Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo nº 2066361-77.2014.8.26.0000

Requerente: Prefeita Municipal de Mirassol

Requerido: Presidente da Câmara Municipal de Mirassol

 

 

Ementa:

 

Constituição. Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei Municipal n. 3.619, de 10 de dezembro de 2013, do Município de Mirassol. Obrigação de instalação de piso tátil. Acessibilidade de pessoas portadoras de deficiência. Calçadas. Praças. Parques, Passeios Públicos e áreas de circulação. Iniciativa Parlamentar. Separação de poderes. Reserva de iniciativa legislativa. Reserva da Administração. Procedência da ação. 1. A iniciativa parlamentar de lei local que institui obrigação que gera ônus para a Administração é incompatível com o princípio da separação de poderes. 2. Violação das regras da separação de poderes e da reserva de administração. Criação de despesas sem fonte específica de receita (arts. 5º, 25, 24, § 2º, 2, 47, II, XIV, e XIX, a, e 174, III, da Constituição Estadual). 3. Parecer pela procedência da ação.

 

 

 

 

Colendo Órgão Especial

Senhor Desembargador Relator

 

Tratam estes autos de ação direta de inconstitucionalidade, tendo como alvo a Lei Municipal nº 3.619, de 10 de dezembro de 2013, do Município de Mirassol, de iniciativa parlamentar que “Dispõe sobre a instalação de piso tátil para demarcar obstáculos em áreas e localização da faixa de pedestre, visando a acessibilidade das pessoas portadoras de deficiências no Município de Mirassol”.

Sustenta o requerente que a lei é inconstitucional por apresentar vício de iniciativa, violar o princípio da separação de poderes e por criar despesas sem previsão de receita. Daí a alegação de violação dos arts. 5º, 25 e 47, II e XIV da Constituição Estatual.

A liminar foi deferida, para a suspensão da eficácia do ato normativo impugnado (fl. 22).

Citado regularmente (fl. 33), o Senhor Procurador-Geral do Estado declinou de realizar a defesa do ato normativo impugnado, afirmando tratar de matéria de interesse exclusivamente local (fls. 28/30).

Devidamente notificado (fl. 25), o Presidente da Câmara Municipal deixou transcorrer “in albis” o prazo legal para apresentar as informações.

Nestas condições vieram os autos para manifestação desta Procuradoria Geral de Justiça.

Procede o pedido.

DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO

A Lei Municipal nº 3.619, de 10 de dezembro de 2013, do Município de Mirassol, de iniciativa parlamentar, promulgada pelo Presidente da Câmara Municipal, após rejeição do veto do Executivo, tem a seguinte redação:

“(...)

Art. 1º Todo equipamento permanente a ser instalado em calçadas, parques, praças, passeios públicos e em outras áreas de circulação de pessoas, deverá ser circundado por piso tátil, sensível ao contato das pessoas portadoras de deficiências visuais.

§1º As calçadas também deverão ser demarcadas com piso tátil na área em que se encontra a faixa de pedestres.

§2º Ficam isentos da instalação em imóveis residenciais.

Art. 2º Os equipamentos ou obstáculos já instalados ou construídos deverão ser adaptados para cumprir o estabelecido no art. 1º, no prazo de até 180 (cento e oitenta) dias, contados a partir da publicação da presente Lei.

Art. 3º São considerados equipamentos permanentes, para os efeitos previstos nesta Lei, telefones públicos, hidrantes, lixeiras, caixas de correio, quadros de avisos, entradas e saídas de carros, bancos e mesas de praças ou quaisquer outros que constituem obstáculos ao livre trânsito de pedestres portadores de deficiências visuais.

Art. 4º Os pisos tátil ou direcional a ser instalados deverão obedecer as especificações técnicas da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT.

Art. 5º O Descumprimento das Normas desta Lei, incorrerão em multa de 01 (um) salário mínimo vigente e no caso de reincidência, 02 (dois) salários mínimos vigentes.

Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

(...)”

Em que pese a boa intenção que certamente animou a iniciativa parlamentar, o ato normativo impugnado revela-se invasivo da esfera da gestão administrativa, inerente à atividade típica do Poder Executivo.

