Excelentíssimo
Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado
de São Paulo
Protocolado nº
79.906/09
Assunto: Inconstitucionalidade do art. 19
e dos Anexos III, VII e X da Lei n. 4.351 de 31 de julho de 2009, do Município
de Garça e, por arrastamento, do art. 16 e dos Anexos III, VII e IX, da Lei n.
3.414, de 28 de junho de 2000 em sua redação original e na redação dada pelas
Leis Municipais n. 4.182, de 04 de março de 2008 e n. 3.999, de 23 de junho de
2006, ambas do Município de Garça.
Ementa: Leis do Município
de Garça. Inconstitucionalidade. 1) Criação artificial e
abusiva de cargos de provimento em comissão que não expressam atribuições de
assessoramento, chefia e direção em nível superior, mas, funções operacionais,
profissionais, técnicas, com evidente desprestígio aos princípios da legalidade,
moralidade, impessoalidade, da razoabilidade, finalidade, interesse público e
eficiência. 2) Fixação das competências
e atribuições dos agentes por Decreto do Prefeito Municipal. Medida que exige a
adoção de lei em sentido estrito. Reserva legal e cláusula de separação de
poderes. 3) Violação aos arts. 5º, 24, § 2º, 98, §§ 1º a 3º, 99, 100, §
1º 101,111, 115, II e V,
144 e 297 da Constituição Estadual.
O Procurador-Geral de Justiça do
Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art.
116, VI da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei
Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no
art.125, § 2º e art. 129, IV da Constituição Federal, e ainda art. 74, VI e
art. 90, III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações
colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio
Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
do art. 19 e dos Anexos III, VII e X da Lei n. 4.351, de 31 de julho de 2009,
e, por arrastamento, do art. 16 e dos Anexos III, VII e IX, da Lei n. 3.414, de
28 de junho de 2000, em sua redação original e na redação dada pelas Leis
Municipais n. 4.182, de 04 de março de 2008 e n. 3.999, de 23 de junho de 2006,
ambas do Município de Garça, pelos fundamentos a seguir expostos:
I – Os Atos Normativos Impugnados
1. Dispõe a Lei n. 4.351/2009 (fls.
“Art.
a) Serviço Autônomo de Água e
Esgoto – SAAE;
b) Instituto de Aposentadoria e
Pensão dos Servidores Públicos do Município de Garça – IAPEN.
(...)
“Art. 45. O quadro de pessoal da
Administração direta e indireta é composto pelos cargos constantes dos Anexos I
a X, dividindo-se em cargos de provimento efetivo e em comissão, com
denominações próprias, sendo regido pela Lei Municipal nº 2.680/91 e por esta
Lei, cujos valores das referências estão estabelecidos no Anexo XI.”
2.
De acordo com o estatuído pela Lei vigente, classificam-se
como de provimento em comissão os seguintes cargos:
ANEXO
III |
|
CARGOS
DE PROVIMENTO |
|
QUANTIDADE |
DENOMINAÇÃO DO
CARGO |
04 |
Assessor de Gabinete |
01 |
Assessor de Relações Públicas |
03 |
Assessor Técnico de
Engenharia/Arquitetura |
06 |
Assessor Técnico de
Especialidades |
92 |
Chefe de Divisão |
01 |
Chefe de Gabinete |
01 |
Coordenador de Creche |
01 |
Coordenador do Centro Integrado
de Educação |
16 |
Coordenador Pedagógico |
52 |
Diretor de Departamento |
19 |
Diretor de Escola |
03 |
Diretor Jurídico |
02 |
Médico Auditor |
02 |
Orientador Pedagógico |
13 |
Secretário |
01 |
Subprefeito |
01 |
