Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade
Processo n. 0191655-13.2013.8.26.0000
Requerente: Prefeito do Município de São José do Rio Preto
Requerida: Câmara Municipal de São José do Rio Preto
Ementa: Constitucional. Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei n. 11.236, de 03 de julho de 2012, de iniciativa parlamentar, do Município de São José do Rio Preto. Instituição do programa “Leitura em Foco” na rede municipal de ensino público. Geração de despesa pública. Restrição à eficácia da lei no exercício de sua vigência. Separação de poderes. Reserva de iniciativa legislativa do Chefe do Poder Executivo. Procedência da ação. 1. O contencioso de constitucionalidade de lei municipal tem como exclusivo parâmetro a Constituição Estadual (art. 125, § 2º, CF/88), sendo inadmissível seu contraste com a Lei Orgânica Municipal e o direito infraconstitucional. 2. A geração de despesa pública não é suficiente para a reserva de iniciativa legislativa do Chefe do Poder Executivo e somente compromete sua eficácia no exercício de sua vigência. 3. O art. 61, § 1º, II, b, CF/88, aplicável exclusivamente aos Territórios. 4. À lei local, de iniciativa parlamentar, que institui o programa na rede de ensino público e particular, é procedente a alegação de ofensa ao princípio da separação de poderes em virtude da reserva de iniciativa legislativa do Chefe do Poder Executivo pela conferência de atribuições a órgãos do Poder Executivo (arts. 5º, 24, § 2º, 2, e 47, II, XIV e XIX, a, CE/89). 5. Procedência da ação.
Egrégio Tribunal:
1. Trata-se de ação direta de
inconstitucionalidade promovida pelo Prefeito do Município de São José do Rio
Preto impugnando a Lei n. 11.236, de 03 de julho de 2012, do Município de São
José do Rio Preto, de iniciativa parlamentar, que institui o programa “Leitura
em Foco” de ação interdisciplinar e de participação comunitária no quadro
curricular das escolas da rede municipal de ensino fundamental, suscitando
contrariedade aos arts. 5º, 25 e 169, da Constituição do Estado, aos arts. 2º e
61, § 1º, II, b, da Constituição
Federal, à Lei Orgânica do Município e à Lei de Responsabilidade Fiscal (fls.
02/16).
2. Regularizada a representação
processual (fls. 76/77), a liminar foi indeferida (fls. 79/81), sendo desprovido
o agravo regimental interposto (fls. 114/119). O douto Procurador-Geral do
Estado declinou da defesa da lei atacada (fls. 126/127) e a Câmara Municipal de
São José do Rio Preto prestou informações (fls. 129/132) acostando cópia do
processo legislativo respectivo (fls. 133/176).
3. É o relatório.
4. O contencioso de
constitucionalidade de lei municipal tem como exclusivo parâmetro a
Constituição Estadual (art. 125, § 2º, Constituição Federal), sendo
inadmissível seu contraste com a Lei Orgânica Municipal e o direito
infraconstitucional como a Lei de Responsabilidade Fiscal.
5.
Não
há ofensa ao art. 25 da Constituição Estadual e ao art. 169 da Constituição
Federal. A ausência de recursos específicos para atendimento de novas despesas
apenas compromete a eficácia da lei no exercício financeiro de sua vigência.
6.
Com efeito, “inclina-se a
jurisprudência no STF no sentido de que a inobservância por determinada lei das
mencionadas restrições constitucionais não induz à sua inconstitucionalidade,
impedindo apenas a sua execução no exercício financeiro respectivo” (STF, ADI
1.585-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19-12-1997, v.u., DJ
03-04-1998, p. 01).
7.
