Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo nº 2019016-18.2014.8.26.0000

Requerente: Prefeito do Município de Sorocaba

Requerido: Presidente da Câmara Municipal de Sorocaba

 

 

 

                 

Ementa: Constitucional. Administrativo. ação direta de Inconstitucionalidade. Lei n. 10.653, de 10 de dezembro de 2013, do Município de Sorocaba, de iniciativa parlamentar. Revogação do art. 68, II, do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais de Sorocaba, que dispõe acerca de interrupção de contagem para fins de férias, adicional por tempo de serviço e sexta-parte, ao funcionário afastado por motivo de saúde. Matéria reservada ao chefe do poder executivo. Regime jurídico e Remuneração de servidores públicos municipais. Aumento de despesas sem indicação de fonte de custeio. 1. Ação direta de inconstitucionalidade, movida por Prefeito, em face da Lei n. 10.653, de 10 de dezembro de 2013, do Município de Sorocaba, que revoga o inciso II do art. 68 do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais de Sorocaba, o qual previa a interrupção de contagem de tempo, para fins de férias, adicional por tempo de serviço e sexta-parte, em relação ao funcionário municipal afastado para tratamento de doença profissional ou em decorrência de acidente do trabalho. 2. Matéria reservada ao Chefe do Poder Executivo, eis que dispõe sobre regime jurídico e remuneração dos servidores públicos. Aumento de despesas sem indicação de recursos disponíveis. Violação aos arts. 5º; 24, § 1º, 1 e 4, 25 e 144 da CE, que repetem os arts. 2º, 61, § 1º, II, “a” e “c”, da CF. Parecer pela procedência da ação.

 

 

Colendo Órgão Especial,

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente:

 

 

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito Municipal de Sorocaba, tendo por objeto Lei n. 10.653, de 10 de dezembro de 2013, do Município de Sorocaba, que revogou o inciso II do art. 68 do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais de Sorocaba, o qual previa a interrupção de contagem de tempo, para fins de férias, adicional por tempo de serviço e sexta-parte, em relação ao funcionário municipal afastado para tratamento de doença profissional ou em decorrência de acidente do trabalho.

O autor sustenta que cabe exclusivamente ao Prefeito a iniciativa de leis que disponham sobre o regime jurídico e remuneração de servidores públicos, divisando ofensa ao princípio da separação dos poderes, previsto no art. 5º da Constituição do Estado, bem como vício de iniciativa, com violação ao art. 144 da Constituição do Estado. Aponta, ainda, que a Lei impugnada criou despesas, sem a indicação específica de recursos disponíveis para atender aos encargos por ela criados.

Foi deferida a liminar pleiteada (fls. 202/204).

A Procuradoria-Geral do Estado declinou da defesa do ato impugnado, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 215/217).

A Câmara Municipal prestou informações (fls. 219/226), oportunidade em que defendeu a constitucionalidade do ato normativo atacado.

Este é o breve resumo do que consta dos autos.

A lei impugnada revogou o artigo 68, II, do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais de Sorocaba, nos seguintes termos:

“Revoga o inciso II, do art. 68, da Lei nº 3.800, de 02 de dezembro de 1991, que dispõe sobre o Estatuto dos Servidores Públicos Municipais de Sorocaba e dá outras providências.

Projeto de Lei n.º 335/2013, de autoria do Vereador José Francisco Martinez, Presidente da Câmara Municipal de Sorocaba, de acordo com o que dispõe o § 8º, do Art. 46, da Lei Orgânica do Município de Sorocaba, e o § 4º do Art. 176 da Resolução nº 322, de 18 de setembro de 2007 (Regimento Interno) faz saber que a Câmara Municipal de Sorocaba rejeitando o Veto n° 45/2013, decreta e eu promulgo a seguinte Lei:

Art. 1º  Fica expressamente revogado o inciso II, do art. 68 da Lei nº 3.800, de 02 de dezembro de 1991, que dispõe sobre o Estatuto dos Servidores Públicos Municipais de Sorocaba e dá outras providências.

Art. 2º  As despesas com a execução da presente Lei correrão por conta das verbas próprias consignadas no orçamento.

