Excelentíssimo
Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado
de São Paulo
Protocolado nº 111.682/13
Constitucional. Administrativo. Ação Direta de
Inconstitucionalidade. Lei Complementar nº 202, de 07 de junho de 2013, da
Câmara Municipal de Conchas. Transformação
do cargo de Assessor Jurídico do Poder Legislativo em emprego público de
provimento em comissão regido pela CLT. descrição de atribuições que não
representam funções de assessoramento, chefia e direção, mas de natureza
meramente técnica e profissional. Exigibilidade de provimento efetivo para
postos inerentes à Advocacia Pública. Adoção incompossível do regime celetista.
É inconstitucional a transformação
de cargo em emprego público de provimento em comissão cujas atribuições, ainda
que descritas, não evidencia função de assessoramento, chefia e direção, mas, função técnica, burocrática, operacional e
profissional a ser preenchida por servidor público investido em cargo de
provimento efetivo, inclusive a da advocacia pública, cujo provimento
deve se dar mediante aprovação em concurso público, bem como a sujeição de
emprego público comissionado ao regime celetista, contrariando a exigência do
regime administrativo (arts. 30, 98, §§ 1º a 3º, 111, 115, II e V, CE/89).
O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São
Paulo, no exercício da atribuição prevista no art. 116, VI, da Lei
Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica do
Ministério Público de São Paulo), em conformidade com o disposto nos arts. 125,
§ 2º, e 129, IV, da Constituição Federal, e, ainda, nos arts. 74, VI, e 90,
III, da Constituição do Estado de São Paulo, com amparo nas informações
colhidas no incluso protocolado, vem, respeitosamente, perante esse Egrégio
Tribunal de Justiça, promover a presente AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, com pedido liminar, em face da Lei
Complementar nº 202, de 07 de junho de 2013, da Câmara Municipal de Conchas,
pelos fundamentos a seguir expostos:
I – O ATO NORMATIVO IMPUGNADO
A da Lei Complementar nº 202, de 07 de
junho de 2013, da Câmara Municipal de Conchas, que “Dispõe sobre a transformação do cargo de Assessor Jurídico do Poder
Legislativo em emprego público de provimento em comissão de livre nomeação e
demissível ad nutum, regido pela CLT e pelo RGPS e dá outras providências”,
prevê o seguinte:
“(...)
Art. 1° - Fica transformado o cargo de Assessor Jurídico do Poder Legislativo em emprego público de provimento em comissão, de livre nomeação e demissível ad nutum, regido pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e pelo RGPS (Regime Geral de Previdência Social), o qual passa a compor o Quadro de Pessoal da Câmara Municipal de Conchas, com salário mensal de R$ 2.137,55.
Art. 2º - São atribuições do Assessor Jurídico do Poder Legislativo:
I – Emitir parecer jurídico fundamentado em todos os assuntos a que for solicitado pelo Presidente da Câmara, pela Mesa Diretora, pelo Presidente da Comissão, ou por Vereador;
II – Emitir parecer jurídico fundamentado em todos os procedimentos licitatórios de dispensa ou inexigibilidade de licitação, zelando pela legalidade e constitucionalidade do procedimento;
III – Emitir parecer jurídico fundamentado em todos os procedimentos licitatórios, nas modalidades de carta-convite, tomada de preços, concorrência pública, pregão e concurso público, zelando pela legalidade e constitucionalidade de todo o certame;
IV – Emitir parecer jurídico fundamentado em todos os requerimentos de cidadania protocolados na Câmara, antes de sua apreciação de mérito pelo Presidente, pela Mesa Diretora ou pelo Presidente de qualquer Comissão;
V – Propor todas as medidas e/ou ações judiciais de interesse do Poder Legislativo e para salvaguardar as prerrogativas constitucionais da Câmara Municipal e do Vereador;
VI – Defender administrativamente e judicialmente o Poder Legislativo, o Presidente da Câmara, a Mesa Diretora e os membros de Comissão no efetivo exercício de suas atribuições constitucionais, legais e regimentais;
VIII – Observar o Estatuto da OAB e as normas do Código de Ética;
IX – Orienta judicialmente os servidores públicos da Câmara Municipal no que lhe for solicitado;
X – Executa outras tarefas correlatas de suas atribuições típicas ou que sejam determinadas pelo Presidente.
