Excelentíssimo Senhor
Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo
O Procurador-Geral de Justiça, com
fundamento nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição Estadual, no art. 116,
VI, da Lei Complementar Estadual n. 734/93, e nos arts. 125, § 2º, e 129, IV,
da Constituição Federal, e com base nos elementos de convicção constantes do
expediente anexo (Protocolado n. 34.084/07), vem, respeitosamente, promover a
presente AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE, com pedido de liminar, da Lei n. 2.434, de 20 de
dezembro de 2007, do Município de Rio das Pedras, pelos motivos seguir
expostos:
1. O Município
de Rio das Pedras instituiu pelas Leis Municipais n. 2.314, de 20 de dezembro
de 2005, e n. 2.365, de 21 de dezembro de 2006 (fls. 07/08, 14/16, 89/90),
contribuição para custeio da iluminação pública.
2. Essas leis
previam, em apertada síntese, que referida contribuição: a) era exigida do
consumidor de energia elétrica residente ou estabelecido no território
municipal e cadastrado perante a concessionária distribuidora de energia
elétrica que detém a concessão ou permissão no território (art. 3º); b) a base
de cálculo era o valor mensal do consumo total de energia elétrica constante
nas faturas emitidas pela empresa concessionária ou permissionária a seus
consumidores (art. 4º); c) o valor da contribuição era calculado sobre o valor
do consumo individual constante de tabela anexa (art. 5º).
3. Ambas as
normas tinham vigência temporária: a Lei n. 2.314/05, de 01 de janeiro a 31 de
dezembro de 2006 (art. 10); a Lei n. 2.365/06, de 01 de janeiro a 31 de
dezembro de 2007 (art. 10).
4. Em seqüência,
foi editada a Lei Municipal n. 2.434, de 20 de dezembro de 2007 (fls. 38/40,
75/77), com vigência transitória determinada para o período entre 01 de janeiro
e 31 de dezembro de 2008 (art. 10), e que reproduz as disposições das
anteriores.
5. Tal e qual,
na Lei n. 2.434/07 é instituída contribuição para custeio de iluminação pública
prevendo, em linhas gerais: a) sujeição passiva do consumidor de energia
elétrica residente ou estabelecido no território municipal e cadastrado perante
a concessionária distribuidora de energia elétrica que detém a concessão ou
permissão no território (art. 3º); b) a base de cálculo é o valor mensal do
consumo total de energia elétrica constante nas faturas emitidas pela empresa
concessionária ou permissionária a seus consumidores (art. 4º); c) o valor da
contribuição é calculado sobre o valor do consumo individual constante de
tabela anexa (art. 5º).
6. É deste
teor a Lei Municipal n. 2.434/07:
“Art. 1º. Fica instituída, no âmbito do
Município de Rio das Pedras, a CIP - Contribuição para Custeio da Iluminação
Pública, prevista no artigo 149-A da Constituição Federal.
Parágrafo Único. O serviço previsto
no ‘caput’ deste artigo compreende o
consumo de energia destinada à iluminação de vias, logradouros e demais bens
públicos, e a instalação, manutenção, melhoramento e expansão da rede de
iluminação pública.
Art. 2º. É fato gerador da CIP o consumo
de energia elétrica por pessoa natural ou jurídica, mediante ligação regular de
energia elétrica no território do Município.
Art. 3º. Sujeito passivo da CIP é o
consumidor de energia elétrica residente ou estabelecido no território do
Município e que esteja cadastrado junto à concessionária distribuidora de
energia elétrica que detém a concessão e/ou permissão no território do
Município.
Art. 4º. A Base de cálculo da CIP é o
valor mensal do consumo total de energia elétrica constante nas faturas emitidas
pela empresa concessionária e/ou permissionária a seus consumidores.
Art. 5º. O valor de contribuição será
calculado sobre o valor do consumo individual, de acordo com a tabela do Anexo
I.
Parágrafo único. A determinação da
classe/categoria de consumidor observará as normas da Agência Nacional de
Energia Elétrica – ANEEL ou órgão regular que vier a substituí-la.
Art. 6º. A CIP será lançada para
pagamento nas faturas mensais de consumo de energia elétrica.
