Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo n. 2043709-66.2014.8.26.0000

Requerente: Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustiveis – CEISE-BR

Requerido: Prefeito e Câmara Municipal de Sertãozinho

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Constitucional. Tributário. Processo Civil. Ação direta de inconstitucionalidade. Decreto n. 5.966, de 23 de dezembro de 2013, do Município de Sertãozinho. Ilegitimidade ativa. Entidade de classe de âmbito nacional. Representação de categoria econômica. Falta de pertinência temática. IPTU. Decreto. Definição dos padrões de construção dos imóveis edificados. Crise de legalidade. Matéria de fato. Falta de interesse de agir. Carência da ação. 1. Carente de legitimidade ativa entidade de cunho nacional para o controle abstrato de constitucionalidade estadual, não obstante a falta de pertinência temática entre a lei impugnada e suas finalidades institucionais. 2. Em matéria de contencioso concentrado de constitucionalidade, ressalvado o regulamento autônomo, se o regulamento executivo desborda de seus limites, trata-se de crise de legalidade, e não de constitucionalidade. 3. Inadmissível no contencioso objetivo de constitucionalidade de lei municipal a incursão em matéria de fato dependente de prova como a investigação entre a mera atualização monetária segundo os índices inflacionários e a ocorrência de aumento, que constitui decisivo assunto que não pode ser ventilado nesta lide – porquanto somente a majoração de tributo demanda reserva de lei formal. 4. Carência da ação.

 

 

 

Eminente Relator,

Colendo Órgão Especial:

 

 

 

1.                Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustiveis – CEISE-BR ajuíza ação direta de inconstitucionalidade questionando, à luz do art. 111 da Constituição Estadual e do art. 150, I, da Constituição Federal, o Decreto n. 5.966, de 23 de dezembro de 2013, do Município de Sertãozinho, que define os padrões de construção dos imóveis edificados.

2.               A liminar foi negada e o douto Procurador-Geral do Estado declinou de sua intervenção na lide. O agravo regimental interposto contra a decisão denegatória da liminar foi improvido. A Câmara Municipal de Sertãozinho prestou informações assim como o Prefeito do Município de Sertãozinho que arguiu ilegitimidade ativa e defendeu a constitucionalidade do ato normativo impugnado salientando que se tratou de mera atualização monetária autorizada pelo art. 11, § 2º, da Lei Complementar n. 01/90 consubstanciada no Decreto n. 5.960, de 19 de dezembro de 2013.

3.                É o relatório.

4.               A preliminar arguida merece amparo.

5.                A requerente não é entidade civil legitimada a ocupar o polo ativo da demanda nem há pertinência temática, como exigido no inciso V do art. 90 da Constituição do Estado.

6.                Segundo essa norma a legitimação ativa é conferida “as entidades sindicais ou de classe, de atuação estadual ou municipal, demonstrando seu interesse jurídico no caso”.

7.                A requerente é entidade de cunho nacional, como se infere da leitura de seus atos constitutivos.

8.                Além disso, não se vislumbra pertinência temática entre as finalidades estatutárias das entidades requerentes e o conteúdo das normas questionadas, não sendo possível aferir de que forma esta atinge os interesses dos representados.

9.                O colendo Órgão Especial deste Egrégio Tribunal de Justiça já decidiu que “são três os critérios para aferir a legitimidade ativa especial da entidade de classe: a representatividade adequada, mediante homogeneidade de seus membros; o objetivo institucional classista uno; e a pertinência temática que se avalia pelo ajustamento entre os fins a que se propõe a entidade e o conteúdo da lei” (ADI 994.09.229236-7, Rel. Des. Artur Marques, 04-08-2010).

10.              Registre-se que “é preciso que haja uma relação lógica entre a questão versada na lei ou ato normativo a ser impugnado e os objetivos sociais da entidade requerente. Vale dizer: a norma contestada deverá repercutir direta ou indiretamente sobre a atividade profissional ou econômica da classe envolvida, ainda que só parte dela seja atingida” (Luís Roberto Barroso. O Controle de Constitucionalidade no Direito Brasileiro, São Paulo: Saraiva, 2009, 4ª ed., p.168).

