Excelentíssimo
Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado
de São Paulo
Protocolado n. 195.005/13
Constitucional.
Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Leis do Município de São
Caetano do Sul. 1. Criação indiscriminada, abusiva e artificial de cargos e
empregos de provimento em comissão que não retratam atribuições de
assessoramento, chefia e direção, mas, funções técnicas, burocráticas,
operacionais e profissionais a serem preenchidas por servidores públicos
investidos em cargos de provimento efetivo. 2. Ausência de fixação das atribuições dos cargos de
provimento em comissão e delegação ao Poder Executivo para defini-las através
de ato administrativo, gerando invasão da reserva legal, e consequente violação
da separação de poderes. 3.Cargos públicos provimento
em comissão de “Diretor
de Escola”, “Assistente de Diretor de Escola”, “Coordenador Pedagógico” e “Orientador
Educacional”que não retratam atribuições de assessoramento, chefia e direção,
senão funções técnicas, burocráticas, operacionais e profissionais a serem
preenchidas por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo,
mediante a realização de concurso público de provas ou de provas e título. 4. Constituição Estadual: artigos 5º, §1º; 24, § 2º, 1; 111; 115, II, V; e 144.
O Procurador-Geral de Justiça do
Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista no art.
116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei
Orgânica do Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto
nos arts. 125, § 2º, e 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts.
74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas
informações colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse
Egrégio Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE, com pedido liminar, em face do art. 1º, item 1, letra c e item 11, da Lei n. 3.275,
de 19 de fevereiro de 1993; art.1º da Lei n. 4.209,
de 10 de março de 2004; art. 1º, incisos I, II, III e IV da Lei n. 3.954, de 19
de março de 2001; art.2º da Lei n.
4.356, de 14 de dezembro de 2005; art.4º da Lei n. 4.489, de 22 de março de 2007; art. 1º, inciso I
a III da Lei n. 4.032, de 05 de dezembro de
2001; art.2º, inciso III e IV da Lei n.
4.303, de 29 de junho de 2005; art.2º, inciso I, e Anexo I da Lei n. 5.051, de
14 de dezembro de 2011, e por arrastamento, do art. 2º da Lei n. 3.949,
de 07 de março de 2001 do Município de São Caetano do Sul.
I – Os Atos Normativos Impugnados
1.
Ao
dispor sobre a reestruturação administrativa, a Lei 3.275, de 19 de fevereiro
de 1993, no que interessa prescreve:
“Art. 1º - Ficam criados, nas unidades orgânicas de estrutura
administrativa da Prefeitura Municipal, abaixo-assinadas, os cargos públicos
devidamente enumerados seguintes:
1- GABINETE DO PREFEITO
(...)
c- 1 (hum) cargo de Redatora, privativo de portador de título
universitário em comissão, de livre nomeação e demissão do Prefeito Municipal;
(...)
11 – ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
a-
2
(dois) cargos de Jornalistas, em comissão, de livre nomeação e demissão do
Prefeito Municipal, privativo de portador de curso superior de Comunicação
Social, devidamente registrada no Município do Trabalho e no órgão de classe
competente;
b-
1
(hum) cargo de Relações Públicas, em comissão de livre nomeação e demissão do
Prefeito Municipal, privativo de portadores de curso superior em Comunicação
Social, devidamente registrado no Conselho Nacional de Relações Públicas;
c-
1
(hum) cargo de Assistente do Assessor de Comunicação Social, em comissão, de
livre nomeação e demissão do Prefeito Municipal, privativo de portador de
diploma de nível superior;
d-
1
(hum) cargo de cinegrafista, em comissão, de livre nomeação e demissão do
Prefeito Municipal, privativo de portador de diploma de curso secundário, com
conhecimentos técnicos em operação de câmara e vídeo/edição;
e-
1
(hum) cargo de Laborista, privativo de portador de diploma de curso secundário,
com conhecimento em revelação de fotografias e manuseio de material de
laboratório fotográfico;
f-
1
(hum) cargo de Assistente de Relações Públicas, em comissão, de livre nomeação
e demissão do Prefeito Municipal.
(...)
2.
