Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

 

Processo nº. 2000208-62.2014.8.26.0000

Requerente: Sindicato do Comércio Varejista de São José do Rio Preto

Requeridos: Prefeito Municipal de São José do Rio Preto e Presidente da Câmara de São José do Rio Preto

 

 

I - Constitucional. Tributário. Processo civil. Ação direta de inconstitucionalidade. Condições da Ação. Falta de Pertinência Temática. Extinção da Ação sem Resolução do Mérito. II - artigos 17 e seus Anexos I e II; 18; 19 e 20 da Lei Complementar n. 400, de 17 de dezembro de 2013, do Município de São José do Rio Preto. Reajuste do valor venal dos imóveis. Alegação de ofensa aos princípios da moralidade, razoabilidade, capacidade contributiva e vedação do efeito confiscatório do tributo. Limites de cognoscibilidade no contencioso de constitucionalidade.  Matéria de fato dependente de prova. I - Não há pertinência temática se a lei impugnada não reflete direta e imediatamente no interesse da categoria representada, não atendendo ao requisito específico o mero interesse indireto ou econômico, sem ligação imediata e direta com o escopo institucional da entidade sindical II - Não sendo evidente no texto normativo, a violação da capacidade contributiva e da proibição do confisco é matéria de fato dependente de prova, incabível na via estreita do controle abstrato de constitucionalidade. Improcedência da ação.

 

 

 

 

 

Eminente Desembargador Relator,

Colendo Órgão Especial:

 

 

1.                Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade promovida pelo Sindicato do Comércio Varejista de São José do Rio Preto, tendo como alvo os artigos 17, e seus anexos I e II, 18, 19 e 20, da Lei Complementar nº 400, de 17 de dezembro de 2013, do Município de São José do Rio Preto, que estabeleceu aumento do IPTU – Imposto sobre a Propriedade Territorial Urbana.

2.            Sustenta o autor, em síntese, que o ato normativo impugnado viola os princípios da moralidade, razoabilidade, capacidade contributiva e vedação do efeito confiscatório, uma vez que a nova lei impôs aumento de até 125%.

3.                A liminar requerida foi concedida monocraticamente (fls. 158/160). Interposto agravo regimental pelo Prefeito do Município, o Colendo Órgão Especial, por maioria de votos, deu provimento ao recurso, revogando a cautelar concedida (fls. 507/519). A Procuradoria Geral do Estado, ponderando que os dispositivos legais atacados tratariam de matéria exclusivamente local, declinou da defesa do ato impugnado (fls. 325/327).

4.                O Presidente da Câmara Municipal (fls. 188/190) e o Prefeito Municipal (fls. 200/215) prestaram informações, sustentando a constitucionalidade dos dispositivos questionados.

5.                É a síntese necessária.

6.                A Constituição Federal inclui entre os legitimados ativos para a ação direta de inconstitucionalidade confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional (art. 103, IX). Seguindo essa matriz, a Constituição Estadual legitima as entidades sindicais ou de classe, de atuação estadual ou municipal, demonstrando seu interesse jurídico no caso (art. 90, V).

7.                Legitimação ativa possui o requerente. O que demanda examinar é se é portador de pertinência temática que se revela ante a existência de correlação entre o objeto do pedido de declaração de inconstitucionalidade e os objetivos institucionais da associação, como decidido (STF, ADI 3.702-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, 01-06-2011, v.u., DJe 30-08-2011).

8.                O estatuto da entidade sindical estabelece como sua prerrogativa “representar perante as autoridades administrativas e judiciais, os interesses gerais da categoria e os individuais de seus associados”.

9.                Não vejo nessa cláusula pertinência temática. As leis impugnadas inovam a legislação tributária local sem reflexo direto e imediato na categoria representada, ligada ao comércio varejista e lojista.

10.              Não atende ao requisito específico mero interesse indireto ou econômico, sem ligação imediata e direta com o escopo institucional da entidade sindical, como julgado:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - CONFEDERAÇÃO DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO BRASIL (CSPB) - AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE ATIVA ‘AD CAUSAM’ POR FALTA DE PERTINÊNCIA TEMÁTICA - INSUFICIÊNCIA, PARA TAL EFEITO, DA MERA EXISTÊNCIA DE INTERESSE DE CARÁTER ECONÔMICO-FINANCEIRO - HIPÓTESE DE INCOGNOSCIBILIDADE - AÇÃO DIRETA NÃO CONHECIDA. - O requisito da pertinência temática - que se traduz na relação de congruência que necessariamente deve existir entre os objetivos estatutários ou as finalidades institucionais da entidade autora e o conteúdo material da norma questionada em sede de controle abstrato - foi erigido à condição de pressuposto qualificador da própria legitimidade ativa ‘ad causam’ para efeito de instauração do processo objetivo de fiscalização concentrada de constitucionalidade. Precedentes” (STF, ADI-MC 1.157-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 01-12-1994, m.v., DJ 17-11-2006, p. 47).

