Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo nº 2230288-25.2014.8.26.0000

Requerente: Prefeito do Município de Ribeirão Preto

Requerido: Presidente da Câmara Municipal de Ribeirão Preto

 

 

 

Ementa:

1)      Ação direta de inconstitucionalidade. Lei n. 13.137, de 29 de outubro de 2013, do Município de Ribeirão Preto, de iniciativa parlamentar, que “Estabelece que os veículos automotores pertencentes ao Município ou a serviço do município deverão ser licenciados e/ou emplacados na 15ª CIRETRAN de Ribeirão Preto”.

2)      Inconstitucionalidade do ato normativo. Violação aos princípios da impessoalidade, isonomia e exigência de licitação. (Contrariedade aos artigos 5º, 111 e 117 da CE/89).

3)      Atendendo-se ao conceito de causa de pedir aberta inerente ao contencioso de constitucionalidade, tornando admissível a sindicância da lei impugnada com os demais preceitos da CE/89, ao tratar sobre gestão administrativa relacionada a órgão estadual, resulta, ainda, sua incompatibilidade com o princípio da separação dos poderes, à reserva da administração e ao princípio federativo.

4)      Matéria tipicamente administrativa. Iniciativa parlamentar. Invasão da esfera da gestão administrativa, reservada ao Poder Executivo (arts. 5º, 47, II e XIV, e 144 da Constituição do Estado).  

5)      Violação do princípio federativo. Lei Municipal que cuida de regular aspecto da atividade de órgão estadual (CIRETRAN – Circunscrição Regional de Trânsito), desrespeitando, portanto, a autonomia do ente federativo (arts. 1º e 144 da Constituição Paulista).

 

Colendo Órgão Especial,

Senhor Desembargador Relator:

 

         Tratam estes autos de ação direta de inconstitucionalidade, tendo como alvo a Lei n. 13.137, de 29 de outubro de 2013, do Município de Ribeirão Preto, de iniciativa parlamentar, que “Estabelece que os veículos automotores pertencentes ao Município ou a serviço do Município deverão ser licenciados e/ou emplacados na 15ª CIRETRAN de Ribeirão Preto”.

         Em linhas gerais, sustenta a requerente que as expressões “... ou a serviço do Município” (art. 1º) e “... e aos veículos de empresas de prestação de serviços terceirizados ou não, a serviço do Município...” (art. 2º), bem ainda que o inciso II, do art. 3º, todos da Lei Municipal n. 13.137, de 29 de outubro de 2013, de Ribeirão Preto, seriam inconstitucionais por afrontarem, especialmente, os preceitos constitucionais da isonomia, impessoalidade e exigência de licitação. Daí, a afirmação de violação dos arts. 4º, 111, 117 e 144 da Constituição Estadual. 

         Citado regularmente, o Procurador Geral do Estado declinou de realizar a defesa do ato normativo impugnado, afirmando tratar-se de matéria de interesse exclusivamente local (fls. 35/37).

         A Câmara Municipal de Ribeirão Preto prestou informações às fls. 39/41, defendendo a validade do ato normativo objurgado.

         Nestas condições, vieram os autos para manifestação desta Procuradoria-Geral de Justiça.

         É o relatório.

         A Lei n. 13.137, de 29 de outubro de 2013, do Município de Ribeirão Preto, de iniciativa parlamentar, tem a seguinte redação:

Lei nº 13.137, de 29 de outubro de 2013

Estabelece que os veículos automotores pertencentes ao Município ou a serviço do Município deverão ser licenciados e/ou emplacados na 15ª CIRETRAN de Ribeirão Preto.

Art. 1º - Fica estabelecido que os veículos automotores, pertencentes ao Município ou a serviço do Município deverão ser licenciados e/ou emplacados na 15ª CIRETRAN de Ribeirão Preto.

Art. 2º - O disposto no artigo 1º desta lei se aplica aos veículos dos órgãos e secretarias da administração direta e indireta e aos veículos de empresas de prestação de serviços terceirizados ou não, a serviço do Município.

Art. 3º. Aos infratores da presente lei serão aplicadas as seguintes penalidades:

I – Agente Político ou Servidor Municipal: as sanções aplicáveis à espécie previstas no Decreto-Lei nº 201, de 27 de fevereiro de 1967.