Por
sua vez, aLei n°4.209, de 10 de março de 2004,assim dispõe:
“Art. 1° Ficam criados, no Departamento da Saúde e Vigilância Sanitária –
D.S.V.S., os seguintes cargos públicos, providos em comissão, de livre nomeação
e exoneração do Prefeito Municipal, dentre pessoas de escolaridade de nível
superior:
I - 01 (um) cargo de Diretor Técnico, privativo de médico;
II - 01 (um) cargo de Supervisor Administrativo;
III – 01 (um) cargo de Enfermeiro Supervisor;
IV- 01
(um) cargo de Farmacêutico;
V – 04 (quatro) cargos de Auxiliar de Supervisão Administrativa.”
(...)
3. Ainda, a Lei 3.954, de 19 de março de
2001, no que interessa apresenta a seguinte redação:
“Art.1º - Ficam criados, no
Departamento de Educação e Cultura – DEPEC, 04 (quatro) cargos, em comissão, de
livre nomeação e exoneração do Prefeito Municipal, a seguir especificados:
I – 01 (um) cargo de Assessor Técnico
de Ensino;
II – 01 (um) cargo de Diretor de
Escola;
III – 01 (um) cargo de Assistente de
Diretor de Escola; e
IV – 01 (um) cargo de Assistente
Administrativo de Escola.
(...)
4. A
Lei 4.356, de 14 de dezembro de 2005, que “Dispõe sobre a criação de escola
municipal de ensino fundamental, cria cargos e empregos para seu funcionamento
e dá outras providências”, assim estabelece:
“Art. 2º Para o seu funcionamento, ficam criados os seguintes cargos em
comissão de livre nomeação e exoneração do Prefeito:
I – 01 (um) Diretor de Escola;
II – 02 (dois) Assistentes de Diretor de Escola;
III -01 (um) Coordenador Pedagógico da Série Inicial – 4ª série;
IV –01 (um) Coordenador Pedagógico de 5ª a 8ª série;
V – 02 (dois) Orientador Educacional;
VI – 01 (um) Secretário de Escola.
5. Assim
também, a Lei 4.489, de 22 de março de 2007, que institui o Programa
Escola-Bairro; cria os seguintes cargos em comissão:
“Art. 4º - Para atendimento do disposto no artigo 4º ficam criados os
seguintes cargos de livre nomeação e exoneração:
I – 02 (dois) cargos de Assessor de Gestão em Conhecimento,
correspondente ao cargo de Assessor II;
II – 16 (dezesseis) cargos de Agentes Comunitários do Ensino,
correspondentes ao cargo de Assessor III.”
(...)
6. Ao
passo que a lei 4.032, de 05 de dezembro de 2001,cria novos cargos em comissão
no âmbito do Departamento de Educação e Cultura:
“Art.1º- Ficam criados, no
Departamento de Educação e Cultura – DEPEC, 04 (quatro) cargos, em comissão, de
livre nomeação e exoneração do Prefeito Municipal, a seguir especificados:
I-
01
(um) cargo de Assessor Técnico Operador de Áudio, Vídeo e Informática;
II-
01
(um) cargo de Assessor Técnico Restaurador;
III-
02
(dois) cargos de Assessor Técnico Auxiliar de Operador de Aúdio, Vídeo e
Informática.”
(...)
7. A
Lei nº 4.303, de 29 de junho de 2005assim dispõe:
“Art. 2º Para o cumprimento do disposto no artigo anterior, ficam criados
os seguintes cargos e funções:
(...)
III – 04 (quatro) cargos de Auxiliar do Sistema de Controle Interno,
cargos de confiança, de provimento em comissão, de livre nomeação e exoneração
pelo Chefe do Poder Executivo, com vencimentos equivalentes aos de Assessor
III, mais Nível Universitário e RET 75% (setenta e cinco por cento);
IV- 01 (um) cargo de Secretária, cargo de confiança, de provimento em
comissão, de livre nomeação e exoneração pelo Chefe do Poder Executivo, com
vencimentos equivalentes aos de Assessor IV, mais RET de 75% (setenta e cinco
por cento).”
