Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

Protocolado nº 164.416/11

Assunto: Inconstitucionalidade de dispositivos da Lei Complementar nº 6, de 10 de novembro de 2011, do Município de Itu

 

Ementa:

1)      Ação direta de inconstitucionalidade. Dispositivos da Lei Complementar nº 6, de 10 de novembro de 2011, que “Autoriza a concessão de incentivos fiscais aos empreendimentos industriais, comerciais e prestadores de serviços no Município da Estância Turística de Itu, e dá outras providências”.

2)      Inconstitucionalidade. Outorga, por lei, de benefício ou incentivo financeiro, consistente na devolução de parte da receita proveniente do repasse do ICMS em razão do incremento do valor adicionado gerado pela empresa instalada no Município, por violação ao princípio de não afetação da receita de impostos. Violação do princípio da igualdade (artigos 111, 144, 163, II, 176, IV, e 297, todos da Constituição do Estado).

 

 

         O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, IV, da Constituição Federal, e ainda nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face dos dispositivos da Lei Complementar nº 6, de 10 de novembro de 2011, do Município de Itu, a seguir apontados, pelos seguintes fundamentos:

1)  DISPOSITIVOS IMPUGNADOS

A Lei Complementar Municipal nº 6, de 10 de novembro de 2011, que “Autoriza a concessão de incentivos fiscais aos empreendimentos industriais, comerciais e prestadores de serviços no Município da Estância Turística de Itu e dá outras providências”, possui dispositivos inconstitucionais, a seguir transcritos:

“(...)

Art. 3.º (...)

VI- Ressarcimento de 50% (cinquenta por cento) da cota parte do ICMS decorrente do valor adicionado gerado pela empresa pelo período de 10 (dez) anos;

§1º - o benefício previsto no inciso VI será concedido após  02 (dois) anos, a partir do início das atividades, e após apuração do valor adicionado e publicação oficial e definitiva do índice de participação do Município, fornecido pela Secretaria da Fazenda do Estado de São P e excluídas as parcelas destinadas à educação e saúde.

§2º - o benefício previsto no inciso VI será calculado nos termos descritos abaixo:

a) verifica-se o crescimento médio do valor adicionado da empresa por ano, nos últimos 02 (dois) anos;

b) verifica-se o crescimento médio do valor adicionado do Município nos últimos 02 (dois) anos;

c) para calcular a participação efetiva da empresa no índice de participação no ICMS do Município, divide-se o valor apurado no crescimento médio da empresa considerados os 02 (dois) últimos anos pelo valor apurado no crescimento médio do município;

d) a base de cálculo do incentivo a ser restituído à empresa será o equivalente a 76% (setenta e seis por cento) do valor bruto transferido ao município pelo Estado, no mês anterior, deduzidas as parcelas destinadas à Educação 25% (vinte e cinco por cento) e Saúde 15% (quinze por cento).

e) o valor a ser restituído será aquele resultante da operação do índice de participação da empresa aplicado sobre a base de cálculo apurada na forma da alínea “d”; e

f) o benefício será concedido mensalmente e restituído até o 30º dia do mês seguinte à ocorrência do fato gerador.

Art. 4º - O percentual de 76% (setenta e seis por cento) a que alude a alínea “d” do artigo1o desta Lei Complementar é aquele definido no item 1.1.1 do manual editado pelo Governo do Estado de São Paulo - A participação dos Municípios na arrecadação do ICMS, - Lei n° 3.201, de 23 de dezembro de 1981, com as alterações introduzidas pela Lei n° 8.510, de 29 de dezembro de 1993.

Art. 5º - O valor do ICMS – Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços a ser ressarcido à empresa, será calculado nos termos descritos na Tabela Anexo I – Demonstrativo do ICMS, que passa a fazer parte integrante desta Lei Complementar.

(...)”

A lei local possibilita a outorga aos empreendimentos industriais, comerciais e prestadores de serviços de incentivos ou benefícios financeiros, dentre eles a devolução de parcela do Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICMS) nos termos dos §§ 1º, 2° e 3º do inc. VI do art. 3º e dos arts. 4º e 5º.