Embora as normas
constitucionais centrais sejam de observância obrigatória (RT 850/180; RTJ
193/832), é impossível invocar-se como parâmetro o art. 61, § 1º, II, b, da Constituição da República, por ser
norma específica destinada exclusivamente à organização administrativa,
serviços públicos e matéria tributária e orçamentária dos Territórios. Neste
sentido, pronuncia o Supremo Tribunal Federal que:
“(...) a
reserva de lei de iniciativa do chefe do Executivo, prevista no art. 61, § 1º,
II, b,
da Constituição, somente se aplica aos Territórios federais (...)” (STF, ADI 2.447-MG,
Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 04-03-2009, v.u., DJe 04-12-2009).
8. Se a lei cria despesa pública ou
renuncia a receita pública isso não é suficiente para conclusão de sua
inconstitucionalidade por violação à iniciativa reservada do Chefe do Poder
Executivo. Como assinala José Maurício Conti ao comentar a inexistência de
reserva de iniciativa para leis que criam ou aumentam despesa pública, diferentemente
do ordenamento constitucional anterior, “não havendo mais a expressa disposição
no texto constitucional de que é iniciativa privativa do Presidente da
República as leis que disponham sobre matéria financeira, tal reserva não mais
subsiste, não sendo cabível interpretação ampliativa na hipótese, conforme
entende inclusive nossa Suprema Corte” (Iniciativa legislativa em matéria
financeira, in Orçamentos Públicos e
Direito Financeiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, pp. 283-307,
coordenação José Maurício Conti e Fernando Facury Scaff).
9. É conveniente assentar que se
trata de verdadeiro sofisma a alegação de que toda e qualquer lei que gere
despesa só possa advir de projeto de autoria do Executivo. O Supremo
Tribunal Federal tem estimado que:
“(...) não
procede a alegação de que qualquer projeto de lei que crie despesa só poderá
ser proposto pelo Chefe do Executivo. As hipóteses de limitação da iniciativa
parlamentar estão previstas, em numerus
clausus, no artigo 61 da Constituição do Brasil --- matérias relativas ao
funcionamento da Administração Pública, notadamente no que se refere a servidores
e órgãos do Poder Executivo (...)” (RT 866/112).
10. A iniciativa legislativa reservada
é matéria de direito excepcional, sendo impositiva sua interpretação restritiva
que não permite dilatação nem presunção.
11.
Regra é a iniciativa legislativa
pertencente ao Poder Legislativo; exceção é a atribuição de reserva a certa
categoria de agentes, entidades e órgãos, e que, por isso, não se presume.
Corolário é a devida interpretação restritiva às hipóteses de iniciativa
legislativa reservada, perfilhando tradicional lição salientando que:
“a distribuição das funções entre os órgãos do Estado (poderes), isto é, a determinação das competências, constitui tarefa do Poder Constituinte, através da Constituição. Donde se conclui que as exceções ao princípio da separação, isto é, todas aquelas participações de cada poder, a título secundário, em funções que teórica e normalmente competiriam a outro poder, só serão admissíveis quando a Constituição as estabeleça, e nos termos em que fizer. Não é lícito à lei ordinária, nem ao juiz, nem ao intérprete, criarem novas exceções, novas participações secundárias, violadoras do princípio geral de que a cada categoria de órgãos compete aquelas funções correspondentes à sua natureza específica” (J. H. Meirelles Teixeira. Curso de Direito Constitucional, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991, pp. 581, 592-593).
12. Fixadas
estas premissas, as reservas de iniciativa legislativa a autoridades, agentes,
entidades ou órgãos públicos diversos do Poder Legislativo devem sempre ser
interpretadas restritivamente na medida em que, ao transferirem a ignição do
processo legislativo, operam reduções a funções típicas do Parlamento e de seus
membros. Neste sentido, colhe-se da Suprema Corte:
“A iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito, não se presume e nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que – por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo – deve necessariamente derivar de norma constitucional explícita e inequívoca” (STF, ADI-MC 724-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 27-04-2001).
“As hipóteses de limitação da iniciativa parlamentar estão previstas, em numerus clausus, no artigo 61 da Constituição do Brasil --- matérias relativas ao funcionamento da Administração Pública, notadamente no que se refere a servidores e órgãos do Poder Executivo” (RT 866/112).