8. Por fim, a Lei n° 5.051, de 14 de
dezembro de 2011 que “Dispõe sobre a criação de unidades escolares da rede
pública municipal de ensino, cria os cargos em comissão e empregos públicos que
especifica e dá outras providências”, tem os seguintes dispositivos de relevo
para a presente ação:
“ARTIGO 2°- Para a estruturação
administrativa das unidades escolares criadas nos termos do artigo 1º desta
Lei, criados:
I – criado os seguintes cargos em
comissão, de livre nomeação e exoneração pelo Chefe do Poder Executivo, cujas
atribuições encontram-se relacionadas no Anexo I da presente Lei:
a) Diretor de Escola – 02 (dois);
b) Assistente de Diretor de Escola – 02
(dois);
c) Coordenador Pedagógico – 03 (três);
d) Orientador Educacional – 02 (dois).
Anexo I – ATRIBUIÇÕES DOS CARGOS
(ART.1º, INC. I).
DENOMINAÇÃO DO CARGO |
ATRIBUIÇÕES |
DIRETOR DE ESCOLA |
Dirigir a Escola e
superintender todas as suas atividades, cumprindo e fazendo cumprir as leis,
regulamentos, calendário escolas, as determinações superiores e as
disposições de seu Regimento, de modo a garantir a consecução dos objetivos
do processo educacional; representar o estabelecimento perante as autoridades
escolares; organizar as atividades de planejamento no âmbito escolar; cumprir
e fazer cumprir as leis de ensino e determinações legais das autoridades
competentes; coordenar a elaboração, pelos docentes, da proposta pedagógica
da Escola e dos Planos Escolares, bem como controlar a sua execução; aplicar
penalidades previstas no Regimento Escolar; promover iniciativas que visem ao
aperfeiçoamento profissional de toda a equipe; autorizar matrículas e
transferência de alunos; convocar e presidir reuniões dos quadros da Escola –
administrativo, docente e discente, solenidades e cerimônias, delegando
atribuições e competências a seus subordinados, assim como designar comissões
para a execução de tarefas especiais; criar condições de estimular
experiências para o aprimoramento do processo educativo; notificar aos órgãos
competentes a situação de alunos que apresentam um número de faltas acima do
número permitido em lei; outras atribuições previstas no Regimento Interno
Escolar. |
ASSISTENTE DE DIRETOR DE
ESCOLA |
Substituir o diretor em
suas ausências, impedimentos ou por delegação deste, no cumprimento de
atividades específicas; assessorar a direção da escola no desempenho de suas
atribuições; assessorar na elaboração da proposta pedagógica da escola, do
plano de curso e do plano escolar e acompanhar as reuniões do Conselho de
Classe e Ano; acompanhar as inspeções periódicas dos bens patrimoniais da
escola e do seu inventário, informando ao Diretor a necessidade de baixa
patrimonial de inservíveis e a existência de excedentes; supervisionar as
atividades da merenda escolar, no âmbito da escola, mantendo o Diretor da
Escola informado; outras atribuições previstas no Regimento Interno Escolar. |
COORDENADOR PEDAGÓGICO |
Chefiar a elaboração do
Plano Escolar, coordenando os aspectos referentes às proposições
curriculares; promover a coordenação, acompanhamento e o controle das
atividades curriculares da Escola, tendo em vista a proposta pedagógica, os
Planos de Curso e planos de aulas, além de planos de trabalho expressos
através de projetos específicos; coordenar o desenvolvimento, a
implementação, o controle e a avaliação de medidas que visem a melhora do
processo educacional, de acordo com as diretrizes estabelecidas pela
Secretaria Municipal de Educação; outras atribuições previstas no Regimento
Interno Escolar. |
ORIENTADOR EDUCACIONAL |
Orientar e assessorar os
membros da equipe gestora da unidade de elaboração, sistematização,
implementação e avaliação da proposta pedagógica, do plano de curso e do
plano escolar da unidade educacional, a partir das diretrizes estabelecidas
na política educacional da Secretaria Municipal de Educação; outras
atribuições previstas no Regimento Interno Escolar. |
II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade
9. Os
diplomas legais, com exceção da Lei n. 5.051/2011, não descrevem as atribuições
dos cargos de provimento em comissão criados.
10. As leis impugnadas contrariam frontalmente a
Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção
normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição
Federal.
