EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

Protocolado nº 68.807/2008

Assunto: Inconstitucionalidade dos arts. 4º e 5º, caput, e §§ 1º e 4º, da  Lei n. 11.600, de 09 de abril de 2008, e do art. 1º, I e II, da Lei n. 11.622, de 05 de maio de 2008, do Município de Ribeirão Preto.

 

Ementa: Subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito, dos Secretários e dos Vereadores: arts. 4º e 5º, caput, e §§ 1º e 4º, da  Lei n. 11.600, de 09 de abril de 2008, e do art. 1º, I e II, da Lei n. 11.622, de 05 de maio de 2008, do Município de Ribeirão Preto 1. É inconstitucional: a) previsão de reajuste dos subsídios do Chefe do Poder Executivo e de seus auxiliares diretos vinculado à revisão geral anual do funcionalismo público municipal; b) a fixação dos subsídios dos Vereadores em percentual dos subsídios dos Deputados Estaduais; c) a vinculação automática do respectivo reajuste à revisão geral anual do funcionalismo público local ou à fixação ou alteração dos subsídios dos Deputados Estaduais; d) a instituição de décimo-terceiro subsídio. 2. Violação aos princípios da autonomia municipal, da legalidade, da moralidade e da razoabilidade. 3. Vínculo de natureza não profissional com a Administração Pública. 4. Inalterabilidade dos subsídios dos Vereadores durante a legislatura. 5. Vedação a vinculação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público. Arts. 1º, 111, 20, V, 115, XI, XII e XV, 124, § 2º, 144, e 297, Constituição Estadual.

 

         O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º e no art. 129, IV, da Constituição Federal, e ainda nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face dos arts. 4º e 5º, caput, §§ 1º, 4º e 5º, da Lei n. 11.600, de 09 de abril de 2008, em sua redação original e na que foi dada pelo art. 1º, I e II, da Lei n. 11.622, de 05 de maio de 2008, do Município de Ribeirão Preto, pelos fundamentos a seguir expostos:

I. DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO.

1.             A Lei n. 11.600, de 09 de abril de 2008, assim dispõe:

“Artigo 1º - O subsídio mensal do Prefeito Municipal de Ribeirão Preto, cujo mandato iniciar-se-á em 1º de janeiro de 2009, é fixado em R$ 17.359,21 (dezessete mil, trezentos e cinqüenta e nove reais e vinte e um centavos), a ser pago em parcela única.

Artigo 2º - O subsídio mensal do Vice-Prefeito de Ribeirão Preto, cujo mandato iniciar-se-á em 1º de janeiro de 2009, é fixado em R$ 8.679,60 (oito mil, seiscentos e setenta e nove reais e sessenta centavos), a ser pago em parcela única.

Artigo 3º - O subsídio dos secretários do Município de Ribeirão Preto, a serem nomeados a partir de 1º de janeiro de 2009, é fixado em R$ 6.509,70 (seis mil, quinhentos e nove reais e setenta centavos), a ser pago em parcela única.

Parágrafo Único - A remuneração de diretor superintendente de autarquias municipais e de presidentes de empresas municipais cujo controle acionário pertença ao Município, fica limitada ao subsídio estabelecido no caput e será fixada na forma da lei e estatutos sociais, respectivamente.

Artigo 4º - Os subsídios, a que se referem os artigos 1º, 2º e 3º desta lei, serão reajustados na mesma proporção, percentuais e épocas, em que forem reajustados os vencimentos e salários dos servidores municipais.

Artigo 5º - O subsídio mensal do Vereador à Câmara Municipal de Ribeirão Preto, cujo mandato iniciar-se-á em 1º de janeiro de 2009, é fixado no valor correspondente a 75% (setenta e cinco por cento) do que perceba ou venha a perceber o Deputado Estadual à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.

Parágrafo 1º - Entende-se por percebimento do Deputado Estadual todas as parcelas por ele percebidas, durante o exercício parlamentar, notadamente: subsídio, jeton (por sessão ordinária e extraordinária), ajuda de custo e ainda valores devidos no início e no final de cada sessão legislativa, ordinária e extraordinária, bem como verba de gabinete.

