Protocolado nº. 20.461/11

Interessados: Vereador E. N. e 10º Promotor de Justiça de Araçatuba

Objeto: Lei nº 7.339, de 17 de janeiro de 2011, do Município de Araçatuba

 

Ementa: 1) Representação pelo ajuizamento de ADIN da Lei nº 7.339/2011, do Município de Araçatuba, que destina verba honorária a Procuradores Municipais investidos no cargo, ao Procurador Geral do Município, aos Diretores do Departamento Jurídico, ao Chefe de Gabinete da Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos e ao Secretário Municipal de Assuntos Jurídicos, desde que estejam regularmente inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil. Alegação de contrariedade com o art. 4º da Lei Federal nº 9527/97, arts. 125, § 2º e 129, IV, da Constituição Federal, e arts. 74, VI e 90 da Constituição do Estado. Parâmetros de controle que não se prestam à representação por inconstitucionalidade perante o Tribunal de Justiça. 2) Outra representação relativa à mesma lei, porém restrita ao art. 1º, acerca da inconstitucionalidade desse dispositivo, por haver deixado de prever o limite máximo de percepção da verba honorária. Alegação de afronta aos arts. 111; 115, XII e XV, 144 e 297 da Constituição Paulista. Tribunal que não pode atuar como legislador positivo, para, julgando a demanda, incluir regra não prevista pelo legislador. Caso em que descabe cogitar da “interpretação conforme” porque a suposta lacuna legislativa se colmata com regra extraída diretamente da Constituição, que, aliás, está sendo rigorosamente obedecida pelo Município. Arquivamento da representação.

Trata-se de representação, formulada por Vereador, pelo ajuizamento de ADIN da Lei nº 7339, de 17 de janeiro de 2011, do Município de Araçatuba, que “dispõe sobre a distribuição de honorários advocatícios entre os Procuradores Jurídicos Municipais do Município de Araçatuba, conforme Lei Federal nº 8.906, de 4 de julho de 1994, e dá outras providências”.

O Parlamentar noticia que a lei, de iniciativa do Prefeito, destina a verba honorária aos Procuradores Municipais investidos no cargo, ao Procurador Geral do Município, aos Diretores do Departamento Jurídico, ao Chefe de Gabinete da Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos e ao Secretário Municipal de Assuntos Jurídicos, desde que estejam regularmente inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil, o que, aos olhos do interessado, contraria o art. 4º da Lei Federal nº 9527/97, os arts. 125, § 2º e 129, IV, da Constituição Federal, e os arts. 74, VI e 90 da Constituição do Estado.

Também o 10º Promotor de Justiça de Araçatuba cogita da inconstitucionalidade da Lei nº 7339/11, restrita ao seu art. 1º, acoimando-o de incompatível com os arts. 111; 115, XII e XV, 144 e 297 da Constituição Paulista.

É de sua opinião que o dispositivo questionado é inconstitucional por não estabelecer o limite máximo de percepção da verba honorária, de modo que a remuneração dos beneficiários poderá ultrapassar o teto, que, no município, se estabelece pelos subsídios pagos ao Prefeito (art. 37, inc. XI, CF).

Em reforço à tese, o culto Promotor de Justiça colaciona diversos julgados para demonstrar que os honorários advocatícios pagos aos Procuradores Municipais são compreendidos como gratificação de caráter geral (não se confundem com vantagens pessoais) e, desse modo, se incluem no teto remuneratório.

É o relatório.

Observa-se, de partida, que os dispositivos indicados pelo Vereador como parâmetros de controle de constitucionalidade da lei municipal não se prestam, data venia, a tal finalidade.

Como se sabe, a providência alvitrada pelo nobre parlamentar – propositura de ADIN perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – demanda o contraste do ato normativo questionado com dispositivos da Constituição do Estado, cabendo, por isso, desprezar de plano as indicações do art. 4º da Lei Federal nº 9527/97 e dos artigos 125, § 2º e 129, IV, da Constituição Federal, como normas de controle da legislação impugnada.

De fato, o cotejo do ato normativo questionado com a Constituição Federal, com leis federais ou com outros diplomas municipais, incluindo a Lei Orgânica do Município, não viabiliza o processo objetivo que tenha lei municipal como objeto.