11. Os preceitos da Constituição Federal e
da Constituição do Estado são aplicáveis aos Municípios por força de seu art.
144, que assim estabelece:
“Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.
12. As normas contestadas são
incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:
“Art.5º - São Poderes do Estado, independentes
e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
§ 1º - É vedado a qualquer dos
Poderes delegar atribuições.
(...)
Art.24 - A iniciativa das leis
complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Assembleia
Legislativa, ao Governador do Estado, ao Tribunal de Justiça, ao
Procurador-Geral de Justiça e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta
Constituição.
(...)
§2º - Compete, exclusivamente, ao
Governador do Estado a iniciativa das leis que disponham sobre:
1 - criação e extinção de cargos,
funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica, bem como a
fixação da respectiva remuneração;
(...)
Artigo 111 – A
administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes
do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e
eficiência.
(...)
Artigo 115 – Para a
organização da administração pública direta ou indireta, inclusive as fundações
instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o
cumprimento das seguintes normas:
(...)
II - a investidura em
cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de
provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão,
declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;
(...)
V - as funções de
confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo,
e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos
casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às
atribuições de direção, chefia e assessoramento; (...)”.
A
- CRIAÇÃO DE CARGOS E EMPREGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO E INEXISTÊNCIA DE
ATRIBUIÇÕES PREVISTAS EM LEI
13. Os
quadros de cargos e empregos em comissão acima transcritos revelam a criação
indiscriminada, abusiva e artificial de cargos de provimento em comissão. Além
disso, inexiste descrição de suas atribuições em lei.
14. Inicialmente,
é inconstitucional a criação de cargos de provimento em comissão cujas
atribuições são de natureza burocrática, ordinária, técnica, operacional e
profissional, que não revelam plexos de assessoramento, chefia e direção, e que
devem ser desempenhadas por servidores investidos em cargos de provimento
efetivo mediante aprovação em concurso público.
15. A criação de cargos de provimento em comissão não pode ser desarrazoada, artificial, abusiva ou desproporcional, devendo, nos termos do art. 37, II e V, da Constituição Federal de 1988, e do art. 115, II e V, da Constituição Estadual, ater-se às atribuições de assessoramento, chefia e direção para as quais se empenhe relação de confiança, sendo vedada para o exercício de funções técnicas ou profissionais às quais é reservado o provimento efetivo precedido de aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, como apanágio da moralidade, da impessoalidade e da eficiência.
16. Não é lícito à lei declarar a liberdade de provimento de qualquer cargo ou emprego público, somente àqueles que requeiram relação de confiança nas atribuições de natureza política de assessoramento, chefia e direção, e não nos meramente burocráticos, definitivos, operacionais, técnicos, de natureza profissional e permanente.
17. Portanto,
têm a ver com essas atribuições de natureza especial (assessoramento, chefia e
direção em nível superior), para as quais se exige relação de confiança, pouco
importando a denominação e a forma de provimento atribuídas, pois,
18. É
dizer: os cargos de provimento em comissão devem ser restritos às atribuições
de assessoramento, chefia e direção em nível superior, nas quais esteja
presente a necessidade de relação de confiança com os agentes políticos para o
desempenho de tarefas de articulação, coordenação, supervisão e controle de
diretrizes político-governamentais. Não coaduna a criação de cargos desse jaez
– cuja qualificação é matéria da reserva legal absoluta – com atribuições ou
funções profissionais, operacionais, burocráticas, técnicas, administrativas,
rotineiras.
19. Para
tanto, é absolutamente imprescindível que a lei descreva as efetivas
atribuições do cargo de provimento em comissão para se aquilatar se realmente
se amoldam às funções de assessoramento, chefia e direção. Isto se amolda ao
próprio princípio da legalidade – porque a reserva legal exige lei em sentido
formal para disciplina das atribuições de cargo público, como adverte a
doutrina:
“(...) somente a lei pode criar esse conjunto
inter-relacionado de competências, direitos e deveres que é o cargo público.
Essa é a regra geral consagrada no art. 48, X, da Constituição, que comporta
uma ressalva à hipótese do art. 84, VI, b. Esse dispositivo permite ao Chefe do
Executivo promover a extinção de cargo público, por meio de ato administrativo.