Parágrafo 2º - O subsídio será devido, em parcela única, ao Vereador que efetivamente comparecer às sessões ordinárias e extraordinárias da Câmara Municipal, realizadas na forma do Regimento Interno.

Parágrafo 3º - O vereador que, injustificadamente, não comparecer a qualquer sessão ordinária ou extraordinária, deixará de perceber a parcela correspondente à mesma, que será apurada pela divisão do valor do subsídio pelo número de sessões ordinárias e extraordinárias realizadas no mês correspondente.

Parágrafo 4º - O subsídio a que alude o presente artigo será reajustado na mesma proporção e época em que for reajustada ou fixada a remuneração do Deputado Estadual à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo.

Artigo 6º - As despesas decorrentes da aplicação desta lei correrão por conta de dotações próprias dos orçamentos do Poder Executivo e do Poder Legislativo para os exercícios de 2009 e subseqüentes.

Artigo 7º - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário”.

2.                Em 05 de maio de 2008 foi editada a Lei n. 11.622, cujo teor é o seguinte:

“Artigo 1º - Fica, pela presente lei, alterado e acrescido os dispositivos abaixo relacionados da Lei Municipal nº 11.600, de 09 de abril de 2008, que são os seguintes:

I - Dá nova redação ao parágrafo 4º do artigo 5º, que passa a vigorar com a seguinte redação:

‘Artigo 5º -omissis...............................................................

Parágrafo 4º - O subsídio a que alude o presente artigo será reajustado na mesma proporção e época em que for reajustada ou fixada a remuneração do Deputado Estadual à Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, aplicando-se ainda o disposto no artigo 37, X, da Constituição Federal.

II - Acrescenta parágrafo 5º ao artigo 5º, com a seguinte redação:

Artigo 5º - omissis..................................................................

Parágrafo 5º - Fica concedido ao Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores o 13º subsídio.

Artigo 2º - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogando-se as disposições em contrário”.

3.                Os arts. 4º e 5º, caput, e §§ 1º e 4º, da Lei n. 11.600/08 e o art. 1º, I e II, da Lei n. 11.622/08, que, respectivamente, dá nova redação ao § 4º do art. 5º e acrescenta o § 5º ao art. 5º da Lei n. 11.600/08, ofendem frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo por manifesta incompatibilidade vertical com seus arts. 1º, 111, 115, XI, XII e XV, 124, § 2º, 144 e 297.

4.                Com efeito, assim dispõe a Constituição Estadual:

“Art. 1º - O Estado de São Paulo, integrante da República Federativa do Brasil, exerce as competências que não lhe são vedadas pela Constituição Federal.

(...)

Art. 18 - O subsídio dos Deputados Estaduais será fixado por lei de iniciativa da Assembléia Legislativa, na razão de, no máximo, setenta e cinco por cento daquele estabelecido, em espécie, para os Deputados Federais, observado o que dispõem os arts. 39, § 4º, 57, § 7º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I, da Constituição Federal.

(...)

Art. 20 - Compete exclusivamente à Assembléia Legislativa:

V - apresentar projeto de lei para fixar, para cada exercício financeiro, os subsídios do Governador, do Vice-Governador, dos Secretários de Estado e dos Deputados Estaduais;

(...)

Art. 111 - A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Art. 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

XI - a revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos, sem distinção de índices entre servidores públicos civis e militares, far-se-á sempre na mesma data e por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso;

XII - em conformidade com o art. 37, XI, da Constituição Federal, a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;

(...)

XV - é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público, observado o disposto na Constituição Federal.

(...)

Art. 124 - Os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações instituídas ou mantidas pelo Poder Público terão regime jurídico único e planos de carreira.

(...)

§ 2º - Aplica-se aos servidores a que se refere o ‘caput’ deste artigo e disposto no art. 7º, IV, VI, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII, XXIII e XXX da Constituição Federal.

(...)

Art. 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

(...)

