EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

 

Protocolado nº 139.111/12

 

 

Ementa:

1) Leis Complementares ns. 442, de 14 de novembro de 2008, 004, de 04 de maio de 2009, 05 de 04 de maio de 2009 e 010, de 18 de abril de 2011, do Município de Alambari, que instituem cargos de provimento em comissão, sem atribuições descritas em lei aos quais não correspondem a funções de direção, chefia ou assessoramento, mas funções próprias dos cargos de provimento efetivo.

2) Violação dos artigos 115, I, II e V; e 144 da Constituição Estadual.

3) Cargo de Procurador Geral e de Assessor Jurídico. As atividades da Advocacia Pública (assessoria e consultoria a entidades e órgãos da Administração Pública), inclusive sua Chefia, são reservadas a profissionais recrutados por concurso público. Violação dos arts. 98, §§ 1º e 2º, 111, 115, II e V, da Constituição Estadual.

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e art. 129, inciso IV, da Constituição Federal, e ainda art. 74, inciso VI, e art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face das Leis ns. 442, de 14 de novembro de 2008, 004 de 04 de maio de 2009, 05 de 04 de maio de 2009 e 010 de 18 de abril de 2011, do Município de Alambari, pelos fundamentos a seguir expostos.

 

I – DOS ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS

A presente ação tem por objetivo impugnar os cargos de provimento em comissão previstos no Anexo, I da Lei Complementar n. 442, de 14 de novembro de 2008; no Anexo I do inciso I do art. 1º, da Lei Complementar n. 005 de 04 de maio de 2009; no Anexo III do art. 2º da Lei Complementar n. 005 de 04 de maio de 2009; no Anexo 5 da Lei Complementar n. 004 de 04 de maio de 2009 e na Lei Complementar n. 10 de 18 de abril de 2011, todas do Município de Alambari.

 

Com efeito, a Lei Complementar n. 442, de 14 de novembro de 2008, do Município de Alambari, “Dispõe sobre o Quadro de Pessoal da Prefeitura Municipal de Alambari e dá outras providências”.

 

Referida lei revogou expressamente as Leis Municipais n.s 423, de12/03/2008 e 428, de 02/05/2008 (art. 4º).

  

Ocorre, porém, que o Anexo I da Lei n. 442/2008, apresenta os seguintes cargos de provimento em comissão, considerados inconstitucionais:

ANEXO I

Gabinete do Prefeito

 

Cargo

Quantidade

Chefe de Gabinete

01

Procurador Geral do Município

01

Assessor Jurídico

01

Assessor de Gabinete

01

Assessor da Presidência

01

Coordenador do Fundo Social

01

Secretário da Junta do Serviço Militar

01

 

Departamento de Administração e Finanças

 

Cargo

Quantidade

Assessor Administrativo

01

Chefe do Setor Administrativo

01

Chefe de Recursos Humanos

01

Chefe de Tributos e Fiscalização

01

Encarregado de Compras e Licitações

01

 

Departamento de Saúde

 

Cargo

Quantidade

Chefe de Assistência Social

01

Gerente Unidade de Saúde

07

Chefe do Setor de Enfermagem

01

Chefe Unidade de Saúde

01

Chefe Vig. San. E Epidemiológica

01

Assessor de Unidade de Saúde

01

Coordenador Ativ. Sanit. Epidemiológica

02

Assessor de Expediente de Diretoria

03

 

Departamento de Obras, Engenharia e Serviços Municipais

 

Cargo

Quantidade

Gerente Divisão Engenharia e Obras

01

Assessor de Agricultura e Meio Ambiente

01

Chefe de Manutenção de Veículos e Máquinas

01

Chefe de Controle de Frota

01

Encarregado de Obras

01

Mestre de Obras

02

Assessor de Serviços Urbanos

01

 

Departamento de Educação, Cultura, Esportes e Turismo

 

Cargo

Quantidade

Gerente do Setor de Esportes

01

Encarregado de Administração II

01

Assessor Man. Ensino Fundamental

01

Encarregado Pré-Primário/Creche

01

Assessor Corporação Musical

01

Assessor Unidade de Educação

02

Assessor de Expediente

08

 

A Lei Complementar n. 004, de 04 de maio de 2009, do Município de Alambari, “Dispõe sobre a estrutura administrativa da Prefeitura de Alambari, e dá outras providências”.

