EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

Protocolado nº 98.644/07

Assunto: Inconstitucionalidade da Lei nº 3.648, de 11 de novembro de 2005, do Município de Piedade.

 

Ementa: Lei nº 3.648/05, do Município de Piedade, que cria a Contribuição para Custeio de Serviços de Iluminação Pública. Fato gerador e base de cálculo alternativos: consumo de energia elétrica ou área do imóvel desprovido de ligação elétrica. Critérios que não permitem aferir a capacidade contributiva e estabelecem tratamento diferenciado aos contribuintes. Progressividade incompatível com a finalidade do tributo, que é a de custear serviço público geral e indivisível. Pedido de declaração de inconstitucionalidade por afronta aos artigos 111, 144, 160, § 1º e 163, II,da Constituição do Estado de São Paulo.

 

           

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art.125, § 2º e art. 129, inciso IV da Constituição Federal, e ainda art. 74, inciso VI e art. 90, inciso III da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE da Lei nº 3.648, de 11 de novembro de 2005, do Município de Piedade, pelos fundamentos a seguir expostos.

1. DO ATO NORMATIVO IMPUGNADO.

O Município de Piedade instituiu pela Lei nº 3.648, de 11 de novembro de 2005, a Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública – CIP (fls. 24/29, 123/126).

Essa lei prevê, em apertada síntese que: a) a contribuição foi estabelecida para custear o consumo de energia elétrica destinada à iluminação de vias, logradouros, praças, jardins, monumentos e assemelhados, bem como a instalação, manutenção, melhoramento e expansão da rede de iluminação pública no município (art. 1º.); b) a base de cálculo da CIP para os imóveis edificados e cadastrados perante a concessionária de energia elétrica é o valor mensal do consumo total de energia elétrica constante das faturas emitidas (art. 4º., caput); c) as alíquotas da contribuição para esses imóveis estão estabelecidas na tabela anexa à lei e são diferenciadas conforme a classe de consumidores e a quantidade de consumo medido em kWh (art. 4º., § 2º); d) a base de cálculo da CIP para os imóveis não edificados ou que não disponham de ligação elétrica será obtida pela divisão entre o valor total do custo do serviço e a área total em metros quadrados de todos os imóveis cadastrados na área urbana e na área de expansão urbana do município, tudo multiplicado pela área do imóvel considerado (art. 4º., § 1º); e) estão isentos da contribuição os consumidores de classe residencial com consumo mensal de até 80 kWh (art. 4º., § 2º., inc. I); f) estão excluídos da base de cálculo da CIP os valores excedentes ao da tabela (art. 4º., § 2º., inc. II); e g) a determinação da classe/categoria de consumidor observará as normas da Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL – ou órgão regulador que vier a substituí-la (art. 4º., § 2º., inc. III).

A lei em análise, no entanto, é verticalmente incompatível com a Constituição do Estado de São Paulo, mais precisamente com os seus artigos 111, 144, 160, § 1º e 163, II, que dispõem o seguinte:

Art. 111. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação e interesse público.

(...)

Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

(...)

Art. 160. Compete ao Estado instituir

(...)

§ 1º. Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.

(...)

Art. 163. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado ao Estado:

(...)

II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos”.

É o que será demonstrado a seguir.

2. FUNDAMENTAÇÃO

Na ordem constitucional em vigor, os Municípios integram a Federação e têm assegurada sua autonomia, atendidos os princípios estabelecidos na Carta Magna e na Constituição do respectivo Estado (art. 29, Constituição Federal). Essa autonomia se revela pelas competências outorgadas a tais entes federativos para legislarem sobre assuntos de interesse local; suplementarem a legislação federal e a estadual no que couber; instituírem e arrecadarem os tributos que lhes são próprios (art. 30, Constituição Federal), a par de outras.

É bem de ver, porém, que a competência tributária dos entes públicos municipais (consubstanciada na capacidade de instituir tributos) encontra limites nas normas da Constituição Federal atinentes ao Sistema Tributário Nacional, dispostas nos arts. 145 e seguintes (e reproduzidas nos arts. 159 e seguintes da Constituição Estadual), que envolvem princípios incontornáveis, dentre os quais as regras matrizes dos tributos.

Realmente, mesmo admitindo-se que a Constituição em vigor não criou tributos, é certo que, além de discriminar competências, ela traçou a “norma padrão de incidência” de cada um dos tributos que podem ser instituídos pelas entidades estatais. Assim, ao conferir às pessoas políticas competência para a instituição de impostos, taxas e contribuições, a Constituição Federal no seu art. 145 classifica juridicamente os tributos, traçando o modelo de cada um deles e vinculando ao legislador ordinário.