II – Empresa a serviço do Município: multa no valor de dois salários mínimos por veículo não licenciado e/ou emplacado, sem prejuízo da rescisão do respectivo contrato de prestação de serviços;

Art. - O Poder Executivo definirá através de Decreto, o Órgão competente para proceder à fiscalização e demais imposições de que tratam essa lei.

Art. - Esta lei entrará em vigor na nata de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.” (sic)

         O ato normativo impugnado, de iniciativa parlamentar, é verticalmente incompatível com nosso ordenamento constitucional por violar os princípios da isonomia, impessoalidade e exigência de licitação, bem como ao princípio federativo e o da separação de poderes, previstos nos arts. 1º, 5º, 111, 117 e 47, II e XIV, da Constituição Estadual.

         Referidos dispositivos são aplicáveis aos Municípios por força do art. 144 da Carta Paulista, e dispõem o seguinte:

“(...)

Art. 1º - O Estado de São Paulo, integrante da República Federativa do Brasil, exerce as competências que não lhe são vedadas pela Constituição Federal.

(...)

Art. 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

(...)

Art. 47 – Compete privativamente ao Governador, além de outras atribuições previstas nesta Constituição:

(...)

II – exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção superior da administração estadual;

(...)

XIV – praticar os demais atos de administração, nos limites da competência do Executivo;

(...)

Art. 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Art. 117 - Ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Parágrafo único - É vedada à administração pública direta e indireta, inclusive fundações instituídas ou mantidas pelo Poder Público, a contratação de serviços e obras de empresas que não atendam às normas relativas à saúde e segurança no trabalho.

(...)

Art. 144 – Os Municípios, com autonomia, política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

(...)”

         Note-se, inicialmente, que ao prever que os veículos do Município ou utilizados a seu serviço devem ser licenciados e/ou emplacados no CIRETRAN – Circunscrição Regional de Trânsito, o Poder Legislativo Municipal pretende regrar atividade que está inserida na esfera da gestão executiva.

         Isso porque a matéria nela disciplinada encontra-se no âmbito da atividade administrativa do município, cuja organização, funcionamento e direção superior cabe ao Prefeito Municipal, com auxílio dos Secretários Municipais.

         A questão referente ao licenciamento e emplacamento de veículos automotores, pertencentes ao Município ou utilizados na prestação de seus serviços, consiste em matéria exclusivamente relacionada à Administração Pública, a cargo de Chefe do Executivo.

         Trata-se de atividade nitidamente administrativa, representativa de atos de gestão, privativa do Poder Executivo e inserida na esfera de seu poder discricionário.

         Não se trata, evidentemente, de atividade sujeita à iniciativa legislativa do Poder Legislativo. Logo, este não pode, através de lei, ocupar-se da administração, sob pena de se permitir que o legislador atue invadindo área privativa do Poder Executivo.

         Quando o Poder Legislativo do Município edita lei disciplinando atuação administrativa, como ocorre, no caso em exame, invade, indevidamente, esfera que é própria da atividade do administrador público, violando o princípio da separação de poderes.

         Cabe essencialmente à Administração Pública, e não ao legislador deliberar a respeito do tema, sendo vedada a intromissão de qualquer outro poder.

         A inconstitucionalidade, portanto, decorre da violação da regra da separação de poderes, prevista na Constituição Paulista e aplicável aos Municípios (arts. 5º, 47, II e XIV, e 144).

         É pacífico na doutrina, bem como na jurisprudência, que ao Poder Executivo cabe primordialmente a função de administrar, que se revela em atos de planejamento, organização, direção e execução de atividades inerentes ao Poder Público. De outro lado, ao Poder Legislativo, de forma primacial, cabe a função de editar leis, ou seja, atos normativos revestidos de generalidade e abstração.

         Abstraindo quanto aos motivos que podem ter levado a tal solução legislativa, ela se apresenta como manifestamente inconstitucional, por interferir na realização, em certa medida, da gestão administrativa do Município.