11.              Com efeito, não estará cumprido o requisito da pertinência temática, que se completa com a demonstração genérica de que o provimento jurisdicional almejado atende a interesse dos associados que a entidade se propõe a defender. As normas censuradas inovam a legislação tributária do Município sem reflexo direto e imediato na categoria representada, ligada à produção industrial. Não atende ao requisito específico mero interesse indireto ou econômico, sem ligação imediata e direta com o escopo institucional da entidade sindical, como julgado:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - CONFEDERAÇÃO DOS SERVIDORES PÚBLICOS DO BRASIL (CSPB) - AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE ATIVA ‘AD CAUSAM’ POR FALTA DE PERTINÊNCIA TEMÁTICA - INSUFICIÊNCIA, PARA TAL EFEITO, DA MERA EXISTÊNCIA DE INTERESSE DE CARÁTER ECONÔMICO-FINANCEIRO - HIPÓTESE DE INCOGNOSCIBILIDADE - AÇÃO DIRETA NÃO CONHECIDA. - O requisito da pertinência temática - que se traduz na relação de congruência que necessariamente deve existir entre os objetivos estatutários ou as finalidades institucionais da entidade autora e o conteúdo material da norma questionada em sede de controle abstrato - foi erigido à condição de pressuposto qualificador da própria legitimidade ativa ‘ad causam’ para efeito de instauração do processo objetivo de fiscalização concentrada de constitucionalidade. Precedentes” (STF, ADI-MC 1.157-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 01-12-1994, m.v., DJ 17-11-2006, p. 47).

12.              A requerente objetiva a pronúncia da inconstitucionalidade do Decreto n. 5.966, de 23 de dezembro de 2013, que, majorou o IPTU de maneira indevida.

13.              Ocorre que esse decreto não contém qualquer reajuste ou aumento do valor venal dos imóveis para fins do imposto. A norma apenas dispôs sobre a definição dos padrões de construção dos imóveis edificados (fls. 354/356).

14.              A alteração do IPTU foi definida em outro ato normativo – o Decreto n. 5.960, de 19 de dezembro de 2013 – que, entre outros assuntos, fixou o reajuste do imposto em 5,58% (fls. 351/353), o que, segundo as informações, dispensa lei em sentido estrito por se tratar de mera atualização segundo os índices inflacionários a teor da permissão contida no § 2º do art. 11 da Lei Complementar n. 01/90.

15.              Conquanto possa parecer controversa a revisão da planta genérica de valores em regulamento (art. 10, I, Lei Complementar n. 01/90), ambos os decretos são atos normativos vinculados e dependentes não tendo primariedade normativa necessária para o controle abstrato de constitucionalidade. Em matéria de contencioso concentrado de constitucionalidade, ressalvado o regulamento autônomo, se o regulamento executivo desborda de seus limites, trata-se de crise de legalidade, e não de constitucionalidade.

16.              Não bastasse, o contencioso objetivo de constitucionalidade de lei municipal tem como parâmetro exclusivo a Constituição Estadual, ainda que reproduza, imite ou remeta à Constituição Federal. E não se presta ao exame de matéria de fato dependente de prova, porque a via estreita do controle abstrato de constitucionalidade se sedimenta no contraste direto e frontal entre ato normativo local e norma constitucional estadual. Assim sendo, a investigação entre a mera atualização monetária segundo os índices inflacionários e a ocorrência de aumento é decisivo assunto que não pode ser ventilado nesta lide – porquanto somente a majoração de tributo demanda reserva de lei formal.

17.              Destarte, falece interesse de agir.

18.              Opino pela extinção do processo sem resolução do mérito por ilegitimidade ativa e falta de interesse de agir.

                   São Paulo, 03 de junho de 2014.

 

 

 

        Nilo Spinola Salgado Filho

        Subprocurador-Geral de Justiça

        Jurídico

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