EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

Protocolado nº 27.611/09

Assunto: Inconstitucionalidade da Lei nº 1.216, de 20 de setembro de 2002, do Município de Monteiro Lobato.

 

Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada pelo PGJ, da Lei nº 1.216, de 20 de setembro de 2002, do Município de Monteiro Lobato, que “dispõe sobre a autorização para instalação de Escritório Virtual e consequentes aberturas de firmas prestadoras de serviço no mesmo endereço”. Norma cujo escopo é atrair contribuintes do ISS e aparelhar o Município para a “guerra fiscal”. Conceitos de estabelecimento e de local do domicílio do prestador reservados pela Constituição Federal à lei complementar (art. 156, III, CF). Legislador municipal que, diante do pacto federativo e do princípio da repartição constitucional das competências, está impedido de inovar tais conceitos. Ofensa ao art. 144 da Constituição do Estado. Precedentes do TJ. Pedido de reconhecimento da inconstitucionalidade da referida lei.

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º e art. 129, inciso IV da Constituição Federal, e ainda art. 74, inciso VI e art. 90, inciso III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE da Lei nº 1.216, de 20 de setembro de 2002, do Município de Monteiro Lobato, pelos fundamentos a seguir expostos.

A edição nº 1938 da revista VEJA, de 11 de janeiro de 2006, trouxe curiosa reportagem sobre a “guerra fiscal” travada pelos municípios em busca de maior arrecadação do ISS. A matéria dá conta de que determinadas cidades oferecem alíquotas reduzidas desse tributo e, com isso, atraem inúmeras empresas prestadoras de serviço, que neles se instalam “só no papel”. De acordo com o informativo, determinado município deste Estado conseguiu atrair cerca de 2.400 empresas prestadoras de serviço (número expressivo para uma comuna com 6.000 habitantes), que foram cadastradas pela Prefeitura como contribuintes nos endereços do ginásio de esportes, do edifício-sede da Prefeitura, de um lago e até do cemitério da cidade.

De acordo a revista:

“A guerra dos municípios beneficia principalmente profissionais liberais e grandes empresas de prestação de serviços, que embolsam o imposto que deveria abastecer os caixas das prefeituras. E obtêm essa vantagem de uma forma muito mais segura do que as empresas que se envolveram na guerra dos estados. (...) No caso do ISS, a mudança ocorre, na maioria das vezes, apenas no papel. Arranja-se um endereço na cidade que dá desconto de ISS e transfere-se a sede para lá. Em geral, a alteração é só de fachada e não implica nenhum custo administrativo permanente, como aluguéis e funcionários. Não raro, a nova sede resume-se a uma caixa postal. Os prestadores de serviços transferem sua sede, fazem jus ao benefício fiscal, mas continuam atuando e obtendo a maior parte de seu faturamento nas capitais e grandes cidades” (cf. em http://veja.abril.com.br/110106/p_094.html. Acesso em 24 abr. 2009).

O Município de Monteiro Lobato resolveu participar da “guerra fiscal”. Editou a Lei nº 1.216, de 20 de setembro de 2002, objeto da presente ação direta de inconstitucionalidade, que tem o seguinte teor:

LEI nº 1.216, de 20 de setembro de 2002

Dispõe sobre autorização para instalação de Escritório Virtual e conseqüentes aberturas de firmas prestadoras de serviços no mesmo endereço.

JOÃO BUENO DA SILVA, Prefeito Municipal de Monteiro Lobato, usando das atribuições que lhe são conferidas por Lei, em especial a Lei Orgânica do Município de Monteiro Lobato.

Faço saber que a Câmara Municipal de Monteiro Lobato aprova e eu sanciono e promulgo a seguinte Lei:

Art. 1º Fica permitida a instalação de escritório denominado Escritório Virtual, cuja finalidade exclusiva será de representar diversas empresas prestadoras de serviços, abertas no mesmo endereço, excetuando-se as representações de firmas de serviços contábeis.

Parágrafo único. Fica obrigada abertura de inscrição individualizada, tanto para o Escritório Virtual, bem como para as firmas que vierem a se instalar no Município, obedecendo-se ainda as disposições contidas no Código Tributário Municipal.

Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 3º Revogam-se as disposições em contrário.

Prefeitura Municipal de Monteiro Lobato, 20 de setembro de 2002.

JOÃO BUENO DA SILVA Prefeito Municipal

O desiderato está implícito na mensagem justificativa que acompanhou o projeto de lei subscrita pelo chefe do Poder Executivo. Nela o Alcaide afirmou que a propositura era “fundamental para o Município”, para que pudesse “trabalhar a sua receita de forma a melhorar o seu orçamento”. Solicitou tramitação urgente “em face da importância do projeto para as finanças municipais” (fls. 113).