Na ação direta de inconstitucionalidade de lei municipal, o parâmetro a ser considerado é a Constituição do Estado, nos precisos termos do art. 125, § 2º, Constituição Federal. O único exame que se faz no controle concentrado decorre do confronto direto entre o ato normativo impugnado e o dispositivo constitucional (na hipótese, apenas estadual) adotado como parâmetro (STF, ADI 2.714, Rel. Min. Maurício Corrêa, julgamento em 13-3-03, DJ de 27-2-04; ADI-MC 1347/DF, Rel. Min. Celso de Mello, j. 05/09/1995, Tribunal Pleno, DJ 01-12-1995, p. 41685, EMENT VOL-01811-02, p. 00241, g.n.; ADI-MC n.º 842 - DF, RTJ 147/545-546).

O C. Órgão Especial comunga desse entendimento:

“As ações diretas de inconstitucionalidade devem ater-se a contrastes com dispositivos constitucionais, não com normas de direito comum, independente de sua hierarquia. A violação de dispositivo de leis ordinárias, leis complementares e mesmo de preceitos inseridos em lei orgânica do município, não pode ser invocada em ação direta” (TJSP, ADI 46.911-0/4-00, Órgão Especial, Rel. Des. Franciulli Netto, v.u., 08-09-1999).

Nem mesmo a menção feita aos arts. 74, VI e 90 da Constituição do Estado na representação formulada pelo ilustre Vereador autoriza a providência almejada. É que o art. 74, VI, define tão somente a competência do Tribunal de Justiça para julgar a representação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo contestado em face da Constituição Paulista, enquanto o art. 90 fornece o rol de legitimados para a propositura da ação direta de inconstitucionalidade no âmbito do Estado, tratando-se, pois, de normas de conteúdo processual e que não se prestam à verificação da compatibilidade vertical do ato normativo sindicado com a norma superior.

Se não bastasse, louvando-me nas informações trazidas aos autos pela Municipalidade, deve-se atentar para o fato de que, em recente pronunciamento, o E. Tribunal de Justiça entendeu legítima a repartição de honorários advocatícios entre procuradores jurídicos, agentes políticos e detentores de cargos em comissão integrantes da Secretaria de Assuntos Políticos do Município de Guarulhos, avalizando orientação contrária a que esposa o parlamentar. Confira-se:

Inconstitucionalidade. Ação direta. Art. 1º, caput, da Lei nº 3.548/89, com redação dada pelo art. 1º da Lei nº 5.426/99, ambas do Município de Guarulhos, que determina a integração dos honorários sucumbenciais pagos ao Município na remuneração dos Procuradores-chefes e dos Diretores dos Departamentos Jurídicos, bem como dos Consultores Jurídicos e Secretários de Assuntos Jurídicos. Legitimidade ativa. Interesse jurídico da associação. Alegação de que os honorários advocatícios somente devem ser pagos aos Procuradores-chefes e Diretores de Departamentos Jurídicos quando forem também Procuradores do Município. Secretários de Assuntos Jurídicos e consultores jurídicos, por serem, respectivamente, agentes políticos e ocupantes de cargo em comissão, não podem se beneficiar daquela verba. Ofensa às normas previstas nos arts. 39, § 4º, da Constituição da República e arts. 24, § 1º, item 3, 111 e 144, todos da Carta Paulista. Inocorrência. Ação improcedente (ADIN nº 994.09.001629-7, rel. Penteado Navarro, j; 16 Jun. 2010).

Cuidemos, então, da representação subscrita pelo Promotor de Justiça e que recebeu, no âmbito da Subprocuradoria-Geral de Justiça, o número de ordem 0022535/11, tendo sido juntada ao incluso protocolado em razão da identidade do objeto (fls. 21).

Para tanto, deve-se ter em mira que a Lei nº 7.339, de 17 de janeiro de 2011, dispôs sobre a distribuição de honorários advocatícios decorrentes de condenação, arbitramento ou sucumbência nos feitos em que a municipalidade de Araçatuba figure como parte.

Pelo art. 1º do referido diploma, a integralidade da verba honorária é destinada aos Procuradores Municipais investidos no respectivo cargo público, ao Procurador-Geral do Município, aos Diretores do Departamento Jurídico, ao Chefe de Gabinete da Secretaria Municipal de Assuntos Jurídicos e ao Secretário Municipal de Assuntos Jurídicos, conquanto que regularmente inscritos nos quadros da OAB.

