EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR
PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado nº 4.086/09
Assunto: Inconstitucionalidade parcial das Leis n. 1152/95, 1161/96, 1169/96, 1177/96, 1182/96, 1235/97, 1256/97, 1297/98, 1494/00, 1601/02, 1658/03, 1769/05, 1771/05, 1772/05, 1777/05, 1801/05, 1813/05, 1865/06, 1885/06, 1920/06, 1989/07, 1996/07, 2000/07, 2004/07, 2058/07, 2072/08, 2096/08, 2123/08 e 2124/08, do Município de Arujá.
Ementa: Leis n. 1152/95, 1161/96, 1169/96, 1177/96, 1182/96, 1235/97, 1256/97, 1297/98, 1494/00, 1601/02, 1658/03, 1769/05, 1771/05, 1772/05, 1777/05, 1801/05, 1813/05, 1865/06, 1885/06, 1920/06, 1989/07, 1996/07, 2000/07, 2004/07, 2058/07, 2072/08, 2096/08, 2123/08 e 2124/08, do Município de Arujá, que instituem cargos e empregos de provimento em comissão, aos quais não correspondem funções de direção, chefia e assessoramento, mas funções próprias dos cargos de provimento efetivo. Violação do art. 115, inc. II e V, da Constituição do Estado de São Paulo. Pedido para que se declare a inconstitucionalidade material das expressões que identificam tais cargos e empregos.
O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º e art. 129, inciso IV da Constituição Federal, e ainda art. 74, inciso VI e art. 90, inciso III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
das Leis n. 1152/95, 1161/96, 1169/96, 1177/96, 1182/96, 1235/97, 1256/97, 1297/98, 1494/00, 1601/02, 1658/03, 1769/05, 1771/05, 1772/05, 1777/05, 1801/05, 1813/05, 1865/06, 1885/06, 1920/06, 1989/07, 1996/07, 2000/07, 2004/07, 2058/07, 2072/08, 2096/08, 2123/08, e 2124/08, do Município de Arujá, pelos fundamentos a seguir expostos.
I – DOS ATOS
NORMATIVOS IMPUGNADOS
Os atos normativos acima indicados tratam de cargos e empregos de provimento em comissão criados na Prefeitura Municipal de Arujá.
O quadro de servidores comissionados de referida Municipalidade se formou a partir da edição de sucessivas leis, umas acrescendo cargos à organização primitiva, outras a alterando, notando-se que a Administração hoje ressente de um diploma legislativo que sintetize o rol de cargos/empregos subsistentes e os situe nas Secretarias que integram a Prefeitura.
Por esse motivo, segue adiante a relação das leis
impugnadas, com seus respectivos cargos/empregos por elas criados. Alguns deles
aparecem tachados (tachados) para indicar que foram suprimidos ou
redenominados pelos atos normativos mencionados nos parentesis que sucedem tais
indicações gráficas. Com a devida vênia pela opção pouco usual, espera-se com
isso facilitar a intelecção da presente.
1.1. No Gabinete do Prefeito: Chefe
de Gabinete, 1 cargo; Assessor de
Gabinete, 2 cargos; Assessor de
Imprensa, 1 cargo; Encarregado da Guarda Municipal (denominação
alterada para Comandante da Guarda Municipal pela Lei 1182/96, fls. 261), 1
cargo; Assistente de Gabinete, 4
cargos; Secretária de Gabinete, 1 cargo;
Oficial de Gabinete, 1 cargo; Recepcionista
Nível I, 6 cargos (extinto pelo art. 7º da Lei 1.169/96 – fls. 254); Recepcionista
Nível II (cargo redenominado para Recepcionista
de Gabinete – Nível II, pelo art. 7º da Lei 1.169/96 – fls. 254), 2 cargos;
Sub-encarregado da Guarda Municipal (incluído pelo art. 1º da Lei n.
1.177/96, fls. 406; denominação alterada para Subcomandante da Guarda Municipal pela Lei 1182/96, fls. 261), 1
cargo; Vigilante, 2 cargos (conforme
art. 3º da Lei n. 1.182/96, fls. 261); Assessor
Técnico de Gabinete, 10 cargos (incluído pelo art. 2º da Lei n. 1.494/00,
fls. 273).