         Os benefícios criados pelo referido diploma são incompatíveis com nosso ordenamento constitucional tributário, como será demonstrado a seguir.

 

2)  INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL: VEDAÇÃO DE VINCULAÇÃO DE RECEITA

Os dispositivos anteriormente mencionados da Lei Complementar nº 6, de 10 de novembro de 2011, do Município de Itu, são verticalmente incompatíveis com os preceitos a seguir transcritos da Constituição do Estado de São Paulo.

                              “(...)

Art. 111. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

(...)

Art. 163. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado ao Estado:

(...)

II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos.

(...)

Art. 176: São vedados:

(...)

IV – a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, ressalvadas as permissões previstas no art. 167, IV, da Constituição Federal e a destinação de recursos para a pesquisa científica e tecnológica, conforme dispõe o artigo 218, § 5º, da Constituição Federal;

(...)

Art. 297. São também aplicáveis no Estado, no que couber, os artigos das Emendas à Constituição Federal que não integram o corpo do texto constitucional, bem como as alterações efetuadas no texto da Constituição Federal que causem implicações no âmbito estadual, ainda que não contempladas expressamente pela Constituição do Estado.

(...)”

Importante recordar, ademais, que os dispositivos acima mencionados (art. 111, art. 163, II, e art. 176, IV, da Constituição Paulista) são normas de reprodução de dispositivos da Constituição da República (art. 37, caput; art. 150, II; e art. 167, IV).

O princípio da não afetação da receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, indica a impossibilidade de vinculação dessa espécie tributária (Kiyoshi Harada. Direito Financeiro e Tributário, São Paulo: Atlas, 1998, 4ª ed., p. 74) e significa que “não pode haver mutilação das verbas públicas. O Estado deve ter disponibilidade da massa de dinheiro arrecadado, destinando-o a quem quiser, dentro dos parâmetros que ele próprio elege como objetivos preferenciais” (Régis Fernandes de Oliveira. Curso de Direito Financeiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 328).

O princípio da não afetação se justifica “na medida em que reserva ao orçamento e à própria Administração, em sua atividade discricionária na execução da despesa pública, espaço para determinar os gastos com os investimentos e as políticas sociais” (Ricardo Lobo Torres. Tratado de Direito Constitucional, Financeiro e Tributário, Rio de Janeiro: Renovar, 2000, 2ª ed., vol. V, p. 275) e “em virtude da generalidade e da impessoalidade que haverão de presidir a elaboração e a execução do orçamento, em obséquio, inclusive, ao postulado de igualdade, que não poderia tolerar privilégios na destinação dos recursos públicos, que pertencem a toda a coletividade e não a um grupo de suseranos” (Eduardo Marcial Ferreira Jardim. Manual de Direito Financeiro e Tributário, São Paulo: Saraiva, 1994, 2ª ed., p. 25).

No domínio da atividade financeira a Administração Pública tem a prerrogativa de estabelecimento de metas e prioridades e os recursos oriundos dos impostos se destinam, em regra, ao atendimento das necessidades gerais, porque “o propósito do princípio é evitar a edição de leis que, vinculando receita proveniente de impostos, prejudiquem o custeio de despesas genéricas pelo orçamento” (Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior. Curso de Direito Constitucional, São Paulo: Saraiva, 1999, 3ª ed., p. 348), assegurando “que os recursos sejam livres e à disposição para a realização de obras e serviços, em conformidade com as necessidades existentes e em obediência à escala de prioridades estabelecida a partir de análise rigorosa da situação existente” (José Afonso da Silva. Comentário contextual à Constituição, São Paulo: Malheiros, 2006, 2ª ed., p. 697).

Contudo, o inciso IV do art. 176 da Constituição Paulista oferece exceções, remetendo a análise diretamente às hipóteses indicadas expressamente no art. 167, IV, da Constituição Federal. Além disso, por força de interpretação sistemática, incluem-se em suas ressalvas as situações mencionadas em outros dispositivos da Constituição Federal (v.g.: arts. 100, § 15, 165, § 8º, 167, § 4º, 204, parágrafo único, art. 216, § 6º, Constituição Federal).