§ 1º. O município conveniará ou
contratará com a concessionária de Energia Elétrica a forma de cobrança e repasse
dos recursos relativos a esta contribuição, conforme minuta que fica fazendo
parte da presente lei.
§ 2º. O convênio ou contrato a que se
refere o caput deste artigo deverá, obrigatoriamente, prever repasse imediato
do valor arrecadado pela concessionária ao município, retendo os valores
necessários ao pagamento da energia fornecida para iluminação pública e os
valores fixados para remuneração dos custos de arrecadação e de débitos que,
eventualmente, o município tenha ou venha a ter com a concessionária, relativos
aos serviços supracitados.
Art. 7º. Fica aberto uma Conta
Corrente Especial de Iluminação Pública, que será administrada pelo
Departamento Municipal de Finanças.
§ 1º. As despesas decorrentes da
execução dos serviços previstos no § Único do artigo 1º desta Lei Complementar,
correrão por conta da unidade executora, logradouros e vias urbanas constantes
no Orçamento Municipal de 2008.
§ 2º. Os recursos da Conta Corrente
Especial de Iluminação Pública serão aplicados especificamente no custeio da
Iluminação Pública do Município.
Art. 8º. O Poder Executivo
regulamentará esta Lei Complementar por Decretos no prazo máximo de 60
(sessenta) dias corridos, contados da data de sua publicação, no que couber, e
baixará as normas necessárias à sua aplicação.
Art. 9º. Fica o Poder Executivo
autorizado a firmar com a concessionária ou permissionária do seu município, o
convênio ou contrato a que se refere os Parágrafos 1º e 2º, do artigo 6º, da
presente Lei Complementar.
Art. 10. Esta Lei Complementar entra
em vigor em 1º de janeiro de 2008 e terá vigência até 31 de dezembro de 2008.
Art. 11. Revogam-se as disposições em
contrário, em especial a Lei Complementar n. 2.365 de 21 de dezembro de
7. A lei local
acima reproduzida é verticalmente incompatível com a Constituição do Estado de
São Paulo, mais precisamente com os seus arts. 5º, 111, 144, 160, § 1º e 163,
II, que dispõem o seguinte:
“Art. 5º. São Poderes do Estado,
independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
§ 1º. É vedado a qualquer dos Poderes
delegar atribuições.
(...)
Art.
(...)
Art. 144. Os Municípios, com
autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se
auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na
Constituição Federal e nesta Constituição.
(...)
Art. 160. Compete ao Estado instituir
(...)
§ 1º. Sempre que possível, os
impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica
do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para
conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos
individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades
econômicas do contribuinte.
(...)
Art. 163. Sem prejuízo de outras
garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado ao Estado:
(...)
II – instituir tratamento desigual
entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer
distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida,
independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos”.
8. Na ordem
constitucional em vigor, os Municípios integram a Federação e têm assegurada
sua autonomia, atendidos os princípios estabelecidos na Carta Magna e na Constituição
do respectivo Estado (art. 29, Constituição Federal). Essa autonomia se revela
pelas competências outorgadas a tais entes federativos para legislarem sobre
assuntos de interesse local; suplementarem a legislação federal e a estadual no
que couber; instituírem e arrecadarem os tributos que lhes são próprios (art.
30, Constituição Federal), a par de outras.
9. É bem de
ver, porém, que a competência tributária dos entes públicos municipais (consubstanciada
na capacidade de instituir tributos) encontra limites nas normas da
Constituição Federal atinentes ao Sistema Tributário Nacional, dispostas nos arts.
145 e seguintes (e reproduzidas nos arts. 159 e seguintes da Constituição
Estadual), que envolvem princípios incontornáveis, dentre os quais as regras
matrizes dos tributos.
10. Realmente,
mesmo admitindo-se que a Constituição em vigor não criou tributos, é certo que,
além de discriminar competências, ela traçou a “norma padrão de incidência” de
cada um dos tributos que podem ser instituídos pelas entidades estatais. Assim,
ao conferir às pessoas políticas competência para a instituição de impostos,
taxas e contribuições, a Constituição Federal no seu art. 145 classifica
juridicamente os tributos, traçando o modelo de cada um deles e vinculando ao
legislador ordinário.
