Parecer em Ação Direta de
Inconstitucionalidade
Processo nº 0155184-95.2013.8.26.0000
Requerente:
Mesa Diretora da Câmara Municipal da Estância Turística de São Roque
Requeridos: Prefeito Municipal e Presidente
da Câmara Municipal da Estância Turística de São Roque
Ementa:
1) Ação direta de inconstitucionalidade.
Arts. 47, 48, 49 e 50 da Lei Orgânica Municipal da Estância Turística de São
Roque e arts. 334, 335, 336, 337 e 338 do Regimento Interno da Câmara Municipal
da Estância Turística de São Roque que disciplinam as hipóteses e o procedimento
para extinção e cassação do mandato de Vereador.
2) Preliminar. Limites à
cognição judicial no processo objetivo de controle de constitucionalidade das
leis. Precedentes do E. STF. A ofensa à legislação infraconstitucional não é
suficiente para deflagrar o processo objetivo de controle de
constitucionalidade. Ofensa reflexa ou indireta ao texto constitucional não
viabiliza a instauração da jurisdição constitucional. Extinção do processo sem
resolução do mérito.
3) Processo objetivo. Causa de pedir
aberta. Possibilidade de reconhecimento da inconstitucionalidade por fundamento
não apontado na inicial.
4) Dispositivos que tipificam infrações
político-administrativas praticadas por Vereador e disciplinam respectivo
processo de cassação. Tema da alçada federal. Ofensa à regra da repartição
constitucional de competências associada diretamente ao princípio federativo
(art. 1º e art. 18 da CF/88). Previsão de hipótese de extinção de mandato não
contemplada no âmbito estadual e federal. Princípios de observância obrigatória
pelos Estados e Municípios (art. 1º e 144 da Constituição do Estado de São
Paulo).
5) Procedência parcial.
Colendo Órgão
Especial,
Senhor Desembargador
Relator:
Tratam estes autos de ação direta de inconstitucionalidade, tendo como alvo os arts. 47, 48, 49 e 50 da Lei Orgânica Municipal da Estância Turística de São Roque e os arts. 334, 335, 336, 337 e 338 do Regimento Interno da Câmara Municipal da Estância Turística de São Roque, que disciplinam as hipóteses e o procedimento para extinção e cassação do mandato de Vereador.
Sustenta o requerente que os dispositivos legais impugnados são inconstitucionais por violarem a Lei Orgânica Municipal, o Decreto Lei nº 201/67 e os arts. 15 caput, 22, I e XIII e 24, XI da Constituição Federal.
Foi indeferido o pedido de liminar (fls. 119/120).
Citado regularmente (fl. 128), o Senhor Procurador-Geral do Estado declinou da defesa do ato impugnado, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 130/131).
Devidamente notificado (fl. 125), o Presidente da Câmara Municipal não prestou informações.
Nestas condições vieram os autos para manifestação desta Procuradoria-Geral de Justiça.
PRELIMINARMENTE
Não foram apontados parâmetros da Constituição Estadual para o controle da constitucionalidade. O requerente limitou-se a afirmar violação da Lei Orgânica Municipal pelos dispositivos do Regimento Interno da Câmara Municipal e violação do Decreto Lei nº 201/67 pelos dispositivos do Regimento Interno da Câmara Municipal e da Lei Orgânica Municipal, bem como ofensa a dispositivos da Constituição Federal.
No controle concentrado de constitucionalidade das leis, promovido por meio da ação direta, a discussão a respeito da legitimidade constitucional da norma é relativamente limitada.
A ofensa à legislação infraconstitucional não é suficiente para deflagrar o processo objetivo de controle de constitucionalidade.
Inconstitucionalidades indiretas ou reflexas, ou mesmo decorrentes de questões de fato não podem ser aferidas. O único exame que se faz, no processo objetivo, decorre do confronto direto entre o ato normativo impugnado e o parâmetro constitucional (na hipótese, apenas estadual) adotado para fins de controle (STF, ADI 2.714, Rel. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 13-3-03, DJ de 27-2-04; ADI-MC 1347 /DF, Rel. Min. Celso de Mello, j. 05/09/1995, Tribunal Pleno, DJ 01-12-1995, p.41685, EMENT VOL-01811-02, p.00241, g.n.; ADI-MC n.º 842 - DF, RTJ 147/545-546).
Tem prevalecido na doutrina e na jurisprudência, nesse tema, o sentido de que, no processo objetivo, a única avaliação admissível é aquela referente à questão de direito, no confronto direto entre a lei e o texto constitucional.
