EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR PRESIDENTE DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

 

Protocolado n. 75.731/2013

 

Assunto: Inconstitucionalidade do art. 3º e anexo I, da Lei n. 1920, de 15 de agosto de 1991, da Lei 3.097, de 18 de março de 2013, do § 3º do art. 30 da Lei 2.808, de 31 de dezembro de 2.008, alterado pelo art. 1º, da Lei n. 2825, de 20 de maio de 2009, e dos artigos 80, 81, caput, 100, inciso I, e seu parágrafo único, 102 e seus parágrafos, da Lei Complementar n. 37, de 06 de junho de 2012 e por arrastamento, a Lei n. 2.434, de 21 de dezembro de 2001, Lei n. 2.661, de 22 de agosto de 2006 e Lei n. 2.994, de 04 de agosto de 2011, do Município de Santa Rita do Passa Quatro.

 

Ementa: Constitucional. Administrativo. Ação direta de inconstitucionalidade. gratificação. exercício, a qualquer título, de função com remuneração superior. Incorporação de 1/5 por ano, até 5/5. Delegação ao chefe do executivo para fixação do percentual.  Prêmio aniversário. violação aos princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, razoabilidade e da Separação dos poderes. 1 – A concessão de gratificação a servidores públicos, que exerçam funções comissionadas, por meio de Delegação ao Chefe do Poder Executivo ou do Legislativo, assim como sua incorporação, na fração de 1/5 ao ano, viola os princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, razoabilidade, interesse público e separação dos poderes. 2 - A previsão de incorporação ao servidor que, a qualquer título, exerça funções com remuneração superior, viola os princípios da moralidade, impessoalidade e acessibilidade aos cargos públicos por meio de concurso público. 3 – Vantagem pecuniária denominada “Prêmio Aniversário” que não atende ao interesse público e ao princípio da razoabilidade - Arts. 5º, § 1º, 24, § 2º, 1, 111, 115, XI, 128, 133 e 144, da Constituição Estadual.

 

                  O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993, em conformidade com o disposto nos arts. 125, § 2º, e 129, IV, da Constituição Federal, e nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do art. 3º, e anexo I da Lei n. 1920, de 15 de agosto de 1991, da Lei 3.097, de 18 de março de 2013, do § 3º do art. 30 da Lei 2.808, de 31 de dezembro de 2.008, dos artigos 80, 81, caput, 100, caput, inciso I, e seu parágrafo único, 102, caput, e seus parágrafos, da Lei Complementar n. 37, e, por arrastamento, da Lei n. 2.434, de 21 de dezembro de 2001, Lei n. 2.661, de 22 de agosto de 2006 e Lei n. 2.994, de 04 de agosto de 2011, do Município de Santa Rita do Passa Quatro, pelos fundamentos a seguir expostos.

I. OS ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS

A Lei n. 1.920, de 15 de agosto de 1991 (fls. 80/82), assim dispõe:

 “Art. 3º. Fica criada a gratificação por exercício de empregos em comissão para os cargos constantes do anexo I da presente Lei, nos limites ali estabelecidos que será reajustada na mesma proporção dos vencimentos, sendo aplicada sobre os salários iniciais dos padrões, ou das respectivas referências iniciais:

Anexo I - Cargos em Comissão – Gratificação

CARGOS

VAGAS

REFERÊNCIAS

PORCENTAGEM

ADMINISTRADOR DE DISTRITO

01

11/18

            ATÉ 10%

COORDENADOR PEDAGÓGICO

01

17/24

              ATÉ 40%

SECRETÁRIA DE EXPEDIENTE

01

20/27

ATÉ 10%

COORDENADOR DE ÁREA

07

20/27

ATÉ 10%

CHEFE DE SEÇÃO

18

26/33

ATÉ 20%

DIRETOR DE DIVISÃO

06

29/36

ATÉ 50%

ASSESSOR DE GABINETE

01

32/39

ATÉ 50%

CHEFE DE GABINETE

01

43/50

ATÉ 50%

DIRETOR DE DEPARTAMENTO

07

43/50

 

ATÉ 50%

SECRETÁRIA ADMINISTRATIVA

02

14/21

ATÉ 10%

ASSESSOR TÉCNICO

02

43/50

ATÉ 50%

 

A Lei nº 2.434, de 21 de dezembro de 2001 (fls. 86/88), estabelecia gratificação similar aos servidores do legislativo:

“Art. 1º - Fica estabelecida a gratificação pelo exercício de função de direção ou chefia para os cargos constantes do Anexo I da presente Lei, nos limites ali estabelecidos que será reajustada na mesma proporção dos vencimentos, sendo aplicada sobre os salários iniciais das respectivas referências.

Parágrafo único – A gratificação mencionada no “caput” deste artigo incorporará a remuneração do funcionário e integra o provento da aposentadoria, na proporção de 1/5 (um quinto) por ano de exercício na função de direção e chefia até o limite de 5/5 (cinco quintos).”

CARGOS

VAGAS

REFERÊNCIAS

PORCENTAGEM

DIRETORA GERAL

01

45/49

10%

ASSESSOR JURÍDICO

01

45/45

10%

DIRETORA DO SER. LEGISLATIVO

01

31/36

10%

CHEFE DE SEÇÃO

01

28/31

10%

CHEFE DO SER. LEGISLATIVO

01

28/31

10%

                                                           

A Lei n. 2.661, de 22 de agosto de 2006 (fls. 67/68), alterou o art. 1º da Lei 2.434/2001, nos seguintes termos:

“Artigo 1º - Fica estabelecida a gratificação pelo exercício de função de direção ou chefia para os servidores da Câmara Municipal, para os cargos constantes do Anexo I da presente Lei, nos limites ali estabelecidos que será reajustado na mesma proporção dos vencimentos, sendo aplicada sobre os salários iniciais das respectivas referências.

