EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

 

Protocolado nº 177.875/13

 

 

Ementa:

1)      Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Complementar nº 318, de 19 de junho de 2013, do Município de Taubaté, que “Concede abono pecuniário aos servidores técnicos-administrativos e docentes da Universidade de Taubaté e da Escola de Aplicação Dr. Alfredo José Balbi”.

2)      “Abono Pecuniário”. Inconstitucionalidade. Benefício que não atende ao interesse público e às exigências do serviço. Ofensa ao princípio da razoabilidade.  (arts. 111 e 128 da Constituição Paulista).

 

O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, inciso VI, da Lei Complementar Estadual nº 734 de 26 de novembro de 1993, e em conformidade com o disposto no art. 125, § 2º, e no art. 129, inciso IV, da Constituição da República, e ainda nos arts. 74, inciso VI, e art. 90, inciso III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado (PGJ nº 177.875/13), vem perante esse Egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face da Lei Complementar nº 318, de 19 de junho de 2013, do Município de Taubaté, pelos fundamentos expostos a seguir.

1)    DISPOSITIVOS IMPUGNADOS

A propositura da presente ação direta decorre de representação endereçada a esta Procuradoria-Geral de Justiça pelo DD. Promotor de Justiça de Taubaté, Dr. José Carlos de Oliveira Sampaio.

A Lei Complementar nº 318, de 19 de junho de 2013, do Município de Taubaté, assim dispõe:

Art. 1º Fica concedido, a partir de 1º de maio do corrente ano, a todos os servidores técnicos, administrativos e docentes, estatutários e celetistas da Universidade de Taubaté e da Escola de Aplicação Dr. Alfredo José Balbi, abono pecuniário mensal de R$ 100,00 (cem reais).

Art. 2º O abono de que trata o art. 1º estende-se aos servidores inativos e aos pensionistas, obedecidas as restrições dos dispositivos constitucionais, que percebem o provento e a pensão pelo IPMT (Instituto de Previdência do Município de Taubaté) e pela Funcabes (Fundação Caixa Beneficente dos Servidores da Universidade de Taubaté).

Art. 3º O abono referido no art. 1º é extensivo aos ocupantes de cargos de provimento em comissão e a termo, e tem como características:

I – não integrará o padrão de vencimento dos servidores em atividade e nem os valores que servirão de base para o cálculo dos proventos de aposentadoria e das pensões;

II – sobre ele não incidirão as vantagens pessoais e do cargo, incorporados ou não;

III – será pago, também, juntamente com o 13º salário e correspondentes proventos e pensões.

Art. 4º As despesas decorrentes desta Lei Complementar correrão por conta das dotações orçamentárias próprias da Universidade de Taubaté, suplementadas, se necessário, ficando o Reitor autorizado a adequar o orçamento vigente às condições aqui estabelecidas.

Art. 5º Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação. 

 

2)    O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

A lei impugnada é incompatível com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:

 

“Artigo 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

Artigo 128 - As vantagens de qualquer natureza só poderão ser instituídas por lei e quando atendam efetivamente ao interesse público e às exigências do serviço.”

A concessão de “abono pecuniário”, no valor de R$ 100,00 (cem reais), aos servidores técnico-administrativos e docentes da Universidade de Taubaté e da Escola de Aplicação Dr. Alfredo José Balbi, não foi acompanhada de suficiente motivação, a indicar o interesse público defendido, que pudesse autorizar o pagamento de tal benefício.

A instituição de vantagens pecuniárias para servidores públicos só se mostra legítima se realizada em conformidade com o interesse público e com as exigências do serviço, nos termos do art. 128 da Constituição do Estado, aplicável aos municípios por força do art. 144 da mesma Carta, sendo certo que, da análise do processo legislativo que embasou a edição do referido ato normativo (fls.16/33), não se extrai qual o interesse público perseguido com a concessão do benefício.

Vale lembrar, nesse passo, o ensinamento de Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo Brasileiro, 34. Ed., São Paulo, Malheiros, 2008, p. 495), que criticando a excessiva liberalidade da Administração Pública na concessão de vantagens pecuniárias “anômalas”, sem qualquer razão de interesse público, pontuava que:

“(...)

Além dessas vantagens, que encontram justificativa em fatos ou situações de interesse administrativo, por relacionadas direta ou indiretamente com a prestação do serviço ou com a situação do servidor, as Administrações têm concedido vantagens anômalas, que refogem completamente dos princípios jurídicos e da orientação técnica que devem nortear a retribuição do servidor. Essas vantagens anômalas não se enquadram quer como adicionais, quer como gratificações, pois não têm natureza administrativa de nenhum destes acréscimos estipendiários, apresentando-se como liberalidades ilegítimas que o legislador faz à custa do erário, com o só propósito de cortejar o servidor público.

(...)”

A lei impugnada viola o princípio da razoabilidade, que deve nortear a Administração Pública e a atividade legislativa, e que tem assento no art. 111 da Constituição do Estado, aplicável aos Municípios por força do art. 144 da mesma Carta.

Por força desse princípio, é necessário que a norma passe pelo denominado “teste” de razoabilidade, ou seja, que ela seja: (a) necessária (a) partir da perspectiva dos anseios da Administração Pública); (b) adequada (considerando os fins públicos que com a norma se pretende alcançar); e (c) proporcional em sentido estrito (que as restrições, imposições ou ônus dela decorrentes não sejam excessivos ou incompatíveis com os resultados a alcançar).

Da análise do processo legislativo que instrui esta ação, verifica-se que a autorização do pagamento do “abono pecuniário”, na forma em que concebido, não passa por nenhum dos critérios do teste de razoabilidade: (a) não atende a nenhuma necessidade da Administração Pública, vindo em benefício exclusivamente da conveniência dos servidores públicos beneficiados por essa vantagem pecuniária; (b) é, por consequência, inadequado na perspectiva do interesse público; (c) é desproporcional em sentido estrito, pois cria ônus financeiros que naturalmente se mostram excessivos e inadmissíveis, tendo em vista que não acarretarão benefício algum para a Administração Pública.

Confira-se: Diogo de Figueiredo Moreira Neto, Curso de direito administrativo, 14. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2006, p. 101; Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito administrativo, 19. ed., São Paulo, Atlas, 2006, p. 95; Gilmar Ferreira Mendes, “A proporcionalidade na jurisprudência do STF”, publicado em Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade, São Paulo, Instituto Brasileiro de Direito Constitucional e Celso Bastos Editor, 1998, p.83.

Portanto, a Lei Complementar nº 318, de 19 de junho de 2013, viola os arts. 111 e 128 da Constituição Paulista.

3)    DA LIMINAR

Estão presentes, na hipótese examinada, os pressupostos do fumus bonis iuris e do periculum in mora, a justificar a suspensão liminar dos preceitos normativos impugnados.

A razoável fundamentação jurídica decorre dos motivos expostos, que indicam, de forma clara, que os dispositivos impugnados nesta ação padecem de inconstitucionalidade.

O perigo da demora decorre especialmente da ideia de que sem a imediata suspensão da vigência e eficácia dos atos normativos questionados, subsistirá a sua aplicação, com realização de despesas (e imposição de obrigações à Municipalidade), que dificilmente poderão ser revertidas aos cofres públicos, na hipótese provável de procedência da ação direta.

Basta lembrar que os pagamentos realizados aos servidores públicos pelos dias não trabalhados em razão de aniversário, certamente não serão revertidos ao erário, pela argumentação usual, em casos desta espécie, no sentido do caráter alimentar da prestação.

A ideia do fato consumado, com repercussão concreta, guarda relevância para a apreciação da necessidade da concessão da liminar na ação direta de inconstitucionalidade. Note-se que, com a procedência da ação, pelas razões declinadas, não será possível restabelecer o status quo ante.

Assim, a imediata suspensão da eficácia das normas impugnadas evitará a ocorrência de maiores prejuízos, além dos que já se verificaram.

De resto, ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida. Com efeito, no contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (cf. ADIN-MC 125, j. 15.2.90, DJU de 4.5.90, p. 3.693, rel. Min. Celso de Mello; ADIN-MC 568, RTJ 138/64; ADIN-MC 493, RTJ 142/52; ADIN-MC 540, DJU de 25.9.92, p. 16.182).

Diante do exposto, requer-se a concessão da liminar, para fins de suspensão imediata da eficácia dos dispositivos indicados nesta inicial.

4)    CONCLUSÃO E PEDIDO

Diante de todo o exposto, aguarda-se o recebimento e processamento da presente ação declaratória, para que ao final seja ela julgada procedente, reconhecendo-se a inconstitucionalidade da Lei Complementar nº 318, de 19 de junho de 2013, do Município de Taubaté.

Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Senhor Prefeito Municipal de Taubaté, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para manifestar-se sobre o ato normativo impugnado.

Posteriormente, aguarda-se vista para fins de manifestação final.

Termos em que,

Aguarda-se deferimento.

São Paulo, 01 de abril de 2014.

 

         Álvaro Augusto Fonseca de Arruda

         Procurador-Geral de Justiça

      em exercício

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Protocolado nº 177.875/13

 

 

 

           1. Distribua-se a inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face da Lei Complementar nº 318, de 19 de junho de 2013, do Município de Taubaté.

          2.  Oficie-se ao interessado, com o envio de cópias, comunicando-se a propositura da ação.        

 

São Paulo, 01 de abril de 2014.

 

 

         Álvaro Augusto Fonseca de Arruda

         Procurador-Geral de Justiça

       em exercício

 

 

 

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