         Cumpre recordar aqui o ensinamento de Hely Lopes Meirelles, anotando que “a Prefeitura não pode legislar, como a Câmara não pode administrar. (...) O Legislativo edita normas; o Executivo pratica atos segundo as normas. Nesta sinergia de funções é que residem a harmonia e independência dos Poderes, princípio constitucional (art.2º) extensivo ao governo local. Qualquer atividade, da Prefeitura ou Câmara, realizada com usurpação de funções é nula e inoperante”.

         Sintetiza, ademais, que “todo ato do Prefeito que infringir prerrogativa da Câmara – como também toda deliberação da Câmara que invadir ou retirar atribuição da Prefeitura ou do Prefeito – é nulo, por ofensivo ao princípio da separação de funções dos órgãos do governo local (CF, art. 2º c/c o art. 31), podendo ser invalidado pelo Poder Judiciário” (Direito municipal brasileiro, 15. ed., atualizada por Márcio Schneider Reis e Edgard Neves da Silva, São Paulo, Malheiros, 2006, p. 708 e 712).

         Deste modo, quando a pretexto de legislar, o Poder Legislativo administra, editando leis que equivalem na prática a verdadeiros atos de administração, viola a harmonia e independência que devem existir entre os poderes estatais.

         A matéria tratada na lei encontra-se na órbita da chamada reserva da administração, que reúne as competências próprias de administração e gestão, imunes a interferência de outro poder (art. 47, II e XIV da Constituição Estadual - aplicável na órbita municipal por obra de seu art. 144), pois privativas do Chefe do Poder Executivo.

         Ainda que se imagine que houvesse necessidade de disciplinar por lei alguma matéria típica de gestão municipal, a iniciativa seria privativa do Chefe do Poder Executivo, mesmo quando ele não possa discipliná-la por decreto nos termos do art. 47, XIX, da Constituição Estadual.  

         Assim, a Lei, ao regulamentar matéria atinente à gestão pública, ainda que parcialmente, viola os arts. 5º e 47, II e XIV, da Constituição Estadual, no estabelecimento de regras que respeitam à direção da administração, à organização e ao funcionamento do Poder Executivo, matéria essa que é de alçada da reserva da Administração.

         A inconstitucionalidade transparece exatamente pelo divórcio da iniciativa parlamentar da lei local com os preceitos mencionados da Constituição Estadual.     

         Mas não é só.

         O CIRETRAN (Circunscrição Regional de Trânsito) é unidade administrativa vinculada ao Governo do Estado e, mais especificamente, ao DETRAN (Departamento Estadual de Trânsito).

         Assim, ao editar a lei em questão, o legislador municipal pretende regular a prestação de um serviço a cargo do Estado, o que não é possível, sem que se reconheça a evidente violação do princípio federativo, aplicável aos Municípios por força dos artigos 1º e 144 da Constituição Paulista.

         Note-se: o art. 1º da Constituição Paulista, como não poderia deixar de ser, assenta a incidência do princípio federativo no âmbito do Estado de São Paulo.

         No regime federativo, as entidades federadas (União, Distrito Federal, Estados e Municípios) têm autonomia política e administrativa, exercendo competências próprias.

         Não é possível, portanto, que um ente federativo, fora de sua própria esfera de competência, pretenda regular, através de lei, serviço cuja prestação se insere na competência de outro ente federativo.

         A relevância do princípio federativo é essencial, visto tratar-se de uma das escolhas fundamentais do legislador constituinte, o que se qualifica como princípio estabelecido, cuja inobservância deve ser objeto de reconhecimento e declaração em sede de ação direta de inconstitucionalidade.

O Col. STF já afirmou que a invasão da esfera de competência de um ente federativo por outro configura violação ao princípio federativo e, consequentemente, ofensa à Constituição.

Confira-se precedente que, mutatis mutandis, aplica-se à hipótese em exame:

“(...)

Na espécie, cuida-se da autonomia do Estado, base do princípio federativo amparado pela Constituição, inclusive como cláusula pétrea (art. 60, § 4º, I). Na forma da jurisprudência desta Corte, se a majoração da despesa pública estadual ou municipal, com a retribuição dos seus servidores, fica submetida a procedimentos, índices ou atos administrativos de natureza federal, a ofensa à autonomia do ente federado está configurada (RE 145.018/RJ, Rel. Min. Moreira Alves; Rp 1426/RS, Rel. Min. Néri da Silveira; AO 258/SC, Rel. Min. Ilmar Galvão, entre outros). (ADPF 33-MC, voto do Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 29-10-2003, Segunda Turma, DJ de 6-8-2004.)

