EXCELENTÍSSIMO
SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO
PAULO
Protocolado n. 15.915/09
Assunto: Inconstitucionalidade do art. 2º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, do art. 133 da Lei n. 1.056 de 31 de maio de 1972, em sua redação original e na que foi dada pelo art. 3º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, e do art. 2º da Lei n. 4.171, de 06 de novembro de 2007, do Município de Itapira.
Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade. Leis do Município de Itapira. Art. 2º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, do art. 133 da Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972 em sua redação original e na redação dada pelo art. 3ºda Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, e do art. 2º da Lei n. 4.171, de 06 de novembro de 2007. Concessão de vantagens pecuniárias de servidores públicos à margem de lei assim como sua incorporação. Convalidação de seus efeitos. Delegação ao Chefe do Poder Executivo para fixação das gratificações. Ofensa aos princípios de legalidade, moralidade, impessoalidade, razoabilidade, interesse público e de separação dos poderes. Arts. 5º, § 1º, 24, § 2º, 1, 111, 115, XI, 128 e 144, da Constituição Estadual.
O
Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição
prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de
novembro de 1993, em conformidade com o disposto nos arts. 125, § 2º, e 129, IV,
da Constituição Federal, e nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do
Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso
protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça,
promover a presente AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE do art. 2º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999,
do art. 133 da Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972 em sua redação original e na
que foi dada pelo art. 3º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, e do art.
2º da Lei n. 4.171, de 06 de novembro de 2007, do Município de Itapira, pelos fundamentos a seguir
expostos.
I. OS ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS
1. A Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, assim dispõe:
“Art. 1º. É acrescentado ao art. 127 do Estatuto dos Funcionários Públicos Municipais de Itapira, Lei nº 1.056, de 31 de junho de 1972, o seguinte inciso:
‘VII – pela execução de atividades consideradas especiais e que resultem em acréscimo de atribuições, não definidas no elenco das competências traçadas pela organização interna dos serviços, ou pela supervisão de atividades extras alheias ao Departamento ou Superintendência em que estiver lotado o funcionário, ou ainda pelo desempenho de trabalhos junto à comunidade, fora do horário normal de serviço, mediante palestras, cursos e outras atividades e que sejam de interesse da Administração.’
Art. 2º. Os recebimentos por gratificações e outras vantagens porventura já concedidas e que representem alteração nos vencimentos/proventos, ficam convalidadas pela presente lei, vedadas novas concessões que não estejam rigorosamente previstas em texto que as autorizem.
Art. 3º. O art. 133 do Estatuto dos Funcionários Públicos Municipais de Itapira, Lei nº 1.056, de 31 de maio de 1972, passa a vigorar com a seguinte redação:
‘Art. 133 - A gratificação a que se referem os itens II, III, V, VI e VII do artigo 127 será arbitrada pelo Prefeito’.
Art. 4º. Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário” (fl. 285).
2. Em 10 de março de 2004 foi editada a Lei n. 3.598 com o seguinte teor:
“Art. 1º. Ficam incorporados aos respectivos vencimentos as gratificações e outros adicionais concedidos aos servidores do Poder Executivo há mais de um ano, mediante decisão administrativa, com base no art. 127 do Estatuto dos Funcionários Públicos Municipais, alterada pela Lei nº 3.125, de 27 de agosto de 1999, convalidando-se as concessões efetuadas.
Art. 2º. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário”(fl. 298).
3. Entretanto,
em 06 de novembro de 2007, foi editada a Lei n. 4.171, com o seguinte teor:
“Art. 1º. Fica revogada a Lei nº 3.598, de 10 de março de 2004, que dispõe sobre a incorporação aos vencimentos das gratificações e outros adicionais concedidos aos servidores do Poder Executivo.
Art. 2º. As incorporações de gratificações e outros adicionais concedidos aos servidores públicos do Poder Executivo, até a data da promulgação desta lei, ficam convalidadas.
Art. 3º. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação” (fl. 299).
4. A
análise desses três diplomas legais revela, num primeiro momento, que o art. 2º
da Lei n. 3.125/99 teve por objetivo o fornecimento de ares de legitimidade à
concessão de vantagens pecuniárias a servidores públicos à margem da lei,
qualidade revelada pela parte final do dispositivo ao proibir novos atos desse
porte mediante o uso da fórmula “vedadas novas concessões que não estejam
rigorosamente previstas em texto que as autorizem”.