“A disciplina
jurídica do processo de elaboração das leis tem matriz essencialmente
constitucional, pois residem, no texto da Constituição - e nele somente -, os
princípios que regem o procedimento de formação legislativa, inclusive aqueles
que concernem ao exercício do poder de iniciativa das leis. - A teoria geral do
processo legislativo, ao versar a questão da iniciativa vinculada das leis,
adverte que esta somente se legitima - considerada a qualificação eminentemente
constitucional do poder de agir em sede legislativa - se houver, no texto da
própria Constituição, dispositivo que, de modo expresso, a preveja. Em
conseqüência desse modelo constitucional, nenhuma lei, no sistema de direito
positivo vigente no Brasil, dispõe de autoridade suficiente para impor, ao
Chefe do Executivo, o exercício compulsório do poder de iniciativa legislativa”
(STF, MS 22.690-CE, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 17-04-1997, v.u.,
DJ 07-12-2006, p. 36).
13. Postulado
básico da organização do Estado é o princípio da separação dos poderes,
constante do art. 5º da Constituição do Estado de São Paulo, norma de
observância obrigatória nos Municípios conforme estabelece o art. 144 da mesma
Carta Estadual.
14. Este dispositivo é tradicional pedra fundamental do Estado de Direito
assentado na ideia de que as funções estatais são divididas e entregues a
órgãos ou poderes que as exercem com independência e harmonia, vedando
interferências indevidas de um sobre o outro. Todavia, o exercício dessas
atribuições nem sempre é fragmentado e estanque, pois, observa a doutrina que:
“O princípio da separação dos poderes (ou divisão, ou distribuição, conforme a terminologia adotada) significa, portanto, entrosamento, coordenação, colaboração, desempenho harmônico e independente das respectivas funções, e ainda que cada órgão (poder), ao lado de suas funções principais, correspondentes à sua natureza, em caráter secundário colabora com os demais órgãos de diferente natureza, ou pratica certos atos que, teoricamente, não pertenceriam à sua esfera de competência” (J. H. Meirelles Teixeira. Curso de Direito Constitucional, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991, p. 585).
15. Como consequência
do princípio da separação dos poderes, a Constituição Estadual, perfilhando as
diretrizes da Constituição Federal, comete a um Poder competências próprias,
insuscetíveis de invasão por outro. Assim, ao Poder Executivo são outorgadas
atribuições típicas da função administrativa, como dispor sobre a sua
organização e seu funcionamento. Em essência, a separação ou divisão de
poderes:
“consiste um confiar cada uma das funções governamentais (legislativa, executiva e jurisdicional) a órgãos diferentes (...) A divisão de Poderes fundamenta-se, pois, em dois elementos: (a) especialização funcional, significando que cada órgão é especializado no exercício de uma função (...); (b) independência orgânica, significando que, além da especialização funcional, é necessário que cada órgão seja efetivamente independente dos outros, o que postula ausência de meios de subordinação” (José Afonso da Silva. Comentário contextual à Constituição, São Paulo: Malheiros, 2006, 2ª ed., p. 44).
16. Também por decorrência
do citado princípio da separação de poderes, e à vista dos mecanismos de
controle recíprocos de um sobre o outro para evitar abusos e disfunções, a
Constituição Estadual cuidou de precisar a participação do Poder Executivo no
processo legislativo. Como observa a doutrina:
“É a esse arranjo, mediante o qual, pela distribuição de competências, pela participação parcial de certos órgãos estatais controlam-se e limitam-se reciprocamente, que os ingleses denominavam, já anteriormente a Montesquieu, sistema de ‘freios recíprocos’, ‘controles recíprocos’, ‘reservas’, ‘freios e contrapesos’ (checks and controls, checks and balances), tudo isso visando um verdadeiro ‘equilíbrio dos poderes’ (equilibrium of powers).
(...)
