EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Protocolado nº 118.795/2011

Assunto: Inconstitucionalidade das Emendas nº 30, 31, 36 (no que diz respeito à alteração promovida no § 3º do art. 42) e 46 à Lei Orgânica do Município de Valinhos .

 

Ementa: Ação Direta de Inconstitucionalidade.  Emendas nº 30, 31, 36 (no que diz respeito à alteração promovida no § 3º do art. 42) e 46 à Lei Orgânica do Município de Valinhos. Emendas 30, 31 e 36. Regras do processo legislativo (quórum e previsão de reapresentação de matéria constante de emenda rejeitada) que não se harmonizam com o modelo estruturador estadual. Emenda 46. Normatização relativa às instalações físicas do Gabinete do Vice-Prefeito. Criação de dois cargos de provimento em comissão, de assessores do Vice-Prefeito. Previsões incompatíveis com a função a que se relaciona, inclusive porque o Vice-Prefeito não titulariza cargo. Violação do princípio da separação dos Poderes, na medida em que a Câmara Municipal está dispondo sobre tema cuja iniciativa está constitucionalmente reservada ao Alcaide. Violação dos artigos 5º; 10, § 1º; 22, § 4º; 23; 24, § 2º, inciso 1; 47, inciso II, e 144, da Constituição Paulista.

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e art. 129, inciso IV, da Constituição Federal, e ainda art. 74, inciso VI, e art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE,  das  Emendas nº 30, 31, 36 (no que diz respeito à alteração promovida no § 3º do art. 42) e 46 à Lei Orgânica do Município de Valinhos, pelos fundamentos a seguir expostos.

 

1. DOS ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS

A Mesa da Câmara Municipal de Valinhos aprovou, nas sessões dos dias 14 de junho de 2011 e 29 de junho de 2011, um conjunto de 29 (vinte e nove) Emendas à Lei Orgânica do Município de Valinhos.

Nesta demanda, em atenção à representação subscrita por Vereador em exercício (fls. 2/17), questionam-se as seguintes emendas, a seguir transcritas: Emendas nº 30; 31; 36 (no que diz respeito à alteração promovida no § 3º do art. 42 da L.O.M); e 46.

EMENDA Nº 30

No artigo 46, § 1º, suprima-se o inciso VI:

VI – Plano Diretor

EMENDA Nº 31

No artigo 46, § 2º, em I, leia-se:

I – Plano Diretor e zoneamento urbano;

(...)

EMENDA Nº 36

O artigo 42 passa a ter a seguinte redação:

Artigo 42 – A Lei Orgânica do Município poderá ser emendada mediante proposta:

I – de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara Municipal;

II – do Prefeito;

III – de cidadãos, mediante iniciativa popular assinada, no mínimo, por um por cento dos eleitores do Município, identificados pelo respectivo endereço e número do Título de Eleitor;

§ 1º- A proposta será discutida e votada em dois turnos, considerando-se aprovada quando obtiver, em ambas as votações, o voto favorável de três quintos dos membros da Câmara Municipal.

§ 2º- A emenda à Lei Orgânica será promulgada pela Mesa da Câmara, com o respectivo número de ordem.

§ 3º - A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada só poderá ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa se subscrita por três quintos dos Vereadores ou por um por cento do eleitorado do Município, na forma do inciso III.

(...)

EMENDA Nº 46

Acrescente-se em Disposições Gerais o seguinte artigo, ora numerado em 284, renumerando-se para 285 o atual artigo 284:

Artigo 284 – É assegurado ao Vice-Prefeito Municipal ter à sua disposição dois assessores, cargos em comissão de sua confiança e escolha e um gabinete com pelo menos duas salas mobiliadas e equipadas, preferencialmente no mesmo próprio municipal onde está instalado o Gabinete do Prefeito Municipal.

Art. 285 – A revisão geral ...”

Constatou-se que as Emendas impugnadas ofendem frontalmente os seguintes dispositivos da Constituição do Estado de São Paulo: artigos 5º; 10, § 1º; 22, § 4º; 23; 24, § 2º, inciso 1; 47, inciso II, e 144, da Constituição do Estado de São Paulo.

É o que será demonstrado a seguir.

 

2. DA FUNDAMENTAÇÃO

2.1. EMENDAS nº 30 e 31 (análise conjunta)

As Emendas nº 30 e 31 promoveram alterações no art. 46 da Lei Orgânica, a primeira suprimindo inciso do § 1º e a segunda alterando a redação de inciso do § 2º.