De acordo com o magistério de Roque Antonio Carrazza, “a Constituição, ao discriminar as competências tributárias, estabeleceu - ainda que, por vezes, de modo implícito e com uma certa margem de liberdade para o legislador - a norma padrão de incidência (o arquétipo genérico, a regra matriz) de cada exação. Noutros termos, ela apontou a hipótese de incidência possível, o sujeito ativo possível, o sujeito passivo possível, a base de cálculo possível e a alíquota possível, das várias espécies e subespécies de tributos. Em síntese, o legislador, ao exercitar a competência tributária, deverá ser fiel à norma padrão de incidência do tributo, pré-traçada na Constituição. O legislador (federal, estadual, municipal ou distrital)  enquanto cria o tributo, não pode fugir deste arquétipo constitucional” (Curso de Direito Constitucional Tributário, 4.ª ed., p. 257).

Nesse mesmo sentido é a orientação que emerge da mais alta Corte Judiciária brasileira, acentuando que “o fundamento do poder de tributar (...) reside no dever jurídico de essencial e estrita fidelidade dos entes tributantes ao que imperativamente dispõe a Constituição da República” (Min. Celso de Mello, Informativo STF nº. 125), sendo, portanto, inconstitucional qualquer tributo criado fora desses limites.

No caso sob exame, com fundamento no permissivo do art. 149-A da Constituição Federal, a Câmara de Vereadores editou a Lei nº 3.648, de 11 de novembro de 2005, instituindo a cobrança de contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública que tem por fato gerador o consumo de energia elétrica por pessoa natural ou jurídica, mediante ligação regular de energia elétrica no território do Município ou a área total de metros quadrados de cada imóvel não edificado ou que não disponha de ligação elétrica (art. 2º). O sujeito passivo são todos os proprietários, os detentores do domínio útil ou possuidores a qualquer título de imóveis edificados ou não, localizados nas áreas urbanas e de expansão urbana do município (art. 3º.). A base de cálculo corresponde ao valor mensal do consumo de energia elétrica indicado na fatura emitida pela concessionária de energia elétrica ou é estabelecida, para os imóveis não edificados ou que não disponham de ligação elétrica, pela fórmula constante do art. 4º., § 1º, que a torna proporcional à área do imóvel considerado. As alíquotas são diferenciadas (leia-se progressivas) e estabelecidas conforme a classe de consumidores e a quantidade de consumo medido em kWh (art. 4º, § 2º).

O artigo 4º., § 2º, III, da lei impugnada remete-nos às classes estabelecidas pela ANEEL para efeito de aplicação da tarifa (art. 20  da Resolução nº 456, de 29 de novembro de 2000). É relevante notar que, em cada uma delas, o valor da contribuição é medido conforme o volume do consumo individual de energia elétrica de modo progressivo, ou seja, para consumo menor valores menores, para consumo maior, valores maiores.

Façamos um registro histórico. Antes da promulgação da Emenda Constitucional nº. 39/02, que possibilitou a instituição e a cobrança desse tributo, inúmeros Municípios implantaram a taxa de iluminação pública, declarada reiteradamente inconstitucional pelo Colendo Supremo Tribunal Federal (RE 231.764 e 233.332, v.g.), por ser serviço inespecífico e indivisível.

Não obstante a Emenda nº. 39, a Lei Municipal nº. 3.648, de 11 de novembro de 2005, contrariou frontalmente a Constituição, fugindo do modelo por esta traçado, ao instituir a progressividade de alíquotas em função da classe de consumidores e da quantidade de consumo, nos termos da tabela que veicula, conforme já exposto.

A tabela a que se refere o art. 4º, § 2º da lei local estabelece, sem dúvida alguma, valores progressivos e diferenciados.

Entretanto, por sua natureza peculiar, a contribuição de iluminação pública não condiz com o regime de alíquotas progressivas, tal como previsto na lei ora discutida, mormente pela ausência de autorização constitucional expressa, ou seja, esse tipo de tributo não pode variar na razão da presumível capacidade contributiva do sujeito passivo da obrigação tributária. 

Mesmo se fosse juridicamente possível a adoção do critério da progressividade na definição das alíquotas dessa contribuição, o que se admite tão-só para argumentar, não haveria como aferir a capacidade contributiva simplesmente pelo padrão de consumo de energia elétrica, de acordo com a respectiva classe de consumidores (industrial, comercial, residencial e poder público), uma vez que esse critério não se presta à efetiva realização da justiça tributária.