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”

O artigo 68, II, da Lei 3800/91 (Estatuto dos Servidores Públicos Municipais de Sorocaba) assim dispunha:

“Art. 68. Será interrompida a contagem para fins do direito às férias, adicional por tempo de serviço e sexta parte durante o tempo em que o funcionário estiver afastado do serviço em virtude de:

(...)

II – Licença para tratamento de doença profissional ou em decorrência de acidente no trabalho;

(...)”

Inicialmente, não há que se falar em ofensa ao art. 63, I, da CF, reproduzido no art. 24, § 5º, 1, da CE, pois tal dispositivo tem aplicação para as hipóteses de emendas parlamentares, em projetos de iniciativa do poder executivo, e não para projetos de lei de iniciativa parlamentar, como é a hipótese dos autos.

De outro lado, o art. 61, § 1º, II, b, da Constituição Federal, cuida de lei tributária dos Territórios, sendo inadmissível sua invocação, como julgado:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 553/2000, DO ESTADO DO AMAPÁ. DESCONTO NO PAGAMENTO ANTECIPADO DO IPVA E PARCELAMENTO DO VALOR DEVIDO. BENEFÍCIOS TRIBUTÁRIOS. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR. AUSÊNCIA DE VÍCIO FORMAL. 1. Não ofende o art. 61, § 1º, II, b da Constituição Federal lei oriunda de projeto elaborado na Assembléia Legislativa estadual que trate sobre matéria tributária, uma vez que a aplicação deste dispositivo está circunscrita às iniciativas privativas do Chefe do Poder Executivo Federal na órbita exclusiva dos territórios federais. Precedentes: ADI nº 2.724, rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 02.04.04, ADI nº 2.304, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 15.12.2000 e ADI nº 2.599-MC, rel. Min. Moreira Alves, DJ 13.12.02 2. A reserva de iniciativa prevista no art. 165, II da Carta Magna, por referir-se a normas concernentes às diretrizes orçamentárias, não se aplica a normas que tratam de direito tributário, como são aquelas que concedem benefícios fiscais. Precedentes: ADI nº 724-MC, rel. Min. Celso de Mello, DJ 27.04.01 e ADI nº 2.659, rel. Min. Nelson Jobim, DJ de 06.02.04. 3. Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido se julga improcedente” (STF, ADI 2.464-AP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 11-04-2007, v.u., DJe 25-05-2007).”

 

Porém, a lei impugnada, de iniciativa parlamentar, é verticalmente incompatível com os seguintes preceitos da Constituição do Estado de São Paulo:

“Artigo 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. 

(...)

Artigo 24 - A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

(...)

§ 2º - Compete, exclusivamente, ao Governador do Estado a iniciativa das leis que disponham sobre: 

1 - criação e extinção de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica, bem como a fixação da respectiva remuneração; 

(...) 

4 - servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;

(...)”

 

É decorrência do princípio da divisão funcional do poder (separação dos poderes) que as regras acerca da remuneração e do regime jurídico dos servidores públicos são da iniciativa legislativa reservada ao Chefe do Poder Executivo, sendo interditado seu tratamento por emenda parlamentar.

As regras do processo legislativo federal são de observância compulsória pelos Estados e Municípios, como vem julgando reiteradamente o Supremo Tribunal Federal:

“(...) 2. A Constituição do Brasil, ao conferir aos Estados-membros a capacidade de auto-organização e de autogoverno --- artigo 25, caput ---, impõe a obrigatória observância de vários princípios, entre os quais o pertinente ao processo legislativo. O legislador estadual não pode usurpar a iniciativa legislativa do Chefe do Executivo, dispondo sobre as matérias reservadas a essa iniciativa privativa. (...)” (STF, ADI 1.594-RN, Tribunal Pleno, Rel. Min. Eros Grau, 04-06-2008, v.u., DJe 22-08-2008).

“(...)I. - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que as regras básicas doprocesso legislativo da Constituição Federal, entre as quais as que estabelecem reserva de iniciativa legislativa, são de observância obrigatória pelos estados-membros. (...)” (RT 850/180).

“(...)1. A Constituição do Brasil, ao conferir aos Estados-membros a capacidade de auto-organização e de autogoverno (artigo 25, caput), impõe a obrigatória observância de vários princípios, entre os quais o pertinente ao processo legislativo, de modo que o legislador estadual não pode validamente dispor sobre as matérias reservadas à iniciativa privativa do Chefe do Executivo. (...)” (RTJ 193/832).