A distribuição das funções entre os órgãos do Estado (poderes), isto é, a determinação das competências, constitui tarefa do Poder Constituinte, através da Constituição. Donde se conclui que as exceções ao princípio da separação, isto é, todas aquelas participações de cada poder, a título secundário, em funções que teórica e normalmente competiriam a outro poder, só serão admissíveis quando a Constituição as estabeleça, e nos termos em que fizer. Não é lícito à lei ordinária, nem ao juiz, nem ao intérprete, criarem novas exceções, novas participações secundárias, violadoras do princípio geral de que a cada categoria de órgãos compete aquelas funções correspondentes à sua natureza específica” (J. H. Meirelles Teixeira. Curso de Direito Constitucional, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991, pp. 581, 592-593).
19. Assim, se em
princípio a competência normativa é do domínio do Poder Legislativo, certas
matérias por tangenciarem assuntos de natureza eminentemente administrativa e,
concomitantemente, direitos de terceiros ou o próprio exercício dos poderes
estatais, são reservadas à iniciativa legislativa do Poder Executivo (arts. 24,
§ 2º, 2, 47, II, XIV e XIX, a).
20. Esse desenho
normativo de status constitucional –
aplicável aos Municípios por obra do art. 144 da Constituição Estadual - permite
assentar as seguintes conclusões: (a) a iniciativa legislativa não é ampla nem
livre, só podendo ser exercida por sujeito a quem a Constituição entregou uma
determinada competência; (b) ao Chefe do Poder Executivo a Constituição
prescreve iniciativa legislativa reservada em matérias inerentes à
Administração Pública; (c) há matérias administrativas que, todavia, escapam à
dimensão do princípio da legalidade consistente na reserva de lei em virtude do
estabelecimento de reserva de norma do Poder Executivo. A propósito, frisa Hely
Lopes Meirelles a linha divisória da iniciativa legislativa:
“Leis de
iniciativa da Câmara ou, mais propriamente, de seus vereadores são todas as que
a lei orgânica municipal não reserva, expressa e privativamente à iniciativa do
prefeito. As leis orgânicas municipais devem reproduzir, dentre as matérias
previstas nos arts. 61, § 1º, e 165 da CF, as que se inserem no âmbito da
competência municipal” (Direito Municipal
Brasileiro, São Paulo: Malheiros, 1997, 9ª ed., p. 431).
21. A criação de órgãos públicos
do Poder Executivo, adicionada à respectiva conferência de atribuições e competências, é matéria da
reserva de iniciativa legislativa de seu Chefe, como proclama pacífica jurisprudência:
“CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. LEI QUE ATRIBUI TAREFAS AO DETRAN/ES, DE INICIATIVA PARLAMENTAR: INCONSTITUCIONALIDADE. COMPETÊNCIA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. C.F, art. 61, § 1°, n, e, art. 84, II e VI. Lei 7.157, de 2002, do Espírito Santo.
I. - É de iniciativa do Chefe do Poder Executivo a proposta de lei que vise a criação, estruturação e atribuição de órgãos da administração pública: C.F, art. 61, § 1°, II, e, art. 84, II e VI.
II. - As regras do processo legislativo federal, especialmente as que dizem respeito à iniciativa reservada, são normas de observância obrigatória pelos Estados-membros.
III. - Precedentes do STF.
IV - Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente” (STF, ADI 2.719-1-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 20-03-2003, v.u.).
“É indispensável a iniciativa do Chefe do Poder Executivo (mediante projeto de lei ou mesmo, após a EC 32/01, por meio de decreto) na elaboração de normas que de alguma forma remodelem as atribuições de órgão pertencente à estrutura administrativa de determinada unidade da Federação” (STF, ADI 3.254-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 16-11-2005, v.u., DJ 02-12-2005, p. 02).