O resultado disso é que, agora, para a aprovação do Plano Diretor, são necessários 2/3 (dois terços) dos votos dos membros da Câmara Municipal, em lugar da maioria absoluta que a L.O.M. reclamava.

A exigência de quórum qualificado para essa matéria, entretanto, não se sustenta, diante do que dispõem o § 1º do art. 10 e o art. 23 da Constituição Paulista, in verbis:

“Artigo 10 - A Assembleia Legislativa funcionará em sessões públicas, presente, pelo menos, um quarto de seus membros.

§ 1º - Salvo disposição constitucional em contrário, as deliberações da Assembleia Legislativa e de suas Comissões serão tomadas por maioria de votos, presente a maioria absoluta de seus membros.

Artigo 23 - As leis complementares serão aprovadas pela maioria absoluta dos membros da Assembleia Legislativa, observados os demais termos da votação das leis ordinárias.

Parágrafo único - Para os fins deste artigo, consideram-se complementares:

1 - a Lei de Organização Judiciária;

2 - a Lei Orgânica do Ministério Público;

3 - a Lei Orgânica da Procuradoria Geral do Estado;

4 - a Lei Orgânica da Defensoria Pública;

5 - a Lei Orgânica da Polícia Civil;

6 - a Lei Orgânica da Polícia Militar;

7 - a Lei Orgânica do Tribunal de Contas;

8 - a Lei Orgânica das Entidades Descentralizadas;

9 - a lei Orgânica do Fisco Estadual;

10 - os Estatutos dos Servidores Civis e dos Militares;

11 - o Código de Educação;

12 - o Código de Saúde;

13 - o Código de Saneamento Básico;

14 - o Código de Proteção ao Meio Ambiente;

15 - o Código Estadual de Proteção contra Incêndios e Emergências;

16 - a Lei sobre Normas Técnicas de Elaboração Legislativa;

17 - a lei que institui regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões;

18 - a Lei que impuser requisitos para a criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de Municípios ou para a sua classificação como estância de qualquer natureza.”

É que o cotejo das Emendas com as normas-parâmetro autoriza a conclusão de que a previsão, trazida pela Emenda, do quórum de 2/3 (dois terços) para aprovação do Plano Diretor é inconstitucional, por não encontrar amparo em regras do processo legislativo de observância obrigatória nos Municípios.

Assim é que, na Carta Bandeirante, o quórum de dois terços (maioria qualificada) está restrito, em relação às deliberações da Assembleia Legislativa, às hipóteses do art. 14, § 8º e do art. 49, caput.

De se ver, portanto, que somente temas excepcionais demandam a deliberação da maioria qualificada. De ordinário, as decisões são tomadas por maioria simples. Por fim, certas matérias, expressamente elencadas, serão decididas pela maioria absoluta, por se cuidarem de objeto de leis complementares.

Ora, “as regras gerais que veiculam princípios do processo legislativo são impositivas para as três esferas do governo. A legislação local não pode restringi-la nem ampliá-las. São dispositivos inarredáveis, considerados de importância primordial para a regência das relações harmônicas e independentes dos Poderes. Dizem respeito à própria configuração do Estado, em seu modelo de organização política, traçado pela nova ordem constitucional. Dele, o Município, como integrante da Federação, não pode se afastar” (Hely Lopes Meirelles. Direito Municipal Brasileiro, 16ª. ed., São Paulo: Malheiros, 2008, p. 675).

Na esteira desse raciocínio, reproduz-se no Estado-membro e nos municípios, nestes por força do art. 144 da Constituição Paulista, o “princípio da suficiência da maioria”, sem o qual incontáveis óbices de ordem prática poderiam se suceder e comprometer a função primordial do Poder encarregado da produção legislativa.

Desse modo, em que pese a relevância para a Comuna do Plano Diretor, a Constituição não o relacionou à exigência de quórum qualificado, de tal sorte que a novidade trazida pelas Emendas nº 30 e 31 se afigura ilegítima.