Na esteira da jurisprudência selecionada pelo culto subscritor, tem-se por certo que “a verba percebida por procuradores em razão do exercício de suas funções, a título de honorários advocatícios, é de natureza pública e não se reveste de caráter individual, porque paga a todos os procuradores indistintamente, razão pela qual deve ser incluída no cálculo do teto remuneratório” (REsp nº 190.460/SP, Min. Felix Fischer, 5ª. T., j. 23.6.2004).

Desse modo, o problema da lei, sempre de acordo com a referida representação, não está na distribuição dos honorários advocatícios entre os agentes mencionados no art. 1º – que se assume legítima – mas na ausência de preceito normativo que limite a remuneração dos beneficiários ao equivalente aos subsídios do Prefeito, teto remuneratório do âmbito municipal.

Se é assim, o pleito para que se declare a insubsistência do art. 1º não pode ser atendido, pois a distribuição da honorária determinada pelo dispositivo é constitucional.

De se ver, também, que de nada adiantaria expurgar a expressão “integralmente” do art. 1º, porque a redução de seu texto não garantiria, por si só, a observância do limite pela Administração.

De outro giro, o Tribunal não pode exercer o papel de legislador positivo para, decidindo a ADIN, acrescentar à lei a regra limitadora que o legislador municipal não incluiu no ato normativo.

Restaria cogitar da propositura da ação direta para buscar a “interpretação conforme a Constituição” da lei objurgada.

No entanto, lê-se nas informações da Municipalidade que a Administração entende pacificamente que a distribuição da verba honorária está condicionada ao teto remuneratório constitucional, por se tratar de gratificação de caráter geral, e mais, que, não obstante entender prescindível, estuda a elaboração de Decreto regulamentar que explicite que dita verba deve se conter no limite constitucional.

A propósito, colhe-se da manifestação a seguinte passagem, que bem ilustra o entendimento adotado:

O fato de o Município não ter disciplinado de forma expressa a matéria não significa o desrespeito à norma constitucional.

Em outros termos, pode-se afirmar que a Lei Municipal nº 7.339/11 é constitucional, pois a mesma deve observância aos textos constitucionais federal e estadual, não porque os previu em seu corpo, mas por decorrência do próprio sistema normativo.

De mais a mais, o que se tem feito, por ora, é o exercício futurístico de eventual e possível inconstitucionalidade, já que a mesma, até o presente momento, inexiste.

Tivesse o Município de Araçatuba, por sua Lei Municipal nº 7.339/11, disposto expressamente que a parcela recebida a título de honorários, por se tratar de vantagem pessoal, não integra a remuneração ou ao subsídio para fins de limitação do teto remuneratório, aí sim poderíamos afirmar ter a legislação municipal incorrido em flagrante vício de inconstitucionalidade, o que a tornaria natimorta.

No entanto, a lei mencionada, porque inteiramente submissa aos textos constitucionais (estadual e federal) por decorrência natural do sistema normativo, sequer disciplinou a matéria.

Da mesma forma, poderíamos cogitar da sua inconstitucionalidade se os beneficiários estivessem percebendo valores que suplantassem o limite constitucional. No entanto, esta também não é a hipótese que ora se apresenta (e nem se apresentará, diga-se de passagem, pois os valores submetem-se ao teto remuneratório).

A providência pleiteada seria, portanto, desnecessária.

Demais disso, se a omissão da lei pode ser suprida pelo texto constitucional, não se abre a possibilidade de “interpretação conforme” para excluir outras possibilidades de interpretação do ato normativo, eis que, no caso, colmata-se a alegada lacuna legislativa com regra auto-aplicável extraída diretamente da Constituição Federal (art. 37, inc. XI), in verbis:

XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como li-mite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o sub-sídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003).

Pelo exposto, opino pelo arquivamento da presente representação, com ciência aos interessados.

 

São Paulo, 25 de abril de 2011.

 

 

 

José Eduardo de Souza Pimentel

Promotor de Justiça – Assessor

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Protocolado nº. 20.461/11

Interessados: Vereador Ermenegildo Nava e 10º Promotor de Justiça de Araçatuba

Objeto: Lei nº 7.339, de 17 de janeiro de 2011, do Município de Araçatuba

 

 

 

 

 

 

1.    Homologo o parecer ofertado pelo Corpo Técnico.

2.     Determino o arquivamento dos autos, com as comunicações de praxe.

 

                    São Paulo, 25 de abril de 2011.

 

 

 

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

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