Parecer em Ação de Inconstitucionalidade por Omissão
Processo n. 2030082-92.2014.8.26.0000
Requerente: Federação dos Funcionários Públicos Municipais do Estado de São Paulo - FUPESP
Requeridos: Prefeito e Câmara Municipal de Pinhalzinho
Ementa: Constitucional. Administrativo. Ação de inconstitucionalidade por omissão. Servidor público municipal. Afastamento para o exercício de mandato classista. Lei Orgânica do Município de Pinhalzinho. Legitimidade passiva da Câmara Municipal. Ilegitimidade passiva do Prefeito Municipal. Regime jurídico do servidor público. Lei de iniciativa reservada do Chefe do Poder Executivo. Inadmissibilidade de tratamento da matéria na Lei Orgânica do Município. 1. Entidade sindical detentora de legitimidade ativa (art. 90, V, CE/89). 2. Legitimidade passiva da Câmara Municipal, órgão detentor do dever de legislar. 3. Arguição ex officio da ilegitimidade ativa do Prefeito Municipal: acusada omissão na Lei Orgânica do Município, o Chefe do Poder Executivo local não participa de qualquer fase de seu processo legislativo, não estando em mora no cumprimento do dever de legislar. 4. Não vinga alegação de mora ou omissão no dever de legislar tributada à Lei Orgânica do Município em matéria (afastamento remunerado de servidor público em mandato classista) que é da reserva de iniciativa do Chefe do Poder Executivo [regime jurídico dos servidores públicos (art. 24, § 2º, 4, CE/89)], considerando-se que as normas sobre processo legislativo do âmbito federal (art. 61, § 1º, II, c, CF/88) constituem modelo de observância simétrica e reprodução obrigatória nos Estados. 5. Sendo eleito o regime celetista para disciplinar as relações jurídicas de servidores municipais, é patente a incompetência do Município na edição de regras trabalhistas, ex vi do disposto no art. 22, inciso I da CF/88. Ademais, em razão da existência de disposição na CLT concernente ao tema em epígrafe (art. 543 e §), resta infundada a alegação de omissão legislativa invocada pela requerente, sendo desnecessária a colmatação normativa pleiteada 6. Improcedência da ação.
Douto Relator,
Colendo Órgão Especial:
1. Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade promovida pela Federação dos Funcionários Públicos Municipais do Estado de São Paulo – FUPESP em razão da omissão, na Lei Orgânica do Município de Pinhalzinho, de previsão de afastamento de servidor público municipal eleito para o desempenho de mandato classista em sindicato da categoria, requerendo a supressão da omissão em 180 (cento e oitenta) dias, sob pena de aplicação supletiva do art. 125, § 1º, da Constituição Estadual.
2. A douta Procuradoria-Geral do
Estado declinou da defesa do ato normativo impugnado (fls. 135/137).
3. Instado, o Prefeito
Municipal deixou fluir in albis o
prazo para apresentação de suas informações (fls. 146). O Presidente da Câmara
Municipal sustentou ilegitimidade passiva, observando que o assunto é reservado
à iniciativa legislativa do Chefe do Executivo, assim como ausência de omissão
legislativa no caso em epígrafe, porquanto a Consolidação das Leis do Trabalho
– CLT já disciplina a temática em seu art. 543 e parágrafos, aplicada à
situação por força do regime celetista empregado aos servidores municipais
(fls. 139/142).
4. É o relatório.
5. Não procede a preliminar de
ilegitimidade passiva arguida pela Câmara Municipal de Pinhalzinho por se
tratar do órgão público detentor, em tese, do dever de legislar reclamado.
6. Entretanto, ex officio, suscito a ilegitimidade ativa do Prefeito Municipal. De
fato, a requerente acusa omissão na Lei Orgânica do Município e o Chefe do
Poder Executivo local não participa de qualquer fase de seu processo
legislativo, não estando, portanto, em mora no cumprimento do dever de
legislar.
7. Assim sendo, opino pela rejeição
da preliminar suscitada nas informações da Câmara Municipal e pela parcial
extinção do processo, sem resolução do mérito, em face do Prefeito Municipal de
Pinhalzinho.
8. No mérito, registre-se que o art.
125, § 1º, da Constituição Estadual, assegura ao servidor público eleito para
cargo em sindicato da categoria o afastamento remunerado de suas funções
durante o mandato, nos termos da lei, e o colendo Órgão Especial deste egrégio
Tribunal de Justiça vem reiteradamente sufragando o entendimento de
aplicabilidade desse preceito aos Municípios.
9. Porém, o pedido não pode ser
acolhido.
10. A petição inicial acusa omissão da
Lei Orgânica Municipal no dever de legislar.
11. Ocorre que o afastamento remunerado
de servidor público para o exercício de mandato classista não é assunto próprio
da Lei Orgânica do Município, senão matéria
peculiar ao regime jurídico do funcionalismo, cuja iniciativa legislativa é
reservada com exclusividade ao Executivo, ex vi do disposto no art. 24,
§ 2º, 4, da Constituição do Estado de São Paulo, reproduzindo o art. 61, § 1º,
II, c, da Constituição da República
Federativa do Brasil.