A questão constitucional já foi enfrentada pelo E. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, reconhecendo-se, em hipótese análoga a que se apresenta, a inconstitucionalidade da exigência do quórum qualificado para a votação, dentre outros assuntos, do Plano Diretor. Confira-se:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PROCESSO LEGISLATIVO. PRINCÍPIO DA SUFICIÊNCIA DA MAIORIA. POSTULADO DA SIMETRIA. FLEXIBILIZAÇÃO. Em relação ao quórum de deliberação parlamentar, vige no sistema constitucional brasileiro o princípio da suficiência da maioria (art. 47, CF/88, e art. 51, CE/89), que, com fundamento no postulado da simetria (art. 29, CF/88, e art. 8º, CE/89), deve ser transplantado para o processo legislativo municipal. Assim, em princípio, Lei Orgânica Municipal não pode exigir quórum qualificado para a aprovação de projeto de lei local, nas hipóteses em que a Constituição Estadual, por simetria à Carta Federal, não o faz. Possibilidade de flexibilização da exigência. Permissão a que os Municípios contemplem a previsão de leis complementares sobre matérias de especial relevância, análogas - e não exatamente idênticas àquelas previstas nas Constituições Federal e Estadual, a exemplo do Plano Diretor, Código de Obras e Edificações e Código Administrativo. Ação direta julgada parcialmente procedente, para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 59, incisos I a VII, e § 2º, alínea b; 60, caput e incisos I a IV; e 77, inciso VII, e §§ 1º e 2º, todos da Lei Orgânica Municipal de Lagoa Vermelha, por infração aos artigos 8º, 51 e 59, da CE/89, e artigos 29, 47 e 69 da CF/88. Unânime.” (Ação Direta de Inconstitucionalidade Nº 70010237014, Tribunal Pleno, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Berenice Dias, Julgado em 11/04/2005) (70010237014 RS, Relator: Maria Berenice Dias, Data de Julgamento: 11/04/2005, Tribunal Pleno, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 03/06/2005).

Desse modo, impõe-se a declaração de inconstitucionalidade das Emendas citadas.

2.2. EMENDA nº 36 (no que diz respeito à alteração promovida no § 3º do art. 42 da L.O.M)

Com a alteração promovida pela Emenda nº 36, a Lei Orgânica do Município de Valinhos passou a prever hipótese não contemplada na Constituição do Estado, segundo a qual:

“Art. 42 – (...)

§ 3º - A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada só poderá ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa se subscrita por três quintos dos Vereadores ou por um por cento do eleitorado do Município, na forma do inciso III.”

A previsão de reapresentação da proposta na mesma sessão legislativa, todavia, não se sustenta, diante do que dispõe o § 4º do art. 22, da Constituição do Estado, assim expresso:

“Artigo 22 – (...)

§ 4º - A matéria constante de proposta de emenda rejeitada não poderá ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.”

Nesse passo, não se pode esquecer que o processo legislativo, compreendido o conjunto de atos realizados para a formação das leis, é objeto de minuciosa previsão na Constituição Federal, para que se constitua em meio garantidor da independência e harmonia dos Poderes.

O delineamento constitucional conforma o processo legislativo dos Estados-membros e Municípios, de modo a não permitir soluções que divirjam daquelas preconizadas para o âmbito Federal. Na dicção do STF:

“O modelo estruturador do processo legislativo, tal como delineado em seus aspectos fundamentais pela Constituição da República - inclusive no que se refere às hipóteses de iniciativa do processo de formação das leis - impõe-se, enquanto padrão normativo de compulsório atendimento, à incondicional observância dos Estados-Membros. Precedentes: RTJ 146/388 - RTJ 150/482” (ADIn nº 1434-0, medida liminar, relator Ministro Celso de Mello, DJU nº 227, p. 45684).

Em consequência, o § 4º do art. 22 da Constituição Paulista constitui-se em comando impositivo não somente para o Estado como também para os Municípios que o integram.

Desse modo, tem-se, pela Emenda objurgada, inequívoco desrespeito às normas do processo legislativo, cujas linhas mestras estão traçadas na Constituição, ao se permitir que proposta de emenda rejeitada seja objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa, destoando da orientação traçada na regra de controle.

A consequência é a inconstitucionalidade formal do ato produzido, que deverá, no caso presente, sofrer a censura por parte desse Sodalício.

2.3. EMENDA nº 46

O ato normativo impugnado foi concebido na Câmara Municipal, como comprovam as informações prestadas por sua Presidência (fls. 86 e 89).