A esse propósito, é oportuno averbar a advertência feita pelo i. Min. Celso de Mello, do E. STF: “A ação direta não pode ser degradada em sua condição jurídica de instrumento básico de defesa objetiva da ordem normativa inscrita na Constituição. A válida e adequada utilização desse meio processual exige que o exame ‘in abstracto’ do ato estatal impugnado seja realizado exclusivamente à luz do texto constitucional. Desse modo, a inconstitucionalidade deve transparecer diretamente do texto do ato estatal impugnado. A prolação desse juízo de desvalor não pode e nem deve depender, para efeito de controle normativo abstrato, da prévia análise de outras espécies jurídicas infraconstitucionais, para, somente a partir desse exame e num desdobramento exegético ulterior, efetivar-se o reconhecimento da ilegitimidade constitucional do ato questionado” (ADI-MC n.º 842 - DF, RTJ 147/545-546, g.n.).
Deixa-se, portanto, de proceder à analise da validade dos atos normativos impugnados em face da Lei Orgânica Municipal e do Decreto Lei nº 201/67 . O confronto direto com a Constituição Federal só será possível nos limites do art. 144 da Constituição Estadual.
DA
CAUSA DE PEDIR ABERTA
Inicialmente oportuno consignar que a ação direta estadual é processo objetivo de verificação da incompatibilidade entre a lei e a Constituição do Estado. Por essa razão é possível aferir-se a ilegitimidade constitucional do ato normativo impugnado à luz de preceitos e fundamentos constitucionais estaduais não mencionados na petição inicial.
A causa de pedir consiste na violação à Constituição Estadual, razão pela qual tem sido denominada como causa de pedir aberta, possibilitando no controle concentrado de constitucionalidade o acolhimento por fundamento ou parâmetro não apontado na inicial.
A
propósito, anota Juliano Taveira Bernardes que, no processo objetivo, “Segundo o STF, o âmbito de cognoscibilidade
da questão constitucional não se adstringe aos fundamentos constitucionais
invocados pelo requerente, pois abarca todas as normas que compõe a
Constituição Federal. Daí, a fundamentação dada pelo requerente pode ser
desconsiderada e suprida por outra encontrada pela Corte” (Controle abstrato de constitucionalidade,
São Paulo, Saraiva, 2004, p. 436).
Assim vem decidindo o Col. STF:
“(...)
Ementa: constitucional. (...). 'Causa petendi' aberta, que permite examinar a questão por fundamento
diverso daquele alegado pelo requerente. (...) (ADI 1749/DF, Rel. Min.
OCTAVIO GALLOTTI, Rel. p. acórdão Min. NELSON JOBIM, j. 25/11/1999, Tribunal
Pleno , DJ 15-04-2005, PP-00005, EMENT VOL-02187-01, PP-
(...)”
Confira-se ainda, nesse mesmo sentido: ADI 3576/RS, Rel. Min. ELLEN GRACIE, j. 22/11/2006, Tribunal Pleno, DJ 02-02-2007, PP-00071, EMENT VOL-02262-02, PP-00376.
DAS VIOLAÇÕES CONSTITUCIONAIS
Passa-se, assim, ao exame do mérito da ação direta.
Nos termos do art. 144 da Constituição Federal: “Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.
Para a solução do caso, é necessário ter em mente que
tratar de crimes de responsabilidade (infrações político-administrativas) é
atividade que se encontra inserida dentro da competência legislativa exclusiva
do legislador federal, por força do art. 22, I, da CR/88.
Recorde-se
com Alexandre de Moraes, referindo-se aos ilícitos político-administrativos,
que há “(...) necessidade de que a
tipificação de tais infrações emane de lei federal, eis que o Supremo Tribunal
Federal tem entendido que a definição formal dos crimes de responsabilidade se
insere, por seu conteúdo penal, na competência exclusiva da União” (Direito constitucional, 19. ed., São
Paulo, Atlas, 2006, p. 443).
A
questão, inclusive, foi pacificada pelo E. STF, que editou a respeito à Súmula
nº 722, do seguinte teor: “São da competência
legislativa da União a definição dos crimes de responsabilidade e o
estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento."
Vários
foram os precedentes que justificaram a edição da mencionada súmula,
Em
cada um desses precedentes ficou claro o posicionamento da Suprema Corte no
sentido de que cabe ao legislador federal tipificar as infrações político-administrativas,
e traçar as normas para o respectivo processo e julgamento.