Art. 3º - As despesas decorrentes com a execução da presente Lei Complementar correrão por conta da seguinte dotação orçamentária vigente: 3.1.30.90.11.00.
Art. 4º - Suprimido.
Art. 5º - Esta Lei Complementar entrará em vigor na data de sua publicação.
Art. 6º - Revogam-se as disposições em contrário, especialmente, as contidas na Lei Complementar nº 02/2009, de autoria da Mesa Diretora.
(...)”
II – O PARÂMETRO DA FISCALIZAÇÃO ABSTRATA DE
CONSTITUCIONALIDADE
A transformação
do cargo de Assessor Jurídico do Poder Legislativo em emprego público de
provimento em comissão regido pela CLT, previsto na Lei Complementar nº 202, de
07 de junho de 2013, da Câmara Municipal de Conchas contraria frontalmente a
Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção
normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição
Federal. As disposições normativas impugnadas violam os seguintes preceitos
constitucionais:
“Artigo 30 - À Procuradoria da Assembleia Legislativa compete exercer a representação judicial, a consultoria e o assessoramento técnico-jurídico do Poder Legislativo.
Parágrafo único - Lei de iniciativa da Mesa da Assembleia Legislativa organizará a Procuradoria da Assembleia Legislativa, observados os princípios e regras pertinentes da Constituição Federal e desta Constituição, disciplinará sua competência e disporá sobre o ingresso na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos.
(...)
Art. 98 - A
Procuradoria Geral do Estado é instituição de natureza permanente, essencial à
administração da justiça e à Administração Pública Estadual, vinculada
diretamente ao Governador, responsável pela advocacia do Estado, sendo
orientada pelos princípios da legalidade e da indisponibilidade do interesse
público.
§ 1º - Lei
orgânica da Procuradoria Geral do Estado disciplinará sua competência e a dos
órgãos que a compõem e disporá sobre o regime jurídico dos integrantes da
carreira de Procurador do Estado, respeitado o disposto nos arts. 132 e 135 da
Constituição Federal.
§ 2º - Os Procuradores do Estado, organizados em carreira, na qual o ingresso dependerá de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, exercerão a representação judicial e a consultoria jurídica na forma do ‘caput’ deste artigo.
§ 3º - Aos procuradores referidos neste artigo é assegurada estabilidade após três anos de efetivo exercício, mediante avaliação de desempenho perante os órgãos próprios, após relatório circunstanciado das corregedorias.
(...)
Art. 111. A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, razoabilidade, finalidade, motivação, interesse público e eficiência.
(...)
Art. 115. Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as fundações instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:
(...)
II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei, de livre nomeação e exoneração;
(...)
V - as funções de confiança, exercidas exclusivamente por servidores ocupantes de cargo efetivo, e os cargos em comissão, a serem preenchidos por servidores de carreira nos casos, condições e percentuais mínimos previstos em lei, destinam-se apenas às atribuições de direção, chefia e assessoramento;
(...)
Art. 144. Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.”
A – CRIAÇÃO ABUSIVA OU ARTIFICAL DE CARGO OU EMPREGO DE
PROVIMENTO EM COMISSÃO
O ato normativo
acima transcrito revela a criação indiscriminada, abusiva e artificial de cargo
de provimento em comissão. No caso, o cargo de Assessor jurídico do Poder Legislativo
previsto na Lei Complementar nº 202, de 07 de junho de 2013, da Câmara
Municipal de Conchas não retrata atribuições de assessoramento, chefia e
direção, a exigir liberdade de provimento em comissão porque não existe o
componente fiduciário.
Como bem
pontificado em venerando acórdão deste Egrégio Tribunal:
“A criação de tais cargos é exceção a esta regra geral e tem por finalidade de propiciar ao governante o controle de execução de suas diretrizes políticas, sendo exigido de seus ocupantes absoluta fidelidade às orientações traçadas.