Parágrafo único – A gratificação mencionada no “caput” desse artigo incorporará a remuneração do servidor e integra o provento da aposentadoria, na proporção de 1/5 (um quinto) por ano de exercício na função de direção e chefia até o limite de 5/5 (cinco quintos).”

Anexo I

CARGOS

VAGAS

REFERÊNCIAS

PORCENTAGEM

DIRETORA GERAL

01

45

20%

PROCURADOR JURÍDICO

01

45

20%

DIRETORA DO DEP. LEGISLATIVO

01

45

20%

ASSISTENTE DE DIRETOR DE DEPARTAMENTO

01

40

20%

CHEFE DO SER. LEGISLATIVO

01

28

20%

 

A Lei nº 2.994 de 04 de agosto de 2011 (fls. 65/66), alterou o anexo I da Lei 2661/2006, nos seguintes termos:

Anexo I

CARGOS

VAGAS

REFERÊNCIAS

PORCENTAGEM

DIRETORA GERAL

01

45

ATÉ 50%

PROCURADOR JURÍDICO

01

45

ATÉ 50%

ASSESSORA DE GABINETE

01

45

ATÉ 50%

SUB-DIRETORA DE DEP.

01

40

ATÉ 50%

CHEFE DO SER. LEGISLATIVO

01

28

ATÉ 50%

ASSESSOR DE IMPRENSA

01

36

ATÉ 50%

ASSESSOR LEGISLATIVO

01

34

ATÉ 50%

 

Por fim, a Lei n. 3.097, de 18 de março de 2013 (fls. 12/14), revogou a Lei n. 2.294, de 04 de agosto de 2011, bem como alterou a Lei n. 2.661, de 22 de agosto de 2006, nos seguintes termos:

“Artigo 1º - Fica estabelecida a gratificação para os servidores da Câmara Municipal, para os cargos constantes do Anexo I da presente Lei, nos limites ali estabelecidos que será reajustado na mesma proporção dos vencimentos, sendo aplicada sobre os salários iniciais das respectivas referências.

Parágrafo único – A gratificação mencionada no “caput” desse artigo incorporará a remuneração do servidor e integra o provento da aposentadoria, na proporção de 1/5 (um quinto) por ano de exercício na função de direção e chefia até o limite de 5/5 (cinco quintos).”

ANEXO I

CARGOS

VAGAS

REFERÊNCIAS

PORCENTAGEM

DIRETOR GERAL

01

45

ATÉ 50%

PROCURADOR JURÍDICO

01

45

ATÉ 50%

ASSESSOR DE GABINETE

01

45

ATÉ 50%

SUB-DIRETOR DE DEP.

01

40

ATÉ 50%

CHEFE DO SER. LEGISLATIVO

01

35

ATÉ 50%

ASSESSOR DE IMPRENSA

01

31

ATÉ 50%

ASSESSOR LEGISLATIVO

01

45

ATÉ 50%

CHEFE DO DEPARTAMENTO LEGISLATIVO

01

35

ATÉ 50%

CHEFE DO DEPARTAMENTO ADMINISTRATIVO

01

35

ATÉ 50%

 

O art. 30, § 3º, da Lei 2.808, de 31 de dezembro de 2008, (fls. 577/580), prevê:

“Art. 30..

(...)

§ 3º - os cargos de chefe de setor e sub-chefe de seção terão gratificação de até 50% e 10% respectivamente.”

 A Lei Complementar nº 37, de 06 de junho de 2012 (fls. 581/585), dispõe:

“Art. 80 – Poderá ser concedida, pelo Chefe de Poder, ao servidor efetivo, gratificação de representação pelo exercício de cargos ou função gratificada de direção e chefia, cujos percentuais serão de 10% a 50% da referência do cargo a ser exercido, do quadro geral dos servidores do Município de Santa Rita do Passa Quatro, a ser estabelecido a critério da autoridade concedente, no ato de nomeação ou designação para o cargo ou função gratificada.”

Art. 81 – A gratificação de que trata esta subseção tornar-se-á permanente na remuneração do servidor, desde que percebida ou venha a sê-lo por período mínimo de 05 (cinco) anos, ininterruptos ou não.

(...)

Art. 100 – O servidor, com mais de cinco anos de efetivo exercício, que tenha exercido ou venha a exercer, a qualquer título, cargo ou função que lhe proporcione remuneração superior à do cargo de que seja titular, ou função para a qual foi admitido, incorporará um quinto dessa diferença por ano, até o limite de cinco quintos.

I – quando mais de um cargo houver sido exercido, será incorporada a vantagem de maior valor, desde que exercida por mais tempo.

Parágrafo único – Após a incorporação de 5/5 (cinco quintos), o servidor fará jus à incorporação da vantagem do cargo ou função de maior valor, que vier a exercer, desde que o respectivo exercício ocorra por período mínimo de 12 (doze) meses.”

(...)

Art. 102 – O servidor efetivo fará jus, no mês de seu aniversário, ao valor de sua remuneração no cargo efetivo, desde que em efetivo exercício no ano.