É
assente também que as normas federais anteriores à Constituição de 1988 que
tratam da matéria foram recepcionadas pela Carta Magna, ao menos na parte em
que não são com ela incompatíveis.
Deste
modo, os arts. 49, 50 e 51 da Lei Orgânica Municipal de São Roque e os arts.
340, 341, 342, 343 e 344 do Regimento Interno da Câmara Municipal daquela urbe,
por tratarem de matéria de competência da União são inconstitucionais, devendo
seu vício ser reconhecido por esse E. Órgão Especial, em sede de controle
concentrado de normas.
A
prescrição de que os Municípios devem observar os princípios constitucionais
estabelecidos não se encontra apenas no art. 144 da Constituição Paulista. O
art. 29, caput, da CR/88 prevê que “O Município reger-se-á por lei orgânica,
votada em dois turnos, com interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois
terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta
Constituição, na Constituição do respectivo Estado, e os seguintes
preceitos (g.n.).”
Relevante
anotar que quando do julgamento da ADI 130.227.0/0-00 em 21.08.07, rel. des.
Renato Nalini, esse E. Tribunal de Justiça acolheu a tese no sentido da possibilidade
de declaração de inconstitucionalidade
de lei municipal por violação do
princípio da repartição de competências estabelecido pela Constituição
Federal. É relevante trazer excerto de voto do i. Desembargador Walter de
Almeida Guilherme, imprescindível para a elucidação da questão:
“(...) Ora, um dos princípios da Constituição Federal – e de
capital importância – é o princípio federativo, que se expressa, no Título I,
denominado ‘Dos Princípios Fundamentais’, logo no art.1º: ‘A República
Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios
e do Distrito Federal, constitui-se
Sendo a organização federativa do Estado brasileiro um princípio fundamental da República do Brasil, e constituindo elemento essencial dessa forma de estado a distribuição de competência legislativa dos entes federados, inescapável a conclusão de ser essa discriminação de competência um princípio estabelecido na Constituição Federal.
Assim, quando o referido art. 144 ordena que os Municípios, ao se organizarem, devem atender os princípios da Constituição Federal, fica claro que se estes editam lei municipal fora dos parâmetros de sua competência legislativa, invadindo a esfera de competência legislativa da União, não estão obedecendo ao princípio federativo, e, pois, afrontando estão o art. 144 da Constituição do Estado (...)” (trecho do voto do i. des. Walter de Almeida Guilherme, no julgamento da ADI 130.227.0/0-00).
Há leis federais que tratam da tipificação de crimes de responsabilidade praticados por Prefeitos e Vereadores, bem como do respectivo processo e julgamento.
A
Lei nº 1.079/50, recepcionada pela Constituição da República, define quais são
as infrações, e disciplina o processo e julgamento, nos casos de crimes de
responsabilidade (infrações político-administrativas) cometidos pelo Presidente
da República e Ministros de Estado, Ministros do Supremo Tribunal Federal,
Procurador-Geral da República, Governadores e Secretários de Estado.
O
Decreto-lei nº 201/67 define e regula o processo atinente aos crimes de
responsabilidade cometidos por Prefeitos Municipais e por Vereadores.
Destarte,
ostentam vício de inconstitucionalidade,
por violação ao princípio federativo
– não observância das regras associadas à repartição constitucional de
competências - normas contidas na legislação municipal (Lei Orgânica) e
Regimento Interno da Câmara Municipal que conceituam infrações
político-administrativas e regulam o respectivo processo e julgamento.
Apenas
como reforço, cumpre colacionar julgado do E. STF que, mutatis mutandis, serve de parâmetro para o caso em exame:
"(...)
A expressão ‘e julgar’, que consta do inciso XX do artigo 40, e o inciso II do § 1º do artigo 73 da Constituição catarinense consubstancia normas processuais a serem observadas no julgamento da prática de crimes de responsabilidade. Matéria cuja competência legislativa é da União. Precedentes. Lei federal n. 1.079/50, que disciplina o processamento dos crimes de responsabilidade. Recebimento, pela Constituição vigente, do disposto no artigo 78, que atribui a um Tribunal Especial a competência para julgar o Governador. Precedentes. Inconstitucionalidade formal dos preceitos que dispõem sobre processo e julgamento dos crimes de responsabilidade, matéria de competência legislativa da União. A CB/88 elevou o prazo de inabilitação de 5 (cinco) para 8 (oito) anos em relação às autoridades apontadas. Artigo 2º da Lei n. 1.079 revogado, no que contraria a Constituição do Brasil. A Constituição não cuidou da matéria no que respeita às autoridades estaduais. O disposto no artigo 78 da Lei n. 1.079 permanece hígido — o prazo de inabilitação das autoridades estaduais não foi alterado. O Estado-Membro carece de competência legislativa para majorar o prazo de cinco anos — artigos 22, inciso I, e parágrafo único do artigo 85 da CB/88, que tratam de matéria cuja competência para legislar é da União. O Regimento da Assembléia Legislativa catarinense foi integralmente revogado. Prejuízo da ação no que se refere à impugnação do trecho ‘do qual fará chegar uma via ao substituto constitucional do Governador para que assuma o poder, no dia em que entre em vigor a decisão da Assembléia’, constante do § 4º do artigo 232." (ADI 1.628, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 10-8-06, DJ de 24-11-06).
(...)”
Saliente-se que a posição aqui sustentada encontra amparo em precedentes desse E. Tribunal de Justiça. É o caso do julgado relatado pelo Exmo Des. Mohamed Amaro (ADIN 106.343-0/8-00, Ilha Solteira, Julgado em 23.06.2004), de cuja ementa pode-se extrair o seguinte excerto:
“(...)
Os princípios básicos que regem a responsabilização do Chefe do Executivo por crime de responsabilidade consagram que somente a União – no exercício de sua competência privativa para legislar sobre direito penal e processual – poderá definir as figuras típicas correspondentes a crimes de responsabilidade, bem como suas normas para o respectivo processo e julgamento, restando, pois, afastada qualquer previsão da lei orgânica municipal, regimento interno, ou resolução legislativa, diversa do estabelecido na legislação federal pertinente.
Aos municípios, apenas cabe observar as normas decorrentes do Decreto-lei 201/67 – que foi recepcionado pela nova ordem constitucional, como, expressamente, admitido pelo Supremo Tribunal Federal.
O ESTABELECIMENTO DE NORMAS DE PROCESSO E JULGAMENTO DOS CRIMES DE RESPONSABILIDADE – PORTANTO, SIGNIFICANDO INFRAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA - É DA COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO, POR FORÇA DO QUE DIPÕEM OS ARTIGOS 85, PARÁGRAFO ÚNICO, E 22, INCISO I, AMBOS DA CARTA MAGNA.
Precedentes jurisprudenciais.
(...)”
No mesmo sentido o julgamento da ADI nº 153.536-0/8-00, relator Des. Mário Devienne Ferraz, j. 09.04.2008 (v.u.), conforme ementa a seguir transcrita:
“(...)
Ação direta de inconstitucionalidade. Emenda à Lei Orgânica do Município de Tietê nº 2, de 4 de novembro de 2004, que incluiu em seu texto o artigo 61-D, no qual atribui à Câmara Municipal o poder de afastar o Prefeito cuja denúncia por infração político-administrativa for recebida por dois terços de seus membros e quando a denúncia pela prática de crime comum, de responsabilidade ou ato de improbidade administrativa for recebida pelo Poder Judiciário, perdurando o afastamento até final julgamento. Inadmissibilidade. Ofensa ao princípio federativo e ao princípio da competência legislativa. Violação dos artigos 22, I, 24, XI e 29, todos da Constituição Federal, 144 da Carta Política Estadual, e do Decreto-lei nº 201/67. Ação julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade do artigo impugnado.
(...)”
Não pode o legislador municipal, a pretexto de legislar sobre assuntos de interesse local ou suplementar a legislação Federal ou Estadual de ordem geral, invadir a competência legislativa destes entes federativos superiores (RE 313.060, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 29-11-2005, Segunda Turma, DJ de 24-2-2006).
A autonomia das entidades federativas pressupõe repartição de competências legislativas, administrativas e tributárias. Trata-se de um dos pontos caracterizadores e asseguradores da existência e de harmonia do Estado Federal.
A base do conceito do Estado Federal reside exatamente na repartição de poderes autônomos, que, na concepção tridimensional do Estado Federal Brasileiro, se dá entre União, Estados e Municípios. É através desta distribuição de competências que a Constituição Federal garante o princípio federativo. O respeito à autonomia dos entes federativos é imprescindível para a manutenção do Estado Federal.