11. De acordo
com o magistério de Roque Antonio Carrazza, “a Constituição, ao discriminar as
competências tributárias, estabeleceu - ainda que, por vezes, de modo implícito
e com uma certa margem de liberdade para o legislador - a norma padrão de
incidência (o arquétipo genérico, a regra matriz) de cada exação. Noutros
termos, ela apontou a hipótese de incidência possível, o sujeito ativo
possível, o sujeito passivo possível, a base de cálculo possível e a alíquota
possível, das várias espécies e subespécies de tributos. Em síntese, o
legislador, ao exercitar a competência tributária, deverá ser fiel à norma
padrão de incidência do tributo, pré-traçada na Constituição. O legislador
(federal, estadual, municipal ou distrital)
enquanto cria o tributo, não pode fugir deste arquétipo constitucional”
(Curso de Direito Constitucional
Tributário, 4.ª ed., p. 257).
12. Nesse mesmo
sentido é a orientação que emerge da mais alta Corte Judiciária brasileira,
acentuando que “o fundamento do poder de tributar (...) reside no dever
jurídico de essencial e estrita fidelidade dos entes tributantes ao que
imperativamente dispõe a Constituição da República” (Min. Celso de Mello, Informativo
STF n. 125), sendo, portanto, inconstitucional qualquer tributo criado fora
desses limites.
13. No caso sob
exame, com fundamento no permissivo do art. 149-A da Constituição Federal, a
Câmara de Vereadores editou a Lei n. 2.434, de 20 de dezembro de 2007,
instituindo a cobrança de contribuição para o custeio do serviço de iluminação
pública que tem por fato gerador o consumo de energia elétrica por pessoa
natural ou jurídica, mediante ligação regular de energia elétrica no território
do Município (art. 2º), definindo como sujeito passivo o consumidor de energia
elétrica residente ou estabelecido no Município e que esteja cadastrado na
distribuidora de energia elétrica (art. 3º), e precisando como base de cálculo o
valor mensal do consumo total de energia elétrica constante nas faturas
emitidas pela empresa concessionária e/ou permissionária, a seus consumidores
(art. 4º) e como alíquota um valor cobrado sobre o consumo individual
especificado na tabela do Anexo I (art. 5º).
14. Essa tabela
(fl. 76) indica quatro faixas, a saber: residencial, comercial, industrial e
poder público. Em cada uma delas, o valor da contribuição é medido conforme o
volume do consumo individual de energia elétrica de modo progressivo, ou seja,
para consumo menor valores menores, para consumo maior, valores maiores.
15. Curial o
registro histórico. Antes da promulgação da Emenda Constitucional n. 39/02, que
possibilitou a instituição e a cobrança desse tributo, inúmeros Municípios
implantaram a taxa de iluminação pública, declarada reiteradamente
inconstitucional pelo Colendo Supremo Tribunal Federal (RREE 231.764 e 233.332,
v.g.), por ser serviço inespecífico e
indivisível.
16. Não obstante
a Emenda n.
17. A tabela a
que se refere o art. 5º da lei local estabelece, sem dúvida alguma, valores
progressivos e diferenciados.
18. Entretanto,
por sua natureza peculiar, a contribuição de iluminação pública não condiz com
o regime de alíquotas progressivas, tal como previsto na lei ora discutida,
mormente pela ausência de autorização constitucional expressa, ou seja, esse
tipo de tributo não pode variar na razão da presumível capacidade contributiva
do sujeito passivo da obrigação tributária.
19. Mesmo se
fosse juridicamente possível a adoção do critério da progressividade na
definição das alíquotas dessa contribuição, o que se admite tão-só para
argumentar, não haveria como aferir a capacidade contributiva simplesmente pelo
padrão de consumo de energia elétrica, de acordo com a respectiva classe de
consumidores (industrial, comercial, residencial e poder público), uma vez que
esse critério não se presta à efetiva realização da justiça tributária.
20. Com efeito,
o critério legalmente eleito - a quantidade de consumo - não permite avaliar a
real capacidade econômica do contribuinte. Para que se alcance a isonomia
tributária, por meio de avaliação da capacidade econômica do contribuinte, é
indispensável a consideração de outros dados, como os rendimentos e as
atividades econômicas do contribuinte, conforme expresso na regra
constitucional.
