Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo n. 2038967-95.2014.8.26.0000

Requerente: Prefeito do Município de Lençóis Paulista

Requerido: Presidente da Câmara Municipal de Lençóis Paulista

 

 

 

EMENTA: Constitucional. Administrativo. Ação direta de inconstitucionalidade. Lei n. 4.584, de 26 de fevereiro de 2014, do Município de Lençóis Paulista. Adicional de 35% aos membros da comissão julgadora de licitações que atuam no poder legislativo, bem como acréscimo de nova hipótese de afastamento remunerado a todos os servidores municipais em razão de luto. iniciativa parlamentar. Violação ao princípio da separação de poderes. falta de recursos financeiros. procedência. 1. A extensão de adicional, correspondente 35% dos vencimentos, aos membros da Comissão Julgadora de Licitações do próprio Poder Legislativo local, não obstante configure matéria de iniciativa reservada ao poder legislativo (art. 20, III, da CE), requer a indicação de recursos orçamentários disponíveis. 2. A instituição de nova hipótese de afastamento remunerado, a todos os servidores municipais, em razão de luto, invade matéria reservada ao Chefe do Poder Executivo, eis que dispõe sobre regime jurídico e remuneração dos servidores públicos municipais, além de propiciar aumento de despesas sem indicação de recursos disponíveis. Violação dos arts. 5º, 24, § 2º, 4, 25 e 144, da Constituição Estadual. 4. Procedência.

Colendo Órgão Especial:

 

 

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade em face da Lei n. 4.584, de 26 de fevereiro de 2014, do Município de Lençóis de Paulista, de iniciativa parlamentar, que concedeu adicional aos membros da Comissão Julgadora de Licitações que atuam junto ao Poder Legislativo local, bem como acréscimo de nova hipótese de afastamento remunerado a todos os servidores municipais em razão de luto, pelo falecimento de tio e tia, sob alegação de violação aos arts. 5º, 24, §§ 2º, 5º, I, 25, 47, II, 144, da Constituição Estadual.

Concedida em parte a liminar (fl. 65/67), a douta Procuradoria-Geral do Estado declinou da defesa do ato normativo objurgado (fls. 77/79) e as informações foram prestadas (fls. 81/83).

É o relatório.

O pedido é procedente.

A lei impugnada assim dispõe:

“Art. 1º Fica alterado o Art. 84-A, da Lei Municipal n.º 3.660, de 20 de dezembro de 2006, incluído através da lei Municipal n.º 4.132, de 20 de janeiro de 2011, com a seguinte redação:

Art. 84-A Os membros da Comissão Julgadora de licitações do Poder Executivo Municipal e do Poder Legislativo Municipal, designados nos termos da Lei Federal n.º 8.666/93, bem como os pregoeiros nomeados nos termos da Lei Federal 10.520/2002, terão direito a um adicional no importe de:

I – (...)

II – (...)

III – aos que atuam na área de Licitações junto ao Poder Legislativo: trinta e cinco por cento do valor do piso salarial praticado no serviço público municipal.

Art. 2º Fica alterado o inciso VIII, do art. 99, da lei municipal n.º 3.660, de 20 de dezembro de 2006, alterado pela Lei Municipal n.º 4.464, de 16 de abril de 2013, com a seguinte redação:

Art. 99 (...)

VIII. Luto pelo falecimento de pai, mãe, padrasto, madrasta, irmão, cônjuge ou companheiro, filho, enteado, menor sob guarda ou tutela, por até cinco dias; até dois dias no caso de avô, avó, sogro e sogra, neto, sobrinho, cunhado, tia, tia, ou pessoa que viva comprovadamente sob sua dependência econômica;

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.”

 

 

A)  Do art. 1º da Lei n.4.584/14:

Em se tratando de processo legislativo, é princípio que as normas do modelo federal são aplicáveis e extensíveis por simetria às demais órbitas federativas. Neste sentido:

“as regras do processo legislativo federal, especialmente as que dizem respeito à iniciativa reservada, são normas de observância obrigatória pelos Estados-membros” (STF, ADI 2.719-1-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 20-03-2003, v.u.).