 

No entanto, consta do Anexo 5 da Lei n. 004/2009, os seguintes cargos tidos como inconstitucionais:

Cargo

Quantidade

Assessor Corporação Musical

01

Assessor de Agricultura e Meio Ambiente

01

Assessor de Diretor

01

Assessor de Expediente de Diretoria

03

Assessor  de Serviços Urbanos

01

Assessor de Unidade de Saúde

02

Assessor Executivo

18

Assessor Jurídico

01

Assessor Man. Ensino Fundamental

01

Assessor Presidência (FSS)

01

Assessor Técnico Administrativo

03

Assessor Técnico Agrícola

02

Assessor Técnico de Tributos

01

Assessor Técnico Desportivo

01

Assessor Unidade de Educação

07

Chefe de Controle de Frota

01

Chefe de Assistência Social

01

Chefe de Divisão de Finanças

01

Chefe de Gabinete

01

Chefe de Manutenção de Veículos e Máquinas

01

Chefe de Recursos Humanos

01

Chefe do Setor de Compras e Licitações

01

Chefe do Setor de Cultura e Turismo

01

Chefe do Setor de Ensino Fundamental

01

Chefe do Setor de U Agrícola

01

Chefe de Tributos e Fiscalização

01

Chefe de Turma de Transporte

01

Chefe do Setor Administrativo

01

Chefe do Setor de Ensino Infantil Creche

01

Chefe do Setor de Enfermagem

01

Chefe Unidade de Saúde

01

Chefe Vig. Sanitária e Epidemiológica

01

Coordenador Ativ. Sanit. Epidemiológica

03

Coordenador de Ação Social

01

Coordenador do Fundo Social

01

Coordenador Pedagógico

03

Diretor de Escola

02

Diretor de EMEI

01

Divisão de Planejamento

01

Encarregado de Administração II

01

Encarregado de Obras

01

Gerente Divisão Engenharia e Obras

01

Gerente do Setor de Esportes

01

Gerente Unidade de Saúde

07

Mestre de Obras

02

Procurador-Geral do Município

01

Secretária de Gabinete

01

Secretário da Junta de Serviço Militar

01

Vice-Diretor

02

 

 

A Lei Complementar n. 05, de maio de 2009, do Município de Alambari, “Altera a Lei Municipal n. 442, de 14 de novembro de 2008, que dispõe sobre o Quadro de Pessoal da Prefeitura Municipal de Alambari e dá outras providências”.

 

A legislação em questão cria cargos de provimento em comissão considerados inconstitucionais e altera algumas das denominações dos mesmos (arts. 1º e 2º).

 

Com efeito, consta do Anexo I, do inciso I do art. 1º da Lei Complementar n. 005/2009, os seguintes cargos de provimento em comissão considerados inconstitucionais:

 

Gabinete do Prefeito

 

Cargo

Quantidade

Coordenador de Ação Social

01

Assessor Executivo

02

 

Departamento de Administração e Finanças

 

Cargo

Quantidade

Chefe de Divisão de Planejamento

01

Chefe de Divisão de Finanças

01

Assessor Técnico de Tributos

01

Assessor Técnico Administrativo

01

Assessor Executivo

02

 

Departamento de Educação, Cultura, Esportes e Turismo

 

Cargo

Quantidade

Assessor de Diretor

01

Chefe do Setor de Ensino Fundamental

01

Chefe do Setor de Cultura e Turismo

01

Assessor Técnico Desportivo

01

Assessor Executivo

02

Assessor de Unidade de Educação

05

 

Departamento de Saúde

 

Cargo

Quantidade

Assessor Técnico Administrativo

01

Assessor de Unidade de Saúde

01

Coordenador de ativ. Sanitárias e Epidemiológicas

01

Assessor Executivo

02

 

Departamento de Obras, Engenharia e Serviços Municipais

 

Cargo

Quantidade

Chefe de Setor de Unidade Agrícola

01

Chefe de Turma de Transportes

01

Assessor Técnico Agrícola

02

Assessor Executivo

02

 

O Anexo III do art. 2º da Lei n. 005/2009 reporta a alteração de denominação de cargos de provimento em comissão.