21. Apenas para
ilustrar essa situação, tome-se como exemplo o imóvel de alto padrão que seja
habitado por apenas um morador, o qual passa a maior parte do tempo fora.
Certamente, o seu consumo de energia elétrica será infinitamente inferior ao de
uma moradia coletiva (v.g. um cortiço), que, em regra, é ocupada por pessoas
mais humildes. Por conta do critério legalmente estabelecido, essas últimas
serão obrigadas ao pagamento de contribuição de iluminação pública em montante
superior ao do primeiro, o que, além de desarrazoado, atenta contra o postulado
constitucional da isonomia.
22. Daí a lúcida
advertência lançada pelo Des. Paulo Shintate ao examinar propositura
semelhante:
“essa progressividade (...)
estabelecida de forma desvinculada da objetiva e adequada avaliação da
capacidade contributiva do sujeito passivo conduz, ao contrário do pretendido
pela norma constitucional, à injustiça e à quebra do princípio da isonomia
tributária” (TJSP, ADI 59.340.0/8, 26-04-2000).
23. Ademais, prevalece no Excelso Pretório o
entendimento de que o legislador ordinário, fora das hipóteses taxativamente
indicadas no texto da Carta Política (arts. 153, § 2º, I, 153, § 4º, 156, § 1º,
182, § 4º, II, 195, § 9º), não pode valer-se da progressividade na definição de
alíquotas pertinentes à contribuição previdenciária (STF, ADI 2.062-DF). Embora
no precedente em foco tenha sido tratado especificamente da instituição de
alíquotas progressivas à cobrança de contribuição previdenciária, os seus
fundamentos são aplicáveis a este caso, em que se contesta a adoção por lei do
critério da progressividade na cobrança da contribuição de iluminação pública.
24. De resto,
cumpre anotar que, em se tratando de contribuição destinada ao custeio do
serviço de iluminação pública, a sua base de cálculo deveria guardar alguma
relação com essa atividade estatal.
25. Contudo, a
lei prevê no seu art. 4º que:
“A Base de cálculo da CIP é o valor
mensal do consumo total de energia elétrica constante nas faturas emitidas pela
empresa concessionária e/ou permissionária a seus consumidores”.
26. Além de
dispor valores diferenciados e progressivos, a lei determinou a sua incidência
sobre o valor do consumo mensal de energia elétrica do próprio contribuinte.
Assim, para a determinação do montante a ser pago a título de contribuição para
o custeio do serviço de iluminação pública, basta converter a unidade de medida
em expressão monetária e aplicar, sobre o valor apurado, a alíquota respectiva.
27. Tal
critério, data venia, é
inconstitucional, à medida que a base imponível desse tributo é totalmente
dissociada da atuação estatal, pois leva em conta fator que serve de fundamento
à cobrança do ICMS: o consumo de energia elétrica pelo contribuinte das classes
industrial, comercial e residencial, donde configurada a bitributação.
28. Ora, o
consumo de energia elétrica residencial, comercial ou industrial nenhuma
relação tem com o serviço de iluminação pública, genérico e indivisível, e cujo
custeio se colima pela contribuição instituída na lei local impugnada porque
parte de um critério eminentemente carecedor de razoabilidade, na medida em que
se emprega um serviço público divisível e específico para fornecer base de
remuneração de outro, genérico e indivisível.
29. Em
conclusão, o ato legislativo em epígrafe é materialmente inconstitucional
porque: (a) a Constituição não autoriza a adoção de alíquotas progressivas na
cobrança da contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública; (b) o
critério legalmente eleito (que considera apenas a quantidade de consumo) não
permite determinar a capacidade contributiva, sendo, portanto, ofensivo à
razoabilidade e à isonomia; (c) da forma como instituída a sua cobrança,
tomando por base o consumo de energia elétrica do contribuinte, a contribuição
criada por essa lei praticamente se equipara a imposto estadual (ICMS), donde
configurada, na espécie, a bitributação.
