Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo n. 0098989-90.2013.8.26.0000

Requerente: Prefeito do Município de Restinga

Requerido: Presidente da Câmara Municipal de Restinga

 

 

Constitucional. Administrativo. Ação direta de inconstitucionalidade. Lei n. 1.571, de 24 de outubro de 2013, do Município de Restinga. Criação de concessão de incentivo por tempo de serviço. Separação de Poderes. Iniciativa parlamentar. Ausência de recursos financeiros. Procedência da ação. 1. Preliminarmente. Na ação direta de inconstitucionalidade, legitimado ativo é o Prefeito do Município (art. 90, II, CE) e considerando a envergadura política dessa legitimidade ativa ad causam, englobante da capacidade postulatória, é razoável assentar que, embora dispensável a representação por causídico, sua existência, todavia, importa a necessidade de, no mínimo, subscrição conjunta da petição inicial e consequente inadmissibilidade de procuração outorgada pelo município. 2. Possibilidade de concessão de liminar pelo Desembargador Relator (arts. 226 e 227 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de São Paulo). O controle objetivo de constitucionalidade de lei ou ato normativo municipal tem como parâmetro a CE/89, inclusive quando reproduza, imite ou remeta a preceito da CF/88 ou se trate de norma de observância obrigatória (art. 125, § 2º, CF/88), não podendo balizá-lo ofensa à norma infraconstitucional como a Lei Orgânica do Município 3. No mérito, lei local, de iniciativa parlamentar, que cria concessão de incentivo por tempo de serviço prestado ao município.  Violação ao princípio da separação dos poderes e ao art. 24, § 2º, 1 e 4 da CE/89. 4. Ausência de indicação específica de fonte financeiro-orçamentária para atendimento das despesas novas geradas (art. 25, da CE/89). 5. Procedência da ação, caso seja superada a preliminar suscitada.

 

  

Colendo Órgão Especial:

 

 

         Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade promovida pelo Prefeito do Município de Restinga em face da Lei n. 1.571, de 24 de outubro de 2008, do Município de Restinga, de iniciativa parlamentar, que “dispõe sobre a concessão de incentivo por tempo de serviço prestado ao município de 30% (trinta por cento) do salário básico, ao servidor municipal do Quadro de funcionários da Prefeitura do Município de Restinga, Estado de São Paulo que já se encontra no período dos últimos 05 (cinco) anos de contribuição e serviços prestados, para alcançar benefício definitivo junto ao INSS”, sob alegação de incompatibilidade com os arts. 5º, 24, § 2º, 1, 2 e 144, da Constituição do Estado, os arts. 41, I, II, III e V e 73, IV, XII da Lei Orgânica do Município e os arts. 2º, e 61, §1º, inc. II, alíneas “a”, “b” e “c” da Constituição Federal.     

 

        O pedido de medida liminar foi deferido (fls. 76).

 

         O douto Procurador Geral do Estado de São Paulo declinou da defesa do ato normativo contestado (fls. 89/90).          

        

         A Câmara Municipal de Restinga prestou informações (fls. 92/102).

 

         É o relatório.

 

PRELIMINARMENTE

Observo que a petição inicial é subscrita apenas por douta advogada (fl. 11), acompanhada de instrumento de mandato outorgado pelo MUNICÍPIO de Restinga (fl. 13).

A legitimidade ativa pertence ao Prefeito do Município (art. 90, II, Constituição Estadual), bem como a capacidade postulatória, como decidido pelo Supremo Tribunal Federal:

“O Governador do Estado de Pernambuco ajuíza ação direta de inconstitucionalidade, na qual alega que a decisão 123/98 do Tribunal de Contas da União, ao exigir autorização prévia e individual do Senado Federal para as operações de crédito entre os Estados e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES, teria afrontado as disposições dos artigos 1º e 52, incisos V e VII, da Constituição Federal.