Em sendo assim, deve ser limitada aos casos em que seja exigível especial relação de confiança entre o governante e o servidor.
(...)
Tratando-se de postos comuns – de atribuição de natureza técnica e profissional -, em que não se exige de quem vier a ocupá-los o estabelecimento de vínculo de confiança ou fidelidade com a autoridade nomeante, deveriam ser assumidos, em caráter definitivo, por servidores regularmente aprovados em concurso público de provas ou de provas e títulos, em conformidade com a regra prevista no citado inciso II” (TJSP, ADI 173.260-0/4-00, Órgão Especial, Rel. Des. Armando Toledo, v.u., 22-07-2009).
De fato, o
cargo transformado em emprego público de provimento em comissão consiste em
função técnica, burocrática, operacional e profissional, e, por isso, deve ser
preenchido por servidor público investido em cargo de provimento efetivo,
recrutado após prévia aprovação em concurso público de provas ou de provas e
títulos.
Um dos
princípios norteadores do provimento de cargos públicos reside na ampla
acessibilidade e igualdade de condições a todos os interessados, respeitados os
requisitos inerentes às atribuições de cada cargo. Acesso esse que visa
garantir, com a obrigatória realização do concurso público, que sem que reste
tangenciado o princípio da isonomia, preserve-se também a eficiência da máquina
estatal, consubstanciada na escolha dos candidatos mais bem preparados para o
desempenho das atribuições do cargo público, de acordo com os critérios
previstos no edital respectivo.
Ao comentar a
exigência de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e
títulos para a investidura em cargo público, afirma Alexandre de Moraes:
“Existe, assim, um verdadeiro direito de acesso aos cargos, empregos e funções públicas, sendo o cidadão e o estrangeiro, na forma da lei, verdadeiros agentes do poder, no sentido de ampla possibilidade de participação da administração pública” (Direito Constitucional, Atlas, São Paulo, 7ª edição, 2000, p. 314).”
A excepcional
possibilidade de a lei criar cargo cujo provimento não se fundamente no
processo público de recrutamento pelo sistema de mérito não admite o uso dessa
prerrogativa para burla à regra do acesso a cargos públicos mediante prévia
aprovação em concurso público (art. 115, II, Constituição do Estado) que
decorre dos princípios de moralidade, impessoalidade e eficiência (art. 111,
Constituição do Estado).
Por oportuno,
cumpre observar que não há óbice à criação de cargos comissionados relativos à
assessoria jurídica do Poder Legislativo, desde que respeitados os requisitos constitucionais,
a saber: descrição de funções concretamente de fidúcia.
Não basta a
lei criar o cargo ou dar-lhe uma denominação de assessoramento, chefia ou
direção – ainda que assessoria jurídica do Poder Legislativo – se não
discriminar primariamente suas atribuições de confiança, para viabilizar o
controle de sua conformidade com as prescrições constitucionais que evidenciam
a natureza excepcional do provimento em comissão.
É dizer: os
cargos de provimento em comissão devem ser restritos às atribuições de
assessoramento, chefia e direção em nível superior, nas quais esteja presente a
necessidade de relação de confiança com os agentes políticos para o desempenho
de tarefas de articulação, coordenação, supervisão e controle de diretrizes
político-governamentais. Portanto, não coaduna a criação de cargos desse jaez –
cuja qualificação é matéria da reserva legal absoluta – com atribuições ou
funções profissionais, operacionais, burocráticas, técnicas, administrativas,
rotineiras, sendo, ademais, irrelevante a denominação e a forma de provimento
atribuídas, pois, verba non mutant
substantiam rei. O essencial é a análise do plexo de atribuições da função
pública.