A regra é a iniciativa legislativa pertencente ao Poder Legislativo; exceção é a atribuição de reserva a certa categoria de agentes, entidades e órgãos, e que, por isso, não se presume. Corolário é a devida interpretação restritiva às hipóteses de iniciativa legislativa reservada, perfilhando tradicional lição salientando que:

“a distribuição das funções entre os órgãos do Estado (poderes), isto é, a determinação das competências, constitui tarefa do Poder Constituinte, através da Constituição. Donde se conclui que as exceções ao princípio da separação, isto é, todas aquelas participações de cada poder, a título secundário, em funções que teórica e normalmente competiriam a outro poder, só serão admissíveis quando a Constituição as estabeleça, e nos termos em que fizer. Não é lícito à lei ordinária, nem ao juiz, nem ao intérprete, criarem novas exceções, novas participações secundárias, violadoras do princípio geral de que a cada categoria de órgãos compete aquelas funções correspondentes à sua natureza específica” (J. H. Meirelles Teixeira. Curso de Direito Constitucional, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991, pp. 581, 592-593).

Como desdobramento particularizado do princípio da separação dos poderes (art. 5º, Constituição Estadual), a Constituição do Estado de São Paulo prevê no art. 24, § 2º, iniciativa legislativa reservada do Chefe do Poder Executivo, bem como no artigo 20 algumas matérias de iniciativa reservada ao Poder Legislativo (aplicável na órbita municipal por obra de seu art. 144).

O artigo 20, inciso III, da Constituição Estadual assim dispõe:

“Artigo 20 - Compete, exclusivamente, à Assembléia Legislativa:

(...)

III – dispor sobre a organização de sua Secretaria, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;”

Portanto, a iniciativa de lei municipal que dispõe acerca da remuneração dos servidores da Câmara Municipal é exclusiva do Poder Legislativo. Não por outro por motivo que o art. 37, X, da CF, aplicável por conta do artigo 144 da CE, assim dispõe:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

X – a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o §4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;”

        No caso em tela, a alteração do art. 84-A do Estatuto dos Servidores Públicos Municipais, que previu o acréscimo do adicional correspondente 35% do piso salarial base, atingiu apenas os membros da Comissão Julgadora de Licitações que atuam perante o Poder Legislativo, não havendo, portanto, violação à separação dos poderes e nem mesmo vício de iniciativa.

Porém, não obstante o aumento de despesa advindo da previsão de pagamento da citada gratificação, não há indicação adequada dos recursos disponíveis para tanto, o que viola o artigo 25, da Constituição Bandeirante.

Neste sentido:

 

“LEI MUNICIPAL QUE, DEMAIS IMPÕE INDEVIDO AUMENTO DE DESPESA PÚBLICA SEM A INDICAÇÃO DOS RECURSOS DISPONÍVEIS, PRÓPRIOS PARA ATENDER AOS NOVOS ENCARGOS (CE, ART 25). COMPROMETENDO A ATUAÇÃO DO EXECUTIVO NA EXECUÇÃO DO ORÇAMENTO - ARTIGO 176, INCISO I, DA REFERIDA CONSTITUIÇÃO, QUE VEDA O INÍCIO DE PROGRAMAS. PROJETOS E ATIVIDADES NÃO INCLUÍDOS NA LEI ORÇAMENTÁRIA ANUAL” (ADIn 142.519-0/5-00, rel. Des. Mohamed Amaro, 15.8.2007).

 

B)   Do art. 2º da Lei n. 4.854/14

Por outro lado, o art. 2º da lei impugnada acabou por inserir nova hipótese de afastamento por luto, em razão de falecimento de tio ou tia, a todos os servidores municipais.

Ocorre, porém, que a referida alteração legislativa é, de fato, verticalmente incompatível com os seguintes preceitos da Constituição do Estado de São Paulo:

“Artigo 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. 

(...)

Artigo 24 - A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou comissão da Assembleia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

(...)

§2º - Compete, exclusivamente, ao Governador do Estado a iniciativa das leis que disponham sobre: 

1 - criação e extinção de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica, bem como a fixação da respectiva remuneração; 

(...) 

4 - servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria;

(...)”

É decorrência do princípio da divisão funcional do poder (separação dos poderes) que as regras acerca da remuneração e do regime jurídico dos servidores públicos são da iniciativa legislativa reservada ao Chefe do Poder Executivo, sendo interditado seu tratamento por emenda parlamentar.

As regras do processo legislativo federal são de observância compulsória pelos Estados e Municípios, como vem julgando reiteradamente o Supremo Tribunal Federal:

“(...) 2. A Constituição do Brasil, ao conferir aos Estados-membros a capacidade de auto-organização e de autogoverno --- artigo 25, caput ---, impõe a obrigatória observância de vários princípios, entre os quais o pertinente ao processo legislativo. O legislador estadual não pode usurpar a iniciativa legislativa do Chefe do Executivo, dispondo sobre as matérias reservadas a essa iniciativa privativa. (...)” (STF, ADI 1.594-RN, Tribunal Pleno, Rel. Min. Eros Grau, 04-06-2008, v.u., DJe 22-08-2008).

