EXCELENTÍSSIMO SENHOR
DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
DO ESTADO DE SÃO PAULO
Protocolado
n. 62.451/11
Assunto:
inconstitucionalidade das Leis n. 2.661, de 21 de dezembro de 2009 e n. 2.738,
de 09 de setembro de 2010, do Município de Guararema.
Constitucional. Urbanístico. Ação direta de inconstitucionalidade.
Lei n. 2.661/08 e Lei n. 2.738/10 do Município de Guararema. Processo
legislativo. Participação comunitária. Inconstitucionais leis municipais de
zoneamento que não asseguram a participação comunitária em seu processo
legislativo (arts. 180, II, e 191, da Constituição Estadual).
O
Procurador-Geral de Justiça do Estado de
São Paulo, no exercício de suas atribuições (artigo 116, VI, da Lei Complementar
Estadual n. 734/93; artigos 125, §2º, e 129,IV, da Constituição Federal;
artigos 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo), com amparo
nas informações colhidas no incluso Protocolado 62.451/11, vem perante esse egrégio
Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, com pedido liminar, em facedas Leis n.
2.661, de 21 de dezembro de 2009 e n. 2.738, de 09 de setembro de 2010, do
Município de Guararema, pelos fundamentos a seguir expostos.
I - OS atoS normativoS impugnadoS
1. A Lei n. 2.661, de 21 de dezembro de 2009, consolidou
as leis que definiram as zonas urbanas e criou a zona de expansão urbana do
Município de Guararema (fl. 206).
2. A Lei n. 2.738, de 09 de setembro de
2010, criou macrorregiões e delimitou bairros no Município de Guararema (fls.
241/259).
3. Os processos legislativos de ambas as
leis não asseguraram a participação de entidades comunitárias e da
coletividade, como resulta da análise de suas respectivas cópias fornecidas
pela Câmara Municipal de Guararema (fls. 207/240, 261/371), e estampam as
próprias informações prestadas por esse órgão ao resumirem que “o Poder
Legislativo não está obrigado a assegurar a participar popular na elaboração,
discussão e deliberação nos diplomas impugnados” (fls. 200/202).
4. Referidas leis são verticalmente incompatíveis
com a ordem constitucional estadual.
II
– O Parâmetro da Fiscalização abstrata de constitucionalidade
5.
A Constituição Federal determina
que os Municípios têm autonomia, mas, devem respeito aos princípios da própria
Constituição Federal e da Constituição Estadual (art. 29), um dos quais a
cooperação das associações representativas no planejamento municipal (art. 29,
XI).
6. A
Constituição do Estado de São Paulo em atenção ao art. 29 da Constituição da República
assim dispõe:
“Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.
7.
Destarte, as Constituições
Federal e Estadual preordenam o exercício da autonomia municipal.
8.
Ora, o processo legislativo
de ambas as leis impugnadas violou o disposto nos arts. 180, II e 191, da
Constituição do Estado de São Paulo, que assim preceituam:
“Art. 180. No estabelecimento de diretrizes e normas relativas ao desenvolvimento urbano, o Estado e os Municípios assegurarão:
(...)
II – a participação das respectivas entidades comunitárias no estudo, encaminhamento e solução dos problemas, plano, programas e projetos que lhes sejam concernentes;
(...)
Art. 191. O Estado e os Municípios providenciarão, com a participação da coletividade, a preservação, conservação, defesa, recuperação e melhoria do meio ambiente natural, artificial e do trabalho, atendidas as peculiaridades regionais e locais e em harmonia com o desenvolvimento social e econômico”.
9.
Esses dispositivos
constitucionais que são parâmetros do controle de constitucionalidade dos atos
normativos municipais em foco nesta sede asseguram a participação da população em
todas as matérias atinentes ao desenvolvimento urbano e ao meio ambiente,
inclusive nos anteprojetos e projetos de lei, e, são reiteradamente
prestigiados pela jurisprudência:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - Lei n. 2.786/2005 de São José do Rio Pardo - Alteração sem plano diretor prévio de área rural em urbana - Hipótese em que não foi cumprida disposição do art. 180, II, da Constituição do Estado de São Paulo que determina a participação das entidades comunitárias no estudo da alteração aprovada pela lei - Ausência ademais de plano diretor - A participação de Vereadores na votação do projeto não supre a necessidade de que as entidades comunitárias se manifestem sobre o projeto - Clara ofensa ao art. 180, II, da Constituição Estadual - Ação julgada procedente.” (TJSP, ADI 169.508.0/5, Rel. Des. Aloísio de Toledo César, 18-02-2009).
