Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

Protocolado n. 97.816/10

Assunto: Inconstitucionalidade do art. 1º (parcial); art. 2º; art. 6º e art. 8º, do Ato das Disposições Transitórias, da Lei Complementar n. 045, de 12 de junho de 2007, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09, do Município de Registro.

 

 

Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Complementar n. 045, de 12 de junho de 2007, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09, do Município de Registro. Possibilidade de acesso aos empregos públicos de Professor de Desenvolvimento Infantil, criados no caput do art. 1º, aos integrantes dos empregos públicos de Atendente de Desenvolvimento Infantil que possuam habilitação em Magistério em nível de ensino médio, com habilitação específica em Pré-Escola ou Curso Superior em Pedagogia com Licenciatura Plena e habilitação em Pré-Escola, bem como de outros que concluam os cursos respectivos no prazo de 05 (cinco) anos, prevista no art. 8º. Transposição ofensiva aos arts. 111 e 115, II, da Constituição Estadual.

         

          O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art.125, § 2º e art. 129, IV da Constituição Federal, e ainda art. 74, VI e art. 90, III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE do art. 1º (parcial); art. 2º; art. 6º e art. 8º, do Ato das Disposições Transitórias, da Lei Complementar n. 045, de 12 de junho de 2007, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09, do Município de Registro, pelos fundamentos a seguir expostos:

I – Os Atos Normativos Impugnados

1.                 Assim rezam os dispositivos impugnados da Lei Complementar nº 045, de 12 de junho de 2007, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09, do Município de Registro:

"ATO DAS DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS DO PROJETO DE LEI COMPLEMENTAR Nº 029/2009

Art. 1º. Fica criado o cargo de 'Professor de Desenvolvimento Infantil', de provimento efetivo por concurso público e dos atuais ocupantes do cargo de Atendente de Desenvolvimento Infantil, que atendam os requisitos legais do art. 2º.   g.n.

Art. 2º. Para que possa ocupar o cargo de 'Professor de Desenvolvimento Infantil', os atuais ocupantes do cargo de Atendente de Desenvolvimento Infantil, deverão:

I. Comprovar, através de diploma devidamente registrado no MEC, ou Certificado acompanhado de Histórico Escolar, habilitação em Magistério em nível de ensino médio, com habilitação específica em Pré-Escola ou Curso Superior em Pedagogia com Licenciatura Plena e habilitação em Pré-Escola.

II. Estar em pleno exercício da função de Atendente de Desenvolvimento Infantil, sem qualquer restrição de saúde física e/ou mental para o exercício da mesma, não devendo apresentar qualquer restrição médica e/ou readaptação funcional que impossibilite a atuação.

§ 2º. Aos integrantes dos empregos de Auxiliar de Desenvolvimento Infantil que não preencham os requisitos do parágrafo anterior faculta-se a possibilidade de transposição, desde que concluam o curso de magistério ou a graduação em pedagogia em 5 (cinco) anos da data de entrada em vigor desta lei.

Art. 6º. Os atuais ocupantes das funções de Atendentes de Desenvolvimento Infantil, que atendam às condições previstas no art. 2º, poderão ter seu cargo redenominado para Professor de Desenvolvimento Infantil.

Art. 8º. Os atuais ocupantes do cargo de Atendente de Desenvolvimento Infantil que não atenderem as condições descritas nos incisos I e II do artigo 2º, terão o prazo de 5 (cinco) anos a partir da data de publicação da Lei Complementar e desta ADCT para se adequarem e requererem o enquadramento.

§ Único.  Ao término do prazo estipulado, os Atendentes de Desenvolvimento Infantil que não se adequarem, permanecerão neste cargo, enquadrados no Anexo II do Quadro de Cargos Efetivos da Lei Municipal nº 808/2008, a serem extintos na vacância."