A criação e a disciplina do cargo público faz-se necessariamente por lei no
sentido de que a lei deverá contemplar a disciplina essencial e indispensável.
Isso significa estabelecer o núcleo das competências, dos poderes, dos deveres,
dos direitos, do modo da investidura e das condições do exercício das
atividades. Portanto, não basta uma lei estabelecer, de modo simplista, que
‘fica criado o cargo de servidor público’. Exige-se que a lei promova a
discriminação das competências e a inserção dessa posição jurídica no âmbito da
organização administrativa, determinando as regras que dão identidade e
diferenciam a referida posição jurídica” (Marçal Justen Filho. Curso de Direito Administrativo, São
Paulo: Saraiva, 2005, p. 581).
20. Pois, somente a partir da descrição
precisa das atribuições do cargo público será possível, a bem do funcionamento
administrativo e dos direitos dos administrativos, averiguar-se a completa
licitude do exercício de suas funções pelo agente público. Trata-se de
exigência relativa à competência do agente público para a prática de atos em
nome da Administração Pública e, em especial, aqueles que tangenciam os
direitos dos administrados, e que se espraiaà aferição da legitimidade da forma
de investidura no cargo público que deve ser guiada pela legalidade,
moralidade, pela impessoalidade e pela razoabilidade.
21. Nem
se alegue, por oportuno, que o art. 8º da Lei n. 4.303/05 e o art.8º da Lei n.
3.949/01ao disporem que
as atribuições dos cargos serão regulamentadas pelo Poder Executivo Municipal
legitima a atuação legislativa. A possibilidade de regulamento autônomo para
disciplina da organização administrativa não significa a outorga de competência
para o Chefe do Poder Executivo fixar atribuições de cargo público e dispor
sobre seus requisitos de habilitação e forma de provimento. A alegação cede à
vista do art. 61, § 1°, II, a, da
Constituição Federal, e do art. 24, § 2º, 1, que, em coro, exigem lei em
sentido formal.Regulamento administrativo (ou de organização) contém normas
sobre a organização administrativa, isto é, a disciplina do modo de prestação
do serviço e das relações intercorrentes entre órgãos, entidades e agentes, e
de seu funcionamento, sendo-lhe vedado criar cargos públicos, somente
extingui-los desde que vagos (arts. 48, X, 61, § 1°, II, a, 84, VI, b,
Constituição Federal; art. 47, XIX, a,
Constituição Estadual) ou para os fins de contenção de despesas (art. 169, §
4°, Constituição). Bem explica Celso Antonio Bandeira de Mello que o
regulamento previsto no art. 84, VI, a,
da Constituição, é:
“(...) mera competência para um arranjo intestino dos órgãos e competências já criadas por lei’, como a transferência de departamentos e divisões, por exemplo (Celso Antonio Bandeira de Mello. Curso de Direito Administrativo, São Paulo: Malheiros, 2006, 21ª ed., pp. 324-325).
22. Neste
sentido, pronuncia a jurisprudência a inconstitucionalidade de leis que delegam
ao Poder Executivo a fixação da descrição das atribuições de cargos de provimento em comissão (STF, RE 577.025-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min.
Ricardo Lewandowski, 11-12-2008, v.u., DJe 0-03-2009; STF, ADI 3.232-TO,
Tribunal Pleno, Rel. Min. Cezar Peluso, 14-08-2008, v.u., DJe 02-10-2008; TJSP,
ADI 170.044-0/7-00, Órgão Especial, Rel. Des. Eros Piceli, 24-06-2009, v.u.).