Verifica-se que a lei impugnada, ao impor a obrigação de instalação de piso tátil em calçadas, praças públicas, parques, passeios públicos, etc, acabou por impor ao executivo local, sob pena de aplicação de multa, a obrigação de realizar tais adequações, pois se trata, à evidência, de bens públicos de uso comum.

A inconstitucionalidade decorre da iniciativa parlamentar, agressiva da separação de poderes, porque seu objeto é típico ato de administração ordinária, reservado exclusivamente ao Poder Executivo e imune da interferência do Poder Legislativo, como se capta dos arts. 5º e 47, II, XIV e XIX, a, da Constituição Estadual.

Postulado básico da organização do Estado é o princípio da separação dos poderes, constante do art. 5º da Constituição do Estado de São Paulo, norma de observância obrigatória nos Municípios conforme estabelece o art. 144 da mesma Carta Estadual. Este dispositivo é tradicional pedra fundamental do Estado de Direito assentado na ideia de que as funções estatais são divididas e entregues a órgãos ou poderes que as exercem com independência e harmonia, vedando interferências indevidas de um sobre o outro.

A Constituição Estadual, perfilhando as diretrizes da Constituição Federal, comete a um Poder competências próprias, insuscetíveis de invasão por outro. Assim, ao Poder Executivo são outorgadas atribuições típicas e ordinárias da função administrativa. Em essência, a separação ou divisão de poderes:

“consiste um confiar cada uma das funções governamentais (legislativa, executiva e jurisdicional) a órgãos diferentes (...) A divisão de Poderes fundamenta-se, pois, em dois elementos: (a) especialização funcional, significando que cada órgão é especializado no exercício de uma função (...); (b) independência orgânica, significando que, além da especialização funcional, é necessário que cada órgão seja efetivamente independente dos outros, o que postula ausência de meios de subordinação” (José Afonso da Silva. Comentário contextual à Constituição, São Paulo: Malheiros, 2006, 2ª ed., p. 44).

Se, em princípio, a competência normativa é do domínio do Poder Legislativo, certas matérias por caracterizarem assuntos de natureza eminentemente administrativa são reservadas ao Poder Executivo (arts. 47, II, XIV e XIX, a, da Constituição Estadual) em espaço que é denominado reserva da Administração. Neste sentido, enuncia a jurisprudência:

“RESERVA DE ADMINISTRAÇÃO E SEPARAÇÃO DE PODERES. - O princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. (...)” (STF, ADI-MC 2.364-AL, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 01-08-2001, DJ 14-12-2001, p. 23).

No caso, foi violada a reserva da Administração Pública, pois, compete ao Poder Executivo o exercício de sua direção superior, a prática de atos de administração típica e ordinária, a edição de normas e a disciplina de sua organização e de seu funcionamento, imune a qualquer ingerência do Poder Legislativo (art. 47, II, XIV e XIX, a, da Constituição Estadual).

Embora elogiável a preocupação do Legislativo local, a iniciativa não tem como prosperar na ordem constitucional vigente, uma vez que a norma disciplina atos que são próprios da função executiva.

Releva notar que ainda que a matéria não poderia ser objeto de iniciativa parlamentar.

Em se tratando de processo legislativo, é princípio que as normas do modelo federal são aplicáveis e extensíveis por simetria às demais órbitas federativas. Neste sentido pronuncia a jurisprudência:

“as regras do processo legislativo federal, especialmente as que dizem respeito à iniciativa reservada, são normas de observância obrigatória pelos Estados-membros” (STF, ADI 2.719-1-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 20-03-2003, v.u.).

“(...) I. - As regras básicas do processo legislativo federal são de observância obrigatória pelos Estados-membros e Municípios. (...)” (STF, ADI 2.731-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 02-03-2003, v.u., DJ 25-04-2003, p. 33).

“(...) 2. A Constituição do Brasil, ao conferir aos Estados-membros a capacidade de auto-organização e de autogoverno - artigo 25, caput -, impõe a obrigatória observância de vários princípios, entre os quais o pertinente ao processo legislativo. O legislador estadual não pode usurpar a iniciativa legislativa do Chefe do Executivo, dispondo sobre as matérias reservadas a essa iniciativa privativa. (...)” (STF, ADI 1.594-RN, Tribunal Pleno, Rel. Min. Eros Grau, 04-06-2008, v.u., DJe 22-08-2008).