12. Assim
sendo, não está a Lei Orgânica Municipal em estado de mora no dever de
legislar, pois, é pacífico no Supremo
Tribunal Federal que não é dado à Constituição Estadual disciplinar o regime
jurídico dos servidores públicos para além das normas de reprodução obrigatória
da Constituição Federal:
“DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 71 DO ADCT DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DA PARAÍBA. VENCIMENTOS E PROVENTOS DE SERVIDORES PÚBLICOS. EQUIPARAÇÃO E VINCULAÇÃO. REGIME JURÍDICO: PODER DE INICIATIVA DE LEI. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO INCISO XIII DO ART. 37 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PROPOSITURA DA ADI PELO PROCURADOR-GERAL DO ESTADO, COM POSTERIOR RATIFICAÇÃO PELO GOVERNADOR: LEGITIMIDADE ATIVA. 1. O texto impugnado assegura ao funcionário ativo e inativo da Secretaria das Finanças, que, na conformidade da legislação então vigente, tenha exercido as funções de Tesoureiro ou de Tesoureiro-auxiliar das Recebedorias de Rendas de João Pessoa ou de Campina Grande, até a data da promulgação da Constituição, os vencimentos ou proventos correspondentes aos atribuídos ao Agente Fiscal dos Tributos Estaduais, símbolo TAF-501.1. Trata-se de equiparação e vinculação proibidas pelo inciso XIII do art. 37 da Constituição Federal, mesmo com a nova redação dada pela E.C. n° 19/98. 2. Basta observar que, aumentados os vencimentos do cargo de Agente Fiscal dos Tributos Estaduais, símbolo TAF-501.1, estarão automaticamente aumentados os vencimentos e proventos dos servidores referidos na norma em questão. 3. Além disso, não pode a Constituição Estadual, segundo pacífica jurisprudência desta Corte, retirar do Governador do Estado sua competência privativa para iniciativa de leis que disponham sobre aumento de remuneração (art. 61, II, ‘a’, da C.F.) ou sobre regime jurídico dos servidores estaduais (art. 61, II, ‘c’). 4. Ação Direta julgada procedente, declarando-se a inconstitucionalidade do art. 71 do ADCT da Constituição Estadual da Paraíba. 5. Plenário. Decisão unânime” (STF, ADI 1.977-PB, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches, 19-03-2003, v.u., DJ 02-05-2003, p. 25).
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 78 DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. REGIME JURÍDICO DE SERVIDORES ESTADUAIS. VÍCIO DE INICIATIVA. Sendo os dispositivos impugnados relativos ao regime jurídico dos servidores públicos fluminenses, resulta caracterizada a violação à norma da alínea c do inciso II do § 1.º do art. 61 da Constituição Federal, que, sendo corolário do princípio da separação de poderes, é de observância obrigatória para os Estados, inclusive no exercício do poder constituinte decorrente. Ação julgada procedente” (STF, ADI 250-RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ilmar Galvão, 15-08-2002, v.u., DJ 20-09-2002, p. 87).
“I. Processo
legislativo: modelo federal: iniciativa legislativa reservada: aplicabilidade,
em termos, ao poder constituinte dos Estados-membros. 1. As regras básicas do
processo legislativo federal são de absorção compulsória pelos Estados-membros
em tudo aquilo que diga respeito - como ocorre às que enumeram casos de
iniciativa legislativa reservada - ao princípio fundamental de independência e harmonia
dos poderes, como delineado na Constituição da República. 2. Essa orientação -
malgrado circunscrita em princípio ao regime dos poderes constituídos do
Estado-membro - é de aplicar- se em termos ao poder constituinte local, quando
seu trato na Constituição estadual traduza fraude ou obstrução antecipada ao
jogo, na legislação ordinária, das regras básicas do processo legislativo, a
partir da área de iniciativa reservada do executivo ou do judiciário: é o que
se dá quando se eleva ao nível constitucional do Estado-membro assuntos miúdos
do regime jurídico dos servidores públicos, sem correspondência no modelo
constitucional federal, a exemplo do que sucede na espécie com a disciplina de
licença especial e particularmente do direito á sua conversão em dinheiro”
(STF, ADI 276-AL, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 13-11-1997,
v.u., DJ 19-12-1997, p. 40).
13. Idêntico raciocínio se devota à Lei
Orgânica do Município, até porque, como já registrado, não tem o Chefe do Poder
Executivo participação em qualquer das fases de seu respectivo processo
legislativo.
14. Por fim, visando afastar
qualquer argumento favorável à omissão legislativa invocada pela requerente,
impende consignar que diante da eleição do regime celetista para disciplinar as relações
jurídicas dos servidores municipais, é patente a incompetência do ente em
comento para dispor sobre o tema, posto que a edição de regras trabalhistas é privativa
da União, por força do art. 22, inciso I da CF/88.
15. Aliás, a própria CLT já dispõe sobre o afastamento de empregado para o exercício de mandato classista, vide art. 543 e parágrafos, sendo totalmente descabida, por conseguinte, a alegação de omissão legislativa passível de colmatação por esta presente ação direta.
16. Posto
isso, opina-se pela rejeição da preliminar alegada nas informações e pela
decretação da parcial
extinção do processo sem resolução do mérito em face do Prefeito Municipal de Pinhalzinho
(ilegitimidade passiva). No mérito, pugna-se pela improcedência da ação.
São Paulo, 03 de junho de 2014.
Nilo Spinola Salgado Filho
Subprocurador-Geral de Justiça
Jurídico
mao