“(...) I. - As regras básicas do processo legislativo federal são de observância obrigatória pelos Estados-membros e Municípios. (...)” (STF, ADI 2.731-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 02-03-2003, v.u., DJ 25-04-2003, p. 33).

Por regime jurídico dos servidores públicos deve-se compreender o “conjunto de normas que disciplinam os diversos aspectos das relações, estatutárias ou contratuais, mantidas pelo Estado com os seus agentes” (STF, ADI-MC 766-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 03-09-1992, v.u., RTJ 157/460). Nessa compreensão estão abrangidas as regras institutivas de direitos e obrigações e cuja “iniciativa é do Poder Executivo, conforme dispõe a alínea ‘c’ do inciso II do § 1º do artigo 61 da Constituição Federal” (RTJ 194/848). Em dimensão mais global, assim se explica:

“Trata-se, em essência, de noção que, em virtude da extensão de sua abrangência conceitual, compreende todas as regras pertinentes (a) às formas de provimento; (b) às formas de nomeação; (c) à realização do concurso; (d) à posse; (e) ao exercício, inclusive as hipóteses de afastamento, de dispensa de ponto e de contagem de tempo de serviço; (f) às hipóteses de vacância; (g) à promoção e respectivos critérios, bem como avaliação do mérito e classificação final (cursos, títulos, interstícios mínimos); (h) aos direitos e às vantagens de ordem pecuniária; (i) às reposições salariais e aos vencimentos; (j) ao horário de trabalho e ao ponto, inclusive os regimes especiais de trabalho; (k) aos adicionais por tempo de serviço, gratificações, diárias, ajudas de custo, e acumulações remuneradas; (l)às férias, licenças em geral, estabilidade, disponibilidade, aposentadoria; (m) aos deveres e proibições; (n) às penalidades e sua aplicação; (o) ao processo administrativo” (STF, ADI-MC 766-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 03-09-1992, v.u., DJ 27-05-94, p. 13.186).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - POLICIAL MILITAR - REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS - PROCESSO LEGISLATIVO - INSTAURAÇÃO DEPENDENTE DE INICIATIVA CONSTITUCIONALMENTE RESERVADA AO CHEFE DO PODER EXECUTIVO - DIPLOMA LEGISLATIVO ESTADUAL QUE RESULTOU DE INICIATIVA PARLAMENTAR - INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA . OS PRINCÍPIOS QUE REGEM O PROCESSO LEGISLATIVO IMPÕEM-SE À OBSERVÂNCIA DOS ESTADOS-MEMBROS. - O modelo estruturador do processo legislativo, tal como delineado em seus aspectos fundamentais pela Carta da República, impõe-se, enquanto padrão normativo de compulsório atendimento, à observância incondicional dos Estados-membros. Precedentes. - O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo legislativo, que resulte da usurpação do poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo eventualmente editado. Nem mesmo a ulterior aquiescência do Chefe do Poder Executivo, mediante sanção do projeto de lei, ainda quando dele seja a prerrogativa usurpada, tem o condão de sanar esse defeito jurídico radical. Insubsistência da Súmula nº 5/STF, motivada pela superveniente promulgação da Constituição Federal de 1988. Doutrina. Precedentes. SIGNIFICAÇÃO CONSTITUCIONAL DO REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS (CIVIS E MILITARES). - A locução constitucional ‘regime jurídico dos servidores públicos’ corresponde ao conjunto de normas que disciplinam os diversos aspectos das relações, estatutárias ou contratuais, mantidas pelo Estado com os seus agentes”(STF, ADI-MC 1.381-AL, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 07-12-1995, v.u., DJ 06-06-2003, p. 29).