1.2. Na Secretaria Municipal de
Governo: Secretário Municipal de Governo, 1 cargo; Diretor do Departamento de Recursos Humanos, 1 cargo; Diretor do Departamento Jurídico, 1
cargo; Diretor do Departamento de
Compras, 1 cargo; Diretor do
Departamento da Administração, 1 cargo; Diretor do Departamento de
Receitas (redenominado para Diretor
Financeiro, pelo art. 9º da Lei n. 1.297/98, fls. 270),1 cargo; Diretor do Departamento de Informática e
Processamento de Dados, 1 cargo; Assistente
Jurídico, 2 cargos; Secretária de
Gabinete, 1 cargo.
1.3. Na Secretaria Municipal de Saúde e Higiene: Secretário Municipal de Saúde e Higiene, 1 cargo; Diretor do Departamento de Assistência Hospitalar e Atendimento de Urgência, 1 cargo; Diretor do Departamento de Saúde, 1 cargo; Assessor de Saúde, 1 cargo; Diretor da Divisão de Pronto Atendimento, 1 cargo; Diretor da Divisão de Suporte e Serviços, 1 cargo; Diretor da Divisão de UBS – Unidade Básica de Saúde, 4 cargos; Coordenador de Saúde Bucal, 1 cargo; Diretor da Divisão de Saúde Pública, 1 cargo; Chefe da Equipe Técnica, 1 cargo; Chefe da Equipe Paramédica, 1 cargo; Supervisor de Saúde Escolar, 1 cargo; Supervisor de Vigilância Sanitária e Zoonoses, 1 cargo; Secretária de Gabinete, 1 cargo; Médico, 6 cargos (incluídos pelo art. 6º da Lei n. 1.235/97, fls. 265).
1.4. Na Secretaria Municipal de Assistência Social: Secretário Municipal da Assistência Social, 1 cargo; Chefe da Divisão da Assistência à Criança e ao Adolescente, 1 cargo; Chefe da Divisão de Desenvolvimento Social, 1 cargo; Chefe da Divisão de Assistência Social, 1 cargo; Diretor da Casa Aberta, 1 cargo; Secretária de Gabinete, 1 cargo; Diretor do Departamento de Assistência Social, 1 cargo (incluído pelo art. 2º da Lei n. 1.256/97, fls. 268).
1.5. Na Secretaria Municipal de
Educação Cultura e Esportes: Secretário Municipal de Educação, Cultura e
Esportes, 1 cargo; Diretor do Departamento de Cultura e Esportes, 1
cargo (redenominado para Diretor do
Departamento de Cultura e Turismo pelo art. 7º da Lei n. 1.169/96, fls.
255); Diretor do Pró-Menor, 1 cargo;
Secretária de Gabinete, 1 cargo; Diretor do Departamento de Educação (cargo
em comissão: art. 7º da Lei n. 1.169/96, fls. 255), 1 cargo; Diretor de Departamento de Esportes, 1
cargo (incluído pelo art. 7º da Lei 1.169/96, fls. 255).
1.6. Na Secretaria Municipal de Planejamento, Meio Ambiente, Obras e Serviços: Secretário Municipal de Planejamento, Meio Ambiente, Obras e Serviços, 1 cargo; Diretor do Departamento de Planejamento, Obras e Meio Ambiente, 1 cargo; Diretor do Departamento de Serviços Municipais, 1 cargo; Assessor Técnico de Serviços, 2 cargos; Assessor de Serviços, 1 cargo; Secretária de Gabinete, 1 cargo.
Sub-Encarregado
da Guarda Municipal (denominação alterada para Subcomandante da Guarda Municipal pela Lei 1182/96, fls. 261), 1
vaga.
Assistente de Coordenadoria (redenominado para Assistente de Departamento pela
Lei 1813/05, fls. 291), 2 vagas; e extinguiu
os cargos de provimento em comissão de Diretor do Departamento Municipal de
Trânsito, de Chefe da Divisão de Apoio Administrativo e de Chefe da Divisão de
Apoio Técnico.