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 6.835/2001 DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. INCLUSÃO DOS NOMES DE PESSOAS FÍSICAS E JURÍDICAS INADIMPLENTES NO SERASA, CADIN E SPC. ATRIBUIÇÕES DA SECRETARIA DE ESTADO DA FAZENDA. INICIATIVA DA MESA DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. A lei 6.835/2001, de iniciativa da Mesa da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo, cria nova atribuição à Secretaria de Fazenda Estadual, órgão integrante do Poder Executivo daquele Estado. À luz do princípio da simetria, são de iniciativa do Chefe do Poder Executivo estadual as leis que versem sobre a organização administrativa do Estado, podendo a questão referente à organização e funcionamento da Administração Estadual, quando não importar aumento de despesa, ser regulamentada por meio de Decreto do Chefe do Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, e e art. 84, VI, a da Constituição federal). Inconstitucionalidade formal, por vício de iniciativa da lei ora atacada” (STF, ADI 2.857-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 30-08-2007, v.u., DJe 30-11-2007).
“III - Independência e Separação dos Poderes: processo legislativo: iniciativa das leis: competência privativa do Chefe do Executivo. Plausibilidade da alegação de inconstitucionalidade de expressões e dispositivos da lei estadual questionada, de iniciativa parlamentar, que dispõem sobre criação, estruturação e atribuições de órgãos específicos da Administração Pública, criação de cargos e funções públicos e estabelecimento de rotinas e procedimentos administrativos, que são de iniciativa reservada ao Chefe do Poder Executivo (CF, art. 61, § 1º, II, e), bem como dos que invadem competência privativa do Chefe do Executivo (CF, art. 84, II)” (STF, ADI-MC 2.405-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 06-11-2002, DJ 17-02-2006, p. 54).
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DE ORIGEM PARLAMENTAR. ORGANIZAÇÃO DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO. VÍCIO FORMAL DE INICIATIVA. As regras previstas na Constituição Federal para o processo legislativo aplicam-se aos Estados-membros. Compete exclusivamente ao Governador a iniciativa de leis que cuidem da estruturação e funcionamento de órgãos vinculados ao Poder Executivo (CF, artigos 61, § 1º, II, ‘e’; e 144, § 6º). Precedentes. Inconstitucionalidade da Lei 10890/01, do Estado de São Paulo. Ação julgada procedente” (STF, ADI 2646-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, 20-03-2003, v.u., DJ 23-05-2003, p. 30).
“CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE - LIMINAR. Há o sinal do bom direito e o risco de manter-se com plena eficácia o quadro quando o diploma atacado resultou de iniciativa parlamentar e veio a disciplinar programa de desenvolvimento estadual - submetendo-o à Secretaria de Estado - a dispor sobre a estrutura funcional pertinente. Segundo a Carta da República, incumbe ao chefe do Poder Executivo deflagrar o processo legislativo que envolva órgão da Administração Pública - alínea ‘e’ do § 1º do artigo 61 da Constituição Federal” (STF, ADI-MC 2.799-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 01-04-2004, v.u., DJ 21-05-2004, p. 31).
“CONSTITUCIONAL. PROCESSO LEGISLATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CRIAÇÃO DE ÓRGÃOS PÚBLICOS. INICIATIVA LEGISLATIVA RESERVADA. C.F., art. 61, § 1º, II, a, c e e, art. 63, I; Lei 13.145/2001, do Ceará, art. 4º; Lei 13.155/2001, do Ceará, artigos 6º, 8º e 9º, Anexo V, referido no art. 1º. I. - As regras do processo legislativo, especialmente as que dizem respeito à iniciativa reservada, são normas de observância obrigatória pelos Estados-membros. Precedentes do STF. II. - Leis relativas à remuneração do servidor público, que digam respeito ao regime jurídico destes, que criam ou extingam órgãos da administração pública, são de iniciativa privativa do Chefe do Executivo. C.F., art. 61, § 1º, II, a, c e e. III. - Matéria de iniciativa reservada: as restrições ao poder de emenda - C.F., art. 63, I - ficam reduzidas à proibição de aumento de despesa e à hipótese de impertinência de emenda ao tema do projeto. Precedentes do STF. IV - ADI julgada procedente” (STF, ADI 2.569-CE, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 19-03-2003, v.u., DJ 02-05-2003, p. 26).
22.
Ora, reproduzindo o art. 61,
§ 1º, II, e, da Constituição Federal,
o art. 24, § 2º, 2, da Constituição Estadual, confere exclusiva iniciativa
legislativa ao Chefe do Poder Executivo para criação de órgãos da Administração
Pública, compreendendo a descrição de suas atribuições e competências. Esse
preceito, que decorre do art. 5º da Constituição Estadual, foi violado.
23.
Além dele, foi violentada a
própria reserva da Administração Pública, pois, compete ao Poder Executivo o
exercício de sua direção superior, a prática de atos de administração típica e
ordinária e a disciplina de sua organização e de seu funcionamento (art. 47,
II, XIV e XIX, a, da Constituição
Estadual).
24.
A instituição de programas
destinados à execução de políticas públicas e a disciplina da prestação dos
serviços públicos, executados direta ou indiretamente pelo poder público
situa-se no domínio da reserva da Administração, espaço conferido com
exclusividade ao Chefe do Poder Executivo no âmbito de seu poder normativo
imune a interferências do Poder Legislativo, e que se radica na gestão
ordinária dos negócios públicos, como se infere dos arts. 5º e 47, II, XIV e
XIX, a, da Constituição Estadual,
aplicável na esfera municipal por força de seu art. 144 e do art. 29 caput da Constituição Federal.
25. Também como decorrência da
separação de poderes, incorporada no art. 5º, a Constituição Paulista prevê no
art. 47 competência privativa do Chefe do Poder Executivo. O dispositivo
consagra a atribuição de governo do Chefe do Poder Executivo, traçando suas
competências próprias de administração e gestão que compõem a denominada
reserva de Administração, pois, veiculam matérias de sua alçada exclusiva,
imunes à interferência do Poder Legislativo.
26.
A alínea a do inciso XIX desse art. 47 fornece ao Chefe do Poder Executivo a
prerrogativa de dispor mediante decreto sobre “organização e funcionamento da
administração estadual, quando não implicar aumento de despesa, nem criação ou
extinção de órgãos públicos”, em preceito semelhante ao art. 84, VI, a, da Constituição Federal. Por sua vez,
os incisos II e XIV estabelecem competir-lhe o exercício da direção superior da
administração e a prática dos demais atos de administração, nos limites da
competência do Poder Executivo, enraizando-se no art. 84, II, da Constituição
de 1988.
27.
Esses assuntos são privativos
do poder normativo do Chefe do Poder Executivo, como já se decidiu:
“(...) 2. As restrições impostas ao exercício das competências constitucionais conferidas ao Poder Executivo, entre elas a fixação de políticas públicas, importam em contrariedade ao princípio da independência e harmonia entre os Poderes (...)” (STF, ADI-MC-REF 4.102-RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, 26-05-2010, v.u., DJe 24-09-2010).
“(...) O
princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência
normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência
administrativa do Poder Executivo. (...)” (STF, ADI-MC 2.364-AL, Tribunal
Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 01-08-2001, DJ 14-12-2001, p. 23).
28. Portanto, a lei local é
inconstitucional por violação dos arts. 5º, 24, § 2º, 2, e 47, II, XIV e XIX, a, da Constituição do Estado de São
Paulo.
29. Opino pela procedência da ação pela incompatibilidade da Lei n. 11.326, de 03 de julho de 2012, do Município de São José do Rio Preto, com os arts. 5º, 24, § 2º, 2, e 47, II, XIV e XIX, a, da Constituição do Estado de São Paulo.
São Paulo, 17 de fevereiro de
2014.
Nilo Spinola Salgado Filho
Subprocurador-Geral de Justiça
Jurídico
wpmj