§ 1º - O prêmio corresponde a 1/12 (um doze avos) da remuneração no cargo efetivo por mês de efetivo exercício no respectivo ano e será pago juntamente com a remuneração do mês do aniversário.

§ 2º - A fração igual ou superior a 15 (quinze) dias será considerada como mês integral.

§ 3º - O efetivo exercício será apurado na forma do disposto no art. 39, desta Lei.

§ 4º - A remuneração no cargo efetivo é a definida na lei previdenciária municipal e constitui a base de cálculo da contribuição previdenciária ao regime próprio de previdência social do servidor municipal.

§ 5º - Não fará jus ao prêmio o servidor nas seguintes situações:

I – que tenha afastamento por licença médica ou auxílio doença, superiores a 30 (trinta) dias, salvo em decorrência de acidente de trabalho e internação hospitalar, devidamente comprovados;

II – reclusão;

II – afastamento sem vencimentos para tratar de interesses particulares, por qualquer período;

III – tenha cometido faltas justificadas ou injustificadas, que, somadas, totalizem mais de 15 (quinze) dias;

IV – tenha sofrido penalidade de suspensão, ainda que convertida em multa.

§ 6º - Não fará jus ao prêmio, sob nenhuma hipótese, os servidores exonerados, demitidos ou que tiverem sofrido penalidade de repreensão ou suspensão.

§ 7º - Sob nenhuma hipótese será pago o prêmio aos servidores titulares exclusivamente de cargo em comissão ou aos inativos e pensionistas.

§ 8º - O prêmio de aniversário não se incorpora à remuneração do servidor para nenhum efeito e tampouco constitui base de cálculo de vantagem pecuniária.”

Os dispositivos impugnados exibem incompatibilidade vertical com os arts. 5º, § 1º, 24, § 2º, 1, 111, 115, XI, 128 e 133 da Constituição do Estado de São Paulo, aplicáveis aos Municípios por obra de seu art. 144, cuja redação, embasada no art. 29 da Constituição Federal, assim expressa:

“Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.

 

II. O PARÂMETRO DE INCONSTITUCIONALIDADE

Assim dispõe a Constituição Estadual:

“Artigo 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

§ 1º - É vedado a qualquer dos Poderes delegar atribuições.

§ 2º - O cidadão, investido na função de um dos Poderes, não poderá exercer a de outro, salvo as exceções previstas nesta Constituição.

(...)

Artigo 24 - A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Assembléia Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

(...)

§ 2º - Compete, exclusivamente, ao Governador do Estado a iniciativa das leis que disponham sobre:

1 - criação e extinção de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica, bem como a fixação da respectiva remuneração;

(...)

Artigo 111 – A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.

(...)

Artigo 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

(...)

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissões, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;

 (...)

Artigo 128. As vantagens de qualquer natureza só poderão ser instituídas por lei e quando atendam efetivamente ao interesse público e às exigências do serviço”.

“Artigo 133 - O servidor, com mais de cinco anos de efetivo exercício, que tenha exercido ou venha a exercer cargo ou função que lhe proporcione remuneração superior à do cargo de que seja titular, ou função para a qual foi admitido, incorporará um décimo dessa diferença, por ano, até o limite de dez”.

 

A) DA FIXAÇÃO DAS GRATIFICAÇÕES

O art. 3º e anexo I, da Lei n. 1920, de 15 de agosto de 1991, a Lei n. 3.097, de 18 de março de 2013, o art. 30 da Lei 2.808, de 31 de dezembro de 2008, e o artigo 80 da Lei Complementar n. 37, de 06 de junho de 2012, do Município de Santa Rita do Passa Quatro, inseriram na ordem jurídica preceitos absolutamente desconformes com a Constituição Estadual que, reproduzindo preceitos da Constituição Federal, enuncia o princípio da reserva legal (legalidade absoluta) para instituição ou majoração de vencimentos e vantagens dos servidores públicos inclusivo do estabelecimento de seus respectivos valores.

Os vencimentos dos servidores públicos devem ser fixados em lei específica, assim como as vantagens pecuniárias, até porque accessorium sequitur principale.

De qualquer modo, nessa compreensão, incluem-se as vantagens pecuniárias e seus respectivos valores porque a dimensão da reserva de lei - da tradição jurídico-constitucional brasileira (art. 15, n. 17, Constituição de 1824; art. 34, n. 24, art. 72, n. 32, Constituição de 1891; art. 65, IV, Constituição de 1946; arts. 43, V, e 57, II, Constituição de 1967; art. 37, X, Constituição de 1988) - abrange quaisquer espécies remuneratórias e, aliás, quaisquer estipêndios pagos pelo poder público sob qualquer rubrica, alcançando acréscimos e vantagens pecuniários, indenizações, auxílios, abonos que só podem ser concedidos por ato normativo da exclusiva alçada do Poder Legislativo, pois, a ele compete a integralidade da disciplina da matéria.

Ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio: se à lei é reservada, com exclusividade, a função de fixação da remuneração do servidor público, inclusive de seu valor, pela mesma razão, pertence-lhe fixar adicional ou da gratificação e seu valor (ainda que fracionário ou percentual e até com diferenciações em razão do cargo situar-se em maior ou menor grau de hierarquia, de complexidade etc.), sob pena, inclusive, de inviabilidade do planejamento e da execução orçamentária (art. 169, Constituição Estadual).

Houve, portanto, ofensa aos princípios da separação dos poderes e da legalidade descritos nos arts. 5º, e § 1º, 24, § 2º, 1, 111, 115, XI, e 128, da Constituição do Estado, pois os dispositivos impugnados autorizam, por ato exclusivo do Chefe do Executivo ou do Legislativo, a fixação do percentual da gratificação, até o limite máximo previsto na lei.