Seja como for, as exceções configuram direito estrito, merecendo interpretação restritiva e refutando ampliações de seu alcance e de seu sentido.

Nesse passo, mostra-se necessário lembrar que “as exceções estão especificadas, tratando-se dos fundos aludidos nos arts. 158 e 159 e também dos recursos de educação e saúde. Ainda é exceção a prestação de garantia às operações de crédito por antecipação de receita e pagamento de crédito da União” (Régis Fernandes de Oliveira. Curso de Direito Financeiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 328).

Não seria possível concluir que os dispositivos impugnados nesta ação estariam legitimados na exceção relacionada à “repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159”.

A Constituição Federal consagra a repartição das receitas tributárias nos arts. 157 a 159, que compreende três modalidades: a) participação direta dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios no produto da arrecadação de imposto de competência da União (arts. 157, I e 158, I); b) participação no produto de impostos de receita partilhada (arts. 157, II, e 158, II a IV); e c) participação em fundos (art. 159).

Argumenta-se, a partir disso, que “nas duas primeiras modalidades (...), as receitas pertencem às entidades aí contempladas nos exatos limites da determinação constitucional (...) Nas hipóteses dos arts. 157, I, e art. 158, I, as entidades beneficiadas apropriam-se diretamente das verbas que lhe pertencem. Nas demais hipóteses, as entidades políticas tributantes devolvem o quantum respectivo às entidades beneficiadas porque a elas pertence de direito, e pode ser exigido judicialmente. Na terceira modalidade, participação nos fundos, regulada pelo art. 159, a entidade beneficiada tem uma expectativa de receber o quantum que lhe cabe, segundo os critérios aí estabelecidos” (Kiyoshi Harada. Direito Financeiro e Tributário, São Paulo: Atlas, 1998, 4ª ed., pp. 55-58).

Em outras palavras, a repartição de receitas tributárias expressa a “participação sobre a arrecadação de impostos alheios” como “principal mecanismo de transferências financeiras intergovernamentais” que podem ser constitucionais (art. 159), legais (Lei Complementar n. 87/96) ou voluntárias (art. 25, Lei Complementar n. 101/00), “diretas (entregues diretamente aos entes menores ou por eles apropriadas mediante mera transferência orçamentária) ou indiretas (realizadas através de fundos de participação ou de destinação, disciplinados no art. 159 da Constituição Federal de 1988)” (Flávio Rubinstein, in Orçamentos Públicos, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 53, coordenação José Maurício Conti).

A Administração Pública “fica também proibida de proceder à vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, salvo, é lógico, a própria repartição do produto da arrecadação dos impostos” (Celso Ribeiro Bastos. Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário, São Paulo: Saraiva, 1992, 2ª ed., p. 79).

Assim, para a entidade dotada de competência tributária a destinação de parcela da receita oriunda de seus impostos é vinculada às entidades beneficiadas com a participação na arrecadação. Mas não é possível que o ingresso da receita daí partilhada na entidade beneficiada venha a ser por esta previamente fixada ou vinculada, ressalvadas as hipóteses dos arts. 198, § 2º, e 212, da Constituição Federal e para os fins ali indicados.

Mais uma vez chega-se à conclusão de que receita resultante de imposto (no caso o ICMS) só pode ser objeto de prévia afetação ou vinculação nos estritos limites fixados no texto constitucional, ainda que oriunda de repartição tributária.

Para que seja efetivo o respeito ao princípio da não afetação é irrelevante se a receita é oriunda de imposto de competência própria ou alheia (isto é, resultante da participação).

A fórmula constitucional expressiva da regra da não afetação não menciona “vinculação de impostos”, mas sim, com dicção sugestiva de maior amplitude, “vinculação da receita de impostos”, o que abrange, destarte, a arrecadação tributária própria ou partilhada (repasse ou participação).