30. Remanesce,
no caso, a necessidade da concessão de medida liminar. É que, quando se trata
do controle normativo abstrato, e uma vez verificada a cumulativa satisfação
dos requisitos legais concernentes ao fumus
boni juris e ao periculum in mora,
o poder geral de cautela autoriza a suspensão da eficácia da norma impugnada,
até o final julgamento da respectiva ação direta de inconstitucionalidade.
31. E, nesse
passo, releva notar que a plausibilidade jurídica da tese exposta na inicial é
evidente, não admitindo maiores questionamentos, ante a adoção por lei de
critério de cobrança desarrazoado, arbitrário e que se revela sobremaneira
ofensivo ao princípio da isonomia tributária, para o custeio do serviço de
iluminação pública.
32. E, por outro
lado, também está delineada a situação de risco, caracterizadora do periculum in mora, tanto mais porque “em
matéria tributária há um permanente estado de ameaça gerada pela potencialidade
de ato administrativo fiscal dirigido ao contribuinte” (STJ, 1ª Turma, 21-08-1997, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJU de
10-11-1997, p. 57.703). Assim, o contribuinte estará sendo compelido a pagar
uma exação cuja constitucionalidade é contestada seriamente aqui – e certamente
o fará por temor às sérias conseqüências que a lei empresta ao inadimplemento
de débitos tributários. Salvo, é claro, se ele estiver amparado pela medida
liminar que ora se pleiteia.
33. Como a contribuição
atinge milhares de pessoas, a repetição do indébito exigirá a multiplicação de
longas e dispendiosas demandas. Ou seja, estar-se-á sujeitando o contribuinte a
uma situação semelhante à anacrônica regra do solve et repete. Em suma: há
justo receio de lesão ao direito que tem o contribuinte de não pagar uma dívida
tributária cuja fonte normativa foi moldada em total afronta às normas
constitucionais. De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de
risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida. Com efeito, no
contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa
da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando
os pronunciamentos mais recentes do Supremo Tribunal Federal, preordenados à
suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (ADI-MC 125, 15-02-1990,
DJU de 04-05-1990, p. 3.693, Rel. Min. Celso de Mello; ADI-MC 568, RTJ 138/64;
ADI-MC 493, RTJ 142/52; ADI-MC 540, DJU de 25-09-1992, p. 16.182).
34. E tais
afirmações se ajustam com precisão aos casos, como o presente, cuja matéria em
discussão é tributária. Com efeito, as limitações constitucionais ao poder
estatal de tributar têm manifesta relevância e é inegável que convém ao bem
comum assegurar o efetivo império de seus princípios. Como se sabe, “o
exercício do poder tributário, pelo Estado, submete-se, por inteiro, aos
modelos jurídicos positivados no texto constitucional, que, de modo explícito
ou implícito, institui em favor dos contribuintes decisivas limitações à
competência estatal para impor e exigir, coativamente, as diversas espécies
tributárias existentes”. Bem por isso, “os princípios constitucionais
tributários (...), sobre representarem importante conquista político-jurídica
dos contribuintes, constituem expressão fundamental dos direitos individuais
outorgados aos particulares pelo ordenamento estatal” (STF, ADI-MC 712-DF, Rel.
Min. Celso de Mello, 07-10-1992).
35. Acrescente-se
que esse egrégio Tribunal de Justiça já reconheceu, em precedentes, a
inconstitucionalidade de leis municipais que instituem a Contribuição para
Custeio da Iluminação Pública pelos motivos articulados nesta peça, verbi gratia:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
– Demanda objetivando a desconstituição da Lei nº 1.371, de 3 de dezembro de
2003, do Município de Echaporã, que ‘dispõe sobre a instituição, no Município
de Echaporã da Contribuição para Custeio da Iluminação Pública – CIP, prevista
no artigo 149-A da Constituição Federal’ – Contribuição para custeio da
iluminação pública – Lei que institui alíquotas progressivas – ‘Art. 5º ‘caput’
– As alíquotas de contribuição são diferenciadas conforme a classe de
consumidores e a quantidade de consumo medida em KW/h, conforme a tabela anexo
I’ – O legislador municipal aplicou o princípio da capacidade contributiva à
espécie tributária ‘contribuição’, sem embargo de coadunar-se, apenas, com os
‘impostos’, conforme a letra da Constituição do Estado (art. 160, § 1º), que
reproduz a Carta Magna (art. 145, § 1º) – Ainda que assim não fosse, a fruição,
pelos contribuintes, da iluminação pública, bem como a repartição, entre eles,
dos respectivos custos, não possui qualquer relação direta com os tipos de atividades
que desenvolvem, que importam, isso sim, maior ou menor gasto ‘individual’ de
energia elétrica, de modo que os fatores eleitos pela lei não podem,
juridicamente, servir de discriminantes de alíquotas. Nessa conformidade, a
progressividade de alíquotas, presente na espécie dos autos, desatende ao
‘princípio da igualdade tributária’ (C. Est., art. 163, II) Precedentes TJSP –
ADIn 104.888-0/0-00, Rel. Des. SOUSA LIMA e TJSP – ADIn 108.351-0/9-00, Rel.
