meio de tais dispositivos, criou mecanismos de controle abstrato, e não concreto, sobre a constitucionalidade das leis.

Daí o entendimento absolutamente pacífico no sentido de que, no processo objetivo, a cognição da Corte está limitada ao confronto direto entre a lei e a norma constitucional indicada como parâmetro de controle, sendo inviável estender esse exame à análise de inconstitucionalidades reflexas ou às questões de fato.

Confira-se, no Col. STF:

“(...)

A Constituição da República, em tema de ação direta, qualifica-se como o único instrumento normativo revestido de parametricidade, para efeito de fiscalização abstrata de constitucionalidade perante o STF. (...). O controle normativo abstrato, para efeito de sua valida instauração, supõe a ocorrência de situação de litigiosidade constitucional que reclama a existência de uma necessária relação de confronto imediato entre o ato estatal de menor positividade jurídica e o texto da CF. Revelar-se-á processualmente inviável a utilização da ação direta, quando a situação de inconstitucionalidade – que sempre deve transparecer imediatamente do conteúdo material do ato normativo impugnado – depender, para efeito de seu reconhecimento, do prévio exame comparativo entre a regra estatal questionada e qualquer outra espécie jurídica de natureza infraconstitucional (...) (ADI 1.347-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 5-10-1995, Plenário, DJ de 1º-12-1995). No mesmo sentido: ADPF 93-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 20-5-2009, Plenário, DJE de 7-8-2009; ADI 3.376, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 16-6-2005, Plenário, DJ de 23-6-2006. (g.n.)

(...)”

Em síntese, não se pode declarar a inconstitucionalidade da lei com base em projeção concreta quanto aos fatos, no sentido de que a lei poderá provocar, em sua aplicação, redução de vencimentos.

Diante do exposto, nosso parecer é no sentido da extinção do processo sem resolução do mérito por falta de interesse de agir (adequação) em razão do não cabimento da ação direta de inconstitucionalidade e na hipótese de análise do mérito, pela improcedência da ação.

São Paulo, 12 de setembro de 2013.

 

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

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