“(...)I. - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que as regras básicas doprocesso legislativo da Constituição Federal, entre as quais as que estabelecem reserva de iniciativa legislativa, são de observância obrigatória pelos estados-membros. (...)” (RT 850/180).

“(...)1. A Constituição do Brasil, ao conferir aos Estados-membros a capacidade de auto-organização e de autogoverno (artigo 25, caput), impõe a obrigatória observância de vários princípios, entre os quais o pertinente ao processo legislativo, de modo que o legislador estadual não pode validamente dispor sobre as matérias reservadas à iniciativa privativa do Chefe do Executivo. (...)” (RTJ 193/832).

“(...) I. - As regras básicas do processo legislativo federal são de observância obrigatória pelos Estados-membros e Municípios. (...)” (STF, ADI 2.731-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 02-03-2003, v.u., DJ 25-04-2003, p. 33).

 

Por regime jurídico dos servidores públicos deve-se compreender o “conjunto de normas que disciplinam os diversos aspectos das relações, estatutárias ou contratuais, mantidas pelo Estado com os seus agentes” (STF, ADI-MC 766-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 03-09-1992, v.u., RTJ 157/460). Nessa compreensão estão abrangidas as regras institutivas de direitos e obrigações e cuja “iniciativa é do Poder Executivo, conforme dispõe a alínea ‘c’ do inciso II do § 1º do artigo 61 da Constituição Federal” (RTJ 194/848). Em dimensão mais global, assim se explica:

“Trata-se, em essência, de noção que, em virtude da extensão de sua abrangência conceitual, compreende todas as regras pertinentes (a) às formas de provimento; (b) às formas de nomeação; (c) à realização do concurso; (d) à posse; (e) ao exercício, inclusive as hipóteses de afastamento, de dispensa de ponto e de contagem de tempo de serviço; (f) às hipóteses de vacância; (g) à promoção e respectivos critérios, bem como avaliação do mérito e classificação final (cursos, títulos, interstícios mínimos); (h) aos direitos e às vantagens de ordem pecuniária; (i) às reposições salariais e aos vencimentos; (j) ao horário de trabalho e ao ponto, inclusive os regimes especiais de trabalho; (k) aos adicionais por tempo de serviço, gratificações, diárias, ajudas de custo, e acumulações remuneradas; (l)às férias, licenças em geral, estabilidade, disponibilidade, aposentadoria; (m) aos deveres e proibições; (n) às penalidades e sua aplicação; (o) ao processo administrativo” (STF, ADI-MC 766-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 03-09-1992, v.u., DJ 27-05-94, p. 13.186).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - POLICIAL MILITAR - REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS - PROCESSO LEGISLATIVO - INSTAURAÇÃO DEPENDENTE DE INICIATIVA CONSTITUCIONALMENTE RESERVADA AO CHEFE DO PODER EXECUTIVO - DIPLOMA LEGISLATIVO ESTADUAL QUE RESULTOU DE INICIATIVA PARLAMENTAR - INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA . OS PRINCÍPIOS QUE REGEM O PROCESSO LEGISLATIVO IMPÕEM-SE À OBSERVÂNCIA DOS ESTADOS-MEMBROS. - O modelo estruturador do processo legislativo, tal como delineado em seus aspectos fundamentais pela Carta da República, impõe-se, enquanto padrão normativo de compulsório atendimento, à observância incondicional dos Estados-membros. Precedentes. - O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo legislativo, que resulte da usurpação do poder sujeito à cláusula de reserva, traduz vício jurídico de gravidade inquestionável, cuja ocorrência reflete típica hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do ato legislativo eventualmente editado. Nem mesmo a ulterior aquiescência do Chefe do Poder Executivo, mediante sanção do projeto de lei, ainda quando dele seja a prerrogativa usurpada, tem o condão de sanar esse defeito jurídico radical. Insubsistência da Súmula nº 5/STF, motivada pela superveniente promulgação da Constituição Federal de 1988. Doutrina. Precedentes. SIGNIFICAÇÃO CONSTITUCIONAL DO REGIME JURÍDICO DOS SERVIDORES PÚBLICOS (CIVIS E MILITARES). - A locução constitucional ‘regime jurídico dos servidores públicos’ corresponde ao conjunto de normas que disciplinam os diversos aspectos das relações, estatutárias ou contratuais, mantidas pelo Estado com os seus agentes”(STF, ADI-MC 1.381-AL, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 07-12-1995, v.u., DJ 06-06-2003, p. 29).