Observe-se, a título de reforço, que o ingresso de recursos decorrentes da participação no produto de impostos de outro ente tributante (transferência corrente) qualifica-se como receita pública derivada de natureza tributária, visto que obtida a partir de obrigação legal que grava o patrimônio particular e transfere suas riquezas ao Estado – perfeitamente amoldada ao conceito de tributo constante do art. 3º do Código Tributário Nacional.

A vantagem prevista na lei local é um benefício ou incentivo financeiro. O erário municipal recebe parcela da arrecadação de imposto alheio e concede um percentual ao particular, gerando dispêndio público, pois, o benefício é egresso do erário municipal.

Consoante elucida a literatura especializada, a partir da arrecadação, “quando o dinheiro entra nos cofres públicos, ele fica sujeito às regras do Direito Financeiro” (Celso Ribeiro Bastos. Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário, São Paulo: Saraiva, 1992, 2ª ed., p. 136), o que compreende as regras da repartição de receitas tributárias.

Registre-se que, como acentua a doutrina, a diferença entre privilégios fiscais e financeiros é apenas jurídico-formal, pois, “tanto faz diminuir-se a receita, pela isenção ou dedução, como aumentar-se a despesa, pela restituição ou subvenção, que a mesma conseqüência financeira será obtida” (Ricardo Lobo Torres. Tratado de Direito Constitucional, Financeiro e Tributário, Rio de Janeiro: Renovar, 2000, 2ª ed., vol. V, p. 259).

O benefício financeiro em foco pode ser encarado como subvenção econômica, espécie de transferência corrente (arts. 12, §§ 2º e 3º, II, Lei n. 4.320/64), na medida em que se refere ao fomento de atividades econômicas.

É, de qualquer maneira, um incentivo financeiro da espécie denominada de restituição de tributo a título de incentivo, assim explicado: “a importância restituída já não é tributo, categoria exclusiva de receita, mas uma prestação de direito público idêntica a qualquer outra obrigação do Estado. Não se confunde com a obrigação tributária, por ser exatamente o inverso desta, aparecendo como obrigação financeira criada por lei. (...) No conceito de subvenção, que é indeterminado e multissignificativo, pode se subsumir, pelas semelhanças que com ela guarda, o de restituição-incentivo, isto é, a devolução de tributo como mecanismo de estímulo fiscal”, inegável renúncia de receita (Ricardo Lobo Torres. Tratado de Direito Constitucional, Financeiro e Tributário, Rio de Janeiro: Renovar, 2000, 2ª ed., vol. V, pp. 267-268, 334-335).

De qualquer modo, sendo resultante de receita tributária de impostos, soa inadmissível sua vinculação a despesa específica e determinada que não se compreende no âmbito das exceções previstas no inciso IV do art. 176 da Constituição Federal.

Em hipótese bem semelhante, assim decidiu o Supremo Tribunal Federal:

“(...)

LEI ESTADUAL QUE DETERMINA QUE OS MUNICÍPIOS DEVERÃO APLICAR, DIRETAMENTE, NAS ÁREAS INDÍGENAS LOCALIZADAS EM SEUS RESPECTIVOS TERRITÓRIOS, PARCELA (50%) DO ICMS A ELES DISTRIBUÍDA - TRANSGRESSÃO À CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DA NÃO-AFETAÇÃO DA RECEITA ORIUNDA DE IMPOSTOS (CF, ART. 167, IV) E AO POSTULADO DA AUTONOMIA MUNICIPAL (CF, ART. 30, III) - VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL QUE IMPEDE, RESSALVADAS AS EXCEÇÕES PREVISTAS NA PRÓPRIA CONSTITUIÇÃO, A VINCULAÇÃO, A ÓRGÃO, FUNDO OU DESPESA, DO PRODUTO DA ARRECADAÇÃO DE IMPOSTOS - INVIABILIDADE DE O ESTADO-MEMBRO IMPOR, AO MUNICÍPIO, A DESTINAÇÃO DE RECURSOS E RENDAS QUE A ESTE PERTENCEM POR DIREITO PRÓPRIO - INGERÊNCIA ESTADUAL INDEVIDA EM TEMA DE EXCLUSIVO INTERESSE DO MUNICÍPIO - DOUTRINA - PRECEDENTES - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - CONFIGURAÇÃO DO ‘PERICULUM IN MORA’ - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA (STF, ADI-MC 2.355-PR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 19-06-2002, m.v., DJe 28-06-2007).