Por ela, o Poder Legislativo acabou se intrometendo na gestão do Município, ao dispor sobre o local de trabalho do Vice-Prefeito, matéria de cunho eminentemente administrativo.

Se não bastasse, a Emenda criou dois cargos de provimento em comissão – de assessor do Vice-Prefeito – olvidando que a matéria demandaria a iniciativa do Alcaide.

Desse modo, a norma concretizada é formalmente inconstitucional, afrontando os artigos 5º; 24, § 2º, inciso 1; 47, inciso II, e 144, da Constituição do Estado de São Paulo, abaixo transcritos:

“Art. 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

Art. 24 - (...)

§ 2º - Compete, exclusivamente, ao Governador do Estado a iniciativa das leis que disponham sobre:

1 - criação e extinção de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica, bem como a fixação da respectiva remuneração;

Art. 47 - Compete privativamente ao Governador, além de outras atribuições previstas nesta Constituição:

(...)

II - exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção superior da administração estadual;

Art. 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.”

Senão, vejamos.

Quando a Carta Política conferiu aos Municípios o poder de editar suas próprias leis orgânicas, o fez em nome da autonomia municipal, incluindo o Município como peça essencial da Federação.

A previsão foi inspirada no Home Rule Charter do Direito Norte Americano, que concede aos Municípios “o direito de promulgar a lei básica de sua organização, atendidos os princípios da Constituição da República e os consagrados na Constituição do respectivo Estado-membro” (Hely Lopes Meirelles, Direito municipal brasileiro, 16ª ed., São Paulo, Malheiros, 2008, p. 87).

As Cartas Próprias, como são conhecidas as leis orgânicas, são, indiscutivelmente, autônomas. Sofrem, contudo, as restrições decorrentes de sua submissão às Constituições Federal e Estadual.

Na esteira desse raciocínio, Hely Lopes Meirelles consigna uma advertência, que reputamos de fundamental importância para a análise do tema constitucional que ora se desenvolve. Confira-se a lição:

“... o Poder Legislativo Municipal não pode, a pretexto de elaborar a lei orgânica – processo legislativo excepcional destinado a dar estrutura e organização ao Município –, dispor sobre matéria de lei ordinária, com o intuito de arredar a participação do Executivo, subtraindo-lhe o direito de vetar, sancionar e promulgar atos normativos dessa natureza” (Hely Lopes Meirelles, Direito municipal brasileiro, 16ª ed., São Paulo, Malheiros, 2008, p. 88).

Na hipótese vertente, é curial que a previsão normativa ditada pela Câmara Municipal está retirando do Prefeito atribuições administrativas típicas de seu cargo, como a de designar o gabinete do Vice-Prefeito (se entender necessário) ou mesmo de deflagrar o processo legislativo para a edição de norma criadora de cargos da Administração.

Há outras impropriedades na Emenda.

É que, ao prever que o Vice-Prefeito disporá de sala com tais e quais características, além de dois assessores nomeados, o Poder Legislativo carreou à Administração ônus incompatível com a função em estudo. O Vice-Prefeito, como se sabe, não é detentor de cargo. É titular de mandato executivo com expectativa de exercício do cargo de Prefeito, nos afastamentos e em caso de sucessão. Dessa condição “não deve auferir qualquer vantagem” (Hely Lopes Meirelles, Direito municipal brasileiro, 16ª ed., São Paulo, Malheiros, 2008, p. 733), muito menos dispor de dois assessores de livre nomeação, anotando-se que, a rigor, o Vice-Prefeito não possui encargos até que, por um motivo ou por outro, substitua o Alcaide. O fato se torna mais grave quando se nota que ditos assessores não possuem suas atribuições ditadas pelo ato normativo. Sob esse prisma, a Emenda atenta contra o princípio da moralidade administrativa (art. 111, CE).

Em suma, pela Emenda objurgada, a Câmara Municipal está dispondo sobre assunto cuja discussão legislativa depende da iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo (CF, art. 61, § 1º), regra de observância obrigatória pelos Estados-membros que, ao disciplinar o processo legislativo no âmbito das respectivas Constituições estaduais, dela não pode se afastar.

Assim, a iniciativa reservada das leis que criam cargos revela-se, enquanto prerrogativa conferida pela Carta Política ao Chefe do Poder Executivo, projeção específica do princípio da separação dos poderes, incidindo em inconstitucionalidade formal a norma inscrita em Lei Orgânica de Município que, subtraindo a disciplina da matéria ao domínio normativo da lei, disponha sobre o assunto, v.g., criando cargos de provimento em comissão, como se vê na hipótese dos autos.

Esse panorama conduz à ofensa ao princípio basilar da separação de poderes, pois, no abalizado dizer desse Sodalício:

“Ao Executivo haverá de caber sempre o exercício de atos que impliquem no gerir as atividades municipais. Terá, também, evidentemente, a iniciativa das leis que lhe propiciem a boa execução dos trabalhos que lhe são atribuídos. Quando a Câmara Municipal, o órgão meramente legislativo, pretende intervir na forma pela qual se dará esse gerenciamento, está a usurpar funções que são de incumbência do Prefeito” (Adin n. 53.583-0, rel. Des. FONSECA TAVARES).

Desse modo, é de se declarar a inconstitucionalidade da norma questionada, pois ela retira do Alcaide prerrogativas que lhe são inerentes e das quais não pode renunciar, delegá-las ou aquiescer que o Legislativo as exerça (nesse sentido: Hely Lopes Meirelles. Direito Municipal Brasileiro, 16ª. ed., São Paulo: Malheiros, 2008, p. 748).

 

3. PEDIDO DE LIMINAR

Estão presentes, na hipótese examinada, os pressupostos do fumus bonis iuris e do periculum in mora, a justificar a suspensão liminar da vigência e eficácia dos atos normativos impugnados.

A razoável fundamentação jurídica decorre dos motivos expostos anteriormente, que indicam, de forma clara, que as Emendas impugnadas na presente ação padecem de vício de inconstitucionalidade.

O perigo da demora decorre especialmente da ideia de que, sem a imediata suspensão da vigência e eficácia do ato normativo impugnado, instalar-se-á, provavelmente, situação consumada, seja no campo da produção legislativa, seja em sede da instalação do Gabinete do Vice-Prefeito, com a consequente nomeação de seus assessores.

A ideia do fato consumado, com repercussão concreta, guarda relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade. Válida tal afirmação, na medida em que providências administrativas que ulteriormente serão necessárias para o restabelecimento do statu quo ante, com a esperada procedência da ação, trarão ônus e custos para a Administração Pública.

Assim, a imediata suspensão da eficácia dos atos normativos, cuja inconstitucionalidade é palpável, evita qualquer desdobramento no plano dos fatos que possa significar, na prática, prejuízo concreto para o Poder Público Municipal no aspecto administrativo.

De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida. Com efeito, no contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos mais recentes do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (cf. ADIN-MC 125, j. 15.2.90, DJU de 4.5.90, p. 3.693, rel. Min. Celso de Mello; ADIN-MC 568, RTJ 138/64; ADIN-MC 493, RTJ 142/52; ADIN-MC 540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).

Diante do exposto, requer-se a concessão da liminar, para fins de suspensão imediata da eficácia dos atos normativos impugnados, ou seja, as Emendas nº 30; 31; 36 (no que diz respeito à alteração promovida no § 3º do art. 42 da L.O.M); e 46, durante o trâmite da presente Ação Direta de Inconstitucionalidade.

 

4. CONCLUSÃO E PEDIDO

Por todo o exposto, evidencia-se a necessidade de reconhecimento da inconstitucionalidade da norma aqui apontada.

Assim, aguarda-se o recebimento e processamento da presente Ação Declaratória, para que ao final seja julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade das Emendas nº 30; 31; 36 (no que diz respeito à alteração promovida no § 3º do art. 42 da L.O.M); e 46 à Lei Orgânica do Município de Valinhos.

Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

 

São Paulo, 10 de novembro de 2011.

 

                        Fernando Grella Vieira

                        Procurador-Geral de Justiça

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Protocolado nº 118.795/2011

Interessado: Câmara Municipal de Valinhos

Assunto: Inconstitucionalidade das Emendas nº 30, 31, 36 (no que diz respeito à alteração promovida no § 3º do art. 42) e 46 à Lei Orgânica do Município de Valinhos .

 

 

 

 

 

1.     Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face das Emendas nº 30, 31, 36 (no que diz respeito à alteração promovida no § 3º do art. 42) e 46 à Lei Orgânica do Município de Valinhos ,  junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.     Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

São Paulo, 10 de novembro de 2011.

 

 

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

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