2.                 Embora o emprego público de Atendente de Desenvolvimento Infantil também fosse provido por concurso público e tivesse atribuições parecidas com as de Professor de Desenvolvimento Infantil, são postos de trabalho de natureza e requisitos de ingresso diferentes na Administração Pública municipal, com distintos regimes remuneratórios e jornadas de trabalho, como se infere dos arts. 7º e 11º, da Lei Complementar nº 45/09, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09.

3.                 Ademais, conforme previsto na Descrição de Cargo de Atendente de Desenvolvimento Infantil, Nível II, cabe-lhe auxiliar o professor de Creche (fls.16), não podendo, desta forma, ser equiparado ao Professor de Desenvolvimento Infantil, a quem incumbe a "docência nas Creches, com atividade de Educação geral, conforme alínea "m", do inc. I, do art. 11, da Lei Complementar nº 045/09, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09.  Outrossim, o Cargo de Atendente de Desenvolvimento Infantil não faz parte do Quadro do Magistério Municipal, enquanto que o de Professor de Desenvolvimento Infantil encontra-se previsto no art. 6º, parágrafo único, letra "j", da retromencionada legislação.

4.                 A remuneração deste último encontra regulamentação no art. 7º, ou seja: mês de 05 (cinco) semanas e hora/aula de 60 (sessenta) minutos, enquanto que a remuneração do Atendente de Desenvolvimento Infantil segue o estabelecido para o Pessoal da Administração Pública, de acordo com a Lei nº 808/2008.

5.                 A jornada de trabalho do Professor de Desenvolvimento Infantil é de 30 horas semanais, decomposta de acordo com o art. 12, inc. I, da Lei Complementar nº 045/09, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09; enquanto que a jornada prevista para o Atendente de Desenvolvimento Infantil é de 40 horas semanais (fls.17).

6.                 Não se trata, portanto, de mera redenominação de cargo ou emprego público, como se parece inferir, prima facie, do art. 6º, do Ato das Disposições Transitórias, da Lei Complementar nº 045/09, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09.

7.                 Cuida-se, sem dúvida alguma, da transposição vedada de servidores públicos lato sensu admitidos para um determinado cargo ou emprego público, isolado, para outro de natureza, regime e requisitos de investidura diversos, bem como de carreira distinta, sem submissão à prévia aprovação em concurso público de provas e títulos.

8.                 Distanciam-se os dois cargos, na medida em que não são as mesmas atividades desempenhadas e o nível de formação exigido.   Veja-se que para o Atendente de Desenvolvimento Infantil exige-se escolaridade:  Nivel I - Ensino Médio Completo e Nível II - Superior Completo em Pedagogia (fls.17), muito diferente do que exige o art. 2º, do ADT, da Lei Complementar nº 045/09, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09. Ademais, ao Professor de Desenvolvimento Infantil cabe a tarefa de "Exercer a docência nas Creches, com atividades de Educação geral" (art. 11, inc. I, letra "m", da Lei Complementar nº 045/09, com a redação dada pela Lei Complementar nº 47/09), atividade esta não incumbida ao Atendente de Desenvolvimento Infantil.

II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

9.                 O art. 1º, na parte em que prevê a possibilidade de preenchimento da vaga pelos atuais ocupantes do cargo de Atendente de Desenvolvimento Infantil; e os arts. 2º, 6º e 8º, do Ato das Disposições Transitórias, da Lei Complementar n. 045, de 12 de junho de 2007, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09, do Município de Registro, contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, a qual está subordinada a produção normativa municipal por força dos seguintes preceitos ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal:

Art. 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

§ 1º - É vedado a qualquer dos Poderes delegar atribuições.

§ 2º - O cidadão, investido na função de um dos Poderes, não poderá exercer a de outro, salvo as exceções previstas nesta Constituição.

(...)

Art. 111. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Art. 115. Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;

(...)

Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

(...)

Art. 297. São também aplicáveis no Estado, no que couber, os artigos das Emendas à Constituição Federal que não integram o corpo do texto constitucional, bem como as alterações efetuadas no texto da Constituição Federal que causem implicações no âmbito estadual, ainda que não contempladas expressamente pela Constituição do Estado”.