Além disso, houve transgressão aos princípios da legalidade, da moralidade, da impessoalidade, da razoabilidade e do interesse público, cunhados nos arts. 111 e 128 da Constituição Paulista.

O esquema normativo impugnado fornece aos Chefes dos Poderes Executivo e Legislativo ampla e excessiva discricionariedade, permitindo-lhe aquinhoar, por escolha imotivada ou motivada por critérios alheios ao interesse público primário, servidores credores das gratificações com valores variáveis, pessoais e individualizados que não se amoldam às exigências da moralidade e impessoalidade, da razoabilidade e do interesse público, na medida em que é permeável a critérios desprovidos de objetividade, neutralidade, imparcialidade, igualdade e impessoalidade.

Na compreensão do princípio da impessoalidade está, entre outros, a matriz da igualdade, repudiando tratamentos discriminatórios desprovidos de relação lógica e proporcional entre o fator de discriminação e a sua finalidade.

Desta forma, os atos normativos impugnados possibilitam aos Chefes dos Poderes Executivos e Legislativo atribuírem valores (referentes à gratificação) sem qualquer critério objetivo ou por critérios sigilosos ou subjetivos, expondo a Administração Pública a tratamentos desigualitários, imorais, desarraz oados, e, sobretudo, distantes do interesse público primário.

Em torno do tema, o Supremo Tribunal Federal prestigia a prevalência da reserva legal na remuneração dos servidores públicos e sua indelegabilidade:

“O tema concernente à disciplina jurídica da remuneração funcional submete-se ao postulado constitucional da reserva absoluta de lei, vedando-se, em conseqüência, a intervenção de outros atos estatais revestidos de menor positividade jurídica, emanados de fontes normativas que se revelem estranhas, quanto à sua origem institucional, ao âmbito de atuação do Poder Legislativo, notadamente quando se tratar de imposições restritivas ou de fixação de limitações quantitativas ao estipêndio devido aos agentes públicos em geral. - O princípio constitucional da reserva de lei formal traduz limitação ao exercício das atividades administrativas e jurisdicionais do Estado. A reserva de lei - analisada sob tal perspectiva - constitui postulado revestido de função excludente, de caráter negativo, pois veda, nas matérias a ela sujeitas, quaisquer intervenções normativas, a título primário, de órgãos estatais não-legislativos. Essa cláusula constitucional, por sua vez, projeta-se em uma dimensão positiva, eis que a sua incidência reforça o princípio, que, fundado na autoridade da Constituição, impõe, à administração e à jurisdição, a necessária submissão aos comandos estatais emanados, exclusivamente, do legislador. Não cabe, ao Poder Executivo, em tema regido pelo postulado da reserva de lei, atuar na anômala (e inconstitucional) condição de legislador, para, em assim agindo, proceder à imposição de seus próprios critérios, afastando, desse modo, os fatores que, no âmbito de nosso sistema constitucional, só podem ser legitimamente definidos pelo Parlamento. É que, se tal fosse possível, o Poder Executivo passaria a desempenhar atribuição que lhe é institucionalmente estranha (a de legislador), usurpando, desse modo, no contexto de um sistema de poderes essencialmente limitados, competência que não lhe pertence, com evidente transgressão ao princípio constitucional da separação de poderes” (STF, ADI-MC 2.075-RJ, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, 07-02-2001, v.u., DJ 27-06-2003, p. 28).

“Em tema de remuneração dos servidores públicos, estabelece a Constituição o princípio da reserva de lei. É dizer, em tema de remuneração dos servidores públicos, nada será feito senão mediante lei, lei específica. CF, art. 37, X, art. 51, IV, art. 52, XIII. Inconstitucionalidade formal do Ato Conjunto n. 01, de 5-11-2004, das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados” (STF, ADI 3.369-MC, Rel. Min. Carlos Velloso, 16-12-2004, DJ 01-02-2005).

“Ação direta de inconstitucionalidade. Resoluções n.ºs 26, de 22/12/94; 15, de 23/10/97, e 16, de 30/10/97, todas do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, havendo a primeira criado a gratificação de representação, correspondente a 40% do valor global atribuído a diversos cargos, estendendo-a, inclusive, aos inativos que se aposentaram em cargos de igual denominação ou equivalente. 2. Alegação de ofensa a funções privativas dos Poderes Legislativo e Executivo. 3. Medida cautelar deferida e suspensa, com eficácia ex nunc, a eficácia das Resoluções impugnadas. 4. Procedência da alegação de ofensa a funções privativas dos Poderes Legislativo e Executivo, eis que há necessidade de lei em sentido formal para a criação de vantagens pecuniárias a servidores do Poder Judiciário. 5. A Lei Magna não assegura aos Tribunais fixar, sem lei, vencimentos ou vantagens a seus membros ou servidores. 6. Jurisprudência do STF no sentido de que ‘não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos, sob o fundamento da isonomia’ (Súmula 339 e ADINs n.º 1776, 1777 e 1782). 7. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente”(STF, ADI 1.732-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Néri da Silveira, 17-04-2002, v.u., DJ 07-06-2002, p. 81).