(...)”

         Vale mencionar que, referindo-se aos princípios fundamentais da Constituição, os quais revelam as opções políticas essenciais do Estado, José Afonso da Silva aponta que entre eles podem ser inseridos, “os princípios relativos à existência, forma, estrutura e tipo de Estado: República Federativa do Brasil, soberania, Estado Democrático de Direito (art. 1º)” (Curso de direito constitucional positivo, 13ªed., ed., São Paulo, Malheiros, 1997, p.96, g.n.).

         Um dos aspectos de maior relevo, e que representa a dimensão e alcance do princípio do pacto federativo, adotado pelo Constituinte em 1988, é justamente o que se assenta nos critérios adotados pela Constituição Federal para a repartição de competências entre os entes federativos, bem como a fixação da autonomia, e dos respectivos limites, dos Estados, Distrito Federal, e Municípios, em relação à União.

         Anota a propósito Fernanda Dias Menezes de Almeida que “avulta, portanto, sob esse ângulo, a importância da repartição de competências, já que a decisão tomada a respeito é que condiciona a feição do Estado Federal, determinando maior ou menor grau de descentralização.” Daí a afirmação de doutrinadores no sentido de que a repartição de competências é “’a chave da estrutura do poder federal’, ‘o elemento essencial da construção federal’, ‘a grande questão do federalismo’, ‘o problema típico do Estado Federal’” (Competências na Constituição Federal de 1988, 4ª ed., São Paulo, Atlas, 2007, p.19/20).

         A preservação do princípio federativo tem contado com a anuência do C. STF, pois como destacado em julgado relatado pelo Min. Celso de Mello:

"(...) a idéia de Federação — que tem, na autonomia dos Estados-membros, um de seus cornerstones — revela-se elemento cujo sentido de fundamentalidade a torna imune, em sede de revisão constitucional, à própria ação reformadora do Congresso Nacional, por representar categoria política inalcançável, até mesmo, pelo exercício do poder constituinte derivado (CF, art. 60, § 4º, I)." (HC 80.511, voto do Min. Celso de Mello, julgamento em 21-8-01, DJ de 14-9-01).

         Por essa linha de raciocínio, pode-se também afirmar que a Lei Municipal que regula matéria cuja competência é do legislador estadual está, ao desrespeitar a repartição constitucional de competências, a violar o princípio federativo.

         A prescrição de que os Municípios devem observar os princípios constitucionais estabelecidos não se encontra apenas no art. 144 da Constituição Paulista. A art. 29 caput da CR/88 prevê que “O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado, e os seguintes preceitos (g.n.).”

         Relevante anotar que quando do julgamento da ADI 130.227.0/0-00 em 21.08.07, rel. des. Renato Nalini, esse E. Tribunal de Justiça acolheu a tese no sentido da possibilidade de declaração de inconstitucionalidade de lei municipal por violação do princípio da repartição de competências estabelecido pela Constituição Federal. É relevante trazer excerto de voto do i. Desembargador Walter de Almeida Guilherme, imprescindível para a elucidação da questão:

“(...) Ora, um dos princípios da Constituição Federal – e de capital importância – é o princípio federativo, que se expressa, no Título I, denominado ‘Dos Princípios Fundamentais’, logo no art.1º: ‘A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito...’.

Sendo a organização federativa do Estado brasileiro um princípio fundamental da República do Brasil, e constituindo elemento essencial dessa forma de estado a distribuição de competência legislativa dos entes federados, inescapável a conclusão de ser essa discriminação de competência um princípio estabelecido na Constituição Federal.

Assim, quando o referido art. 144 ordena que os Municípios, ao se organizarem, devem atender os princípios da Constituição Federal, fica claro que se estes editam lei municipal fora dos parâmetros de sua competência legislativa, não estão obedecendo ao princípio federativo, e, pois, afrontando estão o art. 144 da Constituição do Estado (...)” (trecho do voto do i. des. Walter de Almeida Guilherme, no julgamento da ADI 130.227.0/0-00).

