Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo nº 0269424-34.2012.8.26.0000

Requerente: Prefeito Municipal de Catanduva

Requerido: Presidente da Câmara Municipal de Catanduva

 

 

Ementa:

 

1)      Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei nº 5.329, de 18 de junho de 2012, do Município de Catanduva, de iniciativa parlamentar, que institui o Dia Municipal do Espiritismo.

2)      Ausência de afronta à separação dos Poderes. Inexistência de reserva de iniciativa da matéria em favor do Poder Executivo. Propositura que, demais, não acarretou aumento de despesa pública e nem viola o art. 19, I da Constituição Federal.

3)      Improcedência do pedido.

 

 

Egrégio Órgão Especial:

 

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito do Município de Catanduva, tendo por objeto a Lei nº 5.329, de 18 de junho de 2012, daquele Município, de iniciativa parlamentar, que conforme rubrica “Instituiu o Dia Municipal do Espiritismo no Município de Catanduva e dá outras providências”.

Sustenta o autor que o ato normativo impugnado é inconstitucional porque viola o princípio da separação dos poderes e o da legalidade, por conter vício de iniciativa, bem como por criar despesa sem indicar os recursos disponíveis. Daí a alegação de violação dos arts. 5º, 25 e 144 da Constituição Estadual.

Citado regularmente (fl. 30), o Procurador Geral do Estado declinou da defesa do ato impugnado, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 37/39).

Notificado (fl. 27), o Presidente da Câmara Municipal prestou informações levantando preliminar de ilegitimidade de parte ativa uma vez que o Prefeito teria sancionado a lei sem veto. No mérito defendeu a validade do ato normativo impugnado (fls. 32/36).

É a síntese do que consta dos autos.

DA PRELIMINAR

A preliminar de ilegitimidade de parte deve ser afastada uma vez que a simples sanção da lei impugnada não obsta a propositura da ação direta de inconstitucionalidade.

Como a ação direta de inconstitucionalidade é um processo objetivo, sem partes, no exercício da jurisdição constitucional, decorrente diretamente da Lei Maior, não lhe são aplicáveis categorias e institutos específicos do processo civil, destinado à solução de conflitos de natureza subjetiva, dentre eles eventual falta de interesse de agir em razão de eventual ato formal de anuência ao texto da lei.

Ademais o veto ou sanção é instrumento de natureza política não interferindo na legitimidade para a propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade que tem assento constitucional sem qualquer restrição da natureza apontada na preliminar.

NO MÉRITO

A Lei nº 5.329, de 18 de junho de 2012, do Município de Catanduva, de iniciativa parlamentar, que “Instituiu o Dia Municipal do Espiritismo no Município de Catanduva e dá outras providências”.  tem a seguinte redação:

“Art. 1° Fica instituído o Dia Municipal do Espiritismo no Município de Catanduva, o ser comemorado no dia 18 de abril de cada ano.

Art. 2º A comemoração instituída posso a integrar o Calendário Oficial de Eventos do cidade, assim como os as atividades alusivas a data.

Art. 3º Os eventos em alusão a data serão estabelecidos pelo Poder Executivo e as entidades e grupos dedicadas ao trabalho de assistência social inspirado pelo Espiritismo.

Art. 4º As despesas decorrentes do implantação desta lei correrão por conta dos dotações orçamentárias próprias, suplementadas, se necessário.

Art. 5º Esta Lei entrará em vigor na data de sua pubIicação, revogadas os disposições em contrário.”

Inicialmente, importante ressaltar que a análise a ser feita, para fins de ajuizamento de ação direta, limita-se ao confronto entre a lei local e a Constituição do Estado.

Assim, impossível o exame do ato normativo impugnando à luz de o padrão de confronto da Lei Orgânica Municipal.

Não se verifica no ato normativo impugnado qualquer vício de inconstitucionalidade. Não se pode cogitar invasão da esfera reservada ao Chefe do Poder Executivo, de violação do princípio da legalidade e nem de criação de despesa nova.

Com efeito, a Constituição vigente não contém nenhuma disposição que impeça a Câmara de Vereadores de legislar sobre a fixação de datas e eventos comemorativos, ou de incluir, como ocorre no caso em análise, dia comemorativo no calendário oficial do município. Tal matéria não foi reservada com exclusividade ao Executivo.

Por força da Constituição, os Municípios foram dotados de autonomia legislativa, que vem consubstanciada na capacidade de legislar sobre assuntos de interesse local, inclusive a fixação de datas comemorativas, e de suplementar a legislação federal e estadual no que couber (art. 30, I e II).

Observe-se que a Constituição em vigor nada dispôs sobre a instituição de reserva em favor do Executivo da iniciativa de leis que versem sobre a fixação de datas comemorativas e, como as situações previstas no art. 24 da Carta Paulista constituem exceção à regra da iniciativa geral ou concorrente, a sua interpretação deve sempre ser restritiva, máxime diante de sua repercussão no postulado básico da independência e harmonia entre os Poderes.

 Cada ente federativo dispõe de autonomia para fixar datas comemorativas que sejam relacionadas com fatos ou pessoas que façam parte de sua história, bem como de incluir em seu calendário eventos típicos da localidade, só havendo limites quanto à fixação de feriados, por força de legislação federal de regência, o que, porém, não ocorre na situação em análise.

Assim, com a devida vênia, não é possível recusar à Câmara de Vereadores o direito de estabelecer no calendário oficial do Município o período no qual é realizado determinado evento religioso de responsabilidade de entes privados.

Por fim, importante reiterar que o ato normativo impugnado não criou nem aumentou a despesa pública, pois nele não há nenhuma previsão nesse sentido, e, de mais a mais, não obrigou o Poder Público a prática de qualquer ato no dia previsto para a comemoração do Dia Municipal do Espiritismo no Município.

O Poder Executivo não ficou obrigado a realização de qualquer atividade específica. Os eventos em alusão a data previsto no art. 3º da lei impugnada serão estabelecidos de acordo com a discricionariedade administrativa.

A atividade parlamentar, da qual resultou o ato normativo impugnado, foi desenvolvida dentro dos limites constitucionais.

Entendimento em sentido contrário esvaziaria o poder de legislar inerente a atuação parlamentar.

Por fim, a previsão no calendário oficial de eventos do município do Dia Municipal do Espiritismo, não se confunde com atos específicos de estabelecimento de cultos religiosos, favorecimento, subvenção ou aliança a determinada crença ou religião vedados pelo art. 19, I da Constituição Federal.

Ante o exposto, o pedido deve ser julgado improcedente.

 

                                São Paulo, 25 de março de 2013.

 

 

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

 

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