Perfilhando esta orientação, merece destaque recente julgamento deste egrégio Tribunal de Justiça cuja ementa é a seguinte:

“Ação Direta de Inconstitucionalidade – Ato normativo municipal que confere ao Chefe do Poder Executivo a possibilidade de, mediante portaria e a seu alvedrio, conceder gratificações de 20 e até 100% sobre os vencimentos dos servidores – Violação da cláusula da reserva legal, visto que somente por lei, em sentido formal, podem ser fixadas gratificações e vantagens – Precedente do Colendo Supremo Tribunal Federal – Preceito normativo que, ademais, vulnera a moralidade, o princípio da impessoalidade e da razoabilidade – Ofensa aos artigos 5º, 24, § 2º, nº 1, 111, 115, XI, todos da Constituição Estadual, aplicáveis aos Municípios ex vi o artigo 144 da mesma Carta – Inconstitucionalidade do § 1º do artigo 5º da Lei nº 3.122 do Município de Cruzeiro reconhecida – Inconstitucionalidade também do § 2º do mesmo preceito por arrastamento – Ação procedente” (TJSP, ADI 169.057-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. A. C. Mathias Coltro, 28-01-2009, v.u.).

Destarte, impõe a declaração de inconstitucionalidade do art. 3º e anexo I, da Lei n. 1920, de 15 de agosto de 1991, da Lei n. 3.097, de 18 de março de 2013, do § 3º do art. 30 da Lei 2808, de 31 de dezembro de 2008, e do artigo 80 da Lei Complementar n. 37, do Município de Santa Rita do Passa Quatro.

 

B) DA INCORPORAÇÃO DAS VANTAGENS PECUNIÁRIAS

Como acima exposto, a Lei n. 3.097, de 18 de março de 2013 e os artigos 81, caput, e 100, caput, inciso I e seu parágrafo único, da Lei Complementar nº 37, 06 de junho de 2012, prevêem a incorporação, aos vencimentos, das gratificações acima mencionadas, no prazo de cinco anos, na fração de 1/5 a cada ano.

O inciso I do art. 100 da Lei Complementar 37/2012 autoriza que, em caso de exercício de duas funções, será incorporada aquela vantagem de maior valor, desde que exercida por mais tempo. Trata-se, na verdade, de arredondamento a maior da gratificação com vantagem menor, ou seja, autoriza-se a incorporação de vantagem a maior, sem o seu efetivo exercício por cinco anos.

Também prevê o parágrafo único do artigo 100 que, após a incorporação de 5/5, eventual vantagem de maior valor que o servidor vier a receber, será incorporada, bastando o decurso de novo período de 12 meses.

Trata-se de preceitos legais que violam a expressa redação do artigo 133 da Constituição Estadual:

“Artigo 133 - O servidor, com mais de cinco anos de efetivo exercício, que tenha exercido ou venha a exercer cargo ou função que lhe proporcione remuneração superior à do cargo de que seja titular, ou função para a qual foi admitido, incorporará um décimo dessa diferença, por ano, até o limite de dez”.

A possibilidade de incorporação na fração de 1/5 ao ano, a possibilidade de arredondamento a maior, bem como de nova incorporação após 12 meses, ofendem a moralidade e razoabilidade, bem como destoa da diretriz estabelecida pelo art. 133 da CE.

A operação de construção normativa sobre incorporação de vantagens pecuniárias aos vencimentos dos servidores públicos demanda orientação pelo princípio da razoabilidade.

Trata-se, novamente, de nítido desvio de poder que contamina o ato legislativo. Visível, pois, a ofensa aos princípios de legalidade, razoabilidade, moralidade e interesse público que tisnam a norma legal impugnada, manifestando o completo divórcio com os arts. 5º, § 1º, 24, § 2º, 1, 111, 115, XI, 128 e 133 da Constituição Estadual.

Acerca do tema assim decidiu este Egrégio Órgão Especial na ADIN nº 0133699-39.2013.8.26.0000, julgada em 12/03/2014, Des. Rel. Guerrieri Rezende:

“Não se discute a idoneidade da instituição de vantagem para remuneração do exercício de cargo de provimento em comissão ou função de confiança por servidor público titular de cargo de provimento efetivo. Essa vantagem está de acordo com o interesse público e as exigências do serviço previstas no artigo 128 da Constituição Estadual, bem como aos princípios da Administração Pública relacionados no artigo 111 da referida Constituição. O que não está de acordo com a legislação estadual é a fórmula normativa adotada para a incorporação da gratificação de função. O artigo 133 da Constituição Estadual determina que “o servidor, com mais de cinco anos de efetivo exercício, que tenha ou venha a exercer cargo ou função que lhe proporcione remuneração superior à do cargo de que seja titular, ou função para a qual foi admitido, incorporará um décimo dessa diferença, por ano, até o limite de dez décimos”. No caso em apreço, a incorporação, por si só, não é inconstitucional. O que se verifica inconstitucional é a fórmula gradual e proporcional de “1/3 (um terço) por ano de exercício na função em comissão, até o limite de 3/3 (três terços)”, previsto pelo art. 108, caput, da Lei Complementar nº 01/10, bem como no caput do art. 2º da Lei nº 1.364/01.”

 

C) DA INCONSTITUCIONALIDADE DA EXPRESSÃO “A QUALQUER TÍTULO” DO ART. 100 DA LEI N. 37/2012

Além da possibilidade de incorporação da gratificação em 5 anos, a expressão “a qualquer título,” contida no “caput” do art. 100 da Lei Complementar nº 37/2012, ofende o inciso II do art. 115 da Constituição do Estado de São Paulo, e o art. 37, II, da Constituição Federal.