É dos autos que, com base nessa lei, diversas empresas obtiveram inscrição no cadastro de contribuintes, como lhes faculta o parágrafo único do art. 1º, e, desse modo, se beneficiam da tributação do ISS com alíquota reduzida praticada pelo referido município.

Uma vez aprovado, no entanto, o ato normativo se mostra incompatível com o artigo 144 da Constituição Estadual, como se verá.

Pelo art. 22, inc. I, da Constituição Federal, compete privativamente à União legislar sobre direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho.

No exercício dessa competência, o legislador federal estabeleceu no Código Civil:

Art. 75. Quanto às pessoas jurídicas, o domicílio é:

I - da União, o Distrito Federal;

II - dos Estados e Territórios, as respectivas capitais;

III - do Município, o lugar onde funcione a administração municipal;

IV - das demais pessoas jurídicas, o lugar onde funcionarem as respectivas diretorias e administrações, ou onde elegerem domicílio especial no seu estatuto ou atos constitutivos.

§ 1o Tendo a pessoa jurídica diversos estabelecimentos em lugares diferentes, cada um deles será considerado domicílio para os atos nele praticados.

§ 2o Se a administração, ou diretoria, tiver a sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da pessoa jurídica, no tocante às obrigações contraídas por cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento, sito no Brasil, a que ela corresponder.

E, no Código Tributário Nacional:

Art. 127. Na falta de eleição, pelo contribuinte ou responsável, de domicílio tributário, na forma da legislação aplicável, considera-se como tal:

I - quanto às pessoas naturais, a sua residência habitual, ou, sendo esta incerta ou desconhecida, o centro habitual de sua atividade;

II - quanto às pessoas jurídicas de direito privado ou às firmas individuais, o lugar da sua sede, ou, em relação aos atos ou fatos que derem origem à obrigação, o de cada estabelecimento;

III - quanto às pessoas jurídicas de direito público, qualquer de suas repartições no território da entidade tributante.

§ 1º Quando não couber a aplicação das regras fixadas em qualquer dos incisos deste artigo, considerar-se-á como domicílio tributário do contribuinte ou responsável o lugar da situação dos bens ou da ocorrência dos atos ou fatos que deram origem à obrigação.

§ 2º A autoridade administrativa pode recusar o domicílio eleito, quando impossibilite ou dificulte a arrecadação ou a fiscalização do tributo, aplicando-se então a regra do parágrafo anterior.

De outro giro, em decorrência da repartição da competência tributária, a Constituição da República concedeu aos Municípios a possibilidade de instituir impostos sobre serviços de qualquer natureza, cujos contornos se definem em lei complementar, verbis:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

(...)

III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.

(...)

§ 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar:

I - fixar as suas alíquotas máximas e mínimas;

II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior.

III - regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.

A lei complementar referida no dispositivo constitucional é a de nº 116, de 31 de julho de 2003, das quais se destacam as seguintes regras:

Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador.

(...)

Art. 3º O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local:

(...)

Art. 4º Considera-se estabelecimento prestador o local onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação ou contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas.

Art. 5º Contribuinte é o prestador do serviço.

(...)

Quanto aos Municípios, por força do art. 30, CF:

Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

A Constituição da República não permite que o legislador local discipline matéria reservada à legislação federal ou a estadual. A suplementação legislativa deve se efetivar de modo que as regras não contrariem a regulamentação da União e do Estado-membro.

No caso em análise, ao permitir a instalação de “escritórios virtuais”, com “abertura de inscrição individualizada”, o legislador lobatense acabou burlando os conceitos legais de domicílio e local de estabelecimento criados pelas normas federais acima reproduzidas.

Sobre o local do recolhimento do ISS, explica Hely:

“O contribuinte – vale dizer, o prestador do serviço – pode possuir ou não estabelecimento fixo, pois o imposto, pela lei, será devido: a) no local do estabelecimento prestador; b) não havendo estabelecimento, no local do domicílio do prestador; c) excetuam-se as hipóteses previstas nos incisos do art. 3º.

Essas disposições legais têm dupla finalidade: dirimir possíveis conflitos de competência tributária entre Municípios e resguardar o contribuinte da bitributação.

Assim, ao indicar o local do estabelecimento prestador do serviço como primeira regra para a fixação da competência tributária, a lei exclui os demais, inclusive aquele em que o serviço foi prestado. O Município competente para arrecadar o ISS será, portanto, exclusivamente o do estabelecimento prestador do serviço, ainda que a empresa ou o profissional tenha seu estabelecimento principal (matriz) em outra Comuna. Para tanto, o Município deverá atender ao disposto em sua lei tributária, de modo que se esta não contemplar a espécie o serviço não estará sujeito ao ISS mesmo que a lei do Município onde o serviço foi prestado, oou onde o prestador tenha seu principal estabelecimento, o faça.