Des. BARBOSA PEREIRA. – Impossibilidade de parcial procedência da ação, para
permitir que a lei subsista, cobrando-se, apenas, pelo menor valor previsto,
pois isso implicaria em estar o Tribunal a legislar (TJSP – ADIn
104.888-0/0-00) 0 – Inconstitucionalidade da Lei n. 1.371, de dezembro de 2003,
do Município de Echaporã, por afronta ao artigo 163, inciso II, da Constituição
do Estado de São Paulo – Ação procedente” (TJSP, ADI 132.065-0/4-00, Órgão
Especial, Rel. Des. Mohamed Amaro, 02-08-2006, v.u.).
“AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE- Lei Complementar nº 03/2002 e Lei Complementar nº
01/2003, do Município de Panorama – Instituição de contribuição para o custeio
do serviço de iluminação pública – Inconstitucionalidade – Caracterização –
Afronta aos arts. 111, 144, 160, parágrafo 1º, e 163, inciso II, todos da
Constituição Estadual – Progressividade de alíquotas – Inexistência de previsão
constitucional – Faixas de consumo de energia elétrica – Critério que não
permite avaliar a real capacidade contributiva – Inobservância dos princípios
da razoabilidade e da isonomia – Subsistência parcial das leis –
Impossibilidade – Tribunal que não pode legislar – Leis declaradas
inconstitucionais – Ação procedente, mantidos até a data do julgamento os
efeitos da liminar” (TJSP, ADI 130.412-0/4-00, Órgão Especial, Rel. Des. Sousa
Lima, 22-11-2006, v.u.).
“Inconstitucionalidade – Ação direta
– Lei Municipal nº 1693 de 21 de novembro de 2005 – Contribuição para custeio
de iluminação pública – Base de cálculo que se vincula ao ‘quantum’ de energia
elétrica que o contribuinte consome mensalmente – Ação procedente –
Inconstitucionalidade declarada” (TJSP, ADI 149.672-0/3-00, Órgão Especial,
Rel. Des. Barbosa Pereira, 19-12-2007, v.u.).
36. No mesmo
sentido: ADI 125.535-0/3-00, Rel. Des. Jarbas Mazzoni, 08-11-2006, v.u.; ADI
123.974-0/1-00, Rel. Des. Denser de Sá, 24-01-2007, v.u.; ADI 129.272.0/1, Rel.
Des. Sousa Lima, 21-03-2007, v.u..
37. Face ao
exposto, requer:
a) a concessão de liminar suspendendo a eficácia da lei
impugnada até final julgamento da lide e o processamento do feito observando as
prescrições legais e regulamentares;
b) a colheita das informações necessárias dos Excelentíssimos
Senhores Prefeito e Presidente da Câmara Municipal de Sumaré, sobre as quais
protesta por manifestação oportuna;
c) a oitiva do douto Procurador-Geral do Estado, nos termos
do art. 90, § 2º, da Constituição Estadual;
d) ao final, seja julgada procedente a presente ação,
declarando-se a inconstitucionalidade integral da Lei n. 2.434, de 20 de
dezembro de 2007, do Município de Rio das Pedras, promovendo-se a comunicação prevista
no art. 90, § 3º, da Constituição Estadual.
Termos em que, pede deferimento.
São Paulo, de junho de 2008.
Fernando Grella Vieira
Procurador-Geral de
Justiça