Dispositivo análogo da Constituição Paulista foi julgado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em venerando acórdão cuja ementa é adiante transcrita:

“CONCURSO PÚBLICO. RESSALVA. NOMEAÇÃO PARA CARGO EM COMISSÃO. DÉCIMOS DA DIFERENÇA ENTRE REMUNERAÇÃO DO CARGO DE QUE SEJA TITULAR O SERVIDOR E DO CARGO EM FUNÇÃO OCUPADO. INCONSTITUCIONALIDADE.1. A Constituição Federal prevê, em seu art. 37, II, in fine, a ressalva à possibilidade de ‘nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação’, como exceção à exigência de concurso público. Inconstitucional o permissivo constitucional estadual apenas na parte em que permite a incorporação ‘a qualquer título’ de décimos da diferença entre a remuneração do cargo de que seja titular e a do cargo ou função que venha a exercer. A generalização ofende o princípio democrático que rege o acesso aos cargos públicos. 2. Ao Supremo Tribunal Federal, como guardião maior da Constituição, incumbe declarar a inconstitucionalidade de lei, sempre que esta se verificar, ainda que ex officio, em razão do controle difuso, independente de pedido expresso da parte. 3. O Ministério Público atuou, no caso concreto. Não há vício de procedimento sustentado. 4. Embargos da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo e do Estado de São Paulo acolhidos em parte, para limitar a declaração de inconstitucionalidade dos art. 133 da Constituição e 19 do se ADCT, tão só, à expressão, ‘a qualquer título’, constante do primeiro dispositivo. Rejeitados, os do servidor, por não demonstrada a existência da alegada omissão e por seu manifesto propósito infringente” (STF, RE-ED 219.934-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 13-10-2004, v.u., DJ 26-11-2004, p. 06, RTJ 192/722, RT 835/151).

A transcrição da motivação do venerando acórdão é apropriada:

“A questão fundamental posta é, entretanto, a compatibilização do instituto da estabilidade financeira, em decorrência da nomeação para cargo em comissão com a norma contida no artigo 37, II, da Constituição Federal.

Penso, não haver dúvida quanto ao fato de o instituto da estabilidade financeira ser compatível com o sistema constitucional em vigor.

O Ministro relator também assim entendeu, quando afirmou em seu voto (fls. 201):

‘Quanto ao mais, o eminente Ministro Marco Aurélio bem considerou esse caso como sendo de estabilidade financeira, e realmente assim pode ser tachado. Não é, porém, aquela estabilidade financeira usual, que decorre da situação perfeitamente regular de um funcionário efetivo exercer um cargo em comissão e dar-se a estabilidade financeira em virtude dessa legítima razão. Mas, no caso, trata-se de um funcionário efetivo, desviado de função para o exercício de outro cargo efetivo mais elevado e, incorporados os vencimentos desse segundo cargo, concedeu-se a ele, não nominalmente, um outro cargo, mas aquilo que constitui um dos mais importantes atributos da conceituação do cargo público, que são os vencimentos a este atribuídos’ (grifei)

O que deve ser analisado, nestes embargos, porém, é se a situação ilegal do servidor, desviado de sua função, que recebia vencimentos de cargo, não comissionado, diferente daquele para o qual tinha prestado concurso, justifica ou não, a declaração de inconstitucionalidade do artigo 133 da Constituição do Estado de São Paulo e do artigo 19 do seu Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, em face do artigo 37, II, da Constituição Federal.

(...)

A propósito, assim dirimiu a questão, no seu voto vencedor, o Ministro Gallotti:

‘A situação concreta em exame não se traduz formalmente – é certo – na investidura em novo cargo, mas significa o reconhecimento de atributo essencial a ele inerente, qual seja o da sua remuneração.

Permitir a sua percepção, apenas por não se fazer acompanhar de mudança na denominação do cargo, seria, segundo penso, esvaziar o mandamento do art. 37, II, da Constituição, comprometendo-lhe, desenganadamente, a substância.’ (fl. 194)

(...)

Inconstitucional, seria o permissivo constitucional estadual apenas na parte que permite a incorporação ‘a qualquer título’ porque este ‘a qualquer título’ é que abrangeria situações como a dos autos, em que o servidor, que tenha prestado concurso para um cargo venha a receber proventos próprios ou até mesmo a denominação de cargo diferente, para o qual se exija outro concurso”.

Tal como naquela sede, nesta merece prestígio, sob o pálio do arts. 37, II, da Constituição Federal, e do art. 115, II, da Constituição do Estado de São Paulo, entendimento que reconheça a inconstitucionalidade da expressão “a qualquer título” contida no art. 100 da Lei Complementar n. 37/2012, do Município de Santa Rita do Passa Quatro, como decidido por este colendo Órgão Especial em precedente:

“Ação direta de inconstitucionalidade – Artigo 116 da Lei Orgânica do Município de Caçapava – Permite a incorporação de décimos de diferença entre a remuneração do cargo de que seja titular e a do cargo ou função que venha a exercer o servidor público – Interpretação conforme a Constituição com redução da expressão ‘a qualquer título’ para adequá-la ao contido no art. 115, II, da Constituição Estadual, que veda ocupação de cargo ou função sem prévio concurso público. Ação julgada procedente para este fim (TJSP, ADI 169.088-0/4-00, Órgão Especial, Rel. Des. Ribeiro dos Santos, v.u., 22-04-2009).