Estabelecimento, para fins do ISS, é o lugar – como tal compreendido o prédio, equipamento e instalações, onde o contribuinte exerce suas atividades ou de onde as administra. Se tiver mais de um o ISS será devido ao Município onde se situar o estabelecimento que efetivamente prestou o serviço” (Meirelles, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 16ª. ed., São Paulo: Malheiros, 2008, p. 227-8 – g.n.).

Ora, quando o legislador municipal edita ato normativo que tangencia a competência do legislador federal, não se tem pura e simplesmente por violada uma norma contida na Constituição Federal, mas sim, de modo patente e direto, verifica-se o desrespeito a um princípio constitucional latente na Lei Maior, qual seja, o princípio da repartição constitucional de competências.

Este decorre do pacto federativo assentado na Constituição de 1988, extraível dos art. 1º e 18 da Lei Maior, bem como de outros dispositivos constitucionais que indicam as matérias atribuídas às competências administrativas e legislativas de cada ente da Federação.

É assente na doutrina que a competência legislativa, em nosso sistema constitucional, é definida pelo critério da predominância do interesse.

É a clássica lição de José Afonso da Silva, para quem “o princípio geral que norteia a repartição de competência entre as entidades componentes do Estado Federal é o da predominância do interesse, segundo o qual à União caberão aquelas matérias e questões de predominante interesse geral, nacional, ao passo que aos Estados tocarão as matérias e assuntos de predominante interesse regional, e aos Municípios concernem os assuntos de interesse local (...)” (Curso de direito constitucional positivo, 28ªed., São Paulo, Malheiros, 2007, p.478).

Note-se, a propósito, que não se trata de invocar norma da Constituição Federal como parâmetro para o controle da constitucionalidade de lei municipal pelo E. Tribunal de Justiça. Isso, de fato, não seria possível, pois significaria usurpação da competência do STF.

Entretanto, a repartição constitucional de competências é princípio estabelecido pela CF/88 (art.1º e 18), pois reflete um dos aspectos mais relevantes do pacto federativo, ao definir os limites da autonomia dos entes que integram a Federação brasileira. Isso decorre claramente da interpretação sistemática da Constituição Federal.

Daí que, violando-se um princípio constitucional (pacto federativo – repartição constitucional de competências), o que se tem é a ofensa ao art. 144 da Constituição Paulista que prevê que “Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.

Acrescente-se também que o art. 29 caput da CR/88 estabelece tal determinação, ao prever que os Municípios, em sua organização, devem atender os princípios estabelecidos na Constituição Federal, bem como na Constituição do respectivo Estado.

Relevante notar que quando do julgamento da ADI 130.227.0/0-00 em 21.08.07, rel. Des. Renato Nalini, esse E. Tribunal de Justiça acolheu a tese acima aventada (possibilidade de declaração de inconstitucionalidade de lei municipal por violação do princípio da repartição de competências estabelecido pela Constituição Federal), sendo relevante trazer excerto de voto do i. Desembargador Walter de Almeida Guilherme, imprescindível para a elucidação da questão:

“(...) Ora, um dos princípios da Constituição Federal – e de capital importância – é o princípio federativo, que se expressa, no Título I, denominado ‘Dos Princípios Fundamentais’, logo no art.1º: ‘A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito...’.

Sendo a organização federativa do Estado brasileiro um princípio fundamental da República do Brasil, e constituindo elemento essencial dessa forma de estado a distribuição de competência legislativa dos entes federados, inescapável a conclusão de ser essa discriminação de competência um princípio estabelecido na Constituição Federal.

Assim, quando o referido art.144 ordena que os Municípios, ao se organizarem, devem atender os princípios da Constituição Federal, fica claro que se estes editam lei municipal fora dos parâmetros de sua competência legislativa, invadindo a esfera de competência legislativa da união, não estão obedecendo ao princípio federativo, e, pois, afrontando estão o art.144 da Constituição do Estado (...)” (trecho do voto do Des. Walter de Almeida Guilherme, no julgamento da ADI 130.227.0/0-00).

Esse mesmo fundamento, para fins de reconhecimento de inconstitucionalidade de lei municipal, foi identificado quando do julgamento da ADI 150.574-0/9-00, rel. des. Debatin Cardoso, em 07.05.08, do qual se destaca o seguinte trecho do voto vencedor:

“(...) Como bem salientado no parecer do douto Procurador-Geral de Justiça: ‘a repartição constitucional de competências é princípio estabelecido pela CF/88 (art. 1º e 18), pois reflete um dos aspectos mais relevantes do pacto federativo, ao definir os limites da autonomia dos entes que integram a Federação brasileira. Isso decorre claramente da interpretação sistemática da Constituição Federal.