Supervisor de Ensino |
01 |
Supervisor do SIBEC |
03 |
Supervisor Pedagógico |
ANEXO
VII |
|
CARGOS
DE PROVIMENTO EM COMISSÃO – S.A.A.E. |
|
QUANTIDADE |
DENOMINAÇÃO DO
CARGO |
13 |
Chefe de Divisão |
18 |
Diretor de Departamento |
01 |
Diretor Superintendente |
02 |
Diretor Jurídico |
ANEXO
XI |
|
CARGOS
DE PROVIMENTO EM COMISSÃO – IAPEN |
|
QUANTIDADE |
DENOMINAÇÃO DO CARGO |
01 |
Chefe de Divisão |
01 |
Diretor Jurídico |
03 |
Diretor de Departamento |
01 |
Diretor Superintendente |
3. Cabe referir que essa Lei, em seu
art. 61, revogou expressamente a Lei Municipal n. 3.414, de 28 de junho de
2000:
“Art. 61. Esta Lei entrará em vigor
na data da sua publicação, revogando-se as disposições em contrário,
especialmente as Leis Municipais 2.818/93, 3.008/95, 3.414/00, 3.464/01e
3.502/01, produzindo seus efeitos a partir de 1º de agosto de
4. Todavia, em essência, a Lei
4.351/2009, reproduz o rol dos quadros de cargos de provimento em comissão disposto
nos anexos III, VII e IX da lei revogada, à exceção dos cargos de Agente de
Crédito do Banco do Povo, Assessor de Divisão, Assessor de Esportes, Assessor
de Paisagismo, Assessor do Procon, Assessor Jurídico, Assessor Técnico de
Departamento, Assessor Técnico de Processamento de Dados, Coordenador do Terminal Rodoviário,
Coordenador de Usina de Reciclagem, Encarregado de Distribuição de Merenda
Escolar, Encarregado de Dívida Ativa, Encarregado de Jardinagem, Encarregado da
Lançadoria, Fiscal do Procon, Oficial de Gabinete, Operador de Aparelhos
Eletrográficos, Assessor Técnico de Engenharia, Assessor Técnico de
Laboratório, Assessor Técnico do Meio Ambiente.
5. Com efeito, previa a Lei 3.414/2000
(fls.
“Art. 32. O quadro de pessoal da Administração direta e
indireta compõe-se de cargos de provimento efetivo e em comissão, com
denominações próprias, constantes dos Anexos I a IX, regidos pela Lei Municipal
nº 2.680/91 e por esta Lei, cujos valores das referências estão estabelecidas
no Anexo X.”
ANEXO III |
|
CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO
– PREFEITURA MUNICIPAL (redação alterada pela Lei n.
4.182/2008) |
|
QUANTIDADE |
DENOMINAÇÃO |
02 |
Agente
de Crédito do Banco do Povo |
10 |
Assessor
de Divisão |
01 |
Assessor
de Esportes |
02 |
Assessor de Gabinete |
01 |
Assessor
de Paisagismo |
01 |
Assessor
do Procon |
01 |
Assessor de Relações Públicas |
03 |
Assessor
Jurídico |
11 |
Assessor
Técnico de Departamento |
03 |
Assessor Técnico de
Engenharia/Arquitetura |
10 |
Assessor Técnico de
Especialidades |
02 |
Assessor
Técnico de Processamento de Dados |
01 |
Chefe de Gabinete |
39 |
Chefe de Divisão |
01 |
Coordenador de Creche |
09 |
Coordenador Pedagógico |
01 |
Coordenador do Centro Integrado
de Educação |
01 |
Coordenador
do Terminal Rodoviário |
01 |
Coordenador
de Usina de Reciclagem |
25 |
Diretor de Departamento |
15 |
Diretor de Escola |
01 |
Encarregado
de Distribuição de Merenda Escolar |
01 |
Encarregado
de Dívida Ativa |
01 |
Encarregado
de Jardinagem |
01 |
Encarregado
da Lançadoria |
02 |
Fiscal
do Procon |
02 |
Médico Auditor |
02 |
Oficial
de Gabinete |
01 |
Operador
de Aparelhos Eletrográficos |
02 |
Orientador Pedagógico |
11 |
Secretário |
03 |
Supervisor Pedagógico |
ANEXO VII |
|
CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO
– S.A.A.E (redação alterada pela Lei n.