Por fim, tendo em vista que as empresas que não licenciarem ou emplacarem seus veículos nos termos da Lei n. 13.137, de 29 de outubro de 2013, do Município de Ribeirão Preto, terão seus contratos rescindidos e não poderão concorrer às licitações públicas - posto que, para tanto, devem preencher a referida exigência - o diploma normativo notadamente violou os princípios da igualdade (art. 5º, “caput”, da CF/88) da impessoalidade (artigos 111 da CE/89 e 37, “caput”, da CF/88), bem como a regra da licitação (artigo 117 da CE/89 e 37, XXI, da CF/88).

A lei local não se alinha com os princípios da isonomia, da impessoalidade e da exigência de licitação, responsável por garantir à administração a melhor proposta, pois, primeiro, prevê como penalidade por descumprimento da lei a rescisão do respectivo contrato de prestação de serviços, segundo, porque as empresas que não cumprirem as determinações do diploma normativo objurgado não poderão prestá-los e, notadamente, ficarão impedidas de participar de procedimento licitatório.

Nesse sentido, o art. 117 da Constituição Estadual, reprodutor do inciso XXI do art. 37 da Constituição Federal, impõe a obrigatoriedade de licitação em qualquer modo ou forma de alienação de bens públicos – preceito aplicável aos Municípios por obra dos arts. 144 da Constituição Estadual – e que, em última análise, decorre dos princípios da igualdade (artigo 5º, “caput”, da CF/88) e da impessoalidade (art. 111 da Constituição Paulista e 37, “caput”, da CF/88).

A Constituição Paulista repete tais preceitos, em seu artigo 111 e 117, acima transcritos.

Esse entendimento já foi prestigiado pelo Col. Órgão Especial quando do julgamento da ADI 170.820.9/0-00, Rel. Aloísio de Toledo César, j. 6.5.2009, com a seguinte ementa:

“(...)

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Lei Municipal n. 2.051/97, de Salto, que autoriza a concessão de uso de prédio municipal para instituição de ensino privado com fins lucrativos – Inconstitucionalidade reconhecida. Ao reger matéria tipicamente administrativa, a Câmara Municipal de Salto excluiu de forma peremptória a discricionariedade da Administração, sendo inconstitucional, por ofensa ao princípio da separação de poderes, inserto no art. 5º da Constituição do Estado de São Paulo, e que, por força do art. 144 daquele mesmo texto constitucional, os Municípios estão obrigados a observar – Inaceitável a criação de caso de dispensa de licitação não prevista na Lei 8666/93, infringindo os princípios da impessoalidade e da licitação, esculpidos nos arts. 111 e 117 da Constituição do Estado de São Paulo. Ação julgada procedente.

(...)”

Do mesmo modo, quando do julgamento da ADI 168.129-0/5-00, Rel. Des. José Reynaldo, j. 4.3.2009, assim ementado:

“(...)

Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Municipal autorizando a cessão gratuita de bem público municipal, com isenção de tarifa de bem público municipal, com isenção de tarifa de água e esgoto, a empresa com fins lucrativos, para ser utilizado para prática desportiva. Duvidoso o interesse público na cessão e insuperável a necessidade de prévio procedimento licitatório. Quebra dos princípios da moralidade, razoabilidade e impessoalidade. Ofensa aos artigos 111 e 117 da Constituição do Estado de São Paulo, aplicável aos Municípios por força do artigo 144 do mesmo diploma. Inconstitucionalidade reconhecida. Ação procedente.”

         Ao avaliar, pois, o que dispõe a Constituição Federal e a Constituição do Estado de São Paulo, conclui-se que o diploma normativo que viole os princípios da isonomia, impessoalidade e da exigência de licitação, conforme acima pormenorizado, deve ter sua inconstitucionalidade decretada.

         Diante do exposto, considerando que a íntegra do diploma normativo objurgado ofende a Constituição Estadual, em especial, os artigos 1º, 5º, 47, II e XIV, 111, 117 e 144, requer seja declarada a inconstitucionalidade da Lei n. 13.137, de 29 de outubro de 2013, do Município de Ribeirão Preto, e não apenas das expressões constantes do pedido do autor.

              São Paulo, 11 de março de 2015.

 

Nilo Spinola Salgado Filho

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

 

ef/mjap