(...)”

Nesse julgamento, o eminente Relator, Ministro Celso de Mello, assentou premissas eloquentes integralmente ajustadas à espécie:

“(...)

O exame do diploma legislativo estadual em causa parece evidenciar que a hipótese de afetação da receita oriunda da arrecadação de imposto (ICMS), nele prevista, não se subsume ao rol taxativo, que, em numerus clausus, encontra fundamento no art. 167, IV, da Constituição da República, expondo-se, em conseqüência, tal vinculação – porque instituída com inobservância do modelo federal – à censura do próprio magistério jurisprudencial firmado, no tema, pelo Supremo Tribunal Federal, quer sob a égide da Carta Política anterior (RTJ 120/997, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI – RTJ 127/56, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI – RE 100.435-SP, Rel. Min. SOARES MUÑOZ), quer em face da vigente Lei Fundamental (RDA 185/148, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – RDA 192/174, Rel. Min. CARLOS VELLOSO).

(...)”

No Col. Órgão Especial do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo a matéria foi igualmente examinada, reconhecendo-se a inconstitucionalidade de dispositivo legal análogo, quando do julgamento da ADI nº 0427921-20.2010.8.26.0000, Rel. Des. Renato Nalini, j. 03 de fevereiro de 2011, com a seguinte ementa:

“(...)

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. INCENTIVOS FISCAIS PARA EMPRESAS QUE SE ESTABELECEREM NO MUNICÍPIO. DEVOLUÇÃO DE PARCELA DO ICMS REPASSADO À ENTIDADE FEDERATIVA LOCAL. AFETAÇÃO DA RECEITA DE IMPOSTOS A DESPESA PÚBLICA. VULNERAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 176, INCISO IV, DA CONSTITUIÇÃO DE SÃO PAULO. AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PROCEDENTE.

A vinculação de parcela de ICMS repassado pelo Estado ao Município gera situação incompatível com o princípio da isonomia e transfere para o ambiente municipal a nefasta consequência do fenômeno conhecido como guerra fiscal já existente no Brasil entre vários dos Estados da Federação.

(...)”

Como última, porém não menos importante observação, a solução normativa glosada nesta inicial ainda provoca tratamento desigual entre contribuintes que estão em condição equivalente, tangenciando, por conseguinte, o princípio constitucional da isonomia, aplicável também à Administração Tributária.

Por essas razões, mostra-se necessária a declaração da inconstitucionalidade dos dispositivos legais acima destacados.

 

3)  CONCLUSÃO E PEDIDO

Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade dos §§ 1º, 2° e 3º do inc. VI do art. 3º e dos arts. 4º e 5º, todos da Lei Complementar Municipal nº 6, de 10 de novembro de 2011, que “Autoriza a concessão de incentivos fiscais aos empreendimentos industriais, comerciais e prestadores de serviços no Município da Estância Turística de Itu e dá outras providências”.

Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Senhor Prefeito Municipal de Itu, bem como citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

Termos em que,

Aguarda-se deferimento.

São Paulo, 23 de maio de 2012.

 

        Márcio Fernando Elias Rosa

        Procurador-Geral de Justiça

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Protocolado nº 164.416/11

Assunto: Inconstitucionalidade de dispositivos da Lei Complementar nº 6, de 10 de novembro de 2011, do Município de Itu

 

 

 

 

 

 

 

1.     Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade em face dos §§ 1º, 2° e 3º do inc. VI do art. 3º e dos arts. 4º e 5º, todos da Lei Complementar Municipal nº 6, de 10 de novembro de 2011, que “Autoriza a concessão de incentivos fiscais aos empreendimentos industriais, comerciais e prestadores de serviços no Município da Estância Turística de Itu e dá outras providências”, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.     Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

São Paulo, 23 de maio de 2012.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

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