“(...) 5. Tratando-se de criação de funções, cargos e empregos públicos ou de regime jurídico de servidores públicos impõe-se a iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo nos termos do art. 61, § 1º, II, da Constituição Federal, o que, evidentemente, não se dá com a Lei Orgânica” (RTJ 205/1041).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 54, VI DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PIAUÍ. VEDAÇÃO DA FIXAÇÃO DE LIMITE MÁXIMO DE IDADE PARA PRESTAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO. OFENSA AOS ARTIGOS 37, I E 61, § 1º, II, C E F, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Dentre as regras básicas do processo legislativo federal, de observância compulsória pelos Estados, por sua implicação com o princípio fundamental da separação e independência dos Poderes, encontram-se as previstas nas alíneas a e c do art. 61, § 1º, II da CF, que determinam a iniciativa reservada do Chefe do Poder Executivo na elaboração de leis que disponham sobre o regime jurídico e o provimento de cargos dos servidores públicos civis e militares. Precedentes: ADI 774, rel. Min. Sepúlveda Pertence, D.J. 26.02.99, ADI 2.115, rel. Min. Ilmar Galvão e ADI 700, rel. Min. Maurício Corrêa (...)” (RTJ 203/89).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COMPLEMENTAR N. 792, DO ESTADO DE SÃO PAULO. ATO NORMATIVO QUE ALTERA PRECEITO DO ESTATUTO DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS ESTADUAIS. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS NO PROCESSO LEGISLATIVO ESTADUAL. PROJETO DE LEI VETADO PELO GOVERNADOR. DERRUBADA DE VETO. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. AFRONTA AO DISPOSTO NO ARTIGO 61, § 1º, II, C, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. A Constituição do Brasil, ao conferir aos Estados-membros a capacidade de auto-organização e de autogoverno [artigo 25, caput], impõe a observância obrigatória de vários princípios, entre os quais o pertinente ao processo legislativo, de modo que o legislador estadual não pode validamente dispor sobre as matérias reservadas à iniciativa privativa do Chefe do Executivo. Precedentes. 2. O ato impugnado versa sobre matéria concernente a servidores públicos estaduais, modifica o Estatuto dos Servidores e fixa prazo máximo para a concessão de adicional por tempo de serviço. 3. A proposição legislativa converteu-se em lei não obstante o veto aposto pelo Governador. O acréscimo legislativo consubstancia alteração no regime jurídico dos servidores estaduais. 4. Vício formal insanável, eis que configurada manifesta usurpação da competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo [artigo 61, § 1º, inciso II, alínea ‘c’, da Constituição do Brasil]. Precedentes. 5. Ação direta julgada procedente para declarar inconstitucional a Lei Complementar n. 792, do Estado de São Paulo” (STF, ADI 3.167-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Eros Grau, 18-06-2007, v.u., DJe 06-09-2007).

“PROJETO - INICIATIVA - SERVIDOR PÚBLICO - DIREITOS E OBRIGAÇÕES. A iniciativa é do Poder Executivo, conforme dispõe a alínea ‘c’ do inciso II do § 1º do artigo 61 da Constituição Federal. PROJETO - COMPETÊNCIA PRIVATIVA DO EXECUTIVO - SERVIDOR DO ESTADO - EMENDA - AUMENTO DE DESPESA. Resultando da emenda apresentada e aprovada aumento de despesa, tem-se a inconstitucionalidade, consoante a regra do inciso I do artigo 63 da Constituição Federal. PROJETO - COMPETÊNCIA PRIVATIVA DO EXECUTIVO - EMENDA - POSSIBILIDADE. Se de um lado é possível haver emenda em projeto de iniciativa do Executivo, indispensável é que não se altere, na essência, o que proposto, devendo o ato emanado da Casa Legislativa guardar pertinência com o objetivo visado. PROJETO - COMPETÊNCIA DO EXECUTIVO - EMENDA - PRESERVAÇÃO DE DIREITO ADQUIRIDO. Emenda a projeto do Executivo que importe na ressalva de direito já adquirido segundo a legislação modificada não infringe o texto da Constituição Federal assegurador da iniciativa exclusiva. LICENÇA-PRÊMIO - TRANSFORMAÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER EM OBRIGAÇÃO DE DAR - ALTERAÇÃO NORMATIVA - VEDAÇÃO - OBSERVÂNCIA. Afigura-se constitucional diploma que, a um só tempo, veda a transformação da licença-prêmio em pecúnia e assegura a situação jurídica daqueles que já tenham atendido ao fator temporal, havendo sido integrado no patrimônio o direito adquirido ao benefício de acordo com as normas alteradas pela nova regência” (RTJ 194/848).

“Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Complementar nº 109, de 08 de abril de 1994, do Estado de Rondônia. (...) - No mérito, já se firmou o entendimento desta Corte no sentido de que, também em face da atual Constituição, as normas básicas da Carta Magna Federal sobre processo legislativo, como as referentes às hipóteses de iniciativa reservada, devem ser observadas pelos Estados-membros. Assim, não partindo a lei estadual ora atacada da iniciativa do Governador, e dizendo ela respeito a regime jurídico dos servidores públicos civis, foi ofendido o artigo 61, § 1º, II, ‘c’, da Carta Magna. Ação direta que se julga procedente, para declarar-se a inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 109, de 08 de abril de 1994, do Estado de Rondônia” (STF, ADI 1.201-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, 14-11-2002, v.u., DJ 19-12-2002, p. 69).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE PERNAMBUCO: ART. 98, § 2º, I, VI, XII, XVII: CONCESSÃO DE VANTAGENS A SERVIDOR PÚBLICO. VÍCIO DE INICIATIVA. COMPETÊNCIA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. ART. 99, IV E PARÁGRAFO ÚNICO: INVESTIDURA EM MANDATO ELETIVO. POSSIBILIDADE DE EXERCÍCIO SIMULTÂNEO DA VEREAÇÃO E DE FUNÇÃO PÚBLICA. EXTENSÃO AO VICE-PREFEITO E AO SUPLENTE DE VEREADOR. 1. Conversão em pecúnia de metade das férias e da licença-prêmio adquirida, pagamento de indenização a servidor exonerado de cargo em comissão, estabilidade financeira relativamente a gratificação ou comissão a qualquer título percebida. Impossibilidade. São inconstitucionais dispositivos de Cartas Estaduais, inclusive Emendas, que fixem vencimentos e vantagens, concedem subvenção ou auxílio, ou, de qualquer modo, aumentem a despesa pública, por ser da competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo a iniciativa de lei sobre a matéria. Precedentes. 2. Exercício funcional simultâneo com a edilidade ou o cargo de Vice-Prefeito. Garantia aos servidores públicos civis e aos empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista, integrantes da administração indireta estadual. Extensão ao suplente de Vereador. 2.1. A Constituição Federal condiciona o exercício simultâneo do mandato de Vereador e das funções de agente público à compatibilidade de horários, que, não ocorrendo, impõe o seu afastamento do cargo, emprego ou função, sendo-lhe facultado optar pela remuneração. 2.2. Carta Estadual. Restrição do exercício funcional ao domicílio eleitoral. Impossibilidade. A Constituição Federal prevê tão-somente a hipótese do desempenho simultâneo das funções públicas, observada a compatibilidade de horários. 2.3. Extensão ao suplente de vereador. Insubsistência. Ao suplente de Vereador não se pode validamente estabelecer nenhuma limitação ao exercício do cargo, emprego ou função, por não ser titular de mandato eletivo. 2.4. Servidor público investido no mandato de Vice- Prefeito. Aplicam-se-lhe, por analogia, as disposições contidas no inciso II do art. 38 da Constituição Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade que se julga procedente” (RTJ 167/355).

Portanto, a norma impugnada, de iniciativa parlamentar, ao dispor acerca do regime jurídico e remuneração de servidor público municipal, violou o art. 24, § 2º, 1 e 4, da Constituição Estadual, que decorre do princípio da separação de poderes contido no art. 5º da Constituição Estadual (e que reproduzem o quanto disposto nos arts. 2º e 61, § 1º, II, a e c, da Constituição Federal), aplicáveis aos Municípios por obra de seu art. 144.

De outro lado, e não menos importante, o dispositivo legal impugnado colide frontalmente com o art. 25 da Constituição do Estado de São Paulo.

A norma combatida não indicou de forma adequada os recursos orçamentários necessários para a cobertura do aumento de despesas, impulsionado pelo pagamento de férias, adicional por tempo de serviço e sexta-parte aos funcionários beneficiados pela alteração legislativa atacada.

Diante do exposto, opino pela procedência desta ação direta, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei n. 10.653/2013, do Município de Sorocaba.

São Paulo, 14 de maio de 2014.

 

        Nilo Spinola Salgado Filho

        Subprocurador-Geral de Justiça

        Jurídico

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