A necessidade
de uma burocracia permanente na Administração Pública se dá em função – e a
CF/88 delineia tal estrutura – do intencional objetivo de afastar o spoil’s system. A excepcionalidade da
criação de cargos de provimento em comissão evita tal “sistema de despojos”,
como preleciona Manoel Gonçalves Ferreira Filho:
“gerava inconvenientes graves, quais a instabilidade administrativa, as interrupções no serviço, a descontinuidades nas tarefas, e não podia ser mantido no Welfare State, cujo funcionamento implica a existência de um corpo administrativo capaz, especializado e treinado, à altura de suas múltiplas tarefas” (Manoel Gonçalves Ferreira Filho. Comentários à Constituição brasileira de 1988, São Paulo: Saraiva, 1997, p. 255).
Neste sentido,
a jurisprudência censura a criação abusiva, artificial e indiscriminada de
cargos de provimento em comissão (STF, ADI 3.706, Rel. Min. Gilmar
Mendes, DJ 05-10-2007; STF, RE-AgR 365.368-SC, 1ª Turma,
Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 22-05-2007, v.u., DJ 29-06-2007, p. 49; STF, ADI
3.233-PB, Tribunal Pleno, Rel., Min. Joaquim Barbosa, 10-05-2007, v.u., DJ
14-09-2007, p. 30; STF, ADI 1.141-GO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie,
29-08-2002, v.u., DJ 29-08-2003, p. 16; TJSP, ADI 150.792-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. Elliot
Akel, v.u., 30-01-2008; TJSP, ADIN 173.308.0/4-00, Órgão Especial, Rel. Des. José
Roberto Bedran, v.u.,
24-06-2009; TJSP, ADI 165.773-0/1-00, Órgão Especial, Rel. Des. Maurício
Ferreira Leite, v.u., 10-08-2008).
Não há,
evidentemente, nenhum componente nos postos acima transcritos a exigir o
controle de execução das diretrizes políticas do governante a ser desempenhado
por alguém que detenha absoluta fidelidade a orientações traçadas, sendo, por
isso, ofensivos aos princípios de moralidade e impessoalidade (art. 111,
Constituição Estadual), que orientam os incisos II e V do art. 115 da Constituição
Estadual, o cargo de provimento em comissão de Assessor Jurídico do Poder Legislativo
contido na Lei Complementar nº 202, de 07 de junho de 2013, da Câmara Municipal
de Conchas.
B – IMPOSSIBILIDADE DE PROVIMENTO
COMISSIONADO PARA CARGO OU EMPREGO DA ADVOCACIA PÚBLICA
Convém
adicionar a incompatibilidade do emprego público de Assessor Jurídico do Poder
Legislativo com os arts. 30 e 98 da Constituição Estadual, pois as atividades
inerentes à advocacia pública como assessoramento, consultoria e representação
jurídica de entidades ou órgãos públicos são atribuições de natureza
profissional e técnica e exclusivamente reservadas a profissionais investidos
em cargos de provimento efetivo da respectiva carreira mediante aprovação
prévia em concurso público, como revela a remissão ao art. 132 da Constituição
Federal contida no § 1º do art. 98 da Constituição Estadual. Cediça
jurisprudência assim pronuncia:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI COMPLEMENTAR
11/91, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO (ART. 12, CAPUT, E §§ 1º E 2º; ART. 13 E
INCISOS I A V) - ASSESSOR JURÍDICO - CARGO DE PROVIMENTO EM COMISSÃO - FUNÇÕES
INERENTES AO CARGO DE PROCURADOR DO ESTADO - USURPAÇÃO DE ATRIBUIÇÕES
PRIVATIVAS - PLAUSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - MEDIDA LIMINAR DEFERIDA. - O
desempenho das atividades de assessoramento jurídico no âmbito do Poder
Executivo estadual traduz prerrogativa de índole constitucional outorgada aos
Procuradores do Estado pela Carta Federal. A Constituição da República, em seu
art. 132, operou uma inderrogável imputação de específica e exclusiva atividade
funcional aos membros integrantes da Advocacia Pública do Estado, cujo processo
de investidura no cargo que exercem depende, sempre, de prévia aprovação em
concurso público de provas e títulos” (STF, ADI-MC 881-ES, Tribunal Pleno, Rel.
Min. Celso de Mello, 02-08-
“TRANSFORMAÇÃO, EM CARGOS DE CONSULTOR JURÍDICO, DE CARGOS OU
EMPREGOS DE ASSISTENTE JURÍDICO, ASSESSOR JURÍDICO, PROCURADOR JURÍDICO E
ASSISTENTE JUDICIÁRIO-CHEFE, BEM COMO DE OUTROS SERVIDORES ESTÁVEIS JÁ
ADMITIDOS A REPRESENTAR O ESTADO EM JUÍZO (PAR 2. E 4. DO ART. 310 DA
CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARÁ). INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA POR PRETERIÇÃO
DA EXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL).
LEGITIMIDADE ATIVA E PERTINÊNCIA OBJETIVA DE AÇÃO RECONHECIDAS POR MAIORIA”
(STF, ADI 159-PA, Tribunal Pleno, Rel. Min. Octavio Gallotti, 16-10-
“CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ANEXO II DA LEI COMPLEMENTAR 500, DE 10 DE MARÇO DE 2009, DO ESTADO DE RONDÔNIA. ERRO MATERIAL NA FORMULAÇÃO DO PEDIDO. PRELIMINAR DE NÃO-CONHECIMENTO PARCIAL REJEITADA. MÉRITO. CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EM COMISSÃO DE ASSESSORAMENTO JURÍDICO NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO DIRETA. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. Conhece-se integralmente da ação direta de inconstitucionalidade se, da leitura do inteiro teor da petição inicial, se infere que o pedido contém manifesto erro material quanto à indicação da norma impugnada. 2. A atividade de assessoramento jurídico do Poder Executivo dos Estados é de ser exercida por procuradores organizados em carreira, cujo ingresso depende de concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases, nos termos do art. 132 da Constituição Federal. Preceito que se destina à configuração da necessária qualificação técnica e independência funcional desses especiais agentes públicos. 3. É inconstitucional norma estadual que autoriza a ocupante de cargo em comissão o desempenho das atribuições de assessoramento jurídico, no âmbito do Poder Executivo. Precedentes. 4. Ação que se julga procedente” (STF, ADI 4.261-RO, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, 02-08-2010, v.u., DJe 20-08-2010, RT 901/132).
“ATO NORMATIVO - INCONSTITUCIONALIDADE. A declaração de inconstitucionalidade de ato normativo pressupõe conflito evidente com dispositivo constitucional. PROJETO DE LEI - INICIATIVA - CONSTITUIÇÃO DO ESTADO - INSUBSISTÊNCIA. A regra do Diploma Maior quanto à iniciativa do chefe do Poder Executivo para projeto a respeito de certas matérias não suplanta o tratamento destas últimas pela vez primeira na Carta do próprio Estado. PROCURADOR-GERAL DO ESTADO - ESCOLHA ENTRE OS INTEGRANTES DA CARREIRA. Mostra-se harmônico com a Constituição Federal preceito da Carta estadual prevendo a escolha do Procurador-Geral do Estado entre os integrantes da carreira” (STF, ADI 2.581-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 16-08-2007, m.v., DJe 15-08-2008).
Portanto, é
incompatível o provimento comissionado com a advocacia pública, de modo a
revelar a inconstitucionalidade do cargo de Assessor Jurídico do Poder Legislativo,
constante na Lei Complementar nº 202, de 07 de junho de 2013, da Câmara
Municipal de Conchas.
C – INADMISSIBILIDADE DA ADOÇÃO DO
REGIME CELETISTA PARA CARGOS OU EMPRGOS COMISSIONADOS
A Lei
Complementar nº 202, de 07 de junho de 2013, da Câmara Municipal de Conchas transforma
o cargo de Assessor Jurídico do Poder Legislativo em emprego público de
provimento em comissão regido pelo regime da CLT.
Ocorre que o
provimento em comissão é incompatível com o regime celetista na Administração
Pública porque configura limite à liberdade de provimento e exoneração do cargo
a dispensa imotivada onerosa (art. 115, II e V, Constituição Estadual).
A inserção do emprego comissionado no regime celetista é
incompatível com essa estrutura normativo-constitucional porque, para além,
fornece, indiretamente, uma estabilidade incompossível com a natureza do cargo,
na medida em que o regime celetista de vínculo reprime a dispensa imotivada do
empregado pela imposição de ônus financeiro ao tomador de serviços (aviso
prévio, multa rescisória, indenização e outros consectários de similar
natureza).
O desprovimento do cargo comissionado é medida discricionária
orientada pelos critérios de oportunidade e conveniência da Administração
Pública, e a sua sujeição ao regime celetista tolhe a liberdade de exoneração
reservada ao administrador público.
A jurisprudência respalda a declaração de
inconstitucionalidade:
“4. Além dessa inconstitucionalidade formal, ocorre, também, no caso, a material, pois, impondo uma indenização em favor do exonerado, a norma estadual condiciona, ou ao menos restringe, a liberdade de exoneração, a que se refere o inc. II do art. 37 da C.F.” (STF, ADI 182-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches, 05-11-1997, v.u., DJ 05-12-1997, p. 63.902).
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE, INDENIZAÇÃO COMPENSATÓRIA PAGA PELOS COFRES PÚBLICOS POR OCASIÃO DA EXONERAÇÃO OU DISPENSA DE QUEM, SEM OUTRO VÍNCULO COM O SERVIÇO PÚBLICO, SEJA OCUPANTE DE FUNÇÃO OU CARGO EM COMISSÃO DE LIVRE EXONERAÇÃO, ART. 287 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. 1. A nomeação para os cargos em comissão é feita sob a cláusula expressa de livre exoneração. A disposição que prevê o pagamento pelos cofres públicos de indenização compensatória aos ocupantes de cargos em comissão, sem outro vínculo com o serviço público, por ocasião da exoneração ou dispensa, restringe a possibilidade de livre exoneração, tal como prevista no art. 37, II, combinado com o art. 25 da Constituição Federal. 2. Ação direta julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade e a conseqüente ineficácia do art. 287 da Constituição do Estado de São Paulo, desde a sua promulgação” (STF, ADI 326-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Paulo Brossard, 13-10-1994, m.v., DJ 19-09-1997, p. 45.526).
Inegável a violação aos princípios jurídicos da moralidade e
da razoabilidade (art. 111, Constituição Estadual) e à regra da liberdade de
exoneração que domina o provimento em comissão (art. 115, II e V, Constituição
Estadual), no tocante à Lei Complementar nº 202, de 07 de junho de 2013, da Câmara Municipal de
Conchas.
III – Pedido
liminar
À saciedade
demonstrado o fumus boni iuris, pela
ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos legais da Câmara
Municipal de Conchas apontados como violadores de princípios e regras da
Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento
desta ação, de maneira a evitar oneração do erário irreparável ou de difícil
reparação.
À luz deste
perfil, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e
definitivo julgamento desta ação da Lei Complementar nº 202, de 07 de junho de
2013, da Câmara Municipal de Conchas.
IV – Pedido
Face ao
exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que,
ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade da Lei
Complementar nº 202, de 07 de junho de 2013, da Câmara Municipal de Conchas.
Requer-se ainda
sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de Conchas,
bem como citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre os atos
normativos impugnados, protestando por nova vista, posteriormente, para
manifestação final.
Termos em que, pede deferimento.
São
Paulo, 15 de outubro de 2014.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
mao/dcm
Protocolado
nº 111.682/13
Assunto: Representação para propositura de ação direta de
inconstitucionalidade, em face da Lei Complementar Municipal nº 202/2013, do
Município de Conchas, para análise e providências cabíveis
Distribua-se a
petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade em face da Lei
Complementar nº 202, de 07 de junho de 2013, da Câmara Municipal de Conchas junto
ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Oficie-se ao
interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição
inicial.
São
Paulo, 15 de outubro de 2014.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
mao/dcm