Dessa forma, no conflito normativo aqui analisado, conclui-se que os arts. 49, 50 e 51 da Lei Orgânica Municipal de São Roque e os arts. 340, 341, 342, 343 e 344 do Regimento Interno da Câmara Municipal, violaram a repartição constitucional de competências, que é a manifestação mais contundente do princípio federativo, operando, por consequência, desrespeito a princípio constitucional estabelecido.
Essa é a razão pela qual restou configurada, no caso, a ofensa ao disposto no art. 1º e no art. 144, ambos da Constituição do Estado de São Paulo.
Referindo-se
aos princípios fundamentais da Constituição, que revelam as opções políticas
essenciais do Estado, José Afonso da Silva aponta que entre eles podem ser
inseridos, entre outros, “os princípios
relativos à existência, forma, estrutura e tipo de Estado: República Federativa do Brasil, soberania, Estado Democrático de
Direito (art. 1º)” (Curso de direito
constitucional positivo, 13. ed., São Paulo, Malheiros, 1997, p.
Um
dos aspectos de maior relevo, que representa a dimensão e alcance do princípio
do pacto federativo adotado pelo Constituinte em 1988, é justamente o que se
assenta nos critérios adotados pela Constituição Federal para a repartição de
competências entre os entes federativos, bem como a fixação da autonomia e dos
respectivos limites, dos Estados, Distrito Federal e Municípios, em relação à
União.
Anota,
a propósito, Fernanda Dias Menezes de Almeida que “avulta, portanto, sob esse ângulo, a importância da repartição de
competências, já que a decisão tomada a respeito é que condiciona a feição do
Estado Federal, determinando maior ou menor grau de descentralização.” Daí
a afirmação de doutrinadores no sentido de que a repartição de competências é “’a chave da estrutura do poder federal’, ‘o
elemento essencial da construção federal’, ‘a grande questão do federalismo’,
‘o problema típico do Estado Federal’” (Competências
na Constituição Federal de 1988, 4. ed., São Paulo, Atlas, 2007, p. 19/20).
A
preservação do princípio federativo tem contado com a anuência do C. STF, pois
como destacado em julgado relatado pelo Min. Celso de Mello:
"(...)
a idéia de Federação — que tem, na autonomia dos Estados-membros, um de seus cornerstones — revela-se elemento cujo sentido de fundamentalidade a torna imune, em sede de revisão constitucional, à própria ação reformadora do Congresso Nacional, por representar categoria política inalcançável, até mesmo, pelo exercício do poder constituinte derivado (CF, art. 60, § 4º, I). (HC 80.511, voto do Min. Celso de Mello, julgamento em 21-8-01, DJ de 14-9-01).
(...)”
Por essa linha de raciocínio, pode-se afirmar que a Lei Municipal que trate de matéria cuja competência é do legislador federal ou estadual está, ao desrespeitar a repartição constitucional de competências, a violar o princípio federativo.
Resta ainda observar que, na organização do poder
legislativo municipal, estabelece o art. 29, IX, da Constituição Federal, que
as proibições e incompatibilidades, no exercício da
vereança, devem ser similares, no que couber, àquelas previstas para os membros
do Congresso Nacional na Constituição Federal e na Constituição do respectivo
Estado para os membros da Assembleia Legislativa.
A extinção do mandato pela perda ou suspensão dos direitos políticos, motivo principal da presente ação, encontra-se em similitude ao previsto no art. 16, IV, da Constituição Estadual.
As demais hipóteses de incompatibilidade e de proibições previstas na Lei Orgânica Municipal e no Regimento Interno da Câmara Municipal reproduzem as normas constitucionais ou com elas estão em conformidade, salvo a previsão de extinção do mandato por condenação por crime funcional ou eleitoral, sem exigência do trânsito em julgado (art. 47, III, da Lei Orgânica Municipal e art. 334, I, do Regimento Interno da Câmara Municipal).
Diante
do exposto, aguarda-se que seja dada procedência parcial ao pedido para a
declaração da inconstitucionalidade dos arts. 47, III, 49, 50 e 51 da Lei
Orgânica Municipal de São Roque, dos arts. 340, 341, 342, 343 e 344 e da
expressão condenação por crime funcional ou eleitoral do inciso I do art. 334 do
Regimento Interno da Câmara Municipal de São Roque.
São Paulo, 19 de novembro de 2013.
Sérgio Turra Sobrane
Subprocurador-Geral de Justiça
Jurídico
aca