5. E, num
segundo momento, que embora o art. 1º da Lei n. 3.598/04 tenha automaticamente
determinado a incorporação de qualquer vantagem pecuniária após um ano de sua
fruição pelos servidores públicos e convalidado as concessões efetuadas, esse
diploma legal foi revogado pela Lei n. 4.717/07 (art. 1º), cujo art. 2º, porém,
promoveu a manutenção dos efeitos dessas incorporações até seu advento (06 de
novembro de 2007).
6. Por
fim, o art. 3º da Lei n. 3.125/99 expande a redação do art. 133 da Lei n.
1.056, de 31 de maio de1972, delegando ao Chefe do Poder Executivo Municipal a
fixação do quantum das gratificações.
7. Os
arts. 2º e 3º da Lei n. 3.125/99 e o art. 2º da Lei n. 4.717/07, assim como o
art. 133 da Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972, exibem incompatibilidade
vertical com os arts. 5º, § 1º, 24, § 2º, 1, 111, 115, XI e 128 da Constituição
do Estado de São Paulo, aplicáveis aos Municípios por obra de seu art. 144,
cuja redação, embasada no art. 29 da Constituição Federal, assim expressa:
“Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política,
legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica,
atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta
Constituição”.
II. O PARÂMETRO DE
INCONSTITUCIONALIDADE
8. Assim dispõe a Constituição Estadual:
“Artigo 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
§ 1º - É vedado a qualquer dos Poderes delegar atribuições.
§ 2º - O cidadão, investido na função de um dos Poderes, não poderá exercer a de outro, salvo as exceções previstas nesta Constituição.
(...)
Artigo 24 - A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Assembléia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.
(...)
§ 2º - Compete, exclusivamente, ao Governador do Estado a iniciativa das leis que disponham sobre:
1 - criação e extinção de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica, bem como a fixação da respectiva remuneração;
(...)
Artigo 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.
(...)
Artigo 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:
(...)
XI – a revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos, sem distinção de índices entre servidores públicos civis e militares, far-se-á sempre na mesma data e por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso.
(...)
Artigo 128. As vantagens de qualquer natureza só poderão ser instituídas por lei e quando atendam efetivamente ao interesse público e às exigências do serviço”.
A) A FIXAÇÃO DO VALOR DAS
GRATIFICAÇÕES
9. O art.
3º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, ao delegar ao Chefe do Poder
Executivo a fixação do valor das gratificações, inclusive a criada em seu art.
1º, insere na ordem jurídica preceito absolutamente desconforme a Constituição
Estadual que, reproduzindo preceitos da Constituição Federal, enuncia o
princípio da reserva legal (legalidade absoluta) para instituição ou majoração
de vencimentos e vantagens dos servidores públicos inclusivo do estabelecimento
de seus respectivos valores.
10. Os
vencimentos dos servidores públicos devem ser fixados em lei específica, assim
como as vantagens pecuniárias, até porque accessorium
sequitur principale. De qualquer modo, nessa compreensão incluem-se as
vantagens pecuniárias e seus respectivos valores porque a dimensão da reserva
de lei - da tradição jurídico-constitucional brasileira (art. 15, n. 17,
Constituição de 1824; art. 34, n. 24, art. 72, n. 32, Constituição de 1891;
art. 65, IV, Constituição de 1946; arts. 43, V, e 57, II, Constituição de 1967;
art. 37, X, Constituição de 1988) - abrange quaisquer espécies remuneratórias
e, aliás, quaisquer estipêndios pagos pelo poder público sob qualquer rubrica,
alcançando acréscimos e vantagens pecuniários, indenizações, auxílios, abonos
que só podem ser concedidos por ato normativo da exclusiva alçada do Poder
Legislativo, pois, a ele compete a integralidade da disciplina da matéria.
11. Ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio:
se à lei é reservada, com exclusividade, a função de fixação da remuneração do
servidor público, inclusiva de seu valor, pela mesma razão, pertence-lhe fixar
adicional ou da gratificação e seu valor (ainda que fracionário ou percentual e
até com diferenciações em razão do cargo situar-se em maior ou menor grau de
hierarquia, de complexidade etc.), sob pena de inviabilidade do planejamento e
da execução orçamentária (art. 169, Constituição Estadual).
12. Houve,
portanto, ofensa aos princípios da separação dos poderes e da legalidade
descritos nos arts. 5º, e § 1º, 24, § 2º, 1, 111, 115, XI, e 128, da
Constituição do Estado. Mas, não bastasse houve transgressão aos princípios da
legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da razoabilidade e do interesse
público, cunhados nos arts. 111 e 128 da Constituição Paulista.