3.999/2006) |
|
QUANTIDADE |
DENOMINAÇÃO |
01 |
Assessor
Jurídico |
01 |
Assessor
Técnico de Engenharia |
01 |
Assessor
Técnico de Laboratório |
01 |
Assessor
Técnico do Meio Ambiente |
01 |
Assessor
Técnico de Processamento de Dados |
07 |
Chefe de Divisão |
09 |
Diretor de Departamento |
01 |
Diretor Superintendente |
ANEXO IX |
|
CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO
– IAPEN (redação alterada pela Lei n.
3.999/2006) |
|
QUANTIDADE |
DENOMINAÇÃO |
01 |
Oficial
de Gabinete |
01 |
Chefe de Divisão |
03 |
Diretor de Departamento |
01 |
Diretor Superintendente |
6. No que concerne às atribuições dos
cargos comissionados mencionados na Lei n. 4.351/2009, dispõe o art. 19, em
redação similar à do art. 16 da Lei n. 3.414/2000 que:
“Art. 19. O Prefeito Municipal
fixará por Decreto as competências e atribuições de cada órgão e respectivos
departamentos, bem como de cada um de seus agentes”.
II – O parâmetro da fiscalização
abstrata de constitucionalidade
7. Os dispositivos a seguir indicados das leis do Município
de Garça contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, a qual
está subordinada a produção normativa municipal por força dos seguintes
preceitos ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal:
“Art. 144. Os
Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se
auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na
Constituição Federal e nesta Constituição.
(...)
Art. 297. São também aplicáveis no Estado, no
que couber, os artigos das Emendas à Constituição Federal que não integram o
corpo do texto constitucional, bem como as alterações efetuadas no texto da
Constituição Federal que causem implicações no âmbito estadual, ainda que não
contempladas expressamente pela Constituição do Estado”.
8. A Lei Municipal n. 4.351/2009, ao
criar os cargos supra mencionados, viola frontalmente o artigo 115, incisos II
e V, da Constituição Estadual, pois trata de hipóteses em que não se justifica
a utilização desta forma de provimento de cargo público, a qual exige que a
função a ser desempenhada possua natureza jurídica de chefia, direção e
assessoramento.
9. Determina a Constituição do Estado
de São Paulo que:
“Artigo
115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive
as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das
seguintes normas:
(...)
II
- a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em
concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações
para cargo em comissões, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;
(...)
V –
as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de
cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de
carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei,
destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento”.
10. Elucida José dos Santos Carvalho Filho quanto aos cargos em comissão que esses:
“são
de ocupação transitória. Seus titulares são nomeados em função da relação de
confiança que existe entre eles e a autoridade nomeante” (Manual de Direito Administrativo, Lumen Juris, Rio de Janeiro, 17ª
edição, 2007, p. 530).
11. No caso em tela, à exceção dos cargos de Chefe de Gabinete,
Secretário Municipal, Subprefeito e Diretor Superintendente, todos os demais ou
ostentam evidente natureza técnica e administrativa, que não exigem do agente
nenhum vínculo especial de confiança, ou não possuem atribuição definida por
lei, o que impede que se averigúe sua conformidade com os ditames
constitucionais.
12. Um dos princípios norteadores do provimento de cargos
públicos reside na ampla acessibilidade e igualdade de condições a todos os
interessados, respeitados os requisitos inerentes às atribuições de cada cargo.
Acesso esse que se visa garantir com a obrigatória realização do concurso
público, para que, sem que reste tangenciado o princípio da isonomia,
preserve-se também a eficiência da máquina estatal, consubstanciada na escolha
dos candidatos mais bem preparados para o desempenho das atribuições do cargo público,
de acordo com os critérios previstos no edital respectivo.
13. Ao comentar a exigência de aprovação prévia em concurso
público de provas ou de provas e títulos para a investidura em cargo público, afirma
Alexandre de Moraes que:
“Existe, assim, um
verdadeiro direito de acesso aos cargos,
empregos e funções públicas, sendo o cidadão e o estrangeiro, na forma da
lei, verdadeiros agentes do poder, no sentido de ampla possibilidade de
participação da administração pública” (Direito
Constitucional, Atlas, São Paulo, 7ª edição, 2000, p. 314).
14. Dessa forma, a criação de cargos em comissão, de livre
nomeação e exoneração, é medida excepcional, a ser adotada nos estreitos
limites previstos na norma constitucional, qual seja, apenas nas atribuições de
direção, chefia e assessoramento.