 2. Entende possuir legitimidade para a ação, em face dos reflexos do ato impugnado sobre o Estado.

3. É a síntese do necessário.

4. Decido.

5. Verifico que a ação, embora aparentemente proposta pelo Chefe do Poder Executivo estadual, está apenas assinada pelo Procurador-Geral do Estado. De plano, resulta claro que o signatário da inicial atuou na estrita condição de representante legal do ente federado (CPC, artigo 12, I), e não do Governador, pessoas que não se confundem.

6. A medida constitucional utilizada revela instituto de natureza excepcional, em que se pede ao Supremo Tribunal Federal que examine a lei ou ato normativo federal ou estadual, em tese, para que se proceda ao controle normativo abstrato do ato impugnado em face da Constituição.

7. Com efeito, cuida ela de processo objetivo sujeito à disciplina processual própria, traçada pela Carta Federal e pela legislação específica - Lei 9.896/99. Inaplicáveis, assim, as regras instrumentais destinadas aos procedimentos de natureza subjetiva.

8. O Governador de Estado é detentor de capacidade postulatória intuitu personae para propor ação direta, segundo a definição prevista no artigo 103 da Constituição Federal. A legitimação é, assim, destinada exclusivamente à pessoa do Chefe do Poder Executivo estadual, e não ao Estado enquanto pessoa jurídica de direito público interno, que sequer pode intervir em feitos da espécie (ADI(AgRg)1.797-PE, DJ de 23.2.01; ADI (AgRg) 2.130-SC, Celso de Mello, j. de 3.10.01, Informativo 244; ADI (EMBS.) 1.105-DF, Maurício Corrêa, j. de 23.8.01).

9. Por essa razão, inclusive, reconhece-se à referida autoridade, independentemente de sua formação, aptidão processual plena ordinariamente destinada apenas aos advogados (ADIMC 127-AL, Celso de Mello, DJ 04.12.92), constituindo-se verdadeira hipótese excepcional de jus postulandi.

 10. No caso concreto, em que pese a invocação do nome do Governador como sendo autor da ação (fl.2), a alegada representação pelo signatário não restou demonstrada. Indiscutível, é que a medida foi efetivamente ajuizada pelo Estado, na pessoa de seu Procurador-Geral, que nesta condição assinou a peça inicial.

 11. Ante essas circunstâncias, com fundamento no artigo 21, § 1º do RISTF, bem como nos artigos 3º, parágrafo único e 4º da Lei 9.868/99, não conheço da ação” (STF, ADI 1814-DF, Rel. Min. Maurício Corrêa, 13-11-2001, DJ 12-12-2001, p. 40).

Consoante explica a doutrina, “os legitimados para a ação direta referidos nos itens I a VII do art. 103 da CF dispõem de capacidade postulatória plena, podendo atuar no âmbito da ação direta sem o concurso de advogado” (Ives Gandra da Silva Martins e Gilmar Ferreira Mendes. Controle concentrado de constitucionalidade, São Paulo: Saraiva, 2007, 2ª ed., p. 246).

Logo, considerando a envergadura política dessa legitimidade ativa ad causam, englobante da capacidade postulatória, é razoável assentar que, embora dispensável a representação por causídico, sua existência, todavia, importa a necessidade de, no mínimo, subscrição conjunta da petição inicial e consequente inadmissibilidade da procuração outorgada pelo MUNICÍPIO e não pelo Prefeito.

       Ademais, há decisão registrando que:

 

“É de exigir-se, em ação direta de inconstitucionalidade, a apresentação, pelo proponente, de instrumento de procuração ao advogado subscritor da inicial, com poderes específicos para atacar a norma impugnada” (STF, ADI-QO 2187-BA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 24-05-2000, m.v., DJ 12-12-2003, p. 62).

        

         Assim sendo, opino, preliminarmente, pela intimação do autor para regularização da representação processual, no prazo legal, sob pena de indeferimento, aviando, desde já, nas hipóteses de inércia ou recusa, a extinção sem resolução do mérito.

