Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo nº 0265024-74.2012.8.26.0000

Requerente: Prefeito Municipal de Jundiaí

Requerido: Presidente da Câmara Municipal de Jundiaí

 

 

Ementa:

 

1)      Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Complementar nº 427, de 20 de setembro de 2005, do Município de Jundiaí, de iniciativa parlamentar, que alterou o Código de Obras e Edificações, para prever faixa de pedestres junto aos postos de combustíveis e serviços.

2)      Não é admissível afirmar que lei municipal que obriga estabelecimentos particulares (postos de combustíveis) à demarcação de faixa para pedestre nas calçadas caracteriza a edição de norma sobre trânsito e transporte, como consta desse parâmetro invocado, senão postura sobre o uso de bem público municipal.

3)      Questão atinente às posturas municipais, impondo obrigação positiva a estabelecimentos comerciais em razão da utilização de bem público de uso comum do povo, não caracterizando a iniciativa parlamentar violação à separação dos poderes porque não respeita à reserva de iniciativa legislativa nem a de Administração.

4)      Improcedência da ação.

Colendo Órgão Especial

Senhor Desembargador Relator

 

Tratam estes autos de ação direta de inconstitucionalidade, tendo como alvo a Lei Complementar nº 427, de 20 de setembro de 2005, do Município de Jundiaí, de iniciativa parlamentar, que alterou o Código de Obras e Edificações, para prever faixa de pedestres junto aos postos de combustíveis e serviços.

Sustenta o requerente que a lei é inconstitucional por violar o princípio da separação de poderes, por disciplinar matéria de trânsito e transporte de competência privativa da União, por conter vício de iniciativa, uma vez que matéria relativa ao uso e ocupação do solo é de iniciativa legislativa do Prefeito porque depende de estudos prévios e técnicos que só o Poder Executivo Municipal, por meio de seus órgãos, pode realizar.  Daí, a afirmação de ofensa ao disposto nos arts.  5º, 47, incisos II e XIV, 111, 144 e 180, incisos II e V, e 181da Constituição Estadual.

Foi indeferida a liminar (fls. 32/33).

Citado regularmente (fl. 41), o Procurador-Geral do Estado declinou de realizar a defesa do ato normativo impugnado, afirmando tratar de matéria de interesse exclusivamente local (fls. 95/97).

Notificado, o Presidente da Câmara Municipal prestou informações defendendo a validade do ato normativo impugnado, (fls. 43/53).

É o breve relato do ocorrido nos autos.

Não procede o pedido.

A Lei Complementar nº 427, de 20 de setembro de 2005, do Município de Jundiaí, de iniciativa parlamentar, promulgada pelo Presidente da Câmara Municipal, depois de rejeitado o veto do Prefeito, tem a seguinte redação:

Não se pode cogitar ofensa ao art. 22, IX, da Constituição Federal, porque conquanto o art. 144 da Constituição Estadual possibilite o confronto da lei municipal com preceito constitucional federal através de norma constitucional estadual remissiva – e patenteando virtual violação ao princípio republicano e ao esquema de repartição de competências – não é admissível afirmar que lei municipal que obriga estabelecimentos particulares (postos de combustíveis) à demarcação de faixa para pedestre nas calçadas caracteriza a edição de norma sobre trânsito e transporte, como consta desse parâmetro invocado, senão postura sobre o uso de bem público municipal.

A matéria, embora tenha relação como o uso e ocupação do solo, não demanda realização de planejamento e estudos técnicos, haja vista que não está relacionada com o crescimento ordenado da cidade, este sim reclama aquelas providências prévias.

A demarcação de faixa na área ocupada pelos postos de combustíveis que seriam correspondentes ao passeio público (calçada), trata-se de medida que tem por objetivo a segurança dos munícipes. Refere-se a disciplina do uso de um espaço público, porém não em proporção que possa interferir no ordenamento urbanístico da cidade que exige prévio planejamento e estudo técnico.

Assim, não há violação aos arts. 180, II e V e 181 da Constituição Estadual.

Resta o exame de ofensa ao art. 5º da Constituição do Estado em razão da iniciativa parlamentar da lei contestada.

No ponto, não parece que a matéria objeto da lei objurgada constitua algo contido na reserva de iniciativa legislativa – que deve ser explícita – nem na denominada reserva da Administração que são decorrências do princípio da separação de poderes.

Trata-se de questão atinente às posturas municipais, impondo obrigação positiva a estabelecimentos comerciais em razão da utilização de bem público de uso comum do povo.

A iniciativa reservada, como se sabe, constitui exceção à regra da iniciativa geral ou concorrente e, consoante lição básica de hermenêutica, as normas que estabelecem exceções às regras gerais só admitem interpretação restritiva.

Logo, os casos de iniciativa reservada são apenas aqueles expressamente previstos na Constituição Estadual (art. 24, § 2.º, 1 a 6, e 174, I a III), mas nenhum deles prevê que as leis de polícia ou de posturas municipais devam ser iniciadas pelo Executivo, entendimento esse que, aliás, significa limitar a função normativa da Câmara, que seria transformada em mera chanceladora das proposituras do Executivo, situação inconcebível num Estado Democrático do Direito inaugurado pela Constituição de 1988.

Outro argumento desprovido de lógica é o de que as leis da Câmara não podem interferir na esfera de atuação do Executivo. Como explicar esse raciocínio à vista do princípio da legalidade administrativa, segundo o qual a Administração só pode agir nos limites legalmente previstos, mesmo em se tratando de poder discricionário, que é poder derivado da lei.

No caso, trata-se de legislação que estabelece adequações físicas de sinalização horizontal nos postos de combustíveis visando a segurança dos munícipes que circulam nas calçadas destes estabelecimentos. Esta adequação, no âmbito do Município, não adentra nas matérias reservadas à União, tais como transporte e trânsito.

Desta forma, competente o Município para legislar quando predominante o interesse local na matéria disciplinada.

Esse Colendo Órgão Especial, ao analisar questão idêntica, já se pronunciou acerca da constitucionalidade de ato normativo da mesma natureza. Senão vejamos:

“Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei Municipal, de iniciativa parlamentar, que dispõe sobre a obrigatoriedade dos postos de combustíveis demarcarem faixa para passagem de pedestres em suas calçadas limítrofes. Vício de iniciativa não configurado. Competência do Município para legislar sobre interesse local. Princípios constitucionais não violados. Ação improcedente. (TJ/SP, ADI 0163816-81.2011.8.26.0000, Rel. Des. Caetano Lagrasta, j. em 22/08/2012)”.

Diante do exposto, aguarda-se seja o pedido julgado improcedente.

 

São Paulo, 04 de abril de 2013.

 

 

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

 

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