11.             Destarte, opino pela extinção do processo sem resolução do mérito.

12.             Se superada essa preliminar, o parece é no sentido da improcedência da ação.

13.             Sustenta o autor a inconstitucionalidade material da lei por ofensa aos princípios da moralidade e da razoabilidade, bem como da capacidade contributiva e da proibição do confisco em matéria tributária, previstos nos arts. 111, 160, § 1º, e 163, II e IV, da Constituição Estadual.

14.             A leitura da lei impugnada não permite concluir ter havido inobservância aos princípios da Administração Pública previstos no artigo 111 da Constituição Estadual.

15.             No que se refere à lesão aos princípios constitucionais tributários, também não se vislumbra a inconstitucionalidade alegada.

16.             Com efeito, observa-se dos dispositivos da lei impugnada que eles, de per si, não aumentam o valor do IPTU diretamente, mas revisam seu valor de forma indireta, reajustando a base de cálculo do tributo.

17.             Trata-se, pois, de matéria que exige o exame de questões de fato, não havendo possibilidade de se concluir, a princípio, existir violação a preceitos constitucionais. Note-se que as porcentagens elencadas pelo requerente correspondem à atualização do valor venal dos imóveis, não se tratando, portanto de aumento.

18.             Sobre o tema, é pacífico o entendimento nos tribunais pátrios:

“TRIBUTÁRIO. IPTU. MAJORAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO POR MEIO DE DECRETO MUNICIPAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 160/STJ. 1. Nos termos da jurisprudência pacífica desta Corte, a majoração da base de cálculo do IPTU depende da elaboração de lei, não podendo um simples decreto atualizar o valor venal dos imóveis sobre os quais incide tal imposto com base em uma planta de valores, salvo no caso de simples correção monetária. 2. Não há que se confundir a simples atualização monetária da base de cálculo do imposto com a majoração da própria base de cálculo. A primeira encontra-se autorizada independentemente de lei, a teor do que preceitua o art. 97, § 2º, do CTN, podendo ser realizada mediante decreto do Poder Executivo; a segunda somente poderá ser realizada por meio de lei. 3. Incidência da Súmula 160/STJ: ‘é defeso, ao município, atualizar o IPTU, mediante decreto, em percentual superior ao índice oficial de correção monetária.’ Agravo regimental improvido.” (AgRg no AREsp 66849/MG – Segunda Turma – Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS – Julgamento: 06/12/2011).

19.             Não sendo evidente do texto normativo, a pesquisa sobre a incompatibilidade da lei local, que depende da análise de parâmetros que envolvem a análise de matéria de fato, torna-se inviável o controle concentrado de constitucionalidade, como já decidiu o Supremo Tribunal Federal:

“A ação direta não pode ser degradada em sua condição jurídica de instrumento básico de defesa objetiva da ordem normativa inscrita na Constituição. A válida e adequada utilização desse meio processual exige que o exame ‘in abstracto’ do ato estatal impugnado seja realizado exclusivamente à luz do texto constitucional. Desse modo, a inconstitucionalidade deve transparecer diretamente do texto do ato estatal impugnado. A prolação desse juízo de desvalor não pode e nem deve depender, para efeito de controle normativo abstrato, da prévia análise de outras espécies jurídicas infraconstitucionais, para, somente a partir desse exame e num desdobramento exegético ulterior, efetivar-se o reconhecimento da ilegitimidade constitucional do ato questionado” (RTJ 147/545).

20.             Este Colendo Órgão Especial também já se pronunciou sobre o tema:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Lei Complementar nº 666, de 3 de setembro de 2013, do Município de Atibaia, que dispõe sobre a revisão da Planta Genérica de Valores Imobiliários - Ausência dos alegados vícios no processo legislativo, tendo sido o projeto de lei regularmente discutido e votado pela totalidade dos Vereadores integrantes do Legislativo municipal, sem que qualquer nulidade procedimental fosse arguida - Majoração dos valores venais dos imóveis locais que não implica na igual repercussão na carga tributária imposta aos contribuintes municipais, haja vista a criação de mecanismo de bloqueio que estabeleceu um limite máximo de reajuste do tributo - Exame da razoabilidade do aumento previsto na legislação municipal atacada que, de qualquer modo, demandaria a análise de matéria de fato, incabível em sede de controle abstrato de constitucionalidade - Desconsideração do percentual fixado naquele ato normativo que implicaria, ainda, na indevida substituição da discricionariedade do Poder Legislativo, em sua atuação natural, por uma imprópria atuação do Judiciário - Precedentes desta Corte - Ausência, portanto, de vícios de inconstitucionalidade formal ou material no ato normativo objurgado - Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada improcedente.” (ADIN n. 2001017-52.2014.8.26.0000, Rel. Des. Paulo Dimas Mascharetti, j. 14.05.2014)

21.             Posto isso, opino pela improcedência da presente ação.

 

                            São Paulo, 23 de julho de 2014.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico Em Exercício

 

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