 

         Ainda em sede preliminar, sustenta a Câmara Municipal de Restinga ilegalidade no que concerne à apreciação do pedido de liminar pelo Relator, alegando que se faria necessária a apreciação da medida liminar pelo Colendo Órgão Especial.

 

         Nesse tocante, o art. 226 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de São Paulo, estabelece que: “A ação direta de inconstitucionalidade será processada conforme a Constituição do Estado de São Paulo e a legislação (Lei 9.868, de 10.11.99), no que couber” (grifo nosso). Portanto, o controle de constitucionalidade de normas municipais e estaduais deve obedecer ao disposto no Regimento Interno do Tribunal de Justiça e, apenas em caso de omissão deste, o disposto na Lei n. 9.868/99.

Daí a impossibilidade da aplicação do art. 10, caput, da Lei nº 9.868/99, segundo o qual “a medida cautelar na ação direta será concedida por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal”, uma vez que o Regimento Interno do Egrégio Tribunal estabelece expressamente, em seu art. 227, que compete ao relator apreciar a medida cautelar, sendo facultativa, em caso de relevância da questão, a submissão da apreciação da liminar ao Órgão Colegiado (cf. art. 165, § 2º., do RITJSP), in verbis:

“Art. 227. Caberá ao relator a apreciação da medida cautelar, ressalvada a hipótese do art. 165, § 2º, deste Regimento.

(...)

Art. 165. O relator é o juiz preparador do feito e decidirá as questões urgentes, liminares, incidentes e aquelas que independem do colegiado, nos termos da legislação, oficiando, ainda, como instrutor, sendo facultada a delegação de diligências a juiz de primeiro grau.

(...)

§ 2º Diante da relevância da questão, o relator, em qualquer feito, poderá submeter diretamente ao colegiado a apreciação da liminar ou medida antecipatória.” (grifo nosso)

Conclui-se, dessa forma, que, ante a previsão do art. 227 do RITJSP, que permite a apreciação da liminar pelo relator para ações diretas ajuizadas perante o Egrégio Tribunal de Justiça, descabida aplicação do rito constante do art. 10, caput, Lei nº 9.868/99, que diz respeito apenas às ações diretas ajuizadas perante o Supremo Tribunal Federal. Neste sentido:

“AGRAVO REGIMENTAL - DECISÃO MONOCRÁTICA, PROFERIDA PELO RELATOR EM AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE, DEFERINDO LIMINAR PARA SUSPENDER A VIGÊNCIA E EFICÁCIA DE LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL - COMPETÊNCIA DO RELATOR PARA APRECIAÇÃO DO PLEITO, SEGUNDO O PRECONIZADO NO ARTIGO 93. XV. DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DA CAUTELA. ALÉM DA CONVENIÊNCIA DA MEDIDA ALVITRADA - INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO A GARANTIA DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. VISTO QUE O JUDICIÁRIO É O INTERPRETE DA CONSTITUIÇÃO - DESCABIMENTO DE APLICAÇÃO DO RITO DA LEI 9.868/99. QUE DIZ APENAS COM AS AÇÕES DIRETAS AJUIZADAS PERANTE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - INCIDÊNCIA DAS NORMAS REGIMENTAIS. NESTE PARTICULAR - PROVIMENTO NEGADO POR INEXISTENTE RAZÃO HÁBIL A DIVERSA SOLUÇÃO. NOS TERMOS DO DECISUM RECORRIDO (Agravo Regimental nº. 162.920.030-1 – Rel. Des. A. C. MATHIAS COLTRO – j. 27.02.2008, grifo nosso)

Agravo regimental – Concessão monocrática de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade - Impossibilidade de reconhecimento da ilegitimidade passiva ad causam do Presidente da Câmara Municipal, posto achar-se inserida, dentre suas atribuições, a de representar, em Juízo ou fora dele, sobre dito órgão legislativo - Ausência, outrossim, de afronta ao disposto nos artigos 226 do RITJSP, 10, caput, da Lei n° 9.868/99 e 97 da Constituição Federal, bem assim ao comando inscrito na Súmula Vinculante n° 10 do STF, uma vez que compete ao relator, na via do controle concentrado de constitucionalidade, a apreciação do pedido liminar (ex vi do artigo 227 do RITJSP) - Inexistência, ainda, de argumentação apta a demonstrar, nesta sede recursal, o desacerto do decisum guerreado - Agravo improvido. (Agravo Regimental nº. 0403127-32.2010.8.26.000000 – Rel. Des. Guilherme G.Strenger  – j. 03.02.2010, grifo nosso)

Frise-se que a lei federal infraconstitucional (Lei n. 9.868/99) deverá ser aplicada apenas de forma supletiva, naquilo que o Regimento não previu, o que não é o caso, visto que o art. 227 prevê a competência do Desembargador Relator para apreciar pedido liminar em sede de controle concentrado de constitucionalidade. 

Outrossim, a decisão apenas suspendeu a eficácia das normas liminarmente, não impedindo que a decisão final sobre a constitucionalidade dos referidos diplomas seja pronunciada pelo Órgão Especial. Neste sentido decisão do Colendo Órgão Especial, in verbis:

“AGRAVO REGIMENTAL - MEDIDA LIMINAR - AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - CRIAÇÃO DE CARGOS COMISSIONADOS E RESPECTIVOS VENCIMENTOS – LIMINAR CONCEDIDA - DECISÃO MANTIDA. 1. Nada impede o relator de apreciar, em summaría cognitio, o cabimento de medida liminar em ação direta de inconstitucionalidade de lei, em virtude do art 10, §3", da Lei n" 9.868/99 e do art. 227 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. (...) Evidente, portanto, que nenhum órgão fracionário (Turmas, Câmaras ou Seções), pode declarar a inconstitucionalidade de ato normativo, por se tratar de extraordinária competência reservada ao STF e ao Órgão Especial dos tribunais onde houver, sendo regida pelo princípio da reserva do Plenário (CF, art. 97). Mas nada impede o relator de apreciar, em summaria cognitio, o cabimento de medida liminar em ação direta de inconstitucionalidade de lei, em virtude do art. 10, §3°, da Lei n° 9.868/99 e do art. 227 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.” (Agravo Regimental nº. 0588675-33.2010.8.26.0000/5000 - Des. Rel. Artur Marques  – j. 02.03.2011, grifo nosso)

“Ação direta de inconstitucionalidade - Decisão do relator suspendendo liminarmente a eficácia de determinadas expressões mencionadas no ato impugnado - Ausência de violação ao artigo 97 da Constituição Federal e Súmula vinculante n° 10 - Ato judicial proferido por juiz natural integrante do Órgão Especial do Tribunal, competente para análise e julgamento da ação - Decisão provisória e sujeita a recurso que, ao ser interposto, deverá ser julgado pelo Plenário, que estará decidindo quanto à revogação ou manutenção da decisão do relator- Preliminar rejeitada.” (Agravo Regimental nº. 994.09.229475-4 – Rel. Des. José Reynaldo – j. 27.10.2010, grifo nosso)

         No caso, a Câmara Municipal sustenta que a questão não seria relevante e que, assim sendo, deveria o Relator submeter a apreciação da liminar ao colegiado (art. 165, § 2º, do RITJSP). Entretanto, nos termos do citado dispositivo, “diante da relevância da questão, o relator, em qualquer feito, poderá submeter diretamente ao colegiado a apreciação da liminar ou medida antecipatória” (grifo nosso), donde se infere que o legislador deixou a decisão de encaminhar ou não a apreciação da liminar ao Órgão Colegiado a cargo do Desembargador Relator. No caso da presente Ação Direta de Inconstitucionalidade, a exemplo do que ocorre comumente, o i. Relator achou por bem apreciar a liminar.