Art. 297 - São também aplicáveis no Estado, no que couber, os artigos das Emendas à Constituição Federal que não integram o corpo do texto constitucional, bem como as alterações efetuadas no texto da Constituição Federal que causem implicações no âmbito estadual, ainda que não contempladas expressamente pela Constituição do Estado”.

5.                A Constituição Federal de 1988, cujos preceitos foram absorvidos pela Constituição Estadual no art. 297, assim prescreve:

Art. 27 - omissis;

(...)

§ 2º - O subsídio dos Deputados Estaduais será fixado por lei de iniciativa da Assembléia Legislativa, na razão de, no máximo, setenta e cinco por cento daquele estabelecido, em espécie, para os Deputados Federais, observado o que dispõem os arts. 39, § 4º, 57, § 7º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I.

(...)

Art. 28 - omissis;

(...)

§ 2º - Os subsídios do Governador, do Vice-Governador e dos Secretários de Estado serão fixados por lei de iniciativa da Assembléia Legislativa, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I

Art. 29 - O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:

(...)

V - subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Secretários Municipais fixados por lei de iniciativa da Câmara Municipal, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;

VI - o subsídio dos Vereadores será fixado pelas respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subseqüente, observado o que dispõe esta Constituição, observados os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica e os seguintes limites máximos:

(...)

f) em Municípios de mais de quinhentos mil habitantes, o subsídio máximo dos Vereadores corresponderá a setenta e cinco por cento do subsídio dos Deputados Estaduais;

(...)

Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;

XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;

(...)

XIII - é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público;

(...)

Art. 39 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.

(...)

§ 3º - Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.

§ 4º - O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI.

(...)

Art. 49 - É da competência exclusiva do Congresso Nacional:

(...)

VII - fixar idêntico subsídio para os Deputados Federais e os Senadores, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I; 

VIII - fixar os subsídios do Presidente e do Vice-Presidente da República e dos Ministros de Estado, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I”.

6.                Enfocando-se o art. 4º da Lei n. 11.600/08 percebe-se que a disposição confere o reajuste automático dos subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Secretários Municipais, atrelando-os à revisão geral anual dos vencimentos dos servidores públicos municipais.  Ora, tal dispositivo não resiste, no controle abstrato de constitucionalidade, ao cotejo com os arts. 20, V, 111, 115, XI, XII e XV, 144 e 297, da Constituição Estadual. Com efeito, ainda que se recuse a observância da regra da anterioridade da legislatura aos subsídios do Chefe do Poder Executivo local e seus auxiliares por interpretação literal do art. 29, V, da Constituição Federal, é absolutamente seguro que a revisão de seus subsídios deve observar o princípio da legalidade remuneratória e não comporta vinculação automática com a revisão geral anual do funcionalismo público seja porque o regime jurídico de sua remuneração é peculiar seja porque o direito à revisão geral anual é exclusivo dos servidores públicos.  Com o expediente adotado no art. 4º da Lei n. 11.600, toda vez que houver reajuste ou revisão dos vencimentos dos servidores públicos municipais, haverá o do Prefeito, Vice-Prefeito e Secretários Municipais, implicando vinculação vedada de espécies remuneratórias, violando o art. 115, XV, da Constituição Estadual. Neste sentido:

“Razoável é a interpretação segundo a qual a Constituição Federal, ao assegurar a revisão geral anual ‘sempre na mesma data e sem distinção de índices’ (inc. X do art. 37), assim determinou para o sistema de remuneração dos servidores públicos e de subsídio dos agentes políticos sem mandato eletivo (referidos no § 4° do art. 39 da CF), não abrangendo o subsídio de agentes políticos detentores de mandato eletivo (Prefeitos, Vice-Prefeitos e Vereadores), que está sujeito a regime próprio. Invocando doutrina de JOSÉ AFONSO DA SILVA (‘in’ ‘Curso de Direito Constitucional Positivo’, ed. Malheiros, 22ª ed., 2003, pág. 663), acrescenta o culto Procurador de Justiça: ‘Caso assim não se entenda haveria um evidente choque de Poderes, mormente em relação àquele que primeiro fixasse o índice. Suponha-se, assim, que a Câmara Municipal, no exercício da competência estabelecida no art. 29, inciso VI, da Constituição Federal, fixasse em 1% o índice para a revisão anual. É certo que a este não ficaria vinculado o chefe do Poder Executivo, que tem a competência constitucional para alterar a remuneração dos seus servidores (art. 61, § 1°, II, ‘a’)’ (fls. 283/284)” (TJSP, AI 356.170-5/5-00, São Paulo, 9ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Gonzaga Franceschini, v.u., 25-08-2004).