23. E, ademais, proclama a inconstitucionalidade de leis que criam cargos de provimento em comissão que possuem atribuições técnicas, burocráticas ou profissionais, ao exigir que elas demonstrem, de forma efetiva, que eles tenham funções de assessoramento, chefia ou direção (STF, ADI 3.706-MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, v.u., DJ 05-10-2007; STF, ADI 1.141-GO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, 29-08-2002, v.u., DJ 29-08-2003, p. 16; STF, AgR-ARE 680.288-RS, 1ª Turma, Rel. Min. LuizFux, 26-06-2012, v.u., DJe 14-08-2012; STF, AgR-AI 309.399-SP, Rel. Min. Dias Toffoli, Informativo STF 663; STF, AgR-RE 693.714-SP, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, 11-09-2012, v.u., DJe 25-09-2012; STF, ADI 4.125-TO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cármen Lúcia, 10-06-2010, v.u., DJe 15-02-2011; TJSP, ADI 150.792-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. Elliot Akel, v.u., 30-01-2008). Neste sentido:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEIS 6.600/1998 (ART. 1º, CAPUT E INCISOS I E II), 7.679/2004 E 7.696/2004 E LEI COMPLEMENTAR 57/2003 (ART. 5º), DO ESTADO DA PARAÍBA. CRIAÇÃO DE CARGOS EM COMISSÃO. I - Admissibilidade de aditamento do pedido na ação direta de inconstitucionalidade para declarar inconstitucional norma editada durante o curso da ação. Circunstância em que se constata a alteração da norma impugnada por outra apenas para alterar a denominação de cargos na administração judicial estadual; alteração legislativa que não torna prejudicado o pedido na ação direta. II - Ofende o disposto no art. 37, II, da Constituição Federal norma que cria cargos em comissão cujas atribuições não se harmonizam com o princípio da livre nomeação e exoneração, que informa a investidura em comissão. Necessidade de demonstração efetiva, pelo legislador estadual, da adequação da norma aos fins pretendidos, de modo a justificar a exceção à regra do concurso público para a investidura em cargo público. Precedentes. Ação julgada procedente” (STF, ADI 3.233-PB, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 10-05-2007, v.u., DJe 13-09-2007, RTJ 202/553).
“Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2.
Direito administrativo. 3. Criação de cargos em comissão por leis municipais.
Declaração de inconstitucionalidade pelo TJRS por violação à disposição da
Constituição estadual em simetria com a Constituição Federal. 3. É necessário
que a legislação demonstre, de forma efetiva, que as atribuições dos cargos a
serem criados se harmonizam com o princípio da livre nomeação e exoneração.
Caráter de direção, chefia e assessoramento. Precedentes do STF. 4. Ausência de
argumentos suficientes para infirmar a decisão agravada. 5. Agravo regimental a
que se nega provimento” (STF, AgR-ARE 656.666-RS, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, 14-02-2012,
v.u., DJe 05-03-2012).
24. A criação abusiva e a ausência de
fixação de atribuições desses cargos caracteriza violação dos 111 e 115, II e
V, da Constituição Estadual, pois, é exigência elementar à criação de cargos
públicos a descrição de suas atribuições em lei.
B - DA NATUREZA TÉCNICA OU
BUROCRÁTICA DAS FUNÇÕES DESEMPENHADAS PELOS CARGOS DE DIRETOR DE ESCOLA,
ASSISTENTE DE DIRETOR DE ESCOLA, COORDENADOR PEDAGÓGICO E ORIENTADOR
EDUCACIONAL
25. Os
cargos de Diretor de Escola, Assistente de Diretor de Escola, Coordenador
Pedagógico e Orientador Educacional, previstos nos incisos I, letras a, b, c e
d, do artigo 2º, da Lei n. 5.051/2011, conforme o rol de atribuições do anexo I
do respectivo diploma legal, desempenham atividades nitidamente
técnico-profissionais relacionadas à área da educação, sem muita margem de
autonomia, haja vista estarem vinculados e sujeitos às normas do sistema
nacional da educação.
26. Como
foi exposto acima, houve no Município de São Caetano do Sul a criação
indiscriminada, abusiva e artificial de cargos de provimento em comissão e, do
mesmo modo, se revela abusiva a criação de funções de confiança para cargos de
natureza técnica ou burocrática.
27. Os
cargos criados de Diretor de Escola, Assistente de Diretor de Escola,
Coordenador Pedagógico e Orientador Educacional consistem em funções técnicas,
burocráticas, operacionais e profissionais, e, por isso, devem ser preenchidos
por servidores públicos investidos em cargos de provimento efetivo recrutados
após prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos.
28. A
excepcional possibilidade de a lei criar cargos cujo provimento não se
fundamente no processo público de recrutamento pelo sistema de mérito não
admite o uso dessa prerrogativa para burla à regra do acesso a cargos e
empregos públicos mediante prévia aprovação em concurso público (art. 115, II,
Constituição do Estado) que decorre dos princípios de moralidade,
impessoalidade e eficiência (art. 111, Constituição do Estado).