Com efeito, o critério legalmente eleito - a quantidade de consumo ou a área do imóvel desprovido de ligação elétrica - não permite avaliar a real capacidade econômica do contribuinte. Para que se alcance a isonomia tributária, por meio de avaliação da capacidade econômica do contribuinte, é indispensável a consideração de outros dados, como os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte, conforme expresso na regra constitucional.

Apenas para ilustrar essa situação, tome-se como exemplo o imóvel de alto padrão que seja habitado por apenas um morador, o qual passa a maior parte do tempo fora. Certamente, o seu consumo de energia elétrica será infinitamente inferior ao de uma moradia coletiva (v.g. um cortiço), que, em regra, é ocupada por pessoas mais humildes. Por conta do critério legalmente estabelecido, essas últimas serão obrigadas ao pagamento de contribuição de iluminação pública em montante superior ao do primeiro, o que, além de desarrazoado, atenta contra o postulado constitucional da isonomia.

Daí a lúcida advertência lançada pelo Des. Paulo Shintate ao examinar propositura semelhante:

“essa progressividade (...) estabelecida de forma desvinculada da objetiva e adequada avaliação da capacidade contributiva do sujeito passivo conduz, ao contrário do pretendido pela norma constitucional, à injustiça e à quebra do princípio da isonomia tributária” (TJSP, ADI 59.340.0/8, 26-04-2000).

Ademais, prevalece no Excelso Pretório o entendimento de que o legislador ordinário, fora das hipóteses taxativamente indicadas no texto da Carta Política (arts. 153, § 2º, I, 153, § 4º, 156, § 1º, 182, § 4º, II, 195, § 9º), não pode valer-se da progressividade na definição de alíquotas pertinentes à contribuição previdenciária (STF, ADI 2.062-DF). Embora no precedente em foco tenha sido tratado especificamente da instituição de alíquotas progressivas à cobrança de contribuição previdenciária, os seus fundamentos são aplicáveis a este caso, em que se contesta a adoção por lei do critério da progressividade na cobrança da contribuição de iluminação pública.

Mas não é só.

A Lei em análise, apontando como sujeito passivo todos os proprietários, detentores e possuidores de imóvel (art. 3º), dotados ou não de ligação de energia elétrica, estabeleceu fato gerador e base de cálculo alternativos, que definem o quantum do tributo a partir do produto da área do imóvel pela fração equivalente ao valor total do custo dos serviços do mês anterior ao da cobrança dividido pela área total em metros quadrados de todos os imóveis cadastrados na área urbana e de expansão urbana do Município.

Nada mais equivocado.

A opção legislativa institui tratamento diferenciado a contribuintes, afrontando o princípio da isonomia que deve orientar a atividade tributária. Aqui também nos deparamos com tratamento discriminatório de contribuintes que se beneficiam igualmente da iluminação, mas devem recolher o tributo proporcional à área de seu imóvel[1]. Cuida-se de critério que não permite a verificação da capacidade contributiva e, por tal motivo, incompatível com o disposto no artigo 144 e 163, inciso II, da Constituição Federal.

De resto, cumpre anotar que, em se tratando de contribuição destinada ao custeio do serviço de iluminação pública, a sua base de cálculo deveria guardar alguma relação com essa atividade estatal, princípio do qual se distancia o artigo 4º da lei em análise.

Além de dispor valores diferenciados e progressivos, a lei determinou a sua incidência sobre o valor do consumo mensal de energia elétrica do próprio contribuinte. Assim, para a determinação do montante a ser pago a título de contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública, basta converter a unidade de medida em expressão monetária e aplicar, sobre o valor apurado, a alíquota respectiva.

Tal critério, data venia, é inconstitucional, à medida que a base imponível desse tributo é totalmente dissociada da atuação estatal, pois leva em conta fator que serve de fundamento à cobrança do ICMS: o consumo de energia elétrica pelo contribuinte das classes industrial, comercial e residencial, donde configurada a bitributação.

Ora, o consumo de energia elétrica residencial, comercial ou industrial nenhuma relação tem com o serviço de iluminação pública, genérico e indivisível, e cujo custeio se colima pela contribuição instituída na lei local impugnada porque parte de um critério eminentemente carecedor de razoabilidade, na medida em que se emprega um serviço público divisível e específico para fornecer base de remuneração de outro, genérico e indivisível.