Assistente de Assuntos Administrativos
(redenominado para Assessor Técnico de
Gabinete pelo art. 2º da Lei 2.096/98, fls. 341), 2 vagas; e Assistente de Relacionamentos, 3 vagas.
18.1. Na Secretaria Municipal de Planejamento e Meio Ambiente: Assessor de Planejamento e Gestão, 1 vaga; Assessor de Projetos e Gestão, 1 vaga;
18.2. Na Secretaria Municipal de Cultura, Esportes e Turismo: Assistente de Departamento, 3 vagas;
18.3. Na Secretaria Municipal de Administração e Finanças: Assessor de Assuntos Administrativos e Financeiros (aumento de vagas);
18.4. Na Secretaria Municipal de Governo: Assistente de Relacionamentos (aumento de vagas);
18.5. No Gabinete do Prefeito: Assessor Técnico de Gabinete (redução de vagas) e Assistente de Atendimento ao Público, 4 vagas.
25.1. Na Secretaria Municipal de Governo e Administração: Assessor de Governo, 2 vagas; Assistente de Relacionamento, 9 vagas; Assistente de Assuntos Internos, 2 vagas; Comandante da Guarda Municipal, 1 vaga; Diretor do Departamento de Administração, 1 vaga; Diretor do Departamento de Comércio e Indústria, 1 vaga; Diretor do Departamento de Compras, 1 vaga; Diretor do Departamento de Recursos Humanos, 1 vaga; Secretária de Gabinete, 1 vaga; Secretário Municipal de Governo e Administração, 1 vaga; Subcomandante da Guarda Municipal, 1 vaga.
25.2. Na Secretaria Municipal de Finanças: Assessor de Assuntos Administrativos e Financeiros, 4 vagas; Assistente de Relacionamento, 2 vagas; Assistente de Assuntos Internos, 1 vaga; Diretor do Departamento Financeiro, 1 vaga; Diretor do Departamento de Informática e Processamentos de Dados, 1 vaga; Secretária de Gabinete, 1 vaga; Secretário Municipal de Finanças, 1 vaga.
25.3. Na Secretaria Municipal de Saúde
e Higiene: Assessor de Atendimento,
2 vagas; Assessor de Saúde, 2 vagas;
Assistente de Assuntos Administrativos (redenominado para Assessor Técnico de Gabinete pelo art.
2º da Lei 2.096/98, fls. 341), 2 vagas; Assistente
de Relacionamento, 3 vagas; Auxiliar
de Serviços Médicos de Pronto Atendimento, 20 vagas; Chefe da Equipe Paramédica, 1 vaga; Chefe de Equipe Técnica, 1 vaga; Coordenador de Saúde Bucal, 1 vaga; Diretor da Divisão de Pronto Atendimento, 1 vaga; Diretor da Divisão de Saúde Pública, 1 vaga;
Diretor da Divisão de Suporte e Serviços,
1 vaga; Diretor da Divisão de UBS –
Unidade Básica de Saúde, 4 vagas; Diretor
do Departamento de Saúde, 1 vaga; Diretor
do Departamento de Assistência Hospitalar e Atendimento de Urgência, 1 vaga;
Médico, 6 vagas; Recepcionista
Nível II (redenominado para Assistente
de Assuntos Internos, pelo art. 2º da Lei 2.072/08, fls. 338), 10 vagas; Secretária de Gabinete, 1 vaga;
Secretária Municipal de Saúde e Higiene, 1 vaga; Supervisor de Atendimento ao Público, 6 vagas; Supervisor de Saúde do Escolar, 1 vaga; e Supervisor de Vigilância Sanitária e Zoonoses, 1 vaga.
25.4. Na Secretaria Municipal de Assistência Social: Chefe da Divisão da Assistência à Criança e ao Adolescente, 1 vaga; Chefe da Divisão de Assistência Social, 1 vaga; Chefe da Divisão de Desenvolvimento Social, 1 vaga; Diretor da Casa Aberta, 1 vaga; Diretor do Departamento de Assistência Social, 1 vaga; Monitor Nível I, 3 vagas; Monitor Nível II, 2 vagas; Monitor Universitário, 2 vagas; Secretária de Gabinete, 1 vaga; Secretário Municipal da Assistência Social, 1 vaga.