15. Já decidiu o Pretório Excelso que:
“A exigência constitucional do concurso
público não pode ser contornada pela criação arbitrária de cargos em comissão
para o exercício de funções que não pressuponham o vínculo de confiança que
explica o regime de livre nomeação e exoneração que os caracteriza.” (STF, RTJ
156/793).
16. Aliás,
em se tratando de Diretor Jurídico, o divórcio também se caracteriza por outros
fundamentos para além dos arts. 111 e 115, II e V, que albergam os princípios
de moralidade e de impessoalidade na gestão pública.
17. Determina
a Lei Municipal n. 4.351/2009, ao cuidar das atribuições da Diretoria Jurídica
do SAAE, que:
“Art. 24. À Diretoria Jurídica do SAAE, cujos Diretores são de livre nomeação pelo Prefeito entre advogados regularmente inscritos na OAB, de notório conhecimento jurídico e boa reputação, compete:
a) Defender o interesse público representado pelas ações empreendidas pela Autarquia em seus atos administrativos;
b) Fornecer pareceres quanto à legalidade das licitações promovidas pelo SAAE em atendimento à lei 8.666, de 21/06/1993 e suas alterações, conjuntamente com os princípios constitucionais administrativos;
c) Defender o interesse público representado nas ações de execução fiscal que objetivam o recebimento de créditos fiscais pela Autarquia;
d) Defender o interesse público nos vários tipos de ações que são propostas contra o SAAE;
e) Propor ações judiciais visando desapropriação de áreas para finalidade pública de relevante interesse da continuidade e aprimoramento da gama de serviços prestados pelo SAAE a toda a população;
f) Auxiliar o Departamento de Meio Ambiente, dando suporte jurídico em ações necessárias na defesa das áreas de interesse de proteção ambiental do SAAE.”
18. Com
efeito, manifesta-se incompatibilidade vertical com os arts. 98, §§ 1º a 3º,
99, e 101, da Constituição do Estado de São Paulo, in verbis:
“Art.
§ 1º.
Lei orgânica da Procuradoria Geral do Estado disciplinará sua competência e a
dos órgãos que a compõem e disporá sobre o regime jurídico dos integrantes da
carreira de Procurador do Estado, respeitado o disposto nos artigos. 132 e 135 da
Constituição Federal.
§ 2º. Os Procuradores do Estado,
organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de
provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas
as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica na
forma do ‘caput’ deste artigo;
§ 3º. Aos procuradores referidos neste
artigo é assegurada estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante
avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado
das corregedorias.
Art.
99. São funções institucionais da Procuradoria Geral do Estado:
I - representar judicial e
extrajudicialmente o Estado e suas autarquias, inclusive as de regime especial,
exceto as universidades públicas estaduais;
II - exercer as atividades de
consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo e das entidades
autárquicas a que se refere o inciso anterior;
III - representar a Fazenda do Estado
perante o Tribunal de Contas;
IV - exercer as funções de
consultoria jurídica e de fiscalização da Junta Comercial do Estado;
V - prestar assessoramento jurídico
e técnico-legislativo ao Governador do Estado;
VI - promover a inscrição, o
controle e a cobrança da dívida ativa estadual;
VII - propor ação civil pública
representando o Estado;
VIII - prestar assistência jurídica
aos Municípios, na forma da lei;
IX - realizar procedimentos
administrativos, inclusive disciplinares, não regulados por lei especial;
X - exercer outras funções que lhe
forem conferidas por lei.
Artigo
100 - A direção superior da Procuradoria-Geral do Estado compete ao Procurador
Geral do Estado, responsável pela orientação jurídica e administrativa da
instituição, ao Conselho da Procuradoria Geral do Estado e à Corregedoria Geral
do Estado, na forma da respectiva lei orgânica.
Parágrafo
único - O Procurador Geral do Estado será nomeado pelo Governador, em comissão,
entre os Procuradores que integram a carreira e terá tratamento, prerrogativas
e representação de Secretário de Estado, devendo apresentar declaração pública
de bens, no ato da posse e de sua exoneração.