Daí que, violando-se um princípio constitucional (pacto federativo – repartição constitucional de competências), o que se tem é a ofensa ao art.144 da Constituição Paulista’ (...)”.

No caso dos autos, o legislador municipal editou lei criadora de “escritório virtual” – no singular – com o fim de “representar diversas empresas prestadoras de serviços, abertas no mesmo endereço” (art. 1º., caput), ensejando inscrições individualizadas das firmas representadas (§ 1º), decorrendo daí a multiplicação dos contribuintes.

É curial que esses dispositivos estão tratando dos conceitos de estabelecimento e de local do domicílio do prestador, objeto do art. 3º da Lei Complementar (Federal) nº 116/03, cujo fundamento de validade se extrai do art. 156, inc. III, da Constituição Federal.

Nem se alegue que o Município editou a norma questionada para suplementar a legislação federal.

A cláusula contida no art. 30 II da CR/88, pela qual o Município pode “suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, deve ser interpretada em consonância com o disposto no inciso I do mesmo artigo, que prevê a competência para que esse ente federativo legisle sobre “assuntos de interesse local.

Em outros termos, é evidente que o legislador municipal pode editar normas que suplementem regras gerais fixadas pelo legislador federal, ou pelo estadual, naquelas matérias que são inseridas no art. 24 da CR/88. Só poderá fazê-lo, entretanto, nos limites do respectivo interesse local.

Aliás, é curial a observação de que, assim não fosse o Poder Legislativo Municipal poderia tratar, de forma ampla, sobre assuntos que são de interesse geral (estadual ou nacional).     A regulamentação da matéria versada na lei em exame, pelo Município, não é viável, por uma simples razão: deve receber tratamento uniforme em todo o território estadual, quiçá nacional.

Explicando o art. 3º da Lei Complementar nº 116/03, Hely Lopes Meirelles afirma o seguinte:

O Código Tributário Nacional editou normas específicas para a caracterização do domicílio tributário, erigindo como regra principal a possibilidade de sua eleição pelo contribuinte; só na falta desta é que se procurará identificar o domicílio tributário com base nos elementos fornecidos pela lei (art. 127 e §§). Não nos parece, todavia, que tais disposições sejam válidas para a caracterização do domicílio do prestador do serviço, nos termos do art. 3º da Lei Complementar nº 116/2003. Esta norma refere-se a domicílio sem qualificá-lo, daí se inferindo que o legislador quis mencionar o domicílio civil, que dispensa o adjetivo, diversamente do que ocorre com o domicílio tributário. Além do mais, as disposições do Código Tributário, se aplicáveis à espécie, prejudicariam o principal escopo da referida lei complementar – qual seja, o de fixar competência para o ISS, dirimindo possíveis conflitos intermuniipais. Com efeito, bastaria ao prestador de serviços eleger domicílio diverso daquele em que efetivamente exerce suas atividades para burlar a lei, e até mesmo se subtrair à obrigação tributária (no caso de não ser tributado o serviço no Município da eleição) (Meirelles, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 16ª. ed., São Paulo: Malheiros, 2008, p. 230-1 – g.n.).

Em outras palavras, a predominância do interesse geral indica a inexistência de competência suplementar do Município para definir o conceito do local da prestação do serviço, mesmo que de forma dissimulada.

E assim, mais que violar um dispositivo constitucional, a lei em exame transgrediu o próprio princípio da repartição constitucional de competências, aplicável ao caso por força do art. 144 da Constituição do Estado.

Por tais motivos, impõe-se reconhecer a inconstitucionalidade da Lei nº 1.216, de 20 de setembro de 2002, do Município de Monteiro Lobato.

Assim, aguarda-se o recebimento e processamento da presente Ação Declaratória, para que ao final seja julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade da Lei nº 1.216, de 20 de setembro de 2002, do Município de Monteiro Lobato.

Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

 

São Paulo, 24 de abril de 2009.

 

                        Fernando Grella Vieira

                        Procurador-Geral de Justiça

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Protocolado nº  27.611/09 - MP

Interessado:  Juízo de Direito da 2ª Vara Criminal da Comarca de São José dos Campos

Assunto: Inconstitucionalidade da Lei nº 1.216, de 20 de setembro de 2002, do Município de Monteiro Lobato.

 

 

 

 

 

 

1.     Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face da Lei nº 1.216, de 20 de setembro de 2002, do Município de Monteiro Lobato, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.     Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

 

                   São Paulo, 24 de abril de 2009.

 

 

 

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

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