 

Situação Antiga

Situação Nova

Denominação

Denominação

Assessor de Gabinete

Secretária de Gabinete

Assessor de Expediente

Assessor Executivo

Assessor Administrativo

Assessor Técnico Administrativo

Chefe de Setor de Enfermagem

Chefe de Divisão de Enfermagem

Encarregado de Compras e Licitações

Chefe de Setor de Compras e Licitações

Encarregado de Obras

Chefe do Setor de Obras

Encarregado de Pré-Primário e Creches

Chefe de Setor de Ensino Infantil e Creche

 

 

Por fim, a Lei Complementar n. 010, de 18 de abril de 2011, criou o cargo de provimento em comissão de Diretor de EMEI junto ao quadro de Magistério, tido como inconstitucional.

 

Entretanto, à exceção do cargo de Diretor de EMEI, as atribuições dos cargos de provimento em comissão citados, não estão previstas em lei.

Desse modo, referidos cargos não poderiam ter sido criados para o exercício das funções de direção, chefia ou assessoramento. Sendo destinados ao provimento em comissão, devem ter seu rol de atribuições legalmente definidos por lei, pois, de outro modo, não se acomodam na hipótese constitucional que excepciona a regra geral do concurso público.

 

A lacuna legal não autoriza, segundo a jurisprudência dessa Corte, a presunção de que referidas lotações se situam na Administração superior ou demandam a estrita confiança do chefe do Poder Executivo.

 

Ademais, a previsão normativa desses cargos de provimento em comissão é contrária, destarte, ao artigo 37, incisos II e V, da Constituição Federal ou ao artigo 115, incisos II e V, da Constituição Estadual, este último indicado como parâmetro de controle.

 

É o que será demonstrado a seguir.

II – DO DIREITO

A Constituição em vigor consagrou o município como entidade federativa indispensável ao nosso sistema federativo, integrando-o na organização político-administrativa e garantindo-lhe plena autonomia, como se observa da análise dos arts. 1º, 18, 29, 30 e 34, VI, “c”, da Constituição Federal (cf. Alexandre de Moraes, “Direito Constitucional”, São Paulo: Atlas, 7.ª ed., p. 261).

 

A autonomia concedida aos municípios não tem caráter absoluto e soberano. Pelo contrário, encontra limites nos princípios emanados dos poderes públicos e dos pactos fundamentais, que instituíram a soberania de um povo (cf. De Plácido e Silva, “Vocabulário Jurídico”, Rio de Janeiro: Forense, v. I, 1984, p. 251), sendo definida por José Afonso da Silva como “a capacidade ou poder de gerir os próprios negócios, dentro de um círculo prefixado por entidade superior”, que no caso é a Constituição (Curso de Direito Constitucional Positivo, 8ª. ed., São Paulo: Malheiros, 1992, p. 545).

 

A autonomia municipal se assenta em quatro capacidades básicas: (a) auto-organização, mediante a elaboração de lei orgânica própria, (b) autogoverno, pela eletividade do Prefeito e dos Vereadores as respectivas Câmaras Municipais, (c) autolegislação, mediante competência de elaboração de leis municipais sobre áreas que são reservadas à sua competência exclusiva e suplementar, (d) autoadministração ou administração própria, para manter e prestar os serviços de interesse local (cf. José Afonso da Silva, ob. cit., p. 546).

 

Nessas quatro capacidades, encontram-se caracterizadas a autonomia política (capacidades de auto-organização e autogoverno), a autonomia normativa (capacidade de fazer leis próprias sobre matéria de sua competência), a autonomia administrativa (administração própria e organização dos serviços locais) e a autonomia financeira (capacidade de decretação de seus tributos e aplicação de suas rendas, que é uma característica da autoadministração) (ob. e loc. cits).

 

Assim, por força da autonomia administrativa de que foram dotadas, as entidades municipais são livres para organizar os seus próprios serviços, segundo suas conveniências locais. E, na organização desses serviços públicos, a Administração cria cargos e funções, institui classes e carreiras, faz provimentos e lotações, estabelece vencimentos e vantagens e delimita os deveres e direitos de seus servidores (cf. Hely Lopes Meirelles, Direito Municipal Brasileiro, 8ª. ed., São Paulo: Malheiros, 1996, p. 420).

 

Contudo, a liberdade conferida aos Municípios para organizar os seus próprios serviços não é ampla e ilimitada; ela se subordina às seguintes regras fundamentais e impostergáveis: (a) a que exige que essa organização se faça por lei; (b) a que prevê a competência exclusiva da entidade ou Poder interessado; e (c) a que impõe a observância das normas constitucionais federais pertinentes ao servidor público (ob. e loc. cits.)

 

No caso em exame, o Legislador Municipal criou cargos de provimento em comissão sem indicar o feixe de atribuições dos mesmos.

 

Essa mácula é somada à percepção de que esses cargos têm natureza inequivocamente técnica ou profissional própria dos cargos de provimento efetivo, além do que dada a estrutura administrativa do município, revelam-se de terceiro ou quarto escalão. Cuidam-se, à evidência, de funções que denotam a natureza profissional do vínculo entre seus agentes e a Administração Pública e que, por essa razão, só poderiam ser preenchidas por concurso público.

 

Segundo Ruy Cirne Lima (Princípios de Direito Administrativo, RT, 6.ª ed., p. 162), o funcionário público profissional se peculiariza por quatro característicos básicos, a saber: (a) natureza técnica ou prática do serviço prestado; (b) retribuição de cunho profissional; (c) vinculação jurídica à Administração Direta; (d) caráter permanente dessa vinculação.

 

Desse modo, nitidamente diferenciado dos cargos que reclamam provimento em comissão, as funções profissionais devem ser exercidas em caráter permanente, ou seja, pelo quadro estável de servidores públicos municipais, os quais, em conformidade com o disposto no art. 115, inciso II, da Constituição do Estado de São Paulo, só podem ser arregimentados por concurso público de provas ou de provas e títulos.

 

Na verdade, o cargo em comissão destina-se apenas às atribuições de “direção, chefia e assessoramento” (CF, art. 37, inciso V, com a redação dada pela EC n.º 19/98) e tem por finalidade propiciar ao governante o controle das diretrizes políticas traçadas. Exige, portanto, das pessoas indicadas a titularizá-los, absoluta fidelidade à orientação fixada pela autoridade nomeante. Em outras palavras, o cargo de provimento em comissão está diretamente ligado ao dever de lealdade à linha fixada pelo agente político superior.

 

Daí porque a exceção contida na parte final do inciso II, do artigo 115, da Constituição do Estado de São Paulo - “ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração” -, que, no ponto, reproduz a dicção do artigo 37, inciso II, da Constituição da República, tem alcance limitado a situações excepcionais, relativas aos cargos cuja natureza especial justifique a dispensa de concurso público.

 

Torna-se evidente, portanto, que a limitação apontada não tem caráter puramente formal, de simples e incriteriosa indicação legal de cargos de provimento em comissão, que pudesse afastar o princípio constitucional da igual acessibilidade aos cargos públicos.

 

Bem a propósito, ao estudar com profundidade esse assunto, Márcio Cammarosano deixou anotado que o princípio democrático implica no princípio da igualdade “e este no princípio da igual acessibilidade dos cargos públicos, com o que se resguarda também o princípio da probidade administrativa” (Provimento de Cargos Públicos no Direito Brasileiro, São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 45).

 

Assim, para que a lei criadora de um cargo em comissão não venha a se constituir em burla ao princípio constitucional arrolado, enunciado expressamente pelo artigo 37, incisos I e II, da Constituição da República, deverá observar criteriosamente a natureza das funções a serem desempenhadas, pois, no dizer de Celso Antônio Bandeira de Mello (O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, Editora Revista dos Tribunais, 1ª edição, pág. 49), “impende que exista uma adequação racional entre o tratamento diferençado construído e a razão diferencial que lhe serviu de supedâneo”.

 

Afinado a esse mesmo entendimento, Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo Brasileiro, 18ª. ed, São Paulo: Malheiros, p. 378) adverte sobre pronunciamento do Supremo Tribunal Federal no sentido de que “a criação de cargo em comissão em moldes artificiais e não condizentes com as praxes de nosso ordenamento jurídico e administrativo, só pode ser encarada como inaceitável esvaziamento da exigência constitucional de concurso”.

 

E, da mesma forma, já decidiu o Pretório Excelso que “a exigência constitucional do concurso público não pode ser contornada pela criação arbitrária de cargos em comissão para o exercício de funções que não pressuponham o vínculo de confiança que explica o regime de livre nomeação e exoneração que os caracteriza.” (STF, RTJ 156/793)

 

Na esteira desse raciocínio, é inescusável que a parte final do inciso II do art. 115 da Constituição do Estado de São Paulo tem alcance circunscrito a situações em que o requisito da confiança seja predicado indispensável ao exercício do cargo.