25.5. Na Secretaria Municipal de Educação: Assessor de Educação, 3 vagas; Assessor Técnico de Coordenação, Supervisão e Orientação Pedagógica, 1 vaga; Assistente de Assuntos Internos, 2 vagas; Assistente de Relacionamentos, 2 vagas; Diretor do Departamento de Educação, 1 vaga; Diretor do Pró-Menor, 1 vaga; Secretária de Gabinete, 1 vaga; Secretário Municipal de Educação, 1 vaga.
25.6. Na Secretaria Municipal de Cultura e Turismo: Assistente de Departamento, 1 vaga; Diretor do Departamento de Cultura e Turismo, 1 vaga; Secretário Municipal de Cultura e Turismo, 1 vaga.
25.7. Na Secretaria Municipal de Esportes: Assistente de Departamento, 2 vagas; Diretor do Departamento de Esportes, 1 vaga; Secretário Municipal de Esportes, 1 vaga.
25.8. Na Secretaria Municipal de Obras e Serviços: Assessor de Serviços, 3 vagas; Assessor Técnico de Serviços, 2 vagas; Assistente de Departamento, 4 vagas; Assistente de Serviços de Manutenção, 1 vaga; Coordenador de Trânsito, 1 vaga; Diretor do Departamento de Obras e Serviços, 1 vaga; Diretor do Departamento de Administração Regional do Parque Rodrigo Barreto, 1 vaga; Secretária de Gabinete, 1 vaga; Secretário Municipal de Obras e Serviços, 1 vaga.
25.9. Na Secretaria Municipal de Planejamento e Meio Ambiente: Assessor para Assuntos Ambientais, 1 vaga; Assessor de Planejamento e Gestão, 1 vaga; Assessor de Projetos e Gestão, 1 vaga; Diretor do Departamento de Planejamento e Meio Ambiente, 1 vaga; Secretário Municipal de Planejamento e Meio Ambiente, 1 vaga.
Ocorre que aos cargos/empregos destacados em negrito, instituídos pelas leis impugnadas, não correspondem funções de direção, chefia e assessoramento. São lotações que não se situam na administração superior, nem demandam a estrita confiança, cujas missões devem ser realizas por servidores de carreira, até mesmo para não haver solução de continuidade por sucessão de administradores.
A previsão normativa desses cargos de provimento em comissão não condiz com o artigo 37, incisos II e V, da Constituição Federal ou com o artigo 115, incisos II e V, da Constituição Estadual.
É o que será demonstrado a seguir.
II – DO DIREITO
A Constituição em vigor consagrou o Município como entidade federativa indispensável ao nosso sistema federativo, integrando-o na organização político-administrativa e garantindo-lhe plena autonomia, como se observa da análise dos arts. 1.º, 18, 29, 30 e 34, VI, “c” da CF (cf. Alexandre de Moraes, “Direito Constitucional”, São Paulo: Atlas, 7.ª ed., p. 261).
A autonomia concedida aos Municípios não tem caráter absoluto e soberano. Pelo contrário, encontra limites nos princípios emanados dos poderes públicos e dos pactos fundamentais, que instituíram a soberania de um povo (cf. De Plácido e Silva, “Vocabulário Jurídico”, Rio de Janeiro: Forense, v. I, 1984, p. 251), sendo definida por José Afonso da Silva como “a capacidade ou poder de gerir os próprios negócios, dentro de um círculo prefixado por entidade superior”, que no caso é a Constituição (Curso de Direito Constitucional Positivo, 8ª. ed., São Paulo: Malheiros, 1992, p. 545).
A autonomia municipal se assenta em quatro capacidades básicas: (a) auto-organização, mediante a elaboração de lei orgânica própria, (b) autogoverno, pela eletividade do Prefeito e dos Vereadores as respectivas Câmaras Municipais, (c) autolegislação, mediante competência de elaboração de leis municipais sobre áreas que são reservadas à sua competência exclusiva e suplementar, (d) auto-administração ou administração própria, para manter e prestar os serviços de interesse local (cf. José Afonso da Silva, ob. cit., p. 546).
Nessas quatro capacidades,
encontram-se caracterizadas a autonomia política (capacidades de
auto-organização e autogoverno), a autonomia normativa (capacidade de fazer
leis próprias sobre matéria de sua competência), a autonomia administrativa
(administração própria e organização dos serviços locais) e a autonomia
financeira (capacidade de decretação de seus tributos e aplicação de suas
rendas, que é uma característica da auto-administração) (ob. e loc. cits).
Assim, por força da autonomia administrativa de que foram dotadas, as entidades municipais são livres para organizar os seus próprios serviços, segundo suas conveniências locais. E, na organização desses serviços públicos, a Administração cria cargos e funções, institui classes e carreiras, faz provimentos e lotações, estabelece vencimentos e vantagens e delimita os deveres e direitos de seus servidores (cf. Hely Lopes Meirelles, Direito Municipal Brasileiro, 8ª. ed., São Paulo: Malheiros, 1996, p. 420).
Contudo, a liberdade conferida aos Municípios para organizar os seus próprios serviços não é ampla e ilimitada; ela se subordina às seguintes regras fundamentais e impostergáveis: (a) a que exige que essa organização se faça por lei; (b) a que prevê a competência exclusiva da entidade ou Poder interessado; e (c) a que impõe a observância das normas constitucionais federais pertinentes ao servidor público (ob. e loc. cits.)
No caso em exame, o Legislador Municipal criou cargos e empregos de provimento em comissão para o exercício de funções estritamente técnicas ou profissionais, próprias dos cargos de provimento efetivo. São funções que denotam a natureza profissional do vínculo entre seus agentes e a Administração Pública e que, por essa razão, só poderiam ser preenchidas por concurso público.
Segundo Ruy Cirne Lima (Princípios de Direito Administrativo, RT, 6.ª ed., p. 162), o funcionário público profissional se peculiariza por quatro característicos básicos, a saber: (a) natureza técnica ou prática do serviço prestado; (b) retribuição de cunho profissional; (c) vinculação jurídica à Administração Direta; (d) caráter permanente dessa vinculação.
Desse modo, nitidamente diferenciado dos cargos que reclamam provimento em comissão, as funções profissionais devem ser exercidas em caráter permanente, ou seja, pelo quadro estável de servidores públicos municipais, os quais, em conformidade com o disposto no art. 115, inciso II, da Constituição do Estado de São Paulo, só podem ser arregimentados por concurso público de provas ou de provas e títulos.
Na verdade, o cargo em comissão destina-se apenas às atribuições de “direção, chefia e assessoramento” (CF., art. 37, inciso V, com a redação dada pela EC n.º 19/98) e tem por finalidade propiciar ao governante o controle das diretrizes políticas traçadas. Exige, portanto, das pessoas indicadas a titularizá-los, absoluta fidelidade à orientação fixada pela autoridade nomeante. Em outras palavras, o cargo de provimento em comissão está diretamente ligado ao dever de lealdade à linha fixada pelo agente político superior.
Daí porque a exceção contida na parte final do inciso II, do artigo 115, da Constituição do Estado de São Paulo - “ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração” -, que, no ponto, reproduz a dicção do artigo 37, inciso II, da Constituição da República, tem alcance limitado a situações excepcionais, relativas aos cargos cuja natureza especial justifique a dispensa de concurso público.
Torna-se evidente, portanto, que a limitação apontada não tem caráter puramente formal, de simples e incriteriosa indicação legal de cargos de provimento em comissão, que pudesse afastar o princípio constitucional da igual acessibilidade aos cargos públicos.
Bem a propósito, ao estudar com profundidade esse assunto, Márcio Cammarosano deixou anotado que o princípio democrático implica no princípio da igualdade “e este no princípio da igual acessibilidade dos cargos públicos, com o que se resguarda também o princípio da probidade administrativa” (Provimento de Cargos Públicos no Direito Brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 45).
Assim, para que a lei criadora de um cargo em comissão não venha a se constituir em burla ao princípio constitucional arrolado, enunciado expressamente pelo artigo 37, incisos I e II, da Constituição da República, deverá observar criteriosamente a natureza das funções a serem desempenhadas, pois, no dizer de Celso Antonio Bandeira de Mello (O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, Editora Revista dos Tribunais, 1.ª edição, pág. 49), “impende que exista uma adequação racional entre o tratamento diferençado construído e a razão diferencial que lhe serviu de supedâneo”.
Afinado a esse mesmo entendimento, Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo Brasileiro, 18ª. ed, São Paulo: Malheiros, p. 378) adverte sobre pronunciamento do Supremo Tribunal Federal no sentido de que “a criação de cargo em comissão em moldes artificiais e não condizentes com as praxes de nosso ordenamento jurídico e administrativo, só pode ser encarada como inaceitável esvaziamento da exigência constitucional de concurso”.
E, da mesma forma, já decidiu o Pretório Excelso que “a exigência constitucional do concurso público não pode ser contornada pela criação arbitrária de cargos em comissão para o exercício de funções que não pressuponham o vínculo de confiança que explica o regime de livre nomeação e exoneração que os caracteriza.” (STF, RTJ 156/793)
Na esteira desse raciocínio, é inescusável que a parte final do inciso II do art. 115 da Constituição do Estado de São Paulo, tem alcance circunscrito a situações em que o requisito da confiança seja predicado indispensável ao exercício do cargo. De fato, como se trata de uma exceção à regra do concurso público, a criação de cargos em comissão pressupõe o atendimento do interesse público e só se justifica para o exercício de funções de “direção, chefia e assessoramento”, em que seja necessário o estabelecimento de vínculo de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado. Fora desses parâmetros, é inconstitucional qualquer tentativa de criação de cargos dessa natureza.
É incontestável que os cargos/empregos abaixo relacionados, cuja validade jurídico-constitucional ora se examina, não se apresentam como cargos ou funções da administração superior, ou mesmo de “direção, chefia e assessoramento”, que exijam relação de confiança ou especial fidelidade às diretrizes traçadas pela autoridade nomeante, mas sim de cargos comuns, de natureza profissional, que devem ser assumidos em caráter permanente por servidores aprovados em concurso.
Em recente julgado (ADIN n° 157 951-0/0. Rel. Des. Sousa Lima. j. 25.6.2008), aliás, esse E. Tribunal de Justiça declarou a inconstitucionalidade de dispositivos de lei municipal que instituiu os seguintes cargos de provimento em comissão, alguns dos quais análogos e/ou com denominações equivalentes aos impugnados, a saber: 1) Assistente Administrativo Escolar; 2) Diretor de Escola; 3) Supervisor de Ensino Fundamental; 4) Agente Municipal de Crédito; 5) Assistente Administrativo Escolar; 6) Chefe de Serviços de Acervo Histórico e Difusão Cultural; 7) Chefe de Serviços de Cadastro Único; 8) Chefe de Serviços de Comunicação; 9) Chefe de Serviços de Esportes Comunitários e de Rendimento; 10) Chefe de Serviços de Fiscalização de Tributos e Posturas; 11) Chefe de Serviços de Turismo; 12) Chefe de Serviços de Gerenciamento da Patrulha Agrícola; 13) Administrador do Ginásio de Esportes; 14) Administrador do Centro de Convivência; 15) Coordenador Geral de Creches; 16) Coordenador Médico; 17) Coordenador Odontológico; 18) Agente Administrativo Financeiro; 19) Agente Administrativo de Recursos Humanos; 20) Supervisor de Saneamento; 21) Assessor Administrativo; 22) Diretor Técnico do Centro de Reabilitação; 23) Assessor Administrativo da Guarda Municipal; 24) Assessor Pedagógico; e 25) Assessor de Diretor.
Na atual formação desse Sodalício, tem-se exigido também que a lei descreva as atribuições de cada um dos cargos, para que seja possível ao Judiciário sindicar se foram criados, efetivamente, para as situações permitidas:
Ação direta de inconstitucionalidade – Lei Complementar n° 1.800, de 8 de março de 2005 – Criação de cargos de provimento em comissão, destinados, muitos deles, a funções burocráticas ou técnicas de caráter permanente - Inadmissibilidade - Dispositivo, ademais, que deixou de descrever as atribuições e responsabilidades de cada um dos cargos, impossibilitando a verificação de que foram criados exclusivamente para os casos constitucionalmente permitidos (direção, chefia e assessoramento) – Violação dos artigos 5°, § 1º, 111, 115, I e II e 144 da Constituição do Estado de São Paulo - Ação procedente (ADIN nº 152.958-0/6, j. 4/03/2009, rel. Des. Debatin Cardoso, g.n.).
Desse último julgado, aliás, extrai-se preciosa lição:
... o dispositivo deixou de descrever as atribuições e responsabilidades de cada um dos cargos criados, necessários para que se possa analisar e concluir que foram criados exclusivamente para os casos constitucionalmente permitidos.
Não basta denominar os cargos como sendo de diretor, chefe ou assessor para que se abra uma exceção à regra do concurso público e se justifique seu provimento em comissão, pois o que importa não é o rótulo, mas a substância deles, fazendo-se necessário examinar as atribuições a serem exercidas por seus titulares e tais atribuições devem estar definidas na lei.
Aliás, Márcio Cammarosano, em artigo intitulado CARGOS EM
COMISSÃO - BREVES CONSIDERAÇÕES QUANTO AOS LIMITES À SUA CRIAÇÃO
(http://www.sertoledo.org.br/limites.html - pesquisado em 18.06.08) ensina que:
"... ofende a ordem jurídica em vigor criar cargos em comissão que não
consubstanciem competências de direção, chefia e assessoramento, ainda que a
denominação que lhes atribua seja própria de cargos daquela espécie, pois o que
importa não é o rótulo, mas a substância de cada qual. Em outras palavras:
denominar cargos públicos como sendo de diretor, chefia ou assessor não lhes
atribui, por si só, a natureza que os permita ser de provimento
Para finalizar, lembra-se que o Órgão Especial desse Egrégio Tribunal de Justiça entende ser possível declarar a inconstitucionalidade material de expressões de lei criadora de cargos em comissão (ADIN n.º 11.939-0, relator Des. OLIVEIRA COSTA), cuja natureza não correspondia às características próprias dessas funções, daí porque, também aqui se impõe declarar a insubsistência dos seguintes empregos/cargos previstos nas leis impugnadas, por serem incompatíveis com os arts. 111; 115, incisos I, II e V e 144, da Constituição do Estado de São Paulo, a saber:
1. Assessor de Assuntos Administrativos e Financeiros
2. Assessor de Atendimento
3. Assessor de Educação
4. Assessor de Gabinete
5. Assessor de Governo
6. Assessor de Imprensa
7. Assessor de Planejamento e Gestão
8. Assessor de Projetos e Gestão
9. Assessor de Saúde
10. Assessor de Serviços
11. Assessor Jurídico
12. Assessor para Assuntos Ambientais
13. Assessor para Assuntos de Informática
14. Assessor Técnico de Coordenação, Supervisão e Orientação Pedagógica
15. Assessor Técnico de Gabinete
16. Assessor Técnico de Serviços
17. Assistente de Assuntos Internos
18. Assistente de Atendimento ao Público
19. Assistente de Comunicação
20. Assistente de Departamento
21. Assistente de Gabinete
22. Assistente de Relacionamento
23. Assistente de Serviços de Manutenção
24. Assistente Jurídico
25. Auxiliar de Serviços Médicos de Pronto Atendimento
26. Chefe da Divisão da Assistência à Criança e ao Adolescente
27. Chefe da Divisão de Assistência Social
28. Chefe da Divisão de Desenvolvimento Social
29. Chefe da Equipe Paramédica
30. Chefe da Equipe Técnica
31. Coordenador de Saúde Bucal