29. Para
atribuição de função de confiança para determinado cargo, a hipótese deve
reclamar especial relação de confiança para desenvolvimento de funções de nível
superior de condução das diretrizes políticas do governo.
30. Não
há, evidentemente, nenhum componente nos postos Diretor de Escola, Assistente
de Diretor de Escola, Coordenador Pedagógico e Orientador Educacional a exigir
o controle de execução das diretrizes políticas do governante a ser
desempenhado por alguém que detenha absoluta fidelidade a orientações traçadas,
sendo, por isso, ofensivas aos princípios de moralidade e impessoalidade (art.
111, Constituição Estadual) que orientam os incisos II e V do art. 115 da
Constituição Estadual.
31. À saciedade
demonstrado o fumus boni iuris, pela
ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos normativos
municipais apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do
Estado de São Paulo é sinal, de per si,
para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se
atuação desconforme o ordenamento jurídico, criadora de lesão irreparável ou de
difícil reparação, consistente na admissão ilegítima de servidores públicos e
correlata percepção de remuneração à custa do erário.
32. À luz desta
contextura, requer-se a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até
final e definitivo julgamento desta ação,do art. 1º, item 1,
letra c e item 11, da Lei n. 3.275, de 19 de fevereiro de 1993; art.1º da Lei n. 4.209, de 10 de março de 2004; art. 1º, incisos I, II, III
e IV da Lei n. 3.954, de 19 de março de 2001; art.2º da Lei n. 4.356, de 14 de dezembro de 2005; art.4º da Lei n. 4.489, de 22 de março de 2007; art. 1º, inciso I
a III da Lei n. 4.032, de 05 de dezembro de
2001; art.2º, inciso III e IV da Lei n.
4.303, de 29 de junho de 2005; art.2º, inciso I, e Anexo I da Lei n. 5.051, de
14 de dezembro de 2011, e por arrastamento, do art. 2º da Lei n. 3.949,
de 07 de março de 2001 do Município de São Caetano do Sul.
IV. DA INCONSTITUCIONALIDADE POR ARRASTAMENTO
33. Não se pode olvidar
que, acaso acolhido o pedido da presente ação direta de inconstitucionalidade,
serão automaticamente restaurados dispositivos de leis anteriores que padecem
do mesmo vício de constitucionalidade no
que concerne à criação dos referidos cargos e empregos em comissão.
34. Torna-se, portanto,
necessário que se reconheça sua inconstitucionalidade por arrastamento ou
atração, sob pena de se instaurar situação mais gravosa que aquela que se busca
combater.
35. A respeito da
inconstitucionalidade por arrastamento, tem-se que:
"(...) se em determinado
processo de controle concentrado de constitucionalidade for julgada
inconstitucional a norma principal, em futuro processo, outra norma dependente
daquela que foi declarada inconstitucional em processo anterior - tendo em
vista a relação de instrumentalidade que entre elas existe - também estará
eivada pelo vício da inconstitucionalidade 'conseqüente', ou por 'arrastamento'
ou por 'atração'" (Pedro Lenza, "Direito Constitucional
Esquematizado", Saraiva, 13ª Edição, p. 208).
36. Segundo
precedentes do Pretório Excelso, é perfeitamente possível a declaração de
inconstitucionalidade por arrastamento (ADI 1.144-RS, Rel. Min. Eros Grau, DJU
08-09-2006, p. 16; ADI 3.645-PR, Rel. Min. Ellen Gracie, DJU 01-09-2006, p. 16;
ADI-QO 2.982-CE, Rel. Min. Gilmar Mendes, LexSTF, 26/105; ADI 2.895-AL, Rel.
Min. Carlos Velloso, RTJ 194/533; ADI 2.578-MG, Rel. Min. Celso de Mello, DJU
09-06-2005, p. 4).