Em conclusão, o ato legislativo em epígrafe é materialmente inconstitucional porque: (a) a Constituição não autoriza a adoção de alíquotas progressivas na cobrança da contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública; (b) o critério legalmente eleito (que considera apenas a quantidade de consumo ou a área de imóvel) não permite determinar a capacidade contributiva, sendo, portanto, ofensivo à razoabilidade e à isonomia; (c) da forma como instituída a sua cobrança, tomando por base o consumo de energia elétrica do contribuinte, a contribuição criada por essa lei praticamente se equipara a imposto estadual (ICMS), donde configurada, na espécie, a bitributação.

3. PEDIDO LIMINAR

Remanesce, no caso, a necessidade da concessão de medida liminar. É que, quando se trata do controle normativo abstrato, e uma vez verificada a cumulativa satisfação dos requisitos legais concernentes ao fumus boni juris e ao periculum in mora, o poder geral de cautela autoriza a suspensão da eficácia da norma impugnada, até o final julgamento da respectiva ação direta de inconstitucionalidade.

E, nesse passo, releva notar que a plausibilidade jurídica da tese exposta na inicial é evidente, não admitindo maiores questionamentos, ante a adoção por lei de critério de cobrança desarrazoado, arbitrário e que se revela sobremaneira ofensivo ao princípio da isonomia tributária, para o custeio do serviço de iluminação pública.

E, por outro lado, também está delineada a situação de risco, caracterizadora do periculum in mora, tanto mais porque “em matéria tributária há um permanente estado de ameaça gerada pela potencialidade de ato administrativo fiscal dirigido ao contribuinte” (STJ, 1ª Turma, 21-08-1997, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJU de 10-11-1997, p. 57.703). Assim, o contribuinte estará sendo compelido a pagar uma exação cuja constitucionalidade é contestada seriamente aqui – e certamente o fará por temor às sérias conseqüências que a lei empresta ao inadimplemento de débitos tributários. Salvo, é claro, se ele estiver amparado pela medida liminar que ora se pleiteia.

Como a contribuição atinge milhares de pessoas, a repetição do indébito exigirá a multiplicação de longas e dispendiosas demandas. Ou seja, estar-se-á sujeitando o contribuinte a uma situação semelhante à anacrônica regra do solve et repete.  Em suma: há justo receio de lesão ao direito que tem o contribuinte de não pagar uma dívida tributária cuja fonte normativa foi moldada em total afronta às normas constitucionais. De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida. Com efeito, no contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos mais recentes do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (ADI-MC 125, 15-02-1990, DJU de 04-05-1990, p. 3.693, Rel. Min. Celso de Mello; ADI-MC 568, RTJ 138/64; ADI-MC 493, RTJ 142/52; ADI-MC 540, DJU de 25-09-1992, p. 16.182).

E tais afirmações se ajustam com precisão aos casos, como o presente, cuja matéria em discussão é tributária. Com efeito, as limitações constitucionais ao poder estatal de tributar têm manifesta relevância e é inegável que convém ao bem comum assegurar o efetivo império de seus princípios. Como se sabe, “o exercício do poder tributário, pelo Estado, submete-se, por inteiro, aos modelos jurídicos positivados no texto constitucional, que, de modo explícito ou implícito, institui em favor dos contribuintes decisivas limitações à competência estatal para impor e exigir, coativamente, as diversas espécies tributárias existentes”. Bem por isso, “os princípios constitucionais tributários (...), sobre representarem importante conquista político-jurídica dos contribuintes, constituem expressão fundamental dos direitos individuais outorgados aos particulares pelo ordenamento estatal” (STF, ADI-MC 712-DF, Rel. Min. Celso de Mello, 07-10-1992).