13. O
esquema normativo impugnado fornece ao Chefe do Poder Executivo ampla e
excessiva discricionariedade, permitindo-lhe aquinhoar, por escolha imotivada
ou motivada por critérios alheios ao interesse público primário, servidores
credores das gratificações com valores variáveis, pessoais e individualizados
que não se amoldam às exigências da moralidade e impessoalidade, da
razoabilidade e do interesse público, na medida em que é permeável a critérios
desprovidos de objetividade, neutralidade, imparcialidade, igualdade e
impessoalidade. Na compreensão do princípio da impessoalidade está, entre
outros, a matriz da igualdade, repudiando tratamentos discriminatórios
desprovidos de relação lógica e proporcional entre o fator de discriminação e a
sua finalidade.
14. A
previsão legal impugnada possibilita ao Chefe do Poder Executivo local atribuir
valores (referentes à gratificação) sem qualquer critério objetivo ou por
critérios sigilosos ou subjetivos, expondo a Administração Pública a
tratamentos desigualitários, imorais, desarrazoados, e, sobretudo, distantes do
interesse público primário.
15. Em torno do tema, o Supremo Tribunal Federal
prestigia a prevalência da reserva legal na remuneração dos servidores públicos
e sua indelegabilidade:
“O tema concernente à disciplina jurídica da remuneração funcional submete-se ao postulado constitucional da reserva absoluta de lei, vedando-se, em conseqüência, a intervenção de outros atos estatais revestidos de menor positividade jurídica, emanados de fontes normativas que se revelem estranhas, quanto à sua origem institucional, ao âmbito de atuação do Poder Legislativo, notadamente quando se tratar de imposições restritivas ou de fixação de limitações quantitativas ao estipêndio devido aos agentes públicos em geral. - O princípio constitucional da reserva de lei formal traduz limitação ao exercício das atividades administrativas e jurisdicionais do Estado. A reserva de lei - analisada sob tal perspectiva - constitui postulado revestido de função excludente, de caráter negativo, pois veda, nas matérias a ela sujeitas, quaisquer intervenções normativas, a título primário, de órgãos estatais não-legislativos. Essa cláusula constitucional, por sua vez, projeta-se em uma dimensão positiva, eis que a sua incidência reforça o princípio, que, fundado na autoridade da Constituição, impõe, à administração e à jurisdição, a necessária submissão aos comandos estatais emanados, exclusivamente, do legislador. Não cabe, ao Poder Executivo, em tema regido pelo postulado da reserva de lei, atuar na anômala (e inconstitucional) condição de legislador, para, em assim agindo, proceder à imposição de seus próprios critérios, afastando, desse modo, os fatores que, no âmbito de nosso sistema constitucional, só podem ser legitimamente definidos pelo Parlamento. É que, se tal fosse possível, o Poder Executivo passaria a desempenhar atribuição que lhe é institucionalmente estranha (a de legislador), usurpando, desse modo, no contexto de um sistema de poderes essencialmente limitados, competência que não lhe pertence, com evidente transgressão ao princípio constitucional da separação de poderes” (STF, ADI-MC 2.075-RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 07-02-2001, v.u., DJ 27-06-2003, p. 28).
“Em tema de remuneração dos servidores públicos, estabelece a Constituição o princípio da reserva de lei. É dizer, em tema de remuneração dos servidores públicos, nada será feito senão mediante lei, lei específica. CF, art. 37, X, art. 51, IV, art. 52, XIII. Inconstitucionalidade formal do Ato Conjunto n. 01, de 5-11-2004, das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados” (STF, ADI 3.369-MC, Rel. Min. Carlos Velloso, 16-12-2004, DJ 01-02-2005).
“Ação direta
de inconstitucionalidade. Resoluções n.ºs 26, de 22/12/94; 15, de 23/10/97, e
16, de 30/10/97, todas do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo,
havendo a primeira criado a gratificação de representação, correspondente a 40%
do valor global atribuído a diversos cargos, estendendo-a, inclusive, aos
inativos que se aposentaram em cargos de igual denominação ou equivalente. 2.
Alegação de ofensa a funções privativas dos Poderes Legislativo e Executivo. 3.
Medida cautelar deferida e suspensa, com eficácia ex nunc, a eficácia das Resoluções impugnadas. 4. Procedência da
alegação de ofensa a funções privativas dos Poderes Legislativo e Executivo,
eis que há necessidade de lei em sentido formal para a criação de vantagens
pecuniárias a servidores do Poder Judiciário.
16. Perfilhando
esta orientação, merece destaque recente julgamento deste egrégio Tribunal de
Justiça cuja ementa é a seguinte:
“Ação Direta de Inconstitucionalidade – Ato normativo municipal que confere ao Chefe do Poder Executivo a possibilidade de, mediante portaria e a seu alvedrio, conceder gratificações de 20 e até 100% sobre os vencimentos dos servidores – Violação da cláusula da reserva legal, visto que somente por lei, em sentido formal, podem ser fixadas gratificações e vantagens – Precedente do Colendo Supremo Tribunal Federal – Preceito normativo que, ademais, vulnera a moralidade, o princípio da impessoalidade e da razoabilidade – Ofensa aos artigos 5º, 24, § 2º, nº 1, 111, 115, XI, todos da Constituição Estadual, aplicáveis aos Municípios ex vi o artigo 144 da mesma Carta – Inconstitucionalidade do § 1º do artigo 5º da Lei nº 3.122 do Município de Cruzeiro reconhecida – Inconstitucionalidade também do § 2º do mesmo preceito por arrastamento – Ação procedente” (TJSP, ADI 169.057-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. A. C. Mathias Coltro, 28-01-2009, v.u.).
17. Verifica-se,
ademais, que não há razoabilidade alguma em delegar ao Chefe do Poder Executivo
local a fixação do valor dessas gratificações, como previsto no enfocado art.
133 da Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972 em sua redação original ou na
expandida pelo art. 3º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, quando, ad esempia, a própria lei subtrai da
competência do Prefeito a fixação do valor da gratificação pela prestação de
serviço extraordinário, balizada pelo art. 35 da Lei Complementar n. 01, de 23
de julho de 2003, assim como a própria Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972,
fixa os valores das vantagens pecuniárias devidas pelos regimes de dedicação
plena e de tempo integral (arts.
18. Ancorado
nestes mesmos fundamentos padece de inconstitucionalidade o art. 2º da Lei n.
3.125/99 quando convalida a concessão de gratificações e outras vantagens
pecuniárias à margem de lei. Pois, se a lei não institui gratificação nem seu
valor, vantagens dessa natureza anteriormente concedidas não podem ser convalidadas
por lei futura em virtude do quanto acima exposto. Trata-se de nítido desvio de
poder que contamina o ato legislativo.
19. Destarte, impõe a declaração de inconstitucionalidade dos arts. 2º e 3º da Lei n. 3.125/99 e, por arrastamento, da antiga redação do art. 133 da Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972, pois, o efeito da declaração de inconstitucionalidade do art. 3º da Lei n. 3.125/99 será a restauração da eficácia da redação anterior que, todavia, não persiste pelos argumentos acima alinhavados com a atual Constituição na medida em que delegava ao Chefe do Poder Executivo local a fixação do valor das gratificações – “A gratificação a que se refere os itens II, III, V e VI do artigo 127, será arbitrada pelo Prefeito, após sua conclusão” (fl. 146).
B) INCORPORAÇÃO DAS VANTAGENS PECUNIÁRIAS
20. Como acima exposto, a Lei n. 3.598, de 10 de março de 2004, em seu art. 1º, previa a incorporação aos vencimentos de “gratificações e outros adicionais” sem distinção alguma. O dispositivo legal não suplantaria o teste de constitucionalidade à luz dos princípios da moralidade, da razoabilidade e do interesse público, porém, foi revogado expressamente pelo art. 1º da Lei n. 4.171, de 06 de novembro de 2007.
21. Não obstante, o art. 2º da Lei n. 4.171, de 06 de novembro de 2007, padece de inconstitucionalidade ao disciplinar a incorporação das gratificações e outros adicionais concedidos aos servidores públicos do Poder Executivo até seu advento e a correlata convalidação.
22. Com efeito, a Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972, já
previa em seu art.
23. Trata-se de preceito legal nitidamente divorciado dos princípios de moralidade, de razoabilidade e do interesse público, vício que tisnava a lei revogada e cuja eficácia foi mantida.
24. É princípio que somente a lei pode deliberar a propósito da incorporação de vantagens pecuniárias devidas aos servidores públicos. E para além, o legislador não tem ampla liberdade para fazê-lo. Não se afina à moralidade, à razoabilidade e ao interesse público uma lei permitir indistintamente a incorporação de qualquer vantagem pecuniária e, uma vez revogada, disposição contida na lei revogadora preservar sua eficácia. E isto porque a operação de construção normativa da incorporação de vantagens pecuniárias aos vencimentos dos servidores públicos demanda orientação pelo princípio da razoabilidade.