O preceito legal enfocado incentiva e estimula práticas administrativas, como o desvio de função, que não se compatibilizam a ética e a probidade nas relações do poder público, favorecendo apaniguados na obtenção de remuneração maior a que fazem jus como expressão do regime jurídico de seus cargos, desde que escolhidos por critérios subjetivos por seus superiores para o exercício de função diversa do cargo público nos quais investidos.

Com a previsão de incorporação de fração da diferença de vencimentos, abre-se a oportunidade à instauração de relações distanciadas do interesse público, criando situações absolutamente imorais de favorecimento abrigadas pela expressão “a qualquer título”. Em suma, proporciona o uso da necessidade do serviço público e dos recursos do erário para melhorias estipendiais oblíquas.

Por essa razão, denota-se a clara incompatibilidade da expressão “a qualquer título” com o art. 37, caput, da Constituição Federal, e o art. 111, caput, da Constituição do Estado de São Paulo, que inscrevem a moralidade como princípio constitucional da administração pública.

 

 

D. DO PRÊMIO DE ANIVERSÁRIO

A instituição de vantagens pecuniárias para servidores públicos só se mostra legítima se realizada em conformidade com o interesse público e com as exigências do serviço, nos termos do art. 128 da Constituição do Estado, aplicável aos municípios por força do art. 144 da mesma Carta.

O denominado “prêmio aniversário”, instituído no art. 102 da Lei Complementar n. 37/2012, não atende a nenhum interesse público, e tampouco às exigências do serviço, servindo apenas como mecanismo destinado a beneficiar interesses exclusivamente privados dos agentes públicos.

Vale lembrar, nesse passo, o ensinamento de Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo Brasileiro, 34. Ed., São Paulo, Malheiros, 2008, p. 495), que criticando a excessiva liberalidade da Administração Pública na concessão de vantagens pecuniárias “anômalas”, sem qualquer razão de interesse público, pontuava que:

“(...)

Além dessas vantagens, que encontram justificativa em fatos ou situações de interesse administrativo, por relacionadas direta ou indiretamente com a prestação do serviço ou com a situação do servidor, as Administrações têm concedido vantagens anômalas, que refogem completamente dos princípios jurídicos e da orientação técnica que devem nortear a retribuição do servidor. Essas vantagens anômalas não se enquadram quer como adicionais, quer como gratificações, pois não têm natureza administrativa de nenhum destes acréscimos estipendiários, apresentando-se como liberalidades ilegítimas que o legislador faz à custa do erário, com o só propósito de cortejar o servidor público.

(...)”

A lei impugnada viola o princípio da razoabilidade, que deve nortear a Administração Pública e a atividade legislativa, e que tem assento no art. 111 da Constituição do Estado, aplicável aos Municípios por força do art. 144 da mesma Carta.

Por força desse princípio, é necessário que a norma passe pelo denominado “teste” de razoabilidade, ou seja, que ela seja: (a) necessária (a) partir da perspectiva dos anseios da Administração Pública); (b) adequada (considerando os fins públicos que com a norma se pretende alcançar); e (c) proporcional em sentido estrito (que as restrições, imposições ou ônus dela decorrentes não sejam excessivos ou incompatíveis com os resultados a alcançar).

A autorização do pagamento do “prêmio aniversário”, na forma concebida, não passa por nenhum dos critérios do teste de razoabilidade: (a) não atende a nenhuma necessidade da Administração Pública, vindo em benefício exclusivamente da conveniência dos servidores públicos beneficiados por essa vantagem pecuniária; (b) é, por consequência, inadequado na perspectiva do interesse público; (c) é desproporcional em sentido estrito, pois cria ônus financeiro que naturalmente se mostram excessivos e inadmissíveis, tendo em vista que não acarretarão benefício algum para a Administração Pública.

Confira-se: Diogo de Figueiredo Moreira Neto, Curso de direito administrativo, 14. ed., Rio de Janeiro, Forense, 2006, p. 101; Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Direito administrativo, 19. ed., São Paulo, Atlas, 2006, p. 95; Gilmar Ferreira Mendes, “A proporcionalidade na jurisprudência do STF”, publicado em Direitos fundamentais e controle de constitucionalidade, São Paulo, Instituto Brasileiro de Direito Constitucional e Celso Bastos Editor, 1998, p.83.

Portanto, o art. 102 da Lei Complementar n. 37/2012 viola os arts. 111 e 128 da Constituição Paulista.

 

E. DA INCONSTITUCIONALIDADE POR ARRASTAMENTO

Importante assinalar que a Lei n. 3.097, de 18 de março de 2013, alterou e revogou as Leis n. 2.434/2001, 2.661/2006 e 2.994/2011, que cuidavam da gratificação e incorporação no âmbito da Câmara Municipal de Santa Rita do Passa Quatro.

Por este motivo, para se evitar que em virtude da declaração da inconstitucionalidade da Lei n. 3.097/2013, automaticamente restaurem-se por repristinação os atos normativos que disciplinavam a matéria, necessária a declaração de inconstitucionalidade por arrastamento.

A declaração de inconstitucionalidade por arrastamento é possível sempre que: a) o reconhecimento da inconstitucionalidade de determinado dispositivo legal torna despidos de eficácia e utilidade outros preceitos do mesmo diploma, ainda que não tenham sido impugnados; b) nos casos em que o efeito repristinatório restabelece dispositivos já revogados pela lei viciada que ostentem o mesmo vicio; c) quando há na lei dispositivos que não foram impugnados, mas guardam direta relação com aqueles cuja inconstitucionalidade é reconhecida.