Art. 101.
Vinculam-se à Procuradoria Geral do Estado, para fins de atuação uniforme e
coordenada, os órgãos jurídicos das universidades públicas estaduais, das
empresas públicas, das sociedades de economia mista sob controle do Estado,
pela sua Administração centralizada ou descentralizada, e das fundações por ele
instituídas ou mantidas.
19. Se o Município é dotado de autonomia
normativa e administrativa, o exercício de suas competências deve observância
às normas de observância compulsória constantes das Constituição Federal (art.
29) e Estadual (art. 144), em especial as que regulam a Administração Pública,
como os arts. 98, 99, 100, 101, 111 e 115, II e V, da Constituição Estadual,
que reproduzem o caput e os incisos
II e V do art. 37 e os arts. 131 e 132 da Constituição Federal. Portanto, quer
o servidor público investido da função da advocacia pública quer do servidor
público investido em seu órgão de direção deve ser escolhido para o exercício
do cargo comissionado dentre os integrantes da carreira. No caso de advogados
públicos é absolutamente incompatível o regime de provimento em comissão do
cargo. Neste sentido, a jurisprudência da Suprema Corte:
“AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR 11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO
(ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO -
CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO
ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO
PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. - O desempenho das atividades de
assessoramento jurídico no âmbito do Poder Executivo estadual traduz
prerrogativa de índole constitucional outorgada aos Procuradores do Estado pela
Carta Federal. A Constituição da República, em seu art. 132, operou uma
inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade funcional aos
membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo de
investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em
concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel.
Min. Celso de Mello, 02-08-
“TRANSFORMAÇÃO,
20. Comunga deste entendimento o colendo Órgão Especial deste
egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em recente julgamento (ADI
173.260-0/4-00, Rel. Des. Armando Toledo, v.u., 22-07-2009).
21.
De outra parte, no que concerne à possibilidade de fixação
das atribuições de cargo público por meio de decreto do Prefeito Municipal, tal
como previsto no art. 19 da Lei n. 4.351/2009, esclarece Marçal Justen Filho:
“(...)
somente a lei pode criar esse conjunto inter-relacionado de competências, direitos
e deveres que é o cargo público. Essa é a regra geral consagrada no art. 48, X,
da Constituição, que comporta uma ressalva à hipótese do art. 84, VI, b. Esse
dispositivo permite ao Chefe do Executivo promover a extinção de cargo público,
por meio de ato administrativo. A criação e a disciplina do cargo público
faz-se necessariamente por lei no sentido de que a lei deverá contemplar a
disciplina essencial e indispensável. Isso significa estabelecer o núcleo das
competências, dos poderes, dos deveres, dos direitos, do modo da investidura e
das condições do exercício das atividades. Portanto, não basta uma lei
estabelecer, de modo simplista, que ‘fica criado o cargo de servidor público’.
Exige-se que a lei promova a discriminação das competências e a inserção dessa
posição jurídica no âmbito da organização administrativa, determinando as
regras que dão identidade e diferenciam a referida posição jurídica” (Curso de Direito Administrativo,
Saraiva, São Paulo, 2005, p. 581).
22. Somente a partir da descrição precisa das atribuições do
cargo público será possível, a bem do funcionamento administrativo e dos
direitos dos administrativos, averiguar-se a completa licitude do exercício de
suas funções pelo agente público. Trata-se de exigência relativa à competência
do agente público para a prática de atos em nome da Administração Pública e, em
especial, aqueles que tangenciam os direitos dos administrados, e que se
espraia à aferição da legitimidade da forma de investidura no cargo público que
deve ser guiada pela legalidade, moralidade, pela impessoalidade e pela
razoabilidade.