“(...) 5. Tratando-se de criação de funções, cargos e empregos públicos ou de regime jurídico de servidores públicos impõe-se a iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo nos termos do art. 61, § 1º, II, da Constituição Federal, o que, evidentemente, não se dá com a Lei Orgânica” (RTJ 205/1041).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 54, VI DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PIAUÍ. VEDAÇÃO DA FIXAÇÃO DE LIMITE MÁXIMO DE IDADE PARA PRESTAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO. OFENSA AOS ARTIGOS 37, I E 61, § 1º, II, C E F, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Dentre as regras básicas do processo legislativo federal, de observância compulsória pelos Estados, por sua implicação com o princípio fundamental da separação e independência dos Poderes, encontram-se as previstas nas alíneas a e c do art. 61, § 1º, II da CF, que determinam a iniciativa reservada do Chefe do Poder Executivo na elaboração de leis que disponham sobre o regime jurídico e o provimento de cargos dos servidores públicos civis e militares. Precedentes: ADI 774, rel. Min. Sepúlveda Pertence, D.J. 26.02.99, ADI 2.115, rel. Min. Ilmar Galvão e ADI 700, rel. Min. Maurício Corrêa (...)” (RTJ 203/89).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COMPLEMENTAR N. 792, DO ESTADO DE SÃO PAULO. ATO NORMATIVO QUE ALTERA PRECEITO DO ESTATUTO DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS ESTADUAIS. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS NO PROCESSO LEGISLATIVO ESTADUAL. PROJETO DE LEI VETADO PELO GOVERNADOR. DERRUBADA DE VETO. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. AFRONTA AO DISPOSTO NO ARTIGO 61, § 1º, II, C, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. A Constituição do Brasil, ao conferir aos Estados-membros a capacidade de auto-organização e de autogoverno [artigo 25, caput], impõe a observância obrigatória de vários princípios, entre os quais o pertinente ao processo legislativo, de modo que o legislador estadual não pode validamente dispor sobre as matérias reservadas à iniciativa privativa do Chefe do Executivo. Precedentes. 2. O ato impugnado versa sobre matéria concernente a servidores públicos estaduais, modifica o Estatuto dos Servidores e fixa prazo máximo para a concessão de adicional por tempo de serviço. 3. A proposição legislativa converteu-se em lei não obstante o veto aposto pelo Governador. O acréscimo legislativo consubstancia alteração no regime jurídico dos servidores estaduais. 4. Vício formal insanável, eis que configurada manifesta usurpação da competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo [artigo 61, § 1º, inciso II, alínea ‘c’, da Constituição do Brasil]. Precedentes. 5. Ação direta julgada procedente para declarar inconstitucional a Lei Complementar n. 792, do Estado de São Paulo” (STF, ADI 3.167-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Eros Grau, 18-06-2007, v.u., DJe 06-09-2007).

“PROJETO - INICIATIVA - SERVIDOR PÚBLICO - DIREITOS E OBRIGAÇÕES. A iniciativa é do Poder Executivo, conforme dispõe a alínea ‘c’ do inciso II do § 1º do artigo 61 da Constituição Federal. PROJETO - COMPETÊNCIA PRIVATIVA DO EXECUTIVO - SERVIDOR DO ESTADO - EMENDA - AUMENTO DE DESPESA. Resultando da emenda apresentada e aprovada aumento de despesa, tem-se a inconstitucionalidade, consoante a regra do inciso I do artigo 63 da Constituição Federal. PROJETO - COMPETÊNCIA PRIVATIVA DO EXECUTIVO - EMENDA - POSSIBILIDADE. Se de um lado é possível haver emenda em projeto de iniciativa do Executivo, indispensável é que não se altere, na essência, o que proposto, devendo o ato emanado da Casa Legislativa guardar pertinência com o objetivo visado. PROJETO - COMPETÊNCIA DO EXECUTIVO - EMENDA - PRESERVAÇÃO DE DIREITO ADQUIRIDO. Emenda a projeto do Executivo que importe na ressalva de direito já adquirido segundo a legislação modificada não infringe o texto da Constituição Federal assegurador da iniciativa exclusiva. LICENÇA-PRÊMIO - TRANSFORMAÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER EM OBRIGAÇÃO DE DAR - ALTERAÇÃO NORMATIVA - VEDAÇÃO - OBSERVÂNCIA. Afigura-se constitucional diploma que, a um só tempo, veda a transformação da licença-prêmio em pecúnia e assegura a situação jurídica daqueles

que já tenham atendido ao fator temporal, havendo sido integrado no patrimônio o direito adquirido ao benefício de acordo com as normas alteradas pela nova regência” (RTJ 194/848).

“Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Complementar nº 109, de 08 de abril de 1994, do Estado de Rondônia. (...) - No mérito, já se firmou o entendimento desta Corte no sentido de que, também em face da atual Constituição, as normas básicas da Carta Magna Federal sobre processo legislativo, como as referentes às hipóteses de iniciativa reservada, devem ser observadas pelos Estados-membros. Assim, não partindo a lei estadual ora atacada da iniciativa do Governador, e dizendo ela respeito a regime jurídico dos servidores públicos civis, foi ofendido o artigo 61, § 1º, II, ‘c’, da Carta Magna. Ação direta que se julga procedente, para declarar-se a inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 109, de 08 de abril de 1994, do Estado de Rondônia” (STF, ADI 1.201-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, 14-11-2002, v.u., DJ 19-12-2002, p. 69).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE PERNAMBUCO: ART. 98, § 2º, I, VI, XII, XVII: CONCESSÃO DE VANTAGENS A SERVIDOR PÚBLICO. VÍCIO DE INICIATIVA. COMPETÊNCIA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO. ART. 99, IV E PARÁGRAFO ÚNICO: INVESTIDURA EM MANDATO ELETIVO. POSSIBILIDADE DE EXERCÍCIO SIMULTÂNEO DA VEREAÇÃO E DE FUNÇÃO PÚBLICA. EXTENSÃO AO VICE-PREFEITO E AO SUPLENTE DE VEREADOR. 1. Conversão em pecúnia de metade das férias e da licença-prêmio adquirida, pagamento de indenização a servidor exonerado de cargo em comissão,estabilidade financeira relativamente a gratificação ou comissão a qualquer título percebida. Impossibilidade. São inconstitucionais dispositivos de Cartas Estaduais, inclusive Emendas, que fixem vencimentos e vantagens, concedem subvenção ou auxílio, ou, de qualquer modo, aumentem a despesa pública, por ser da competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo a iniciativa de lei sobre a matéria. Precedentes. 2. Exercício funcional simultâneo com a edilidade ou o cargo de Vice-Prefeito. Garantia aos servidores públicos civis e aos empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista, integrantes da administração indireta estadual. Extensão ao suplente de Vereador. 2.1. A Constituição Federal condiciona o exercício simultâneo do mandato de Vereador e das funções de agente público à compatibilidade de horários, que, não ocorrendo, impõe o seu afastamento do cargo, emprego ou função, sendo-lhe facultado optar pela remuneração. 2.2. Carta Estadual. Restrição do exercício funcional ao domicílio eleitoral. Impossibilidade. A Constituição Federal prevê tão-somente a hipótese do desempenho simultâneo das funções públicas, observada a compatibilidade de horários. 2.3. Extensão ao suplente de vereador. Insubsistência. Ao suplente de Vereador não se pode validamente estabelecer nenhuma limitação ao exercício do cargo, emprego ou função, por não ser titular demandato eletivo. 2.4. Servidor público investido no mandato de Vice- Prefeito. Aplicam-se-lhe, por analogia, as disposições contidas no inciso II do art. 38 da Constituição Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade que se julga procedente” (RTJ 167/355).

 

Portanto, a norma impugnada é incompatível com o art. 24, § 2º, 1 e 4, da Constituição Estadual, que decorre do princípio da separação de poderes contido no art. 5º da Constituição Estadual (e que reproduzem o quanto disposto nos arts. 2º e 61, § 1º, II, a e c, da Constituição Federal), aplicáveis aos Municípios por obra de seu art. 144.

De outro lado, e não menos importante, o dispositivo legal impugnado, assim como o art. 1º, também colide frontalmente com o art. 25 da Constituição do Estado de São Paulo, pois a norma combatida não indicou, de forma adequada, os recursos orçamentários necessários para a cobertura dos novos encargos.

         Feitas estas considerações, manifesta-se pela procedência do pedido, a fim de que seja reconhecida a inconstitucionalidade da Lei 4.584/14, do Município de Lençóis Paulista.

 

São Paulo, 19 de maio de 2014.

 

 

        Nilo Spinola Salgado filho

        Subprocurador-Geral de Justiça

        Jurídico

 

aaamj