 

De fato, como se trata de uma exceção à regra do concurso público, a criação de cargos em comissão pressupõe o atendimento do interesse público e só se justifica para o exercício de funções de “direção, chefia e assessoramento”, em que seja necessário o estabelecimento de vínculo de confiança entre a autoridade nomeante e o servidor nomeado. Fora desses parâmetros, é inconstitucional qualquer tentativa de criação de cargos dessa natureza.

 

É por isso que esse Sodalício exige efetivamente que a lei descreva as atribuições de cada um dos cargos, pois, do contrário, não é possível ao Poder Judiciário sindicar se foram criados, efetivamente, para as situações constitucionalmente permitidas:

“Ação direta de inconstitucionalidade – Lei Complementar n° 1.800, de 8 de março de 2005 – Criação de cargos de provimento em comissão, destinados, muitos deles, a funções burocráticas ou técnicas de caráter permanente - Inadmissibilidade - Dispositivo, ademais, que deixou de descrever as atribuições e responsabilidades de cada um dos cargos, impossibilitando a verificação de que foram criados exclusivamente para os casos constitucionalmente permitidos (direção, chefia e assessoramento) – Violação dos artigos 5°, § 1º, 111, 115, I e II e 144 da Constituição do Estado de São Paulo - Ação procedente” (ADIN nº 152.958-0/6, j. 4/03/2009, rel. Des. Debatin Cardoso, g.n.).

Desse último julgado, aliás, extrai-se a preciosa lição que fundamenta esta propositura:

“... o dispositivo deixou de descrever as atribuições e responsabilidades de cada um dos cargos criados, necessários para que se possa analisar e concluir que foram criados exclusivamente para os casos constitucionalmente permitidos.

Não basta denominar os cargos como sendo de diretor, chefe ou assessor para que se abra uma exceção à regra do concurso público e se justifique seu provimento em comissão, pois o que importa não é o rótulo, mas a substância deles, fazendo-se necessário examinar as atribuições a serem exercidas por seus titulares e tais atribuições devem estar definidas na lei.”

Aliás, Márcio Cammarosano, em artigo intitulado CARGOS EM COMISSÃO - BREVES CONSIDERAÇÕES QUANTO AOS LIMITES À SUA CRIAÇÃO (http://www.sertoledo.org.br/limites.html - pesquisado em 18.06.08) ensina que:

"... ofende a ordem jurídica em vigor criar cargos em comissão que não consubstanciem competências de direção, chefia e assessoramento, ainda que a denominação que lhes atribua seja própria de cargos daquela espécie, pois o que importa não é o rótulo, mas a substância de cada qual. Em outras palavras: denominar cargos públicos como sendo de diretor, chefia ou assessor não lhes atribui, por si só, a natureza que os permita ser de provimento em comissão. Faz-se necessário examinar as atribuições a serem exercidas por seus titulares, pois cargos públicos consubstanciam, como já assinalado, plexos de competências. Se estas não forem de direção, chefia ou assessoramento, haverá descompasso entre a denominação e as atribuições inerentes ao mesmo, entre o rótulo e a substância. Estar-se-á diante de expediente artificioso, mal disfarçada burla à exigência constitucional de concurso; de concurso público se devessem, em rigor, ter sido criados como cargos isolados ou iniciais de determinada carreira; de concurso interno se devessem ter sido criados como de classe intermediária ou final de carreira ".

 

Essa é, também, a orientação da Corte Constitucional, segundo a qual a norma que cria cargos em comissão cujas atribuições não se harmonizam com o princípio da livre nomeação e exoneração, que informa a investidura em comissão, ofende o disposto no art. 37, II, da Constituição Federal. Para o Supremo Tribunal Federal, há “necessidade de demonstração efetiva, pelo legislador estadual, da adequação da norma aos fins pretendidos, de modo a justificar a exceção à regra do concurso público para a investidura em cargo público" (ADI 3.233, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 10-5-2007, Plenário, DJ de 14-9-2007, com citação de precedentes).

 

Nem mesmo a eventual publicação de decreto para dispor sobre as atribuições dos cargos pode suprir a omissão que se traduz em inconstitucionalidade.