         Posto isso, a alegação de irregularidade formal há de ser afastada, pois é comprovadamente possível a apreciação de liminar pelo Desembargador Relator em Ação Direta de Inconstitucionalidade.

       Por fim, eventual colisão da lei local com dispositivos da Lei Orgânica do Município não merece cognição.

         Insuscetível é o amparo de alegação de afronta à Lei Orgânica do Município, como alegado, pois o contencioso de constitucionalidade de lei ou ato normativo municipal tem como exclusivo parâmetro a Constituição Estadual ainda que remissiva ou reprodutora da Constituição Federal (art. 125, § 2º, Constituição Federal).

         Destarte, qualquer alegação de incompatibilidade com a Lei Orgânica Municipal não merece cognição, tendo em vista que é “inviável a análise de outra norma municipal para aferição da alegada inconstitucionalidade da lei” (STF, AgR-RE 290.549-RJ, 1ª Turma, Rel. Min. Dias Toffoli, 28-02-2012, m.v., DJe 29-03-2012).

         Compete destacar que o art. 144 da Constituição Estadual não tem o alcance exposto pelo requerente. Esse dispositivo, assim como o caput do art. 29 da Constituição Estadual, ao assegurar a autonomia municipal pela respectiva Lei Orgânica, não a eleva ao status de norma constitucional para controle de constitucionalidade de lei local, tanto que o § 2º do art. 125 da Constituição da República prevê como exclusivo parâmetro da jurisdição constitucional a Constituição do Estado. A norma apenas subordina a produção da Lei Orgânica aos preceitos da Constituição Federal e da Constituição Estadual.

         MÉRITO

         Procede a presente ação.

Inicialmente, insta observar que diversamente do sustentado pela Câmara Municipal de Restinga, a legislação impugnada viola dispositivos da Constituição Estadual, circunstância essa, que permite o controle concentrado de constitucionalidade.

        

         Com efeito, a Lei n. 1.571, de 24 de outubro de 2008, do Município de Restinga, apresenta a seguinte redação:

 

“Art. 1º - Visando proporcionar ao Servidor Público Municipal, em razão de tempo de serviço prestado ao Município, fica concedido um incentivo de 30% (trinta por cento) sob o salário básico, ao servidor dos quadros de funcionários da Prefeitura do Município de Restinga, Estado de São Paulo que já se encontra no período dos últimos 05 (cinco) anos de contribuição e serviços prestados, para alcançar benefício junto ao INSS.

 

Art. 2º- O benefício que trata o art. 1º, será concedido sem prejuízo a outros benefícios a que faz juz o servidor público municipal e surtirá seus efeitos legais a partir de 01 de janeiro de 2009.

 

Art. 3º - O Poder Executivo poderá expedir normas complementares visando o aperfeiçoamento da presente Lei.

 

Art. 4º - As despesas com a execução da presente Lei, correrão por conta de dotações Orçamentárias próprias.

 

Art. 5º - Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário”

 

         A lei local impugnada, de iniciativa parlamentar, cria uma espécie de gratificação aos servidores públicos que já se encontram no período dos últimos 05 (cinco) anos de contribuição e serviços prestados, para alcançar a aposentadoria junto ao INSS, no importe de 30% (trinta por cento) sob o salário básico.

        

        Ocorre, porém, que a matéria é sujeita à iniciativa legislativa reservada ao Chefe do Poder Executivo, pois tanto se refere à remuneração de servidores públicos, quanto a aspectos integrantes de seu regime jurídico, nos termos do art. 24, § 2º, 1 e 4, da Constituição Estadual.

        

         Desta feita, ao instituir o referido benefício, a Câmara Municipal de Restinga violou o princípio da separação dos poderes de que trata o art. 5º da Constituição Estadual.

        

         A instituição de vantagem pecuniária e sua disciplina, devida aos servidores públicos, é matéria inserida na reserva de iniciativa legislativa do Chefe do Poder Executivo (art. 24, § 2º, 1 e 4, Constituição Estadual).