32. Coordenador de Trânsito
33. Diretor da Casa Aberta
34. Diretor da Divisão de Pronto Atendimento
35. Diretor da Divisão de Saúde Pública
36. Diretor da Divisão de Suporte e Serviços
37. Diretor da Divisão de UBS – Unidade Básica de Saúde
38. Diretor de Departamento de Esportes
39. Diretor do Departamento Administrativo da Saúde
40. Diretor do Departamento da Administração
41. Diretor do Departamento de Administração Regional do Parque Rodrigo Barreto
42. Diretor do Departamento de Assistência Hospitalar e Atendimento de Urgência
43. Diretor do Departamento de Assistência Social
44. Diretor do Departamento de Comércio e Indústria
45. Diretor do Departamento de Compras
46. Diretor do Departamento de Cultura e Turismo
47. Diretor do Departamento de Educação
48. Diretor do Departamento de Esportes
49. Diretor do Departamento de Informática e Processamento de Dados
50. Diretor do Departamento de Obras e Serviços
51. Diretor do Departamento de Planejamento e Meio Ambiente
52. Diretor do Departamento de Recursos Humanos
53. Diretor do Departamento de Saúde
54. Diretor do Departamento de Serviços Municipais
55. Diretor do Departamento de Vigilância e Saúde
56. Diretor do Departamento Financeiro
57. Diretor do Departamento Jurídico
58. Diretor do Departamento Municipal de Trânsito
59. Diretor do Pró-Menor
60. Diretor Financeiro
61. Enfermeiro de Pronto Atendimento
62. Médico
63. Médico de Pronto Atendimento
64. Monitor Nível I
65. Monitor Nível II
66. Monitor Universitário
67. Oficial de Gabinete
68. Recepcionista de Gabinete - Nível II
69. Secretária de Gabinete
70. Secretário de Gabinete
71. Subcomandante da Guarda Municipal
72. Supervisor de Atendimento ao Público
73. Supervisor de Saúde do Escolar
74. Supervisor de Vigilância Sanitária e Zoonoses
75. Vigilante
III – CONCLUSÃO
Por todo o exposto, evidencia-se a necessidade de reconhecimento da inconstitucionalidade das normas aqui apontadas.
Assim, aguarda-se o recebimento e processamento da presente Ação Declaratória, para que ao final seja julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade parcial das Leis n. 1152/95, 1161/96, 1169/96, 1177/96, 1182/96, 1235/97, 1256/97, 1297/98, 1494/00, 1601/02, 1658/03, 1769/05, 1771/05, 1772/05, 1777/05, 1801/05, 1813/05, 1865/06, 1885/06, 1920/06, 1989/07, 1996/07, 2000/07, 2004/07, 2058/07, 2072/08, 2096/08, 2123/08, e 2124/08, do Município de Arujá, nas partes em que foram previstos os cargos/empregos de provimento em comissão destacados, bem assim de todos os anteriores atos normativos que contenham as mesmas previsões, para se evitar o efeito repristinatório.
Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados.
Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.
São Paulo, 1º de setembro de 2009.
Fernando Grella Vieira
Procurador-Geral de Justiça
jesp
Protocolado nº 4.086/09
Interessado: Promotoria de Justiça de Arujá
Assunto: Inconstitucionalidade parcial das Leis n. 1152/95, 1161/96, 1169/96, 1177/96, 1182/96, 1235/97, 1256/97, 1297/98, 1494/00, 1601/02, 1658/03, 1769/05, 1771/05, 1772/05, 1777/05, 1801/05, 1813/05, 1865/06, 1885/06, 1920/06, 1989/07, 1996/07, 2000/07, 2004/07, 2058/07, 2072/08, 2096/08, 2123/08 e 2124/08, do Município de Arujá.
1. Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face, parcialmente, das Leis n. 1152/95, 1161/96, 1169/96, 1177/96, 1182/96, 1235/97, 1256/97, 1297/98, 1494/00, 1601/02, 1658/03, 1769/05, 1771/05, 1772/05, 1777/05, 1801/05, 1813/05, 1865/06, 1885/06, 1920/06, 1989/07, 1996/07, 2000/07, 2004/07, 2058/07, 2072/08, 2096/08, 2123/08 e 2124/08, do Município de Arujá, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
2. Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 1º de setembro de 2009.
Fernando Grella Vieira
Procurador-Geral de Justiça
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