23. Nem se alegue, por oportuno, que ao Chefe do Poder
Executivo remanesceria competência para descrição das atribuições dos empregos
públicos, sob pena de convalidar a invasão de matéria sujeita exclusivamente à
reserva legal. A possibilidade de regulamento autônomo para disciplina da
organização administrativa não significa a outorga de competência para o Chefe
do Poder Executivo fixar atribuições de cargo público e dispor sobre seus requisitos
de habilitação e forma de provimento. A alegação cede à vista do art. 61, § 1°,
II, a, da Constituição Federal, e do art. 24, § 2º, 1, que, em coro, exigem lei
em sentido formal. Regulamento administrativo (ou de organização) contém normas
sobre a organização administrativa, isto é, a disciplina do modo de prestação
do serviço e das relações intercorrentes entre órgãos, entidades e agentes, e
de seu funcionamento, sendo-lhe vedado criar cargos públicos, somente
extingui-los desde que vagos (arts. 48, X, 61, § 1°, II, a, 84, VI, b,
Constituição Federal; art. 47, XIX, a, Constituição Estadual) ou para os fins
de contenção de despesas (art. 169, § 4°, Constituição). Bem explica Celso
Antonio Bandeira de Mello que o regulamento previsto no art. 84, VI, a, da
Constituição, é:
“(...) mera competência para
um arranjo intestino dos órgãos e competências já criadas por lei’, como a
transferência de departamentos e divisões, por exemplo (Celso Antonio Bandeira
de Mello. Curso de Direito Administrativo,
Malheiros, São Paulo, 21ª edição, 2006, pp. 324-325).
24. Neste sentido, pronuncia o Supremo Tribunal Federal:
“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PODER EXECUTIVO.
COMPETÊNCIA LEGISLATIVA. ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DECRETOS
26.118/05 E 25.975/05. REESTRUTURAÇÃO DE AUTARQUIA E CRIAÇÃO DE CARGOS.
REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. INOCORRENTE OFENSA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
RECURSO DESPROVIDO. I - A Constituição da República não oferece guarida à
possibilidade de o Governador do Distrito Federal criar cargos e reestruturar
órgãos públicos por meio de simples decreto. II - Mantida a decisão do Tribunal
a quo, que, fundado em dispositivos da Lei Orgânica do DF, entendeu violado, na
espécie, o princípio da reserva legal. III - Recurso Extraordinário desprovido”
(STF, RE 577.025-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 11-12-2008,
v.u., DJe 0-03-2009).
“1. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Condição.
Objeto. Decreto que cria cargos públicos remunerados e estabelece as
respectivas denominações, competências e remunerações. Execução de lei
inconstitucional. Caráter residual de decreto autônomo. Possibilidade jurídica
do pedido. Precedentes. É admissível controle concentrado de
constitucionalidade de decreto que, dando execução a lei inconstitucional, crie
cargos públicos remunerados e estabeleça as respectivas denominações,
competências, atribuições e remunerações. 2. INCONSTITUCIONALIDADE. Ação
direta. Art. 5° da Lei n° 1.124/2000, do Estado do Tocantins. Administração
pública. Criação de cargos e funções. Fixação de atribuições e remuneração dos
servidores. Efeitos jurídicos delegados a decretos do Chefe do Executivo.
Aumento de despesas. Inadmissibilidade. Necessidade de lei em sentido formal,
de iniciativa privativa daquele. Ofensa aos arts. 61, § 1°, inc. II, ‘a’, e 84,
inc. VI, ‘a’, da CF. Precedentes. Ações julgadas procedentes. São
inconstitucionais a lei que autorize o Chefe do Poder Executivo a dispor,
mediante decreto, sobre criação de cargos públicos remunerados, bem como os
decretos que lhe dêem execução” (STF, ADI 3.232-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min.
Cezar Peluso, 14-08-2008, v.u., DJe 02-10-2008).
25. Comunga
este entendimento o egrégio Tribunal de Justiça, como se nota da invocação de
recente julgamento de seu colendo Órgão Especial:
“Ação direta de inconstitucionalidade – leis
municipais de São Vicente – criação de cargos – não pode a lei delegar
competência reservada a ela pela Constituição do Estado para decreto
estabelecer as atribuições dos cargos (...) – ação procedente” (TJSP, ADI
170.044-0/7-00, Órgão Especial, Rel. Des. Eros Piceli, 24-06-2009, v.u.).