        

         Neste sentido, é a pronúncia da jurisprudência:

 

“INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Lei nº 740/2003, do Estado do Amapá. Competência legislativa. Servidor Público. Regime jurídico. Vencimentos. Acréscimo de vantagem pecuniária. Adicional de Desempenho a certa classe de servidores. Inadmissibilidade. Matéria de iniciativa exclusiva do Governador do Estado, Chefe do Poder Executivo. Usurpação caracterizada. Inconstitucionalidade formal reconhecida. Ofensa ao art. 61, § 1º, II, alínea ‘a’, da CF, aplicáveis aos estados. Ação julgada procedente. Precedentes. É inconstitucional a lei que, de iniciativa parlamentar, conceda ou autorize conceder vantagem pecuniária a certa classe de servidores públicos” (STF, ADI 3.176-AP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cezar Peluso, 30-06-2011, v.u., DJe 05-08-2011).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE. CONCESSÃO DE VANTAGENS PECUNIÁRIAS A SERVIDORES PÚBLICOS. SIMETRIA. VÍCIO DE INICIATIVA. 1. As regras de processo legislativo previstas na Carta Federal aplicam-se aos Estados-membros, inclusive para criar ou revisar as respectivas Constituições. Incidência do princípio da simetria a limitar o Poder Constituinte Estadual decorrente. 2. Compete exclusivamente ao Chefe do Poder Executivo a iniciativa de leis, lato sensu, que cuidem do regime jurídico e da remuneração dos servidores públicos (CF artigo 61, § 1º, II, ‘a’ e ‘c’ c/c artigos 2º e 25). Precedentes. Inconstitucionalidade do § 4º do artigo 28 da Constituição do Estado do Rio Grande do Norte. Ação procedente” (STF, ADI 1.353-RN, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, 20-03-2003, v.u., DJ 16-05-2003, p. 89).

Oportuno ressaltar, ao contrário do aventado pela Câmara Municipal de Restinga, eventual sanção tácita não convalida a inconstitucionalidade por vício de iniciativa, estando, ademais, revogada a Súmula 05 do Supremo Tribunal Federal.

Neste sentido:

“(...) A SANÇÃO DO PROJETO DE LEI NÃO CONVALIDA O VÍCIO DE INCONSTITUCIONALIDADE RESULTANTE DA USURPAÇÃO DO PODER DE INICIATIVA.- A ulterior aquiescência do Chefe do Poder Executivo, mediante sanção do projeto de lei, ainda quando dele seja a prerrogativa usurpada, não tem o condão de sanar o vício radical da inconstitucionalidade. Insubsistência da Súmula nº 5/STF. (...)” (RTJ 202/78).

 

 Neste diapasão, não há que se falar  em violação à segurança jurídica.

 

         Por fim, a lei local impugnada também é incompatível com o art. 25 da Constituição Estadual.

 

         A lei cria diretamente obrigações para o Poder Executivo sem indicação precisa de recursos orçamentários para atendimento dos deveres nela contidos, não bastando a previsão contida em seu art. 4º de que as despesas com a execução desta Lei correrão por conta de dotação orçamentária.

 

Diante do exposto, caso seja superada a preliminar arguida, nosso parecer é pela procedência da ação, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei n. 1.571, de 24 de outubro de 2008, do Município de Restinga, de iniciativa parlamentar, que “dispõe sobre a concessão de incentivo por tempo de serviço prestado ao município de 30% (trinta por cento) do salário básico, ao servidor municipal do Quadro de funcionários da Prefeitura do Município de Restinga, Estado de São Paulo que já se encontra no período dos últimos 05  (cinco) anos                                                                                                       de contribuição e serviços prestados, para alcançar benefício definitivo junto ao INSS”.

                            São Paulo, 22 de agosto de 2013.

 

 

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

vlcb