 

Nesse passo, cabe gizar que, apreciando lei estadual, o Supremo Tribunal Federal reafirmou, em recente oportunidade, que “a delegação de poderes ao Governador para, mediante decreto, dispor sobre ‘as competências, as atribuições, as denominações das unidades setoriais e as especificações dos cargos, bem como a organização e reorganização administrativa do Estado’, é inconstitucional porque permite, em última análise, sejam criados novos cargos sem a aprovação de lei” (ADI 4125, Relator (a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 10/06/2010, DJe-030 DIVULG 14-02-2011 PUBLIC 15-02-2011 EMENT VOL-02464-01 PP-00068).

 

Soma-se a isto o fato de que embora não haja a descrição das atribuições dos cargos de provimento em comissão impugnados depreende-se pela simples leitura de suas nomenclaturas, que a grande maioria deles referem-se a atribuições técnicas e profissionais, que podem ser exercidos por servidores públicos aprovados em concurso público.

 

No que tange ao cargo de provimento em comissão Diretor do EMEI, em que pese ser o único cargo impugnado com suas atribuições descritas em lei, verifica-se que na realidade trata-se de cargo relacionado a suporte técnico, supervisão, gerenciamento, coordenação, fiscalização, controle, acompanhamentos, informações, organização de reuniões e rotinas dos serviços, execução de projetos, que são atividades destinadas a atender necessidades executórias ou dar suporte a decisões e execução. Trata-se, portanto, de atribuições técnicas, administrativas e burocráticas, distantes dos encargos de comando superior onde se exige especial confiança e afinamento com as diretrizes políticas do governo.

 

Para finalizar, lembra-se que o Órgão Especial desse Egrégio Tribunal de Justiça entende ser possível declarar a inconstitucionalidade material de expressões de lei criadora de cargos em comissão (ADI n.º 11.939-0, relator Des. OLIVEIRA COSTA), cuja natureza não correspondia às características próprias dessas funções, daí porque, também aqui se impõe declarar a insubsistência dos cargos que seguem, ao final, arrolados, previstos nas leis impugnadas, por serem incompatíveis com os arts. 111, 115, incisos I, II e V e 144, da Constituição do Estado de São Paulo.

 

No tocante aos cargos de natureza jurídica, ou seja, o de Procurador Geral e de Assessor Jurídico, a inconstitucionalidade também consiste na sua forma de provimento que, apesar de ser comissionada, não pode ter a dimensão subjetiva franqueada pelas leis que os criaram.

A tarefa de assessoria, consultoria e representação jurídica nos municípios é reservada aos profissionais de carreira da advocacia pública, investidos mediante aprovação em concurso público, como vem se decidindo:

 

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR 11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO - CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. - O desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 02-08-1993, m.v., DJ 25-04-1997, p. 15.197).

 

PROCURADOR-GERAL DO ESTADO - ESCOLHA ENTRE OS INTEGRANTES DA CARREIRA. Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira” (STF, ADI 2.581-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007, m.v., DJe 14-08-2008).

 

“TRANSFORMAÇÃO, EM CARGOS DE CONSULTOR JURÍDICO, DE CARGOS OU EMPREGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO, ASSESSOR JURÍDICO, PROCURADOR JURÍDICO E ASSISTENTE JUDICIÁRIO-CHEFE, BEM COMO DE OUTROS SERVIDORES ESTÁVEIS JÁ ADMITIDOS A REPRESENTAR O ESTADO EM JUÍZO (PAR 2. E 4. DO ART. 310 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARÁ). INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA POR PRETERIÇÃO DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). LEGITIMIDADE ATIVA E PERTINÊNCIA OBJETIVA DE AÇÃO RECONHECIDAS POR MAIORIA” (STF, ADI 159-PA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 16-10-1992, m.v., DJ 02-04-1993, p. 5.611).

“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR 500, DE 10 DE MARÇO DE 2009, DO ESTADO DE RONDÔNIA. ERRO MATERIAL NA FORMULAÇÃO DO PEDIDO. PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO PARCIAL REJEITADA. MÉRITO. CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE ASSESSORAMENTO JURÍDICO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Conhece-se integralmente da ação direta de inconstitucionalidade se, da leitura do inteiro teor da petição inicial, se infere que o pedido contém manifesto erro material quanto à indicação da norma impugnada. 2. A atividade de assessoramento jurídico do Poder Executivo dos Estados é de ser exercida por procuradores organizados em carreira, cujo ingresso depende de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, nos termos do art. 132 da Constituição Federal. Preceito que se destina à configuração da necessária qualificação técnica e independência funcional desses especiais agentes públicos. 3. É inconstitucional norma estadual que autoriza a ocupante de cargo em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito do Poder Executivo. Precedentes. 4. Ação que se julga procedente” (STF, ADI 4.261-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 02-08-2010, v.u., DJe 20-08-2010).