26. A Lei Municipal que cria cargos comissionados, cuja
natureza jurídica é técnica e administrativa, e determina que cabe ao Chefe do
Poder Executivo Municipal a fixação de suas atribuições por meio de decreto,
afronta ainda os princípios da legalidade e da separação de poderes, previstos
nos seguintes preceitos da Constituição Estadual:
“Artigo
5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo,
o Executivo e o Judiciário.
§
1º - É vedado a qualquer dos Poderes delegar atribuições.
§
2º - O cidadão, investido na função de um dos Poderes, não poderá exercer a de
outro, salvo as exceções previstas nesta Constituição.
(...)
Artigo
24 - A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro
ou comissão da Assembléia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de
Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos
previstos nesta Constituição.
§
2º - Compete, exclusivamente, ao Governador do Estado a iniciativa das leis que
disponham sobre:
1 - criação e extinção de cargos,
funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica, bem como a
fixação da respectiva remuneração;
Artigo 111 - A administração pública
direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá
aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade,
razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência”.
27.
Por fim, não se pode olvidar que, acaso
acolhido o pedido da presente ação direta de inconstitucionalidade, o art. 16 e
os Anexos III, VII e IX, da Lei n. 3.414, de 28 de junho de 2000 (alterados
pelas Leis Municipais n. 4.182, de 04 de março de 2008 e n. 3.999, de 23 de
junho de 2006) padecem de idêntico vício de constitucionalidade e foram
revogados pela Lei n. 4.351 de 31 de julho de 2009, e serão automaticamente
restaurados, tornando, necessário, assim, que se reconheça sua
inconstitucionalidade por arrastamento ou atração, sob pena de se instaurar
situação mais gravosa que aquela que se busca combater.
28. A respeito da inconstitucionalidade
por arrastamento, tem-se que:
"...se em determinado processo
de controle concentrado de constitucionalidade for julgada inconstitucional a norma
principal, em futuro processo, outra norma dependente daquela que foi declarada
inconstitucional em processo anterior - tendo em vista a relação de
instrumentalidade que entre elas existe - também estará eivada pelo vício da
inconstitucionalidade 'conseqüente', ou por 'arrastamento' ou por
'atração'" (Pedro Lenza, "Direito Constitucional Esquematizado",
Saraiva, 13ª Edição, p. 208).
29.
Segundo precedentes do Pretório Excelso é
perfeitamente possível a declaração de inconstitucionalidade por arrastamento (cf.,
p. ex., STF, Pleno, ADI 1.144/RS, rel. Min. Eros Grau, DJU de 08/09/06, pág.
16; STF, Pleno, ADI 3.645/PR, rel. Min. Ellen Gracie, DJU de 01/09/06, pág. 16;
STF, Pleno, ADI-QO 2.982/CE, rel. Min. Gilmar Mendes, LexSTF, 26/105; STF,
Pleno, ADI 2.895/AL, rel. Min. Carlos Velloso, RTJ, 194/533; STF, Pleno, ADI 2.578/MG,
rel. Min. Celso de Mello, DJUde 09/06/05, pág. 4).
30.
A declaração de inconstitucionalidade por
arrastamento é possível, sempre que: a) o reconhecimento da
inconstitucionalidade de determinado dispositivo legal torna despidos de
eficácia e utilidade outros preceitos do mesmo diploma, ainda que não tenham
sido impugnados; b) nos casos em que o
efeito represtinatório restabelece dispositivos já revogados pela lei viciada
que ostentem o mesmo vicio; c) quando há na lei dispositivos que não foram
impugnados, mas guardam direta relação com aqueles cuja inconstitucionalidade é
reconhecida.
31.
Restabelecidos os efeitos da lei
revogada, dá-se o que se chama de efeito indesejado, já havendo assentado o
Supremo Tribunal Federal que:
"A reentrada em vigor da norma revogada
nem sempre é vantajosa. O efeito repristinatório produzido pela decisão do
Supremo, em via de ação direta, pode dar origem ao problema da legitimidade da
norma revivida. De fato, a norma reentrante pode padecer de
inconstitucionalidade ainda mais grave que a do ato nulificado. Previne-se o
problema com o estudo apurado das eventuais conseqüências que a decisão
judicial haverá de produzir. O estudo deve ser levado a termo por ocasião da
propositura, pelos legitimados ativos, de ação direta de inconstitucionalidade.
Detectada a manifestação de eventual eficácia repristinatória indesejada,
cumpre requerer igualmente, já na inicial da ação direta, a declaração da
inconstitucionalidade, e, desde que possível, a do ato normativo
ressuscitado." (ADIn 2.621-MC/DF, Rei. Min. Celso de Mello, j . em
1°.8.2002).
32.
Nesse contexto, a declaração de
inconstitucionalidade por arrastamento, do art. 16 e dos Anexos III, VII e IX,
da Lei n. 3.414, de 28 de junho de 2000 (alterados pelas Leis Municipais n.
4.182, de 04 de março de 2008 e n. 3.999, de 23 de junho de 2006), em sua
redação original é medida de rigor, pois referida Lei Municipal apresenta os
mesmos vícios constitucionais que maculam a Lei n. 4.351, de 31 de julho de
2009, que lhe revogou.
33.
Portanto, o art. 19 e os Anexos III, VII
e X da Lei n. 4.351 de 31 de julho de 2009 e, por arrastamento, do art. 16 e dos Anexos III, VII e IX, da
Lei n. 3.414, de 28 de junho de 2000 alterados pelas Leis Municipais n. 4.182,
de 04 de março de 2008 e n. 3.999, de 23 de junho de 2006 ou em sua redação
original, ambas do Município de Garça, são inconstitucionais por violarem os
arts. 5º, 24, § 2º, 1,
III
– Pedido liminar
34. À
saciedade demonstrado o fumus boni iuris,
pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais do Município
de Garça apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do
Estado de São Paulo é sinal, de per si,
para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação porque permitem
a investidura de pessoas em funções públicas de maneira irregular, comprometendo
as forças do erário.
35. À
luz deste perfil, requer-se a concessão de liminar para suspensão da eficácia,
até final e definitivo julgamento desta ação, do do art. 19 e dos Anexos III,
VII e X da Lei n. 4.351, de 31 de julho de 2009, e, por arrastamento, do art.
16 e dos Anexos III, VII e IX, da Lei n. 3.414, de 28 de junho de 2000, em sua
redação original e na redação dada pelas Leis Municipais n. 4.182, de 04 de
março de 2008 e n. 3.999, de 23 de junho de 2006, todas do Município de Garça.
IV – Pedido
36. Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento
da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a
inconstitucionalidade do art. 19 e dos Anexos III, VII e X da Lei n. 4.351, de
31 de julho de 2009, e, por arrastamento, do art. 16 e dos Anexos III, VII e
IX, da Lei n. 3.414, de 28 de junho de 2000, em sua redação original e na
redação dada pelas Leis Municipais n. 4.182, de 04 de março de 2008 e n. 3.999,
de 23 de junho de 2006, todas do Município de Garça.
37. Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara
Municipal e ao Prefeito Municipal de Garça, bem como posteriormente citado o
Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos
impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação
final.
São Paulo, 10 de novembro de 2009.
Fernando Grella
Vieira
Procurador-Geral de Justiça
dms/WPMJ
Protocolado nº
79.906/09
Assunto: Inconstitucionalidade do art. 19
e dos Anexos III, VII e X da Lei n. 4.351 de 31 de julho de 2009, do Município
de Garça e, por arrastamento, do art. 16 e dos Anexos III, VII e IX, da Lei n.
3.414, de 28 de junho de 2000 em sua redação original e na redação dada pelas
Leis Municipais n. 4.182, de 04 de março de 2008 e n. 3.999, de 23 de junho de
2006, ambas do Município de Garça.
1. Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face do art. 19 e dos Anexos III, VII e X da Lei nº 4.351 de 31 de julho de 2009, do art. 16 e dos Anexos III, VII e IX, da Lei nº 3.414, de 28 de junho de 2000, Lei nº 4.182, de 04 de março de 2008 e Lei nº 3.999, de 23 de junho de 2006, do Município de Garça, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
2. Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 10 de novembro de 2009.
Fernando Grella Vieira
Procurador-Geral de Justiça
lgl