7.                 Também padece de inconstitucionalidade o caput do art. 5º da Lei n. 11.600/08.  A disposição em foco não obedece aos princípio republicanos e da autonomia municipal contidos nos arts. 1º, 144 e 297 da Constituição Estadual determinando aos Municípios observarem os princípios dispostos nas Constituições Federal e Estadual. A regra do art. 29, VI, f, da Constituição Federal, não estabelece que os Vereadores têm direito a perceber, a título de subsídio, o equivalente a 75% dos subsídios dos Deputados Estaduais. A previsão constitucional tem outro sentido: a fixação de limite; deste modo, na obra legislativa peculiar à fixação dos subsídios dos Vereadores é defeso estabelecer como valor o próprio limite percentual, mas, tão somente, observá-lo. De outra parte, a norma também viola as regras de legalidade na fixação e revisão dos subsídios de agentes políticos e da proibição de vinculação da remuneração de pessoal, previstas nos arts. 111 e 115, XI, XII e XV, da Constituição Estadual. Ora, o reajuste dos subsídios dos Deputados Estaduais implicará automática revisão dos subsídios dos Vereadores, com a agravante de nulificar as regras da autonomia municipal, da legalidade remuneratória e da anterioridade da legislatura constantes do art. 29, VI, da Constituição Federal. Caracterizada, destarte, violação aos arts. 1º, 144 e 297 da Constituição Estadual. Registre-se, outrossim, que o valor dos subsídios dos Vereadores é inalterável durante a legislatura, como já decidido:

“é da competência privativa da Câmara Municipal fixar, até o final da legislatura, para vigorar na subseqüente, a remuneração dos vereadores” (RTJ 140/269).

8.                Dentre alguns pontos fundamentais desponta a legalidade remuneratória do subsídio de agentes políticos investidos em mandatos eletivos ou cargos de provimento em comissão e a característica de um regime de natureza especial que se aparta do regime remuneratório dos servidores públicos e agentes políticos investidos em cargos de natureza profissional técnico-científica,  valendo observar que, no âmbito municipal, há regime jurídico peculiar que parcialmente derroga as regras da Constituição Federal referentes aos agentes políticos parlamentares municipais. Conforme a jurisprudência, é inválida a vinculação dos subsídios de edis a um percentual da receita orçamentária por ofensa a regra da anterioridade da legislatura (art. 29, VI, Constituição) e ao art. 167, IV, da Constituição (TJSP, AC 328.401-5/0-00, Promissão, 8ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Paulo Dimas Mascaretti, 20-09-2006) e a vinculação automática dos subsídios dos Vereadores aos subsídios dos Deputados Estaduais por violação à autonomia municipal (TJSP, ADI 157.896-0/9-00, Santos, Órgão Especial, Rel. Des. Armando Toledo, v.u., 16-07-2008; TJSP, AC 458.500-5/6-00, Tupã, 5ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Xavier de Aquino, v.u., 22-03-2007; TJSP, AC 336.821-5/0-00, Ribeirão Preto, 3ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Laerte Sampaio, 27-02-2007), assim como a dos Deputados Estaduais por vinculação percentual aos subsídios dos Deputados Federais) configura afronta à autonomia estadual (STF, ADI-MC 3.461-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, 28-06-2006, v.u., DJ 02-03-2007, p. 26; STF, MS 21.075-RN, 1ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 16-09-1997, v.u., DJ 24-10-1997, p. 54.158). Também já estimou a inconstitucionalidade de preceito normativo que fixava o subsídio do Vice-Prefeito em metade do valor da remuneração do Prefeito por ofensa ao art. 37, XIII, da Constituição Federal (STF, ADI 2.738-PB, Tribunal Pleno, Rel. Min. Maurício Corrêa, 08-05-2003, v.u., DJ 12-12-2003, p. 63), 