Portanto, a criação dos cargos em provimento em comissão de Procurador Geral e de Assessor Jurídico, viola os artigos 98, §§ 1º e 2º, 100, par. único, 111, 115, II e V, da Constituição Estadual.

 

III – CONCLUSÃO

Por todo o exposto, evidencia-se a necessidade de reconhecimento da inconstitucionalidade dos cargos de provimento aqui apontados.

 

IV- DO PEDIDO LIMINAR

À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura do preceito legal do Município de Alambari  apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até o final julgamento desta ação.

 

O perigo da demora decorre, especialmente, da ideia de que, sem a imediata suspensão da vigência e da eficácia da disposição normativa questionada, subsistirá a sua aplicação. Serão realizadas despesas (e impostas obrigações à municipalidade) que, dificilmente, poderão ser revertidas aos cofres públicos na hipótese provável de procedência da ação direta.

 

Basta lembrar que os pagamentos realizados aos servidores públicos nomeados para ocuparem tais cargos, certamente, não serão revertidos ao erário, pela argumentação usual, em casos desta espécie, no sentido do caráter alimentar da prestação e da efetiva prestação dos serviços.

 

A ideia do fato consumado, com repercussão concreta, guarda relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação direta de inconstitucionalidade.

 

Note-se que, com a procedência da ação, pelas razões declinadas, não será possível restabelecer o status quo ante.

 

Assim, a imediata suspensão da eficácia das normas impugnadas evitará a ocorrência de maiores prejuízos, além dos que já se verificaram.

 

De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida.

 

Com efeito, no contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (cf. ADIN-MC 125, j. 15.2.90, DJU de 4.5.90, p. 3.693, rel. Min. Celso de Mello; ADIN-MC 568, RTJ 138/64; ADIN-MC 493, RTJ 142/52; ADIN-MC 540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).

 

À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para a suspensão da eficácia, até o final e definitivo julgamento desta ação, reconhecendo-se a inconstitucionalidade dos cargos de provimento impugnados, constantes do Anexo, I da Lei Complementar n. 442, de 14 de novembro de 2008; no Anexo I do inciso I do art. 1º, da Lei Complementar n. 005 de 04 de maio de 2009; no Anexo III do art. 2º da Lei Complementar n. 005 de 04 de maio de 2009; no Anexo 5 da Lei Complementar n. 004 de 04 de maio de 2009 e na Lei Complementar n. 10 de 18 de abril de 2011, todas do Município de Alambari.

V- DO PEDIDO

Assim, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade em face dos cargos de provimento impugnados, constantes do Anexo, I da Lei Complementar n. 442, de 14 de novembro de 2008; no Anexo I do inciso I do art. 1º, da Lei Complementar n. 005 de 04 de maio de 2009; no Anexo III do art. 2º da Lei Complementar n. 005 de 04 de maio de 2009; no Anexo 5 da Lei Complementar n. 004 de 04 de maio de 2009 e na Lei Complementar n. 10 de 18 de abril de 2011, todas do Município de Alambari.

 

Requer-se, ainda, sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Alambari, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos normativos impugnados.

 

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

 

São Paulo, 06 de março de 2014.

 

Álvaro Augusto Fonseca de Arruda

Procurador-Geral de Justiça

em exercício

 

 

 

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Protocolado nº 139.111/12

 

 

 

1.     Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face dos cargos de provimento impugnados, constantes do Anexo, I da Lei Complementar n. 442, de 14 de novembro de 2008; no Anexo I do inciso I do art. 1º, da Lei Complementar n. 005 de 04 de maio de 2009; no Anexo III do art. 2º da Lei Complementar n. 005 de 04 de maio de 2009; no Anexo 5 da Lei Complementar n. 004 de 04 de maio de 2009 e na Lei Complementar n. 10 de 18 de abril de 2011, todas do Município de Alambari, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

 

2.     Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

                  

                   São Paulo, 06 de março de 2014.

 

Álvaro Augusto Fonseca de Arruda

Procurador-Geral de Justiça

em exercício

vlcb