Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo n. 2049.496-76.2014.8.26.0000

Requerente: Prefeito do Município de São José do Rio Preto

Requerida: Câmara Municipal de São José do Rio Preto

 

 

 

Constitucional. Urbanístico. Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 11.406, de 29 de novembro de 2013, do Município de São José do Rio Preto. Zoneamento urbano. Separação de poderes. Conformidade com o plano diretor. Procedência. 1.  Inconsistência da arguição de inconstitucionalidade de lei de zoneamento firmada na reserva de iniciativa legislativa do Chefe do Poder Executivo decorrente da separação de poderes. 2. Inconstitucionalidade, todavia, de lei municipal de zoneamento de iniciativa parlamentar que contém disposição isolada, tópica e pontual, desvinculada do planejamento urbano integral, vulnerando sua compatibilidade com o plano diretor, e sua integralidade, e as normas urbanísticas de uso, ocupação e parcelamento do solo urbano (arts. 180, V, e 181, § 1º, CE/89). 3. Procedência da ação.

 

 

 

Colendo Órgão Especial:

 

 

1.                Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito Municipal de São José do Rio Preto em face da Lei nº 11.406, de 29 de novembro de 2013, do Município de São José do Rio Preto, por sua incompatibilidade com o art. 5º da Constituição Estadual (fls. 01/08).

2.                Concedida liminar (fls. 25/26), o douto Procurador-Geral do Estado declinou da defesa da lei impugnada (fls. 37/39) e as informações foram prestadas (fls. 41/45).

3.                É o relatório.

4.                O contencioso de constitucionalidade de lei municipal não pode envolver outro parâmetro senão a Constituição Estadual ainda que reproduza ou imite a Constituição Federal, sendo, portanto, descabido o confronto do ato normativo local com a legislação infraconstitucional, inclusive a Lei Orgânica Municipal.

5.                A lei local impugnada classifica para fins de zoneamento urbano as vias públicas nela indicadas e, segundo a petição inicial, a iniciativa parlamentar tisna de inconstitucionalidade a norma.

6.                Concessa venia, o argumento não é procedente.

7.                Comungo da orientação devotada pela Suprema Corte sublinhando que, in casu, a iniciativa legislativa é comum ou concorrente, como se colhe do seguinte julgado:

“Recurso extraordinário. Ação direta de inconstitucionalidade contra lei municipal, dispondo sobre matéria tida como tema contemplado no art. 30, VIII, da Constituição Federal, da competência dos Municípios. 2. Inexiste norma que confira a Chefe do Poder Executivo municipal a exclusividade de iniciativa relativamente à matéria objeto do diploma legal impugnado. Matéria de competência concorrente. Inexistência de invasão da esfera de atribuições do Executivo municipal. 3. Recurso extraordinário não conhecido” (STF, RE 218.110-SP, 2ª Turma, Rel. Min. Néri da Silveira, 02-04-2002, v.u., DJ 17-05-2002, p. 73).

 

8.                Portanto, não merece abono a arguição de ofensa ao art. 5º da Constituição do Estado de São Paulo, adicionando que a matéria depende de lei e como a iniciativa legislativa reservada é excepcional demanda expressa previsão constitucional, não se presumindo.

9.                Todavia, a ação é procedente por outros fundamentos.

10.              O conceito de causa de pedir aberta inerente à sindicância objetiva de constitucionalidade de lei ou ato normativo (RTJ 200/91) torna possível o contraste da norma contestada com outros preceitos da Constituição Estadual.

11.              A Constituição do Estado de São Paulo tem as seguintes disposições que se aplicam ao caso em exame:

“Artigo 180 - No estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e os Municípios assegurarão: 

(...)

V - a observância das normas urbanísticas, de segurança, higiene e qualidade de vida; 

(...)

Artigo 181 - Lei municipal estabelecerá em conformidade com as diretrizes do plano diretor, normas sobre  zoneamento, loteamento, parcelamento, uso e ocupação do solo, índices urbanísticos, proteção ambiental e demais limitações administrativas pertinentes. 

§ 1º - Os planos diretores, obrigatórios a todos os Municípios, deverão considerar a totalidade de seu território municipal”.

 

12.              A lei local objurgada contém disciplina pontual e tópica do zoneamento urbano.

13.              É fato – e não prognose – decorrente diretamente do processo legislativo que a lei local de iniciativa parlamentar contém disposição isolada e desvinculada do planejamento urbano integral, o que vulnera a imperiosidade da relação de sua compatibilidade com o plano diretor, e sua integralidade, e as normas urbanísticas de uso, ocupação e parcelamento do solo urbano.

14.              A esse respeito, o Supremo Tribunal Federal entende possível o contencioso de constitucionalidade sem que se configure contraste entre a lei impugnada e o plano diretor, estimando desafio direto e frontal à Constituição:

“(...) Plausibilidade da alegação de que a Lei Complementar distrital 710/05, ao permitir a criação de projetos urbanísticos ‘de forma isolada e desvinculada’ do plano diretor, violou diretamente a Constituição Republicana. (...)” (STF, QO-MC-AC 2.383-DF, 2ª Turma, Rel. Min. Ayres Britto, 27-03-2012, v.u., 28-06-2012).

 

15.              Face ao exposto, opino pela procedência da ação para declarar a inconstitucionalidade da Lei n. 11.406, de 29 de novembro de 2013, do Município de São José do Rio Preto, com os arts. 180, V e 181, § 1º, da Constituição do Estado de São Paulo.

        

                  São Paulo, 22 de maio de 2014.

 

 

 

 

Nilo Spinola Salgado Filho

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

 

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