Acrescente-se que esse egrégio Tribunal de Justiça já reconheceu, em precedentes, a inconstitucionalidade de leis municipais que instituem a Contribuição para Custeio da Iluminação Pública pelos motivos articulados nesta peça, verbi gratia:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – Demanda objetivando a desconstituição da Lei nº 1.371, de 3 de dezembro de 2003, do Município de Echaporã, que ‘dispõe sobre a instituição, no Município de Echaporã da Contribuição para Custeio da Iluminação Pública – CIP, prevista no artigo 149-A da Constituição Federal’ – Contribuição para custeio da iluminação pública – Lei que institui alíquotas progressivas – ‘Art. 5º ‘caput’ – As alíquotas de contribuição são diferenciadas conforme a classe de consumidores e a quantidade de consumo medida em KW/h, conforme a tabela anexo I’ – O legislador municipal aplicou o princípio da capacidade contributiva à espécie tributária ‘contribuição’, sem embargo de coadunar-se, apenas, com os ‘impostos’, conforme a letra da Constituição do Estado (art. 160, § 1º), que reproduz a Carta Magna (art. 145, § 1º) – Ainda que assim não fosse, a fruição, pelos contribuintes, da iluminação pública, bem como a repartição, entre eles, dos respectivos custos, não possui qualquer relação direta com os tipos de atividades que desenvolvem, que importam, isso sim, maior ou menor gasto ‘individual’ de energia elétrica, de modo que os fatores eleitos pela lei não podem, juridicamente, servir de discriminantes de alíquotas. Nessa conformidade, a progressividade de alíquotas, presente na espécie dos autos, desatende ao ‘princípio da igualdade tributária’ (C. Est., art. 163, II) Precedentes TJSP – ADIn 104.888-0/0-00, Rel. Des. SOUSA LIMA e TJSP – ADIn 108.351-0/9-00, Rel. Des. BARBOSA PEREIRA. – Impossibilidade de parcial procedência da ação, para permitir que a lei subsista, cobrando-se, apenas, pelo menor valor previsto, pois isso implicaria em estar o Tribunal a legislar (TJSP – ADIn 104.888-0/0-00) 0 – Inconstitucionalidade da Lei n. 1.371, de dezembro de 2003, do Município de Echaporã, por afronta ao artigo 163, inciso II, da Constituição do Estado de São Paulo – Ação procedente” (TJSP, ADI 132.065-0/4-00, Órgão Especial, Rel. Des. Mohamed Amaro, 02-08-2006, v.u.).

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE- Lei Complementar nº 03/2002 e Lei Complementar nº 01/2003, do Município de Panorama – Instituição de contribuição para o custeio do serviço de iluminação pública – Inconstitucionalidade – Caracterização – Afronta aos arts. 111, 144, 160, parágrafo 1º, e 163, inciso II, todos da Constituição Estadual – Progressividade de alíquotas – Inexistência de previsão constitucional – Faixas de consumo de energia elétrica – Critério que não permite avaliar a real capacidade contributiva – Inobservância dos princípios da razoabilidade e da isonomia – Subsistência parcial das leis – Impossibilidade – Tribunal que não pode legislar – Leis declaradas inconstitucionais – Ação procedente, mantidos até a data do julgamento os efeitos da liminar” (TJSP, ADI 130.412-0/4-00, Órgão Especial, Rel. Des. Sousa Lima, 22-11-2006, v.u.).

“Inconstitucionalidade – Ação direta – Lei Municipal nº 1693 de 21 de novembro de 2005 – Contribuição para custeio de iluminação pública – Base de cálculo que se vincula ao ‘quantum’ de energia elétrica que o contribuinte consome mensalmente – Ação procedente – Inconstitucionalidade declarada” (TJSP, ADI 149.672-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. Barbosa Pereira, 19-12-2007, v.u.).

No mesmo sentido: ADI 125.535-0/3-00, Rel. Des. Jarbas Mazzoni, 08-11-2006, v.u.; ADI 123.974-0/1-00, Rel. Des. Denser de Sá, 24-01-2007, v.u.; ADI 129.272.0/1, Rel. Des. Sousa Lima, 21-03-2007, v.u..

4. CONCLUSÃO E PEDIDO

Por todo o exposto, evidencia-se a necessidade de reconhecimento da inconstitucionalidade da norma aqui apontada.

Assim, aguarda-se o recebimento e processamento da presente Ação Declaratória, para que ao final seja julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade da Lei nº 3.648, de 11 de novembro de 2005, do Município de Piedade.

Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

São Paulo, 28 de outubro de 2008.

 

 

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

 

Jesp

 

 

 

Protocolado PGJ nº 98.644/07

Interessado: Secretário do Conselho Superior do Ministério Público Estadual

 

 

 

 

 

                                                1.Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face da Lei nº 3.648, de 11 de novembro de 2005, do Município de Piedade, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

                                                 2.Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

 

São Paulo, 28 de outubro de 2008

 

 

FERNANDO GRELLA VIEIRA

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 



[1] Em caso análogo, onde a base de cálculo se estabeleceu pela “testada” do imóvel, reconheceu-se a inconstitucionalidade da lei que a instituiu, por afronta aos artigos 144 e 163, inciso II, da Constituição do Estado (ADI nº 149.239-0/8-00 (Pederneiras), rel. Ribeiro dos Santos, j. 23.01.2008).