10.               O art. 1º, na parte em que prevê a possibilidade de preenchimento da vaga pelos atuais ocupantes do cargo de Atendente de Desenvolvimento Infantil; e os arts. 2º, 6º e 8º, do Ato das Disposições transitórias, da Lei Complementar n. 045, de 12 de junho de 2007, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09, do Município de Registro, são inconstitucionais por nítida violação aos arts. 111 e 115, II, da Constituição Estadual, a que estão subordinados os Municípios por obra de seu art. 144.

11.               Com efeito, tais dispositivos legais consagram a ocupantes do emprego público de Atendente de Desenvolvimento Infantil o ingresso, à míngua de concurso público de provas e títulos, aos empregos de Professor de Desenvolvimento Infantil, cujas naturezas, atribuições, remunerações e requisitos de investidura são diversos, assim como diversa é a sua posição na estrutura funcional da administração pública municipal.

12.               Trata-se, como já acenado, de transposição para cargo ou emprego distinto, e que é estimada ilícita e inconstitucional pelo ordenamento jurídico vigente, tanto que o Supremo Tribunal Federal já editou, a propósito, a Súmula 685, cujo teor expressa que:

“É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido”.

13.               A espécie exibe ofensa ao princípio de moralidade administrativa que preordena a exigência constitucional de provimento originário de cargos ou empregos públicos isolados ou de carreira mediante prévia aprovação em concurso público e que, de outra parte, recebe o influxo do princípio da impessoalidade administrativa ao interditar toda a sorte de favorecimentos e privilégios na investidura no serviço público e nas funções públicas correlatas.

III – Pedido liminar

14.               À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos normativos do Município de Registro apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação porque subvertem a necessidade de lei para disciplina das atribuições de empregos públicos e favorecem pessoas determináveis para acesso a empregos públicos de maneira completamente ilícita. Com isso, permitem a investidura ou sua permanência de pessoas em funções públicas de maneira irregular, gerando excessivo ônus financeiro ao erário.

15.               À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação, do art. 1º, na parte em que prevê a possibilidade de preenchimento das vagas pelos atuais ocupantes dos cargos de Atendente de Desenvolvimento Infantil, com a seguinte redação "e dos atuais ocupantes do cargo de Atendente de Desenvolvimento Infantil, que atendam os requisitos legais do art. 2º."; e os arts. 2º, 6º e 8º, do Ato das Disposições Transitórias, da Lei Complementar n. 045, de 12 de junho de 2007, com a redação dada pela Lei Complementar n.047/09, do Município de Registro.

IV – Pedido

16.               Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade do art. 1º, na parte em que prevê a possibilidade de preenchimento das vagas pelos atuais ocupantes dos cargos de Atendente de Desenvolvimento Infantil, com a seguinte redação "e dos atuais ocupantes do cargo de Atendente de Desenvolvimento Infantil, que atendam os requisitos legais do art. 2º."; e dos arts. 2º, 6º e 8º, do Ato das Disposições Transitórias, da Lei Complementar n. 045, de 12 de junho de 2007, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09, do Município de Registro.

17.               Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Registro, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados, protestando por nova vista para manifestação final.

São Paulo, 16 de dezembro de 2010.

 

                            Fernando Grella Vieira

                         Procurador-Geral de Justiça

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Protocolado n. 97.816/10

Assunto: Inconstitucionalidade do art. 1º (parcial); art. 2º; art. 6º e art. 8º, do Ato das Disposições Transitórias, da Lei Complementar n. 045, de 12 de junho de 2007, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09, do Município de Registro.

 

 

 

 

 

1.    Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face art. 1º (parcial); art. 2º; art. 6º e art. 8º, do Ato das Disposições Transitórias, da Lei Complementar n. 045, de 12 de junho de 2007, com a redação dada pela Lei Complementar n. 047/09, do Município de Registro, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.    Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

                    São Paulo, 16 de dezembro de 2010.

 

 

 

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

fjyd