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - Leis n°s. 11.764/2003, 11.878/2004 e 12.162/2004, do município de Campinas - Legislações, de iniciativa parlamentar, que alteram regras de zoneamento em determinadas áreas da cidade - Impossibilidade - Planejamento urbano - Uso e ocupação do solo - Inobservância de disposições constitucionais - Ausente participação da comunidade, bem como prévio estudo técnico que indicasse os benefícios e eventuais prejuízos com a aplicação da medida - Necessidade manifesta em matéria de uso do espaço urbano, independentemente de compatibilidade com plano diretor - Respeito ao pacto federativo com a obediência a essas exigências - Ofensa ao princípio da impessoalidade - Afronta, outrossim, ao princípio da separação dos Poderes - Matéria de cunho eminentemente administrativo - Leis dispuseram sobre situações concretas, concernentes à organização administrativa - Ação direta julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade das normas.” (ADI 163.559-0/0-00).
“ação
direta de inconstitucionalidade – lei
complementar disciplinando o uso e ocupação do solo – processo legislativo
submetido À participação popular – votação, contudo, de projeto substitutivo
que, a despeito de alterações significativas do projeto inicial, não foi levado
ao conhecimento dos munícipes – vício insanável – inconstitucionalidade
declarada.
‘O projeto de lei apresentado para apreciação popular atendia aos interesses da comunidade local, que atuava ativamente a ponto de formalizar pedido exigindo o direito de participar em audiência pública. Nada obstante, a manobra política adotada subtraiu dos interessados a possibilidade de discutir assunto local que lhes era concernente, causando surpresa e indignação. Cumpre ressaltar que a participação popular na criação de leis versando sobre política urbana local não pode ser concebida como mera formalidade ritual passível de convalidação. Trata-se de instrumento democrático onde o móvel do legislador ordinário é exposto e contrastado com idéias opostas que, se não vinculam a vontade dos representantes eleitos no momento da votação, ao menos lhe expõem os interesses envolvidos e as conseqüências práticas advindas da aprovação ou rejeição da norma, tal como proposta” (TJSP, ADI 994.09.224728-0, Rel. Des. Artur Marques, m.v., 05-05-2010).
10.
A democracia participativa
prevista nos parâmetros alcança a elaboração da lei antes e durante o trâmite
de seu processo legislativo até o estágio final de sua produção.
11.
Dada a incompatibilidade
entre os diplomas impugnados e o ordenamento constitucional estadual, pois,a
Constituição do Estado de São Paulo prevê objetivamente a necessidade de participação
comunitária em matéria urbanística, resulta a inconstitucionalidade de ambas as
leis impugnadas.
III - Liminar
12. Presentes no caso
analisado os pressupostos do fumus boni
iuris e do periculum in mora, bastantes
paraautorizar a suspensão liminar da vigência e eficácia dos atos normativosimpugnados.
13. A aparência do bom direito se mostra inquestionável pela
apreciação de todos os motivos acima elencados, a demonstrar a
inconstitucionalidade das leis impugnadas nesta ação.
14. O perigo da demora,
por sua vez, decorre do fato de que, se não for determinada a imediata
suspensão da vigência e eficácia dos atos normativos impugnados, podem ser
realizados projetos, empreendimentos, obras, entre outras ações nas áreas
tratadas pelas leis atacadas. Tais atitudes, que demandam investimentos de
grande vulto, trarão grandes prejuízos à população municipal, em favorecimento
de poucos, sendo certo que a alteração física de áreas pode ser irreversível.
15. A concessão da liminar faz-se essencial para assegurar
que as leis promulgadas em frontal violação à Constituição Estadual não produzam
efeitos prejudiciais à população e ao erário, sendo certo que, posteriormente,
com a aguardada decisão favorável na presente ação, tal medida também evitará
qualquer empecilho à concretização da eficácia do controle concentrado de
constitucionalidade.
16. Diante do exposto, requer-se a concessão da liminar,
para fins de suspensão imediata da eficácia das leis impugnadas até final e
definitivo julgamento desta ação.
IV
- PEDIDO
17. Face ao exposto, requer-se o recebimento e processamento
da presente ação, para que ao final seja julgada procedente, declarando a
inconstitucionalidade das Leis n. 2.661, de 21 de dezembro de 2009 e n. 2.738,
de 09 de setembro de 2010, do Município de Guararema.
42. Requer-se, ainda,
sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e à Prefeitura Municipal de Guararema,
bem como,em seguida, citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre
o ato normativo impugnado, e, posteriormente, aguarda-se vista para fins de
manifestação final.
Termos
em que, pede deferimento.
São Paulo, 03 de agosto de 2011.
Fernando
Grella Vieira
Procurador-Geral
de Justiça
wpmj