37. A
declaração de inconstitucionalidade por arrastamento é possível sempre que: a)
o reconhecimento da inconstitucionalidade de determinado dispositivo legal
torna despidos de eficácia e utilidade outros preceitos do mesmo diploma, ainda
que não tenham sido impugnados; b) nos casos em que o efeito repristinatório
restabelece dispositivos já revogados pela lei viciada que ostentem o mesmo
vicio; c) quando há na lei dispositivos que não foram impugnados, mas guardam
direta relação com aqueles cuja inconstitucionalidade é reconhecida.
38. Restabelecidos
os efeitos da lei revogada, dá-se o que se chama de efeito indesejado, já
havendo assentado o Supremo Tribunal Federal que:
"A reentrada em
vigor da norma revogada nem sempre é vantajosa. O efeito repristinatório
produzido pela decisão do Supremo, em via de ação direta, pode dar origem ao
problema da legitimidade da norma revivida. De fato, a norma reentrante pode
padecer de inconstitucionalidade ainda mais grave que a do ato nulificado.
Previne-se o problema com o estudo apurado das eventuais conseqüências que a
decisão judicial haverá de produzir. O estudo deve ser levado a termo por
ocasião da propositura, pelos legitimados ativos, de ação direta de
inconstitucionalidade. Detectada a manifestação de eventual eficácia repristinatória
indesejada, cumpre requerer igualmente, já na inicial da ação direta, a
declaração da inconstitucionalidade, e, desde que possível, a do ato normativo
ressuscitado" (STF, ADI-MC 2.621-DF, Rel. Min. Celso de Mello,
01-08-2002).
39. Nesse contexto, a declaração de
inconstitucionalidade por arrastamento, do
artigo 2º da Lei 3.949, de 07 de março de 2001, do Município de São
Caetano do Sul,é medida
de rigor, pois referida norma apresenta o mesmo vício que macula os
dispositivos que figuram como objeto desta ação direta de
inconstitucionalidade.
V – Pedido
40. Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento
da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a
inconstitucionalidade do art. 1º, item 1,
letra c e item 11, da Lei n. 3.275, de 19 de fevereiro de 1993; art.1º da Lei n. 4.209, de 10 de março de 2004; art. 1º, incisos I, II, III
e IV da Lei n. 3.954, de 19 de março de 2001; art.2º da Lei n. 4.356, de 14 de dezembro de 2005; art.4º da Lei n. 4.489, de 22 de março de 2007; art. 1º, inciso I
a III da Lei n. 4.032, de 05 de dezembro de
2001; art.2º, inciso III e IV da Lei n.
4.303, de 29 de junho de 2005; art.2º, inciso I, e Anexo I da Lei n. 5.051, de
14 de dezembro de 2011, e por arrastamento, do art. 2º da Lei n. 3.949,
de 07 de março de 2001 do Município de São Caetano do Sul.
41. Requer-se, ainda, que sejam requisitadas informações à
Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de São Caetano do Sul, bem como
posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os
atos normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para
manifestação final.
Termos
em que, pede deferimento.
São Paulo, 13 de junho de 2014.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
ef
Protocolado nº195.005/13
Interessado: Promotoria de Justiça de São Caetano do Sul
Distribua-se a petição inicial da
ação direta de inconstitucionalidade, em facedo
art. 1º, item 1, letra c e item 11, da Lei n. 3.275, de 19 de fevereiro
de 1993; art.1º da Lei n. 4.209, de 10 de
março de 2004; art. 1º, incisos I, II, III e IV da Lei n. 3.954, de 19 de março
de 2001; art.2º da Lei n. 4.356, de 14 de
dezembro de 2005; art.4º da Lei n.
4.489, de 22 de março de 2007; art. 1º, inciso I a III da Lei n. 4.032, de 05 de dezembro de 2001; art.2º, inciso
III e IV da Lei n. 4.303, de 29 de junho
de 2005; art.2º, inciso I, e Anexo I da Lei n. 5.051, de 14 de dezembro de 2011, e por
arrastamento, do art. 2º da Lei n. 3.949, de 07 de março de 2001 do Município
de São Caetano do Sul.
Promovo arquivamento parcial da
representação em face da Lei 2.439, de 01 de setembro de 1977, por ser
precedente à Constituição (Federale Estadual).
Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura
da ação, com cópia da petição inicial.
São Paulo, 13 de junho de 2014.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral
de Justiça