Restabelecidos os efeitos da lei revogada, dá-se o que se chama de efeito indesejado, já havendo assentado o Supremo Tribunal Federal que:

"A reentrada em vigor da norma revogada nem sempre é vantajosa. O efeito repristinatório produzido pela decisão do Supremo, em via de ação direta, pode dar origem ao problema da legitimidade da norma revivida. De fato, a norma reentrante pode padecer de inconstitucionalidade ainda mais grave que a do ato nulificado. Previne-se o problema com o estudo apurado das eventuais consequências que a decisão judicial haverá de produzir. O estudo deve ser levado a termo por ocasião da propositura, pelos legitimados ativos, de ação direta de inconstitucionalidade. Detectada a manifestação de eventual eficácia repristinatória indesejada, cumpre requerer igualmente, já na inicial da ação direta, a declaração da inconstitucionalidade, e, desde que possível, a do ato normativo ressuscitado" (STF, ADI-MC 2.621-DF, Rel. Min. Celso de Mello, 01-08-2002).

 

Assim, a declaração de inconstitucionalidade deve abranger, por arrastamento, a Lei n. 2.434/2001, Lei n. 2.661/2006 e Lei n. 2.994/2011, do Município de Santa Rita do Passa Quatro.

 

III. PEDIDO DE LIMINAR

Demonstrada quantum satis a inconstitucionalidade dos dispositivos legais apontados, requerida é a concessão de medida liminar para suspensão de sua eficácia.

Em se tratando do controle normativo abstrato, uma vez verificada a cumulativa satisfação dos requisitos legais concernentes ao fumus boni iuris e ao periculum in mora, o poder geral de cautela autoriza a suspensão da eficácia dos preceitos legais tidos inconstitucionais.

Convergem para tanto a plausibilidade jurídica da tese exposta na inicial e o delineamento da situação do risco irreparável consistente no pagamento e manutenção de vantagens ilegalmente fixadas, de modo a gravar ilicitamente o erário e dispensar tratamento desigualitário com sérias repercussões financeiras e jurídicas na comuna.

Diante do exposto, requer-se a concessão da liminar, para fins de suspensão imediata da eficácia dos atos normativos impugnados, ou seja, do art. 3º, e anexo I, da Lei n. 1920, de 15 de agosto de 1991, da Lei 3.097, de 18 de março de 2013, do § 3º do art. 30 da Lei 2.808, de 31 de dezembro de 2.008, dos artigos 80, 81, caput, 100, caput, inciso I, e seu parágrafo único, 102, caput, e seus parágrafos, da Lei Complementar n. 37, de 06 de junho de 2012 e, por arrastamento, da Lei n. 2.434, de 21 de dezembro de 2001, Lei n. 2.661, de 22 de agosto de 2006 e Lei n. 2.994, de 04 de agosto de 2011, do Município de Santa Rita do Passa Quatro, durante o trâmite da presente ação e até seu final julgamento.

IV. CONCLUSÃO E PEDIDO.

         Face ao exposto, requer o recebimento e processamento da presente ação que deverá ser julgada procedente para declaração da inconstitucionalidade do art. 3º, e anexo I, da Lei n. 1920, de 15 de agosto de 1991, da Lei 3.097, de 18 de março de 2013, do § 3º do art. 30 da Lei 2.808, de 31 de dezembro de 2.008, dos artigos 80, 81, caput, 100, caput, inciso I, e seu parágrafo único, 102, caput, e seus parágrafos, da Lei Complementar n. 37, de 06 de junho de 2012 e, por arrastamento, da Lei n. 2.434, de 21 de dezembro de 2001, Lei n. 2.661, de 22 de agosto de 2006 e Lei n. 2.994, de 04 de agosto de 2011, do Município de Santa Rita do Passa Quatro.

Requer, ainda, sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Santa Rita do Passa Quatro, bem como a citação do douto Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre o ato normativo impugnado, e, posteriormente, vista para fins de manifestação final.

São Paulo, 22 de abril de 2014.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

Protocolado n. 75.731/2013

 

Assunto: Inconstitucionalidade do art. 3ºe anexo I, da Lei n. 1920, de 15 de agosto de 1991, da Lei 3.097, de 18 de março de 2013, do § 3º do art. 30 da Lei 2.808, de 31 de dezembro de 2.008, alterado pelo art. 1º, da Lei n. 2825, de 20 de maio de 2009, e dos artigos 80, 81, caput, 100, inciso I, e seu parágrafo único, 102 e seus parágrafos, da Lei Complementar n. 37, de 06 de junho de 2012 e, por arrastamento, da Lei n. 2.434, de 21 de dezembro de 2001, Lei n. 2.661, de 22 de agosto de 2006 e Lei n. 2.994, de 04 de agosto de 2011, do Município de Santa Rita do Passa Quatro.

 

 

 

1.    Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face art. 3º, e anexo I, da Lei n. 1920, de 15 de agosto de 1991, da Lei 3.097, de 18 de março de 2013, do § 3º do art. 30 da Lei 2.808, de 31 de dezembro de 2.008, dos artigos 80, 81, caput, 100, caput, inciso I, e seu parágrafo único, 102, caput, e seus parágrafos, da Lei Complementar n. 37, de 06 de junho de 2012 e, por arrastamento, da Lei n. 2.434, de 21 de dezembro de 2001, Lei n. 2.661, de 22 de agosto de 2006 e Lei n. 2.994, de 04 de agosto de 2011, do Município de Santa Rita do Passa Quatro, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.    Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

São Paulo, 22 de abril 2014.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça