Excelentíssimo Senhor
Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo
Ação direta de inconstitucionalidade.
Lei n. 3.353, de 31 de dezembro de 2002, do Município de Agudos, alterada
parcialmente pela Lei n. 3.586, de 22 de dezembro de 2005. Contribuição para o
custeio do serviço de iluminação pública. Inclusão no fato gerador da
iluminação de quaisquer bens públicos. Delegação ao Poder Executivo para edição
de decreto disciplinando os elementos objetivos do tributo (base de cálculo e
alíquota), definidos no Decreto n. 3.262, de 29 de janeiro de 2004, no curso do
exercício financeiro da cobrança e que conferiu isenções e instituiu valores
progressivos, majorados, no curso do exercício financeiro da cobrança, pelos
Decretos n. 3.287, de 09 de junho de 2004, e n. 3.639, de 05 de julho de 2007.
Base de cálculo própria para remuneração do serviço público de iluminação
pública uti singuli, inidônea para
serviço uti universi.
Inconstitucionalidade: arts. 5º e § 1º, 111, 144, 160, § 1º e 163, I, II, e
III, b, e § 6º, Constituição do
Estado de São Paulo.
O Procurador-Geral de Justiça, com fundamento nos arts. 74, VI, e 90,
III, da Constituição Estadual, no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n.
734/93, e nos arts. 125, § 2º, e 129, IV, da Constituição Federal, e com base
nos elementos de convicção constantes do expediente anexo (Protocolado n. 80.161/08),
vem, respeitosamente, promover a presente AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, com pedido de liminar, da Lei n. 3.353, de
31 de dezembro de 2002, com a redação dada pela Lei n. 3.586, de 22 de dezembro
de 2005, e dos Decretos n. 3.262, de 29 de janeiro de 2004, e n. 3.287, de 09
de junho de 2004, do Município de Agudos, pelos motivos seguir expostos:
1. O Município
de Agudos instituiu pela Lei n. 3.353, de 31 de dezembro de 2002, contribuição
para custeio da iluminação pública, in
verbis:
“Artigo 1º. Fica instituída a
Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública - CIP, prevista no
artigo 149-A da Constituição Federal, a ser cobrada de todos os beneficiários
do serviço.
Parágrafo único. O serviço previsto
no caput deste artigo compreende o consumo de energia destinada à iluminação de
vias, logradouros de vias, logradouros e
demais bens públicos, e a instalação, manutenção, melhoramento e expansão
da rede de iluminação pública.
Artigo 2º. São considerados
contribuintes, para os fins desta lei, os proprietários, detentores de domínio
útil e os possuidores a qualquer título, de quaisquer imóveis situados no
perímetro urbano e rural, em área atingida pelos serviços de iluminação
pública.
Artigo 3º. A critério da
Administração Municipal, a contribuição poderá ser cobrada individualmente ou
em conjunto com a fatura de consumo de energia elétrica, ou com documento de
arrecadação de Imposto Predial e Territorial Urbano.
Parágrafo único. No caso de ser
lançada a contribuição juntamente com outra cobrança, obrigatoriamente deverão
constar os seus elementos indicativos.
Artigo 4º. Os vencimentos e os
períodos de arrecadação da contribuição deverão ser fixados por Decreto
Regulamentar.
Artigo 5º. O valor da contribuição para o custeio, de que trata o artigo 1º e seu
parágrafo único, será aferido tomando-se por base o valor despendido para a
prestação do serviço, rateado em função da testada de cada imóvel, levando-se
em conta o tipo de iluminação fornecido (a potência das lâmpadas utilizadas), e
cuja cobrança será objeto de regulamento.
Parágrafo 1º. O período de incidência
da contribuição, bem como os prazos e condições de pagamento, além de outros elementos necessários à
efetivação da cobrança, serão disciplinados no respectivo regulamento.
Parágrafo 2º. Quando o imóvel for
condomínio, cada unidade corresponderá à testada do imóvel.
Parágrafo 3º. Havendo servidão de
passagem para acesso ao imóvel, será levada em conta testada da passagem.
Parágrafo 4º. Em se tratando de
imóvel rural, ainda que lindeiro do perímetro urbano, mas fora dele, o valor da
CIP será reduzido em 50% (cinqüenta por cento).
Parágrafo 5º. No caso de imóvel residencial
de esquina, será levado em conta, para cobrança da CIP, o lado de maior fachada.
Artigo 6º. O Município fica autorizar
a celebrar, com a concessionária distribuidora de energia elétrica, contrato
e/ou convênio, e termos aditivos, para que esta efetive a cobrança de
contribuição na fatura de consumo de energia elétrica no imóvel.
Artigo 7º. O não pagamento da
contribuição nos prazos fixados, sujeitará o contribuinte a todos os acréscimos
fixados para o não pagamento dos tributos municipais.
Parágrafo único. No caso da cobrança
se dar pela, concessionária, será aplicada apenas multa de 2% (dois por cento)
do seu valor, desde que o pagamento se dê dentro do mesmo exercício; caso não
seja, será aplicada a proscrição do caput.
Artigo 8º. Fica criado o Fundo
Municipal de Iluminação Pública, de natureza contábil e administração pelo
Departamento de Finanças.
Parágrafo único. Para o fundo,
deverão ser destinados, além de outros recursos, todos aqueles arrecadados com
a CIP para custear os serviços de iluminação pública previstos nesta lei.
Artigo 9º. Esta lei será
regulamentada por Decreto no prazo de 60 dias.
Artigo
2. Referida lei
foi regulamentada pelo Decreto n. 3.262, de 29 de janeiro de 2004, que assim
dispôs, no que interessa:
“Art. 1º. A Contribuição para Iluminação Pública, instituída
§ 1º. consumidores residenciais, com as seguintes classes de consumo mensais:
a) 0 KW/H à 50 KW/H – isento
b) 51 KW/H à 100 KW/H – R$ 2,50
c) 101 KW/H à 200 KW/H – R$ 3,00
d) 201 KW/H à 500 KW/H – R$ 3,50
e) acima de 501 KW/H – R$ 4,00
§ 2º. consumidores industriais, com as seguintes classes de consumo mensais:
a) 0 KW/H à 50 KW/H – R$ 2,00
b) 51 KW/H à 100 KW/H – R$ 4,00
c) 101 KW/H à 200 KW/H – R$ 5,00
d) 201 KW/H à 500 KW/H – R$ 6,00
e) 501 KW/H à 30.000 KW/H – R$ 10,00
f) acima de 30.001 – R$ 100,00
§ 3º. consumidores comerciais, com as seguintes classes de consumo mensais:
a) 0 KW/H à 100 KW/H – R$ 2,00
b) 101 KW/H à 200 KW/H – R$ 2,50
c) 201 KW/H à 500 KW/H – R$ 3,00
d) acima de 501 KW/H – R$ 5,00
§ 4º. consumidores rurais, com qualquer classe de consumo mensal, fica
estabelecido cota única de R$ 2,00.
§ 5º. consumidores concessionários de serviços públicos, com as seguintes
classes de consumo:
a) 0 KW/H à 100 KW/H – R$ 10,00
b) 101 KW/H à 200 KW/H – R$ 15,00
c) 201 KW/H à 500 KW/H – R$ 20,00
d) acima de 501 KW/H – R$ 50,00
(...)
Art. 4º. Este Decreto entra em vigor
na data de sua publicação ou afixação” (fl. 32).
3. Posteriormente,
esse decreto foi alterado pelo Decreto n. 3.287, de 09 de junho de 2004, cuja
redação, no que interessa, é a seguinte:
“Art. 1º. O valor a ser cobrado à título de Contribuição para Iluminação Pública
será calculado de acordo com a testada frontal do imóvel, instituída
I - residenciais, com consumo até:
a) 0 Kw/h à 50 Kw/h – isento;
b) 51 Kw/h à 100 Kw/h – R$ 3,50;
c) 101 Kw/h à 200 Kw/h – R$ 4,00;
d) 201 Kw/h à 500 Kw/h – R$ 4,50;
e) acima de 501 Kw/h – R$ 6,00;
II - industriais, com consumo até:
a) 0 Kw/h à 50 Kw/h – R$ 3,00;
b) 51 Kw/h à 100 Kw/h – R$ 5,00;
c) 101 Kw/h à 200 Kw/h – R$ 7,00;
d) 201 Kw/h à 500 Kw/h – R$ 8,00;
e) 501 Kw/h à 30.000 Kw/h – R$ 15,00;
f) acima de 30.001 Kw/h – R$ 200,00;
III - comerciais, com consumo até:
a) 0 Kw/h à 100 Kw/h – R$ 3,00;
b) 101 Kw/h à 200 Kw/h – R$ 3,50;
c) 201 Kw/h à 500 Kw/h – R$ 4,00;
d) acima de 501 Kw/h – R$ 6,00;
IV – Para os consumidores rurais, fica estabelecida cota única de R$ 4,00,
independente do consumo de energia elétrica.
(...)
Art. 4º. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação ou
afixação, revogando expressamente o Decreto Municipal nº 3.262/04” (fls.
36/37).
4. Em 22 de
dezembro de
“Art. 5º. O valor da contribuição para o custeio, de que trata o art. 1º e seu
parágrafo único, será aferido proporcionalmente ao consumo de energia elétrica,
regulamentado por decreto. Parágrafo 1º. O período de incidência da
contribuição, bem como os prazos e condições de pagamento, além de outros elementos necessários à efetivação da cobrança, serão
disciplinados no respectivo regulamento.
Parágrafo 2º. Em se tratando de
imóvel rural, ainda que lindeiro do perímetro urbano, mas fora dele, o valor da
CIP será reduzido em 50% (cinqüenta por cento).
Art. 2º. Ficam revogados os demais
parágrafos do artigo 5º da Lei 3.353/02.
Art. 3º. Esta Lei entrará em vigor na
data de sua publicação ou afixação”.
5. Os Decretos
n. 3.262, de 29 de janeiro de 2004 e n. 3.287, de 09 de junho de 2004, e todos
os demais posteriores, não subsistem, pois, está em vigor, o Decreto n. 3.639,
de 05 de julho de 200. Sua redação é a seguinte:
“Art. 1º. A contribuição para Iluminação Pública, instituída
§ 1º - consumidores residenciais, com as seguintes classes de consumo:
a) 0 Kw/h à 50 Kw/h – isento;
b) 51 Kw/h à 100 Kw/h – R$ 7,00;
c) 101 Kw/h à 200 Kw/h – R$ 8,00;
d) 201 Kw/h à 500 Kw/h – R$ 9,50;
e) acima de 501 Kw/h – R$ 11,00;
§ 2º - consumidores industriais, com as seguintes classes de consumo:
a) 0 Kw/h à 50 Kw/h – R$ 8,00;
b) 51 Kw/h à 100 Kw/h – R$ 10,00;
c) 101 Kw/h à 200 Kw/h – R$ 12,00;
d) 201 Kw/h à 500 Kw/h – R$ 13,00;
e) 500 Kw/h à 30.000 Kw/h – R$ 22,00;
f) acima de 30.001 Kw/h – R$ 502,00;
§ 3º - consumidores residenciais, com as seguintes classes de consumo:
a) 0 Kw/h à 100 Kw/h – R$ 8,50;
b) 101 Kw/h à 200 Kw/h – R$ 8,50;
c) 201 Kw/h à 500 Kw/h – R$ 9,00;
d) acima de 500 Kw/h – R$ 11,00;
§ 4º. consumidores rurais, com qualquer classe de consumo mensal, fica
estabelecida cota única de R$ 9,00 (nove reais), devendo ainda ser aplicado o
desconto de 50%, conforme estabelecido no art. 5º, § 2º, da Lei nº 3.353/02,
com redação alterada pela Lei nº 3.586/05.
§ 5º. consumidores concessionários de serviços públicos, com as seguintes
classes de consumo:
a) 0 Kw/h à 100 Kw/h – R$ 22,00;
b) 101 Kw/h à 200 Kw/h – R$ 32,00;
c) 201 Kw/h à 500 Kw/h – R$ 42,00;
d) acima de 500 Kw/h – R$ 102,00
(...)
Art. 4º. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação ou
afixação, revogando expressamente o Decreto nº 3.544, de 18 de setembro de
6. Denota-se a
incompatibilidade vertical das
disposições da lei local e dos decretos com a Constituição do Estado de São
Paulo, mais precisamente com os seus arts.
5º e § 1º, 111, 144, 160, § 1º e 163, I, II, e III, b, e § 6º, que dispõem o seguinte:
“Art. 5º. São Poderes do Estado,
independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
§ 1º. É vedado a qualquer dos Poderes
delegar atribuições.
(...)
Art.
(...)
Art. 144. Os Municípios, com
autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se
auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na
Constituição Federal e nesta Constituição.
(...)
Art. 160. Compete ao Estado instituir:
(...)
§ 1º. Sempre que possível, os
impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica
do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para
conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos
individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades
econômicas do contribuinte.
(...)
Art. 163. Sem prejuízo de outras
garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado ao Estado:
I – exigir ou aumentar tributo sem
lei que o estabeleça;
II – instituir tratamento desigual
entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer
distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida,
independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
III – cobrar tributos:
(...)
b) no mesmo exercício financeiro em
que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
(...)
§ 6º. Qualquer subsídio ou isenção,
redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou
remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderão ser
concedidos mediante lei estadual específica, que regule exclusivamente as
matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem
prejuízo do disposto no art. 155, § 2º, XII, ‘g’, da Constituição Federal”.
7. Os
Municípios têm assegurada autonomia, atendidos os princípios estabelecidos na
Carta Magna e na Constituição do respectivo Estado (art. 29, Constituição
Federal; art. 144, Constituição Estadual), inclusive no exercício das competências
outorgadas para instituição e arrecadação tributária (art. 30, Constituição
Federal). Portanto, a competência tributária dos entes municipais deve ser
exercida em consonância às normas constitucionais tributárias federais e
estaduais; ademais, os entes locais são obrigados a perfilhar o esquema
decorrente do princípio da separação de poderes.
8. De acordo
com o magistério de Roque Antonio Carrazza, “a Constituição, ao discriminar as
competências tributárias, estabeleceu - ainda que, por vezes, de modo implícito
e com uma certa margem de liberdade para o legislador - a norma padrão de
incidência (o arquétipo genérico, a regra matriz) de cada exação. Noutros
termos, ela apontou a hipótese de incidência possível, o sujeito ativo
possível, o sujeito passivo possível, a base de cálculo possível e a alíquota
possível, das várias espécies e subespécies de tributos. Em síntese, o
legislador, ao exercitar a competência tributária, deverá ser fiel à norma
padrão de incidência do tributo, pré-traçada na Constituição. O legislador
(federal, estadual, municipal ou distrital)
enquanto cria o tributo, não pode fugir deste arquétipo constitucional”
(Curso de Direito Constitucional
Tributário, 4.ª ed., p. 257). Nesse mesmo sentido é a orientação que emerge
da mais alta Corte Judiciária brasileira, acentuando que “o fundamento do poder
de tributar (...) reside no dever jurídico de essencial e estrita fidelidade
dos entes tributantes ao que imperativamente dispõe a Constituição da República”
(Min. Celso de Mello, Informativo STF n. 125), sendo inconstitucional qualquer
tributo criado fora desses limites.
9. Com
fundamento no permissivo do art. 149-A da Constituição Federal, o Município editou
lei instituindo a cobrança de contribuição para o custeio do serviço de
iluminação pública.
10. A
inconstitucionalidade da lei local já se nota na definição de seu fato gerador, cujo parágrafo único do
art. 1º contém a expressão “e demais bens públicos”, sem qualquer distinção, autorizando
a incidência do tributo pelo consumo de energia elétrica em qualquer espécie de
bem público, inclusive os de uso especial e os dominicais. Com efeito, assim
dispõe a Lei n. 3.353/02:
“Art. 1º. (...).
Parágrafo único. O serviço previsto
no caput deste artigo compreende o consumo de energia destinada à iluminação de
vias, logradouros de vias, logradouros e
demais bens públicos, e a instalação, manutenção, melhoramento e expansão
da rede de iluminação pública”.
11. Essa extensão é ofensiva ao princípio da
razoabilidade contido no art. 111 da
Constituição Paulista, porque, em última análise, o contribuinte será
onerado pelo fornecimento e consumo de energia elétrica em bens destinados ao
estabelecimento de serviço público, executado direta ou indiretamente (bens
públicos de uso especial), ou objetos de direito real ou pessoal (bens
dominicais), pertencentes ao poder
público como sujeito de direitos.
12. Ora, nestes
casos, o serviço público é prestado a título uti singuli; sua remuneração é operacionalizada por tarifa
pressupondo a divisibilidade e a especificidade da atividade estatal,
diferentemente da contribuição para o custeio de iluminação pública, tributo
vocacionado para a cobertura dos ônus de serviço uti universi, isto é, com os requisitos da indivisibilidade e da generalidade.
13. Portanto,
inconstitucional, à luz do princípio da razoabilidade (art. 111, Constituição
Estadual) a expressão “e demais bens públicos”, constante do parágrafo único, do art. 1º da Lei n.
3.353/02, cuja nulidade deve ser declarada para sua supressão (redução de texto)
ou, se assim não se preferir, para emprestar
interpretação conforme no sentido de limitar-se à expressão aos demais bens
públicos de uso comum do povo.
14. Não
bastasse, essa inconstitucionalidade repousa em outro argumento concorrente. Como a autonomia municipal está limitada
pela observância dos princípios
estabelecidos na Constituição Federal (art. 29) e na Constituição Estadual (art. 144) – e, em decorrência, Estados
e Municípios exercem as competências constitucionais outorgadas (arts. 25, 29 e
30, Constituição Federal; arts. 1º e 144, Constituição Paulista) - soa
inexorável que o exercício da competência tributária do art. 149-A da
Constituição Republicana deve ser observada pelo legislador municipal nos seus estritos limites e segundo a discriminação de receitas tributárias, que reflete o princípio federativo.
15. Destarte,
sendo objeto da remuneração da contribuição prevista nesse preceito o serviço uti universi de iluminação pública, e
não o uti singuli, nisto também
consiste a mácula.
16. O art. 5º da
Lei n. 3.353/02 ao definir a base de cálculo do tributo tinha a seguinte
redação:
“Artigo 5º. O valor da contribuição para o custeio, de que trata o artigo 1º e seu
parágrafo único, será aferido tomando-se por base o valor despendido para a
prestação do serviço, rateado em função da testada de cada imóvel, levando-se
em conta o tipo de iluminação fornecido (a potência das lâmpadas utilizadas), e
cuja cobrança será objeto de regulamento.
Parágrafo 1º. O período de incidência
da contribuição, bem como os prazos e condições de pagamento, além de outros elementos necessários à
efetivação da cobrança, serão disciplinados no respectivo regulamento.
Parágrafo 2º. Quando o imóvel for
condomínio, cada unidade corresponderá à testada
do imóvel.
Parágrafo 3º. Havendo servidão de
passagem para acesso ao imóvel, será levada em conta testada da passagem.
Parágrafo 4º. Em se tratando de
imóvel rural, ainda que lindeiro do perímetro urbano, mas fora dele, o valor da
CIP será reduzido em 50% (cinqüenta por cento).
Parágrafo 5º. No caso de imóvel
residencial de esquina, será levado em conta, para cobrança da CIP, o lado de maior fachada”.
17. Com a edição
da Lei n. 3.586/05, caput e o § 1º do art. 5º foram alterados, a redução
de base de cálculo foi realinhada no § 2º e os parágrafos originais (2º a 5º)
foram revogados, verbis:
“Art. 5º. O valor da contribuição para o custeio, de que trata o art. 1º e seu
parágrafo único, será aferido proporcionalmente ao consumo de energia elétrica,
regulamentado por decreto.
Parágrafo 1º. O período de incidência
da contribuição, bem como os prazos e condições de pagamento, além de outros elementos necessários à
efetivação da cobrança, serão disciplinados no respectivo regulamento.
Parágrafo 2º. Em se tratando de
imóvel rural, ainda que lindeiro do perímetro urbano, mas fora dele, o valor da
CIP será reduzido em 50% (cinqüenta por cento).
Art. 2º. Ficam revogados os demais
parágrafos do artigo 5º da Lei 3.353/02”.
18. É certo que não se declara a
inconstitucionalidade de lei cuja nódoa foi objeto de revogação total ou
parcial por nova lei, mas, a incompatibilidade vertical do art. 5º e § 1º da
Lei n. 3.353/02 na redação dada pela Lei n. 3.586/05 face à Constituição
Estadual terá como efeito a repristinação da antiga redação. Por essa razão,
após expor os motivos da inconstitucionalidade desses dispositivos da lei local
em sua redação vigente, será desenvolvida a argumentação da própria
insubsistência da antiga redação da lei.
19. A regra vigente do caput do art. 5º e de seu § 1º trata dos elementos objetivos
quantitativos do tributo – base de cálculo e alíquota – outorgando
autêntica delegação legislativa absolutamente vedada em geral, e, em
especial, em matéria tributária, sujeita à reserva legal. Com efeito,
isso se revela na fórmula constante da lei local impugnada, tanto no caput do art. 5º, ao referir que o valor
da contribuição “será
aferido proporcionalmente ao consumo de energia elétrica, regulamentado por
decreto”, quanto na parte final de seu § 1º, com a expressão “além de outros elementos necessários à efetivação
da cobrança, serão disciplinados no respectivo regulamento”.
20. Ora, conferir a ato normativo ulterior
do Chefe do Poder Executivo a tarefa de definição da base de cálculo e da
alíquota do tributo ofende o art. 163, I, da Constituição Estadual (que
reproduz o art. 150, I, da Constituição Federal). Pois, somente lei pode criar
ou majorar tributo, expressão inclusiva da definição de seus elementos
objetivos (como base de cálculo e alíquota) e subjetivos. Tratando-se de limite
negativo à intervenção estatal na propriedade e na liberdade, é inadmissível seu
tratamento por outro ato normativo senão lei em sentido formal - vedada
qualquer delegação - e vulnera o princípio da separação de poderes, cuja
expressão na Constituição Estadual proíbe delegação legislativa (art. 5º e §
1º), preceitos aplicáveis aos Municípios por obra do art. 144 da
Constituição Estadual.
21. Nesse sentido, a lição de Roque Antonio
Carrazza afirma que:
“o patrimônio
dos contribuintes só pode ser atingido nos casos e modos previstos na lei, que
deve ser geral e abstrata, igual para todos e irretroativa (art. 150, III, 'a',
da CF), não confiscatória (art. 150, IV, da CF) etc. O tributo, pois, deve
nascer da lei (editada, por óbvio, pela pessoa política competente). Tal
lei deve conter todos os elementos e supostos da norma jurídica tributária
(hipótese de incidência do tributo, seus sujeitos ativo e passivo e suas bases
de cálculo e alíquotas), não se discutindo, de forma alguma, a delegação, ao
Poder Executivo, da faculdade de defini-los, ainda que
22. Com
requintada precisão dogmática, Hugo de Brito Machado expõe que função exclusiva
da lei:
“é estabelecer
todos os elementos de que se necessita para saber se este existe, qual é o seu valor, quem deve
pagar, quando e a quem deve ser pago. Assim, a lei instituidora do tributo há
de conter: (a) a descrição do fato tributável; (b) a definição da base de cálculo e da alíquota ou outro
critério a ser utilizado para o estabelecimento
do valor do tributo; (c) o critério para identificação do sujeito passivo da obrigação
tributária; (d) o sujeito ativo da relação tributária, se for diverso da
pessoa jurídica da qual a lei seja expressão de vontade” (Curso de Direito Tributário, São Paulo: Malheiros, 2002, 20ª ed. p.
41).
23. Destarte, a
lei local impugnada é inteiramente inconstitucional (e não apenas seu art. 5º, § 1º), por força do critério
da dependência; nenhuma valia tem um diploma tributário que institui
tributo, mas, não fixa seus elementos quantitativos (alíquota e base de
cálculo), ou outros elementos da exigência tributária. Neste sentido, explica
Oswaldo Luiz Palu que:
“será total ou parcial a inconstitucionalidade conforme atinja todo um
ato normativo ou apenas parte dele, seja uma norma em relação a um conjunto
delas, ou parte de uma norma em relação a ela mesma. Aqui vige o princípio da
conservação dos atos jurídicos, de inegável caráter utilitário. Também a
inconstitucionalidade negativa ou por omissão pode ser parcial quando, v.g., a falta de cumprimento pelo órgão
público encarregado de certo ato for apenas de alguns aspectos determinados
pela Constituição e não omissão absoluta, como ocorreria na hipótese da outra
categoria (inconstitucionalidade negativa total). Naquela existem normas
insuficientes, entretanto, ao atendimento do determinado constitucionalmente;
nesta, autêntico vazio normativo a respeito (black hole). Ocorre, às vezes, que
a inconstitucionalidade parcial transmuda-se em inconstitucionalidade total.
Suponha-se o caso de um ato normativo
que, em conseqüência da declaração de inconstitucionalidade parcial de seu
texto, deixe o restante sem qualquer significado. O critério da dependência
aplica-se, aqui, para nulificar todo o
ato. No mesmo sentido, se uma norma, que faz parte de uma regulamentação
geral sobre determinado assunto dando-lhe substrato jurídico, for declarada
inconstitucional, os demais também serão nulificados (critério da
interdependência)” (Controle de
Constitucionalidade – conceitos, sistemas e efeitos, São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2ª ed., p. 75).
24. Também
é inconstitucional o art. 5º caput da
Lei n. 3.353/02 na redação dada pelo art. 1º da Lei n. 3.586/02. Estabelecendo
que o valor da contribuição “será aferido proporcionalmente ao consumo de energia elétrica, regulamentado
por decreto”, é ofensiva ao princípio da
razoabilidade (art. 111, Constituição Estadual) a norma local quando adota
como parâmetro o consumo proporcional de energia elétrica porque não guarda
qualquer relação com a contraprestação do serviço prestado, conotando, em
concurso, afronta ao princípio da
capacidade contributiva previsto no art. 160, § 1º, da Constituição Estadual (reprodutor
do art. 145, § 1º, Constituição Federal), aplicáveis aos Municípios por força
do art. 144 da Carta Política Bandeirante.
25. No caso de tributo vinculado a uma
determinada prestação estatal, o valor da obrigação correlata deve se relacionar
ao benefício gerado para seu custeio, sendo vedada a eleição de fatores
aleatórios. A lei local não precisa nem define a espécie de consumo de
energia elétrica – individual ou geral.
26. Tanto isso é verdade que desde os
Decretos n. 3.262/04 e n. 3.287/04 até o Decreto n. 3.639, de 05 de julho de
2007, invasores da reserva legal, cuidaram de fazê-lo. À guisa de
proporcionalidade, estabeleceram progressividade de alíquotas tomando por
base o consumo de energia elétrica individual, que nenhuma relação lógica e
racional tem para legitimar a tributação na espécie. Os decretos distinguiram
classes de consumo individual do serviço de energia elétrica e aplicaram
alíquotas progressivas conforme a maior ou menor quantidade de consumo uti singuli de energia elétrica.
27. Além da natureza peculiar da contribuição de iluminação
pública ser incompatível com alíquotas progressivas, não há Constituição autorização
expressa para tanto. E mesmo se fosse juridicamente possível a adoção do
critério da progressividade na definição das alíquotas dessa contribuição, ad argumentandum tantum, não haveria
como aferir a capacidade contributiva simplesmente pelo padrão de consumo de
energia elétrica, de acordo com a respectiva classe de consumidores
(industrial, comercial, residencial etc.), uma vez que esse critério não se
presta à efetiva realização da justiça tributária, posto que passa ao largo da real
capacidade econômica do contribuinte, instrumento imprescindível ao alcance da
isonomia tributária.
28. O critério
adotado é inconstitucional porque a base imponível do tributo é totalmente
dissociada da atuação estatal, sopesando, em realidade, fator que serve de
fundamento à cobrança do ICMS ( consumo de energia elétrica pelo contribuinte
das classes industrial, comercial e residencial), donde configurada a
bitributação. O consumo de energia elétrica residencial, comercial ou
industrial é específico e divisível; nenhuma
relação tem com o serviço de iluminação pública, genérico e indivisível. É carecedor de razoabilidade o emprego de
um parâmetro próprio para mensuração da contraprestação de serviço público
divisível e específico para remuneração de outro, genérico e indivisível.
29. Apenas para
ilustrar essa situação, tome-se como exemplo o imóvel de alto padrão que seja
habitado por apenas um morador, o qual passa a maior parte do tempo fora.
Certamente, o seu consumo de energia elétrica será infinitamente inferior ao de
uma moradia coletiva (v.g., um
cortiço), que, em regra, é ocupada por pessoas mais humildes. Por conta do
critério estabelecido, essas últimas serão obrigadas ao pagamento de
contribuição de iluminação pública em montante superior ao do primeiro, o que,
além de desarrazoado, atenta contra o
postulado constitucional da isonomia tributária constante dos arts. 160, § 1º, e 163, II, da Constituição
Estadual, aplicáveis ex vi de seu
art. 144. Daí a lúcida advertência lançada pelo eminente Desembargador Paulo
Shintate ao examinar propositura semelhante:
“essa progressividade (...)
estabelecida de forma desvinculada da objetiva e adequada avaliação da
capacidade contributiva do sujeito passivo conduz, ao contrário do pretendido
pela norma constitucional, à injustiça e à quebra do princípio da isonomia
tributária” (TJSP, ADI 59.340-0/8, 26-04-2000).
30. Neste sentido, baliza mais contundente se
encontra no Supremo Tribunal Federal, in
verbis:
“Relevo jurídico da tese segundo a qual o legislador
comum, fora das hipóteses taxativamente indicadas no texto da Carta Política,
não pode valer-se da progressividade na definição das alíquotas pertinentes à
contribuição de seguridade social devida por servidores públicos
31. Estas mesmas premissas valem para demonstração
da inconstitucionalidade dos decretos que,
invadindo o âmbito da reserva legal, com tratamento desigualitário
desarrazoado, adotaram alíquotas
progressivas e conferiram isenções. Não se trata de mera regulamentação da
lei, mas, de nítido ato normativo complementar à lei, com autonomia para
sobrevivência mesmo em face de sua derrogação. Tais normas são passíveis de
fiscalização abstrata de constitucionalidade nesta sede porquanto são atos normativos de caráter abstrato,
genérico, impessoal e indeterminado, nos termos da jurisprudência (RTJ
143/510). Neste sentido:
“é admissível controle concentrado de
constitucionalidade de decreto que, dando execução a lei inconstitucional, crie
cargos públicos remunerados e estabeleça as respectivas denominações,
competências, atribuições e remunerações” (STF, ADI 3.232-TO, Tribunal Pleno,
Rel. Min. Cezar Peluso, 14-08-2008, v.u., DJe 02-10-2008).
“AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE. Liminar. Decreto nº 430/92 que estabelece exigência de
precatório judicial para pagamento devido pela União, suas autarquias e
Fundações, decorrentes de decisão judicial. Art. 3º e seu parágrafo único:
natureza normativa e autônoma, desvinculada da lei regulamentada. Ação Direta
de Inconstitucionalidade, nessa parte, conhecida. Medida Cautelar deferida para
suspender a eficácia das referidas normas” (STF, ADI-MC 673-DF, Tribunal Pleno,
Rel. Min. Paulo Brossard, 12-02-1992, DJ 11-10-2001, p. 05).
32. Se, ad
argumentandum tantum, não prevalecer esta tese, por arrastamento,
devem ser tidos por inconstitucionais.
33. Como acima exposto, a mácula da violação
à cláusula proibitiva de delegação legislativa e a subversão à
reserva legal já constavam da original redação do art. 5º da lei
local impugnada, cujo vício é argüido para evitar sua repristinação em
virtude da inconstitucionalidade total do art. 5º e § 1º da Lei n. 3.353/02 na
redação dada pelo art. 1º da Lei n. 3.586/05. É imperiosa essa necessidade:
“FISCALIZAÇÃO NORMATIVA ABSTRATA - DECLARAÇÃO DE
INCONSTITUCIONALIDADE
34. A fórmula empregada no caput – “o valor despendido para a prestação do serviço,
rateado em função da testada de cada
imóvel, levando-se em conta o tipo de iluminação fornecido (a potência das
lâmpadas utilizadas), e cuja cobrança será objeto de regulamento” – e no § 1º - “além de outros
elementos necessários à efetivação da cobrança, serão disciplinados no
respectivo regulamento” - também viola
os arts. 5º, § 1º, e 163, I, da Constituição Estadual pela delegação da
base de cálculo e das alíquotas do tributo a decreto. Para além, seu caput e as
disposições contidas em seus §§ 2º, 3º, e 5º, revogadas pelo art. 2º da Lei n.
3.586/05, ofendem o princípio da
razoabilidade (art. 111, Constituição Estadual) quando adotam como parâmetro a dimensão (testada) do imóvel e, que,
por sinal, sequer foram obedecidas pelos decretos anteriores à Lei n. 3.586/05.
35. Ora, tal
critério que não guarda qualquer relação com a contraprestação do serviço
prestado, denotando, no ponto, a afronta
aos princípios da isonomia tributária e da capacidade contributiva, constantes
dos arts. 160, § 1º, e 163, II, da Constituição Estadual (reprodutores dos
arts. 145, § 1º, e 150, II, da Constituição Federal), todos aplicáveis aos
Municípios por força do art. 144 da Carta Política Bandeirante.
36. Os decretos
municipais revogados e o decreto em vigor têm outra nódoa. A latere da definição dos elementos objetivos quantitativos da
obrigação tributária, houve a outorga de
isenções tributárias em franca violação
ao princípio da separação dos poderes (art.
5º, Constituição Estadual), pois, a isenção tributária é matéria sujeita à
reserva de lei, configurando, concorrentemente, afronta à legalidade tributária especificamente prevista nos arts. 111 e
163, § 3º, da Constituição Paulista. Neste sentido:
“ISENÇÃO TRIBUTÁRIA: RESERVA CONSTITUCIONAL DE LEI
“MATÉRIA TRIBUTÁRIA E DELEGAÇÃO LEGISLATIVA: A
outorga de qualquer subsídio, isenção ou crédito presumido, a redução da base
de calculo e a concessão de anistia ou remissão em matéria tributaria só podem
ser deferidas mediante lei específica, sendo vedado ao Poder Legislativo
conferir ao Chefe do Executivo a prerrogativa extraordinária de dispor,
normativamente, sobre tais categorias temáticas, sob pena de ofensa ao
postulado nuclear da separação de poderes e de transgressão ao princípio da
reserva constitucional de competência legislativa” (STF, ADI-MC 1.247-PA,
Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 17-08-1995, v.u., DJ 08-09-1995, p.
28.354).
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI ESTADUAL
QUE OUTORGA AO PODER EXECUTIVO A PRERROGATIVA DE DISPOR, NORMATIVAMENTE, SOBRE
MATÉRIA TRIBUTARIA - DELEGAÇÃO LEGISLATIVA EXTERNA - MATÉRIA DE DIREITO ESTRITO
- POSTULADO DA SEPARAÇÃO DE PODERES - PRINCÍPIO DA RESERVA ABSOLUTA DE LEI
37. Embora
revogados os decretos anteriores ao vigente Decreto n. 3.639, de 05 de julho de
2007, justificável, nos termos acima
delineados, evitar sua repristinação.
38. Até porque,
em concurso, há outra grave
inconstitucionalidade. O Decreto n. 3.262, de 29 de janeiro de 2004, estabeleceu os valores da contribuição no mesmo exercício de sua cobrança (arts.
1º e 4º), enquanto os Decretos n. 3.287, de 09 de junho de 2004, e n. 3.639, de
05 de julho de 2007, majoraram os
valores das alíquotas no transcurso do
exercício financeiro (arts. 1º e 4º), rompendo
o princípio da anterioridade tributária constante do art. 163, III, b, da Constituição Estadual,
aplicável aos Municípios por obra de seu art. 144 - e que, no particular,
reproduz o art. 150, III, b, da
Constituição Federal. Portanto, são, no mínimo, inconstitucionais para o
exercício de 2004 e 2007, mediante declaração de nulidade parcial ou
interpretação conforme sem redução de texto.
39. Este egrégio
Tribunal de Justiça já reconheceu, em precedentes, a inconstitucionalidade de leis
municipais instituidoras da contribuição para custeio de iluminação pública
pelos motivos articulados nesta peça, verbi
gratia:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
– Demanda objetivando a desconstituição da Lei nº 1.371, de 3 de dezembro de
2003, do Município de Echaporã, que ‘dispõe sobre a instituição, no Município
de Echaporã da Contribuição para Custeio da Iluminação Pública – CIP, prevista
no artigo 149-A da Constituição Federal’ – Contribuição para custeio da
iluminação pública – Lei que institui alíquotas progressivas – ‘Art. 5º ‘caput’
– As alíquotas de contribuição são diferenciadas conforme a classe de
consumidores e a quantidade de consumo medida em KW/h, conforme a tabela anexo
I’ – O legislador municipal aplicou o princípio da capacidade contributiva à
espécie tributária ‘contribuição’, sem embargo de coadunar-se, apenas, com os
‘impostos’, conforme a letra da Constituição do Estado (art. 160, § 1º), que
reproduz a Carta Magna (art. 145, § 1º) – Ainda que assim não fosse, a fruição,
pelos contribuintes, da iluminação pública, bem como a repartição, entre eles,
dos respectivos custos, não possui qualquer relação direta com os tipos de
atividades que desenvolvem, que importam, isso sim, maior ou menor gasto
‘individual’ de energia elétrica, de modo que os fatores eleitos pela lei não
podem, juridicamente, servir de discriminantes de alíquotas. Nessa
conformidade, a progressividade de alíquotas, presente na espécie dos autos,
desatende ao ‘princípio da igualdade tributária’ (C. Est., art. 163, II)
Precedentes TJSP – ADIn 104.888-0/0-00, Rel. Des. SOUSA LIMA e TJSP – ADIn
108.351-0/9-00, Rel. Des. BARBOSA PEREIRA. – Impossibilidade de parcial
procedência da ação, para permitir que a lei subsista, cobrando-se, apenas,
pelo menor valor previsto, pois isso implicaria em estar o Tribunal a legislar
(TJSP – ADIn 104.888-0/0-00) 0 – Inconstitucionalidade da Lei n. 1.371, de
dezembro de 2003, do Município de Echaporã, por afronta ao artigo 163, inciso
II, da Constituição do Estado de São Paulo – Ação procedente” (TJSP, ADI 132.065-0/4-00,
Órgão Especial, Rel. Des. Mohamed Amaro, 02-08-2006, v.u.).
“AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE- Lei Complementar nº 03/2002 e Lei Complementar nº
01/2003, do Município de Panorama – Instituição de contribuição para o custeio
do serviço de iluminação pública – Inconstitucionalidade – Caracterização –
Afronta aos arts. 111, 144, 160, parágrafo 1º, e 163, inciso II, todos da
Constituição Estadual – Progressividade de alíquotas – Inexistência de previsão
constitucional – Faixas de consumo de energia elétrica – Critério que não
permite avaliar a real capacidade contributiva – Inobservância dos princípios
da razoabilidade e da isonomia – Subsistência parcial das leis –
Impossibilidade – Tribunal que não pode legislar – Leis declaradas
inconstitucionais – Ação procedente, mantidos até a data do julgamento os
efeitos da liminar” (TJSP, ADI 130.412-0/4-00, Órgão Especial, Rel. Des. Sousa
Lima, 22-11-2006, v.u.).
“Inconstitucionalidade – Ação direta
– Lei Municipal nº 1693 de 21 de novembro de 2005 – Contribuição para custeio
de iluminação pública – Base de cálculo que se vincula ao ‘quantum’ de energia
elétrica que o contribuinte consome mensalmente – Ação procedente –
Inconstitucionalidade declarada” (TJSP, ADI 149.672-0/3-00, Órgão Especial,
Rel. Des. Barbosa Pereira, 19-12-2007, v.u.).
40. Na
maioria das vezes e na prática, a alteração introduzida pela Emenda Constitucional
n. 39/02, para instituição desse tributo teve o efeito de, em muitos
municípios, formal substituição da denominação da antiga taxa de iluminação
pública, reiteradamente declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal
Federal (RE 231.764 e RE 233.332, v.g.),
pela falta de especificidade e divisibilidade do serviço público cuja
contraprestação se colimava.
41. Face ao
exposto, requer, inicialmente, a
concessão de medida liminar, à vista da cumulativa satisfação dos
requisitos legais concernentes ao fumus
boni juris e ao periculum in mora,
para a suspensão da eficácia das normas
impugnadas até o final julgamento da respectiva ação direta de
inconstitucionalidade.
42. Não bastasse
a plausibilidade jurídica da tese exposta na inicial, vinga obtemperar que ação
civil pública que impugnava o tributo foi julgada
extinta sem exame do mérito, cessada a eficácia da liminar deferida
(TJSP, AI 631.877-5/6-00, Agudos, 10ª Câmara de Direito Público, Rel. Des.
Antonio Carlos Villen, v.u., 30-07-2007). Esta circunstância se soma à
inerência da situação de risco peculiar de tributação ilegítima em que há um
permanente estado de ameaça, gerado pela potencialidade de ato administrativo
fiscal dirigido ao contribuinte, devendo se evitar o pagamento de tributo
inconstitucional que atinge milhares de pessoas e cuja repetição do indébito
exigirá a atomização de longas e dispendiosas demandas para sobrepujar o solve et repete. Em suma: há justo
receio de lesão ao direito que tem o contribuinte de não pagar uma dívida
tributária cuja fonte normativa foi moldada em total afronta às normas
constitucionais.
43. De resto,
ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a
excepcional conveniência da medida. No contexto das ações diretas e da outorga
de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência
é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos mais recentes
do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis
aparentemente inconstitucionais (ADI-MC 125, Rel. Min. Celso de Mello, 15-02-1990,
DJ 04-05-1990, p. 3.693; ADI-MC 568, RTJ 138/64; ADI-MC 493, RTJ 142/52; ADI-MC
540, DJ 25-09-1992, p. 16.182).
44. Tais
afirmações se ajustam com precisão aos casos, como o presente, cuja matéria em
discussão é tributária. Com efeito, as limitações constitucionais ao poder
estatal de tributar têm manifesta relevância e é inegável que convém ao bem
comum assegurar o efetivo império de seus princípios.
45. Como se
sabe, “o exercício do poder tributário, pelo Estado, submete-se, por inteiro,
aos modelos jurídicos positivados no texto constitucional, que, de modo
explícito ou implícito, institui em favor dos contribuintes decisivas
limitações à competência estatal para impor e exigir, coativamente, as diversas
espécies tributárias existentes”. Bem por isso, “os princípios constitucionais
tributários (...), sobre representarem importante conquista político-jurídica
dos contribuintes, constituem expressão fundamental dos direitos individuais
outorgados aos particulares pelo ordenamento estatal” (STF, ADI-MC 712-DF, Rel.
Min. Celso de Mello, 07-10-1992).
46. Face ao
exposto, requer:
I - nos termos acima desenvolvidos, a concessão de liminar
suspendendo a eficácia dos seguintes atos normativos do Município de Agudos:
a) Leis n. 3.353, de 31 de dezembro de 2002, e n. 3.586, de
22 de dezembro de 2005;
b) Decretos n. 3.262, de 29 de janeiro de 2004, n. 3.287, de
09 de junho de 2004 e n. 3.639, de 05 de julho de 2007;
II - a colheita das informações necessárias dos
Excelentíssimos Senhores Prefeito e Presidente da Câmara Municipal de Agudos,
sobre as quais protesta por manifestação oportuna;
III - a oitiva do douto Procurador-Geral do Estado, nos
termos do art. 90, § 2º, da Constituição Estadual;
IV - ao final, seja julgada procedente a presente ação para
declaração da inconstitucionalidade integral da Lei n. 3.353, de 31 de dezembro
de 2002, e por dependência ou arrastamento, da Lei n. 3.586, de 22 de dezembro
de 2005, e dos Decretos n. 3.262, de 29 de janeiro de 2004, n. 3.287, de 09 de
junho de 2004, e n. 3.639, de 05 de julho de 2007, do Município de Agudos, e,
na eventualidade de seu não acolhimento, a declaração de inconstitucionalidade:
a) com redução de texto da expressão “e demais bens públicos”,
constante do parágrafo único, do
art. 1º da Lei n. 3.353/02, ou para emprestar interpretação conforme no sentido
de limitar-se à expressão aos demais bens públicos de uso comum do povo;
b) do art. 5º, caput,
e § 1º, da Lei n. 3.353/02, com a redação dada pelo art. 1º da Lei n. 3.586/05,
e por dependência, do caput e dos §§
1º a 3º e 5º, da Lei n. 3.353/02, revogados pelo art. 2º da Lei n. 3.586/05, e
dos Decretos n. 3.262/04, n. 3.287/04 e n. 3.639, de 05 de julho de 2007;
c) sem redução de texto, dos arts. 1º e 4º, do Decreto n.
3.262/04 e dos arts. 1º e 4º, do Decreto n. 3.287/04, para o exercício de 2004,
e dos arts. 1º e 4º, do Decreto n. 3.639, de 05 de julho de 2007, para o
exercício de 2007, ainda que por interpretação conforme para exclusão da
incidência tributária nesses exercícios.
Termos em que, pede deferimento.
São
Paulo, 01 de dezembro de 2008.
Fernando Grella Vieira
Procurador-Geral
de Justiça