“(...) I. - A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que as regras básicas do processo legislativo da Constituição Federal, entre as quais as que estabelecem reserva de iniciativa legislativa, são de observância obrigatória pelos estados-membros. (...)” (RT 850/180).

“(...) 1. A Constituição do Brasil, ao conferir aos Estados-membros a capacidade de auto-organização e de autogoverno (artigo 25, caput), impõe a obrigatória observância de vários princípios, entre os quais o pertinente ao processo legislativo, de modo que o legislador estadual não pode validamente dispor sobre as matérias reservadas à iniciativa privativa do Chefe do Executivo. (...)” (RTJ 193/832).

Decorre do mencionado princípio da separação de poderes, e à vista dos mecanismos de controle recíprocos de um sobre o outro para evitar abusos e disfunções, a participação do Poder Executivo no processo legislativo. Como observa a doutrina:

“É a esse arranjo, mediante o qual, pela distribuição de competências, pela participação parcial de certos órgãos estatais controlam-se e limitam-se reciprocamente, que os ingleses denominavam, já anteriormente a Montesquieu, sistema de ‘freios recíprocos’, ‘controles recíprocos’, ‘reservas’, ‘freios e contrapesos’ (checks and controls, checks and balances), tudo isso visando um verdadeiro ‘equilíbrio dos poderes’ (equilibrium of powers)” (J. H. Meirelles Teixeira. Curso de Direito Constitucional, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991, pp. 581, 592-593).

A reserva de iniciativa legislativa se inclui nestes mecanismos, em especial para organização e funcionamento da Administração (entidades e órgãos do Poder Executivo), e outorga de respectivas atribuições, quando houver criação ou extinção de órgãos públicos ou aumento de despesa, segundo se colhe da leitura conjugada dos arts. 24, § 2º, 2 e 47, XIX, a, da Constituição do Estado. Neste sentido:

“É indispensável a iniciativa do Chefe do Poder Executivo (mediante projeto de lei ou mesmo, após a EC 32/01, por meio de decreto) na elaboração de normas que de alguma forma remodelem as atribuições de órgão pertencente à estrutura administrativa de determinada unidade da Federação” (STF, ADI 3.254-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 16-11-2005, v.u., DJ 02-12-2005, p. 02).

“À luz do princípio da simetria, são de iniciativa do Chefe do Poder Executivo estadual as leis que versem sobre a organização administrativa do Estado, podendo a questão referente à organização e funcionamento da Administração Estadual, quando não importar aumento de despesa, ser regulamentada por meio de Decreto do Chefe do Poder Executivo (art. 61, § 1º, II, e e art. 84, VI, a da Constituição federal)” (STF, ADI 2.857-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 30-08-2007, v.u., DJe 30-11-2007).

É inegável que a obrigação de instalação de piso tátil em bens públicos de uso comum, como calçadas, praças, parques e passeios públicos, em razão de barreiras permanentes, como telefone público, lixeiras, ou mesmo para indicação de faixa de pedestres, implica sobrecarga de ônus financeiro, o que demandaria a observância da iniciativa legislativa reservada do Chefe do Poder Executivo.

Lei de iniciativa parlamentar que cria ou fornece atribuição ao Poder Executivo ou seus órgãos, demandando diretamente a realização de despesa pública, não prevista no orçamento, para atendimento de novos encargos, com ou sem indicação de sua fonte de cobertura, inclusive para os exercícios seguintes, padece também de inconstitucionalidade por incompatibilidade com os arts. 25 e 174, III, da Constituição Estadual, seja porque aquele exige a indicação de recursos para atendimento das novas despesas, seja porque este reserva ao Chefe do Poder Executivo iniciativa legislativa sobre o orçamento anual, conforme pronuncia o Supremo Tribunal Federal:

“Ação direta de inconstitucionalidade. 2. Lei do Estado do Amapá. 3. Organização, estrutura e atribuições de Secretaria Estadual. Matéria de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo. Precedentes. 4. Exigência de consignação de dotação orçamentária para execução da lei. Matéria de iniciativa do Poder Executivo. Precedentes. 5. Ação julgada procedente” (LEXSTF v. 29, n. 341, p. 35).

“Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Lei do Estado do Rio Grande do Sul. Instituição do Pólo Estadual da Música Erudita. 3. Estrutura e atribuições de órgãos e Secretarias da Administração Pública. 4. Matéria de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo. 5. Precedentes. 6. Exigência de consignação de dotação orçamentária para execução da lei. 7. Matéria de iniciativa do Poder Executivo. 8. Ação julgada procedente” (LEXSTF v. 29, n. 338, p. 46).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 10.238/94 DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. INSTITUIÇÃO DO PROGRAMA ESTADUAL DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA, DESTINADO AOS MUNICÍPIOS. CRIAÇÃO DE UM CONSELHO PARA ADMIUNISTRAR O PROGRAMA. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 61, § 1º, INCISO II, ALÍNEA ‘E’, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. Vício de iniciativa, vez que o projeto de lei foi apresentado por um parlamentar, embora trate de matéria típica de Administração. 2. O texto normativo criou novo órgão na Administração Pública estadual, o Conselho de Administração, composto, entre outros, por dois Secretários de Estado, além de acarretar ônus para o Estado-membro. Afronta ao disposto no artigo 61, § 1º, inciso II, alínea ‘e’ da Constituição do Brasil. 3. O texto normativo, ao cercear a iniciativa para a elaboração da lei orçamentária, colide com o disposto no artigo 165, inciso III, da Constituição de 1988. 4. A declaração de inconstitucionalidade dos artigos 2º e 3º da lei atacada implica seu esvaziamento. A declaração de inconstitucionalidade dos seus demais preceitos dá-se por arrastamento. 5. Pedido julgado procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei n. 10.238/94 do Estado do Rio Grande do Sul” (RTJ 200/1065).

Ademais, a Lei Federal n. 10.098, de 19 de dezembro de 2000, fixa normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação, dispondo que:

“Art. 1o Esta Lei estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, mediante a supressão de barreiras e de obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação.

Art. 2o Para os fins desta Lei são estabelecidas as seguintes definições:

I – acessibilidade: possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos transportes e dos sistemas e meios de comunicação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida;

II – barreiras: qualquer entrave ou obstáculo que limite ou impeça o acesso, a liberdade de movimento e a circulação com segurança das pessoas, classificadas em:

a) barreiras arquitetônicas urbanísticas: as existentes nas vias públicas e nos espaços de uso público;

b) barreiras arquitetônicas na edificação: as existentes no interior dos edifícios públicos e privados;

c) barreiras arquitetônicas nos transportes: as existentes nos meios de transportes;

d) barreiras nas comunicações: qualquer entrave ou obstáculo que dificulte ou impossibilite a expressão ou o recebimento de mensagens por intermédio dos meios ou sistemas de comunicação, sejam ou não de massa;

III – pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida: a que temporária ou permanentemente tem limitada sua capacidade de relacionar-se com o meio e de utilizá-lo;

IV – elemento da urbanização: qualquer componente das obras de urbanização, tais como os referentes a pavimentação, saneamento, encanamentos para esgotos, distribuição de energia elétrica, iluminação pública, abastecimento e distribuição de água, paisagismo e os que materializam as indicações do planejamento urbanístico;

V – mobiliário urbano: o conjunto de objetos existentes nas vias e espaços públicos, superpostos ou adicionados aos elementos da urbanização ou da edificação, de forma que sua modificação ou traslado não provoque alterações substanciais nestes elementos, tais como semáforos, postes de sinalização e similares, cabines telefônicas, fontes públicas, lixeiras, toldos, marquises, quiosques e quaisquer outros de natureza análoga;

VI – ajuda técnica: qualquer elemento que facilite a autonomia pessoal ou possibilite o acesso e o uso de meio físico.

Art. 3o O planejamento e a urbanização das vias públicas, dos parques e dos demais espaços de uso público deverão ser concebidos e executados de forma a torná-los acessíveis para as pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.

Art. 4o As vias públicas, os parques e os demais espaços de uso público existentes, assim como as respectivas instalações de serviços e mobiliários urbanos deverão ser adaptados, obedecendo-se ordem de prioridade que vise à maior eficiência das modificações, no sentido de promover mais ampla acessibilidade às pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida.

Parágrafo único.  Os parques de diversões, públicos e privados, devem adaptar, no mínimo, 5% (cinco por cento) de cada brinquedo e equipamento e identificá-lo para possibilitar sua utilização por pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, tanto quanto tecnicamente possível. (Incluído pela Lei nº 11.982, de 2009)

Art. 5o O projeto e o traçado dos elementos de urbanização públicos e privados de uso comunitário, nestes compreendidos os itinerários e as passagens de pedestres, os percursos de entrada e de saída de veículos, as escadas e rampas, deverão observar os parâmetros estabelecidos pelas normas técnicas de acessibilidade da Associação Brasileira de Normas Técnicas – ABNT.

 

A referida Lei 10.098/2000 foi regulamentada pelo Decreto n. 5296/2004, valendo transcrever, ao que interessa a esta ação, o seguinte:

“Art. 14.  Na promoção da acessibilidade, serão observadas as regras gerais previstas neste Decreto, complementadas pelas normas técnicas de acessibilidade da ABNT e pelas disposições contidas na legislação dos Estados, Municípios e do Distrito Federal.

        Art. 15.  No planejamento e na urbanização das vias, praças, dos logradouros, parques e demais espaços de uso público, deverão ser cumpridas as exigências dispostas nas normas técnicas de acessibilidade da ABNT.

        § 1o Incluem-se na condição estabelecida no caput:

        I - a construção de calçadas para circulação de pedestres ou a adaptação de situações consolidadas;

        II - o rebaixamento de calçadas com rampa acessível ou elevação da via para travessia de pedestre em nível; e

        III - a instalação de piso tátil direcional e de alerta.

        § 2o  Nos casos de adaptação de bens culturais imóveis e de intervenção para regularização urbanística em áreas de assentamentos subnormais, será admitida, em caráter excepcional, faixa de largura menor que o estabelecido nas normas técnicas citadas no caput, desde que haja justificativa baseada em estudo técnico e que o acesso seja viabilizado de outra forma, garantida a melhor técnica possível.

        Art. 16.  As características do desenho e a instalação do mobiliário urbano devem garantir a aproximação segura e o uso por pessoa portadora de deficiência visual, mental ou auditiva, a aproximação e o alcance visual e manual para as pessoas portadoras de deficiência física, em especial aquelas em cadeira de rodas, e a circulação livre de barreiras, atendendo às condições estabelecidas nas normas técnicas de acessibilidade da ABNT.

        § 1o Incluem-se nas condições estabelecida no caput:

        I - as marquises, os toldos, elementos de sinalização, luminosos e outros elementos que tenham sua projeção sobre a faixa de circulação de pedestres;

        II - as cabines telefônicas e os terminais de auto-atendimento de produtos e serviços;

        III - os telefones públicos sem cabine;

        IV - a instalação das aberturas, das botoeiras, dos comandos e outros sistemas de acionamento do mobiliário urbano;

        V - os demais elementos do mobiliário urbano;

        VI - o uso do solo urbano para posteamento; e

        VII - as espécies vegetais que tenham sua projeção sobre a faixa de circulação de pedestres.”

 

Importante frisar que, além da violação ao princípio da separação dos poderes, a norma impugnada, ao isentar os imóveis residenciais do cumprimento da obrigação (art. 1º, § 2º,) violou o princípio da razoabilidade (art. 111, “caput”, da CE/89), bem como criou exceção não contemplada na Lei Federal n. 10.098/00, não evidenciada por peculiaridade de interesse local (art. 30, I e II, da CF) usurpando, assim, a competência legislativa da União e dos Estados (art. 24, inciso XIV, da CF).

Diante do exposto, opino pela procedência da ação para declarar a incompatibilidade da Lei Municipal nº 3.619, de 10 de dezembro de 2013, do Município de Mirassol, com os arts. 5º, 25, 24, § 2º, 2, 47, II, XIV, e XIX, a, e 174, III, da Constituição Estadual.

 

              São Paulo, 11 de setembro de 2014.

 

Nilo Spinola Salgado Filho

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

 

aaamj/mi