9.                A esse propósito, é igualmente inconstitucional, pelas razões já expendidas, o § 4º do art. 5º da Lei n. 11.600/08 que prevê o reajuste automático dos subsídios dos Vereadores em idênticos momentos e proporções à fixação ou reajuste dos subsídios dos Deputados Estaduais. A alteração promovida pela Lei n. 11.622/08 não alterou profundamente essa nódoa; em verdade, a norma constante do inciso I do art. 1º da lei posterior piorou ao adicionar alternativa: além da revisão ocorrer pelo implemento da fixação ou revisão dos subsídios do Deputado Estadual também acontecerá por força do reajuste geral anual do funcionalismo – em razão de incutir no preceito legal a referência ao inciso X do art. 37 da Constituição Federal – configurando afronta aos arts. 1º, 115, XI, XII e XV, 144 e 297 da Constituição Estadual. Destarte, inconstitucionalidade há tanto na redação original quanto na atual. Em abono da tese aqui sustentada, confira-se a jurisprudência focalizando a alteração dos subsídios durante a legislatura e a vinculação de remuneração:

“(...) Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que negou seguimento a recurso extraordinário interposto de acórdão assim ementado: ‘CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. VEREADORES. SUBSÍDIOS. MAJORAÇÃO EM MEIO À LEGISLATURA. INADMISSIBILIDADE. 1. É inadmissível, por afronta aos arts. 29, VI, da CF/88, a majoração dos subsídios dos vereadores em meio à legislatura. Os dispositivos constitucionais mencionados, não perdendo de vista a moralidade e a impessoalidade da Administração, consagraram o princípio da anterioridade, segundo o qual os subsídios dos Vereadores devem ser fixados em cada legislatura para a subseqüente, portanto, antes de conhecidos os novos eleitos. 2. APELAÇÕES DESPROVIDAS’ (fl. 329).   No RE, interposto com base no art. 102, III, a, da Constituição, alegou-se violação aos arts. 29, VI, 37, X, e 39, § 4º, da mesma Carta.   O agravo não merece acolhida. O acórdão recorrido está em harmonia com a jurisprudência da Corte como se observa do julgamento do RE 206.889/MG, Rel. Min. Carlos Velloso (...)  Nesse sentido, menciono as seguintes decisões, dentre outras: AI 195.378/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; RE 122.521/MA Rel. Min. Ilmar Galvão.   Isso posto, nego seguimento ao recurso” (STF, AI 720.929-RS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 29-09-2008, DJe 10-10-2008).

“INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE. Artigo 3º da Lei n°. 5 357, de 31 de maio de 2000 e artigo 1º da Lei n° 5.960, de 05 de junho de 2003, ambos do Município de Franca. Leis Municipais que dispõem sobre a majoração dos subsídios de vereadores durante a própria legislatura. Aumentos variáveis no tempo. Incidente de inconstitucionalidade suscitado por uma das Câmaras de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, em recurso de apelação contra sentença que julgou ação civil pública em face do referido Município e de todos os seus vereadores. Dispositivos que violam a ‘regra da legislatura’ e o princípio da moralidade administrativa. Reajuste anual que não é aplicável aos vereadores. Ofensa aos artigos 29, VI, e 37, ambos da Constituição Federal e 144 da Constituição do Estado. Argüição acolhida para declarara inconstitucionalidade dos dispositivos objurgados”( TJSP, Incidente de Inconstitucionalidade 161.056-0/0-00, Franca, Órgão Especial, Rel. Des. Mário Devienne Ferraz, v.u., 13-08-2008).

“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 4º DA LEI Nº 11.894, DE 14 DE FEVEREIRO DE 2003. - A Lei Maior impôs tratamento jurídico diferenciado entre a classe dos servidores públicos em geral e o membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais. Estes agentes públicos, que se situam no topo da estrutura funcional de cada poder orgânico da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, são remunerados exclusivamente por subsídios, cuja fixação ou alteração é matéria reservada à lei específica, observada, em cada caso, a respectiva iniciativa (incisos X e XI do art. 37 da CF/88). - O dispositivo legal impugnado, ao vincular a alteração dos subsídios do Governador, do Vice-Governador e dos Secretários de Estado às propostas de refixação dos vencimentos dos servidores públicos em geral ofendeu o inciso XIII do art. 37 e o inciso VIII do art. 49 da Constituição Federal de 1988. Sobremais, desconsiderou que todos os dispositivos constitucionais versantes do tema do reajuste estipendiário dos agentes públicos são manifestação do magno princípio da Separação de Poderes. Ação direta de inconstitucionalidade procedente” (STF, ADI 3.491-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 27-09-2006, v.u., DJ 23-03-2007, p. 71).

“Deputado Estadual: subsídios: decreto-legislativo que, no curso da legislatura, os eleva a 75% da remuneração dos Deputados Federais, aos quais acresce 40% a título de ‘ajuda de gabinete’: plausibilidade da argüição de ofensa ao art. 27, par. 2., CF (cf. EC 1/92), a qual se soma a da possível violação dos arts. 37, XIII e 25, da Lei Fundamental: riscos de danos financeiros de incerta reparação: medida cautelar deferida” (STF, ADI-MC 891-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 23-06-1993, v.u., DJ 13-08-1993, p. 15.676).

10.              Ostenta idêntico vício de inconstitucionalidade o § 1º do art. 5º da Lei n. 11.600/08. Esse preceito expande o subsídio dos parlamentares municipais ao abranger valores excedentes à remuneração do mandato parlamentar estadual (ajuda de custo, jeton, verba de gabinete e outras), fulminando a própria concepção de subsídio como parcela única. Para além de violar os arts. 1º, 144 e 297 da Constituição Estadual que absorvem o conceito de subsídio como parcela única (cunhado nos arts. 37, XI, e 39, § 4º, da Constituição Federal), a previsão normativa ofende o princípio da razoabilidade constante do art. 111 da Constituição Estadual e o conceito do subsídio devotado no inciso XII do art. 115 da Constituição Estadual, além de renovar vinculação vedada (art. 115, XV, Constituição Paulista).

11.              Por derradeiro, também é inconstitucional o inciso II do art. 1º da Lei n. 11.622/08 quando acrescenta § 5º ao art. 5º da Lei n. 11.600/08 e confere ao Prefeito, ao Vice-Prefeito e aos Vereadores o décimo-terceiro subsídio. A previsão ofende os princípios da moralidade e da razoabilidade constantes do art. 111 da Constituição Paulista, posto que o vínculo jurídico entre agente político detentor de mandato eletivo e o Estado não tem natureza profissional. Por essa razão, a tal espécie de agente político não se aplica a extensão dos direitos sociais fundamentais prevista no § 2º do art. 124 da Constituição Paulista, nitidamente vulnerada, porque é adstrita aos servidores públicos e tem como pressuposto vínculo empregatício de natureza profissional. Por força do art. 144 da Constituição Estadual, a violação a esses dois dispositivos caracteriza inconstitucionalidade da lei local.

12.              No ponto, a doutrina  proclama que o preceito simétrico do art. 39, § 3°, da Constituição Federal só vale para os servidores públicos, não para os agentes políticos, “pois é apenas dos primeiros que cogita o art. 39, § 3°” (Celso Antonio Bandeira de Mello. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Malheiros, 2006, 21ª ed., p. 261), razão pela qual não gozam de décimo-terceiro salário, férias e remuneração de horas extraordinárias (Reinaldo Moreira Bruno e Manolo Del Olmo. Servidor Público, Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 155).        Neste sentido, corrobora a jurisprudência:

“RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. EX-DEPUTADOS ESTADUAIS. POSTULAÇÃO DE PAGAMENTO DE 13º SALÁRIO. INOCORRÊNCIA DE RELAÇÃO DE TRABALHO COM O PODER PÚBLICO. INVIABILIDADE. DEPUTADO ESTADUAL, NÃO MANTENDO COM O ESTADO, COMO É DA NATUREZA DO CARGO ELETIVO, RELAÇÃO DE TRABALHO DE NATUREZA PROFISSIONAL E CARÁTER NÃO EVENTUAL SOB VÍNCULO DE DEPENDÊNCIA, NÃO PODE SER CONSIDERADO COMO TRABALHADOR OU SERVIDOR PÚBLICO, TAL COMO DIMANA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL (ARTS. 7º, INCISO VIII, E 39, § 3º), PARA O FIM DE SE LHE ESTENDER A PERCEPÇÃO DA GRATIFICAÇÃO NATALINA.

Recurso a que se nega provimento”(STJ, RMS 15.476-BA, 5ª Turma, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, 16-03-2004, v.u., DJ 12-04-2004, p. 221, RSTJ 192/584).

“AÇÃO POPULAR - Pagamento de décimo terceiro salário a Vice-Prefeito - Inadmissibilidade - Ato lesivo ao patrimônio público municipal - O agente político, exerce mandato eletivo, possuindo vínculo de natureza política e temporária com o Poder Público e não guarda direito ao recebimento do 13° salário. Recursos improvidos” (TJSP, AC 660.400-5/8-00, Barretos, 7ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Walter Swensson, v.u., 08-09-2008).

 

II. PEDIDO DE LIMINAR.

13.              Presentes, na hipótese examinada, os pressupostos do fumus bonis iuris e do periculum in mora, a justificar a suspensão liminar da vigência e eficácia dos dispositivos adiante referidos dos atos normativos impugnados.

14.              A razoável fundamentação jurídica decorre dos motivos expostos anteriormente, que indicam, de forma clara, que a Lei impugnada na presente ação padece de vício de inconstitucionalidade.

15.              O perigo da demora decorre especialmente da idéia de que, sem a imediata suspensão da vigência e eficácia dos dispositivos do atos normativos impugnados, o erário sofrerá indevida oneração de difícil ou quase impossível reparação. Ademais, tratando-se de lei de vigência temporária, mister a tutela de segurança para evitar que o trâmite natural do processo tenha potencialidade de causar lesão com o deletério quilate acima exposto.  Note-se que, conforme documento obtido do site da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, o valor bruto dos subsídios dos Vereadores alcança a soma de R$ 9.288,04.

16.              Assim sendo, a imediata suspensão da eficácia dos dispositivos adiante mencionados dos atos normativos impugnados, cuja inconstitucionalidade é palpável, evita qualquer desdobramento no plano dos fatos que possa significar, na prática, prejuízo concreto para o Poder Público Municipal no aspecto administrativo.

17.              Diante do exposto, requer-se a concessão da liminar, para fins de suspensão imediata da eficácia dos arts. 4º, 5º, caput, e §§ 1º, 4º e 5º, da Lei n. 11.600, de 09 de abril de 2008, na redação original assim como naquela dada pelo art. 1º, I e II, da Lei n. 11.622, de 05 de maio de 2008, durante o trâmite da presente ação direta de inconstitucionalidade até seu julgamento definitivo de mérito.

III. CONCLUSÃO E PEDIDO.

18.              Face ao exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação, para que, ao final, seja julgada procedente, declarando-se a inconstitucionalidade dos arts. 4º, 5º, caput, e §§ 1º, 4º e 5º, da Lei n. 11.600, de 09 de abril de 2008, na redação original assim como naquela dada pelo art. 1º, I e II, da Lei n. 11.622, de 05 de maio de 2008, ambas do Município de Ribeirão Preto.

19.              Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Ribeirão Preto, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para sua manifestação, protestando por nova vista, em seguida, para fins de manifestação final.

São Paulo, 17 de fevereiro de 2009.

 

                        Fernando Grella Vieira

                        Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

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