25. O art. 127 do Estatuto dos Funcionários Públicos Municipais de Itapira (Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972) prevê várias gratificações, assim como, por exemplo, a Lei Complementar n. 4.091, de 18 de maio de 2007 (fls. 390/404), que institui gratificações para cobertura de eventuais perdas de vencimentos e por responsabilidade técnica (arts. 21 e 22). Contudo, no caso das gratificações dos arts. 21 e 22 da Lei Complementar n. 4.091/07 havia expressa previsão de incorporação (art. 23, § 2º), assim como nos arts. 126 e 155 da Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972, em relação aos adicionais por tempo de serviço e às vantagens devidas pela dedicação plena e pelo regime de tempo integral.
26. Com a inovação legislativa produzida pelo art. 2º da Lei n. 4.171, de 06 de novembro de 2007, gratificações e adicionais concedidas passaram a ser incorporadas à remuneração dos servidores públicos municipais pela técnica de convalidação adotada que colima dissimular o vício original consistente na inexistência precedente de lei específica que autorizasse a incorporação e de lei específica que fixasse o valor da própria vantagem pecuniária.
27. Trata-se, novamente, de nítido desvio de poder que contamina o ato legislativo. Visível, pois, a ofensa aos princípios de legalidade, razoabilidade, moralidade e interesse público que tisnam a norma legal impugnada, manifestando o completo divórcio com os arts. 5º, § 1º, 24, § 2º, 1, 111, 115, XI, e 128, da Constituição Estadual.
III. PEDIDO DE LIMINAR
28. Demonstrada
quantum satis a inconstitucionalidade
dos dispositivos legais apontados, requerida é a concessão de medida liminar
para suspensão de sua eficácia.
29. Em se tratando do controle
normativo abstrato, uma vez verificada a cumulativa satisfação dos requisitos
legais concernentes ao fumus boni iuris
e ao periculum in mora, o poder geral
de cautela autoriza a suspensão da eficácia dos preceitos legais tidos
inconstitucionais.
30. Convergem para tanto a plausibilidade jurídica da tese exposta na inicial e o delineamento da situação do risco irreparável consistente no pagamento e manutenção de vantagens ilegalmente fixadas, de modo a gravar ilicitamente o erário e dispensar tratamento desigualitário com sérias repercussões financeiras e jurídicas na comuna.
31. Diante do exposto, requer-se a concessão da liminar, para fins de suspensão imediata da eficácia dos atos normativos impugnados, ou seja, do art. 2º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, do art. 133 da Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972 em sua redação original e na redação dada pelo art. 3ºda Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, e do art. 2º da Lei n. 4.171, de 06 de novembro de 2007, do Município de Itapira, durante o trâmite da presente ação e até seu final julgamento.
IV. CONCLUSÃO E PEDIDO.
32. Face ao exposto, requer o recebimento e processamento da presente ação que deverá ser julgada procedente para declaração da inconstitucionalidade do art. 2º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, do art. 133 da Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972 em sua redação original e na redação dada pelo art. 3ºda Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, e do art. 2º da Lei n. 4.171, de 06 de novembro de 2007, do Município de Itapira.
33. Requer, ainda, sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Itapira, bem como a citação do douto Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre o ato normativo impugnado, e, posteriormente, vista para fins de manifestação final.
São Paulo, 29 de junho de 2009.
Fernando Grella Vieira
Procurador-Geral de Justiça
wpmj
Protocolado n.
15.915/09
Interessado: 1º Promotor de Justiça de Itapira
Assunto: Inconstitucionalidade do art. 2º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, do art. 133 da Lei n. 1.056 de 31 de maio de 1972, em sua redação original e na que foi dada pelo art. 3º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, e do art. 2º da Lei n. 4.171, de 06 de novembro de 2007, do Município de Itapira
1. Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face do art. 2º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, do art. 133 da Lei n. 1.056, de 31 de maio de 1972 em sua redação original e na que foi dada pelo art. 3º da Lei n. 3.125, de 27 de agosto de 1999, e do art. 2º da Lei n. 4.171, de 06 de novembro de 2007, do Município de Itapira, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
2. Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 29 de junho de 2009.
Fernando Grella Vieira
Procurador-Geral de Justiça
eaa