Excelentíssimo Senhor Doutor Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

 

 

 

 

Protocolado n. 114.182/12

 

 

 

 

 

 

Ementa: Constitucional. Administrativo. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Leis n. 13.973, de 12 de maio de 2005 (art. 35), n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007 (Arts. 1º, 2º e 4º) e n. 15.391, de 06 de julho de 2011 (Arts. 1º, 2º e 4º) e Decreto n. 46.860, de 27 de dezembro de 2005 (art. 25), do Município de São Paulo. Servidor Público. Regime Próprio de Previdência Social. Inclusão de servidores temporários, de ocupantes de cargos de provimento em comissão e outros não admitidos por concurso público. As Leis n. 13.973/05, n. 14.651/07 e n. 15.391/11, e o Decreto n. 46.860/05, do Município de São Paulo, ao incluírem no regime próprio de previdência dos servidores públicos os servidores temporários, os ocupantes de cargos de provimento em comissão exclusivamente, e outros para além de servidores públicos titulares de cargo de provimento efetivo após prévia aprovação em concurso público, investidos ou aposentados a partir da EC 20/98, concedendo proventos, pensões e demais benefícios respectivos em momento posterior a esse marco, ofendem o art. 126, caput e § 13, CE/89, que os sujeitam ao regime geral de previdência social.

 

 

 

                   O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, no exercício da atribuição prevista nos arts. 103, II, e 116, VI, da Lei Complementar Estadual n. 734, de 26 de novembro de 1993 (Lei Orgânica Estadual do Ministério Público) e nos arts. 25, I, e 29, I, da Lei n. 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), e em conformidade com o disposto nos arts. 125, § 2º, e 129, IV, da Constituição da República, e nos arts. 74, VI, e 90, III, da Constituição do Estado de São Paulo, com respaldo nas informações colhidas no anexo protocolado em epígrafe referido, vem perante esse egrégio Tribunal de Justiça promover a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE em face do art. 35 da Lei n. 13.973, de 12 de maio de 2005, dos arts. 1º, 2º e 4º da Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007, e dos arts. 1º, 2º e 4º da Lei n. 15.391, de 06 de julho de 2011, e por arrastamento (ou dependência), do art. 25 do Decreto n. 46.860, de 27 de dezembro de 2005, do Município de São Paulo, pelos fundamentos expostos a seguir:

I – OS ATOS NORMATIVOS IMPUGNADOS

1.                A Lei n. 13.973, de 12 de maio de 2005 (fls. 411/416), que dispõe sobre as contribuições para o regime próprio de previdência social dos servidores públicos do Município de São Paulo, assim dispõe em seu art. 35:

“Art. 35. Aplicam-se as disposições constantes desta lei aos servidores abaixo descritos enquanto perdurar decisão judicial nesse sentido:

I – admitidos pela Lei nº 9.160, de 31 de dezembro de 1980;

II – titulares de cargos em comissão exclusivamente, considerados estáveis, nos termos do art. 19 do ADCT, na conformidade do disposto em lei municipal ou ato administrativo normativo próprio;

III – titulares de cargos em comissão exclusivamente, que ingressaram na Prefeitura do Município de São Paulo até a data da publicação da EC 20/98, e que, em razão da natureza específica das funções por eles desempenhadas, não pertinentes à fidúcia, já foram admitidos no regime próprio do servidor efetivo por ato normativo próprio expedido anteriormente pelo Executivo” (fl. 415).

2.                Em consequência foi editado pelo Chefe do Poder Executivo o Decreto n. 46.860, de 27 de dezembro de 2005 (fls. 417/424), para regulamentar essa lei, e cujo art. 25 assim preceitua:

“Art. 25. As disposições deste aplicam-se, também, aos seguintes servidores:

I – admitidos pela Lei nº 9.160, de 31 de dezembro de 1980;

II – titulares de cargos em comissão, exclusivamente, declarados em lei de livre nomeação e exoneração, cuja estabilidade excepcional prevista no art. 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT, da Constituição Federal, tenha sido reconhecida em lei ou atos normativos específicos, na seguinte conformidade:

a) Diretores de Creche – despacho normativo proferido no processo administrativo nº 1993-0.009.682-6, publicado no Diário Oficial do Município de 11 de novembro de 2003;

b) Professores – despacho normativo proferido no Ofício nº 174/91-SME/AT, publicado no Diário Oficial do Município de 3 de outubro de 1991;

c) Inspetores de Alunos, Auxiliares de Secretaria e Auxiliares Administrativo de Ensino – despacho normativo proferido no processo administrativo nº 2000-0.260.509-7, publicado no Diário Oficial do Município de 11 de novembro de 1993;

d) Secretários de Escola – parágrafo único do artigo 104 da Lei nº 11.434, de 13 de novembro de 1993;

III – titulares de cargos em comissão, exclusivamente, declarados de livre provimento e exoneração, que ingressaram na Prefeitura do Município de São Paulo até 16 de dezembro de 1998 e, em razão da natureza específica das funções por eles desempenhadas, não pertinentes à fidúcia, de Referência AA, do Quadro de Atividades Artísticas, e de Referência QPE, do Quadro dos Profissionais da Educação, referidos no Comunicado nº 1/SGP/2002, publicado no Diário Oficial do Município de 7 de fevereiro de 2002, constantes do Anexo II deste decreto” (fl. 423).

3.                A Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007, dispõe sobre a permanência dos servidores públicos nela especificados no regime próprio de previdência social do Município de São Paulo, estabelecendo o seguinte:

“Art. 1º. Estão submetidos ao Regime Próprio de Previdência Social do Município de São Paulo os servidores ativos e inativos a seguir indicados, que tenham sido admitidos para o exercício de função permanente, inclusive de natureza técnica, na Administração Direta e Autárquica, sendo equiparados aos titulares de cargos efetivos para essa finalidade:

I - admitidos pela Lei nº 9.160, de 3 de dezembro de 1980, e alterações;

II – titulares de cargos em comissão, exclusivamente, considerados estáveis nos termos do art. 19 do ADCT, na conformidade do disposto em lei municipal ou ato administrativo próprio;

III – titulares de cargos em comissão exclusivamente, que ingressaram na Prefeitura do Município de São Paulo até a data da publicação da Emenda Constitucional nº 20, de 15 dezembro de 1998, e que, em razão da natureza específica das funções por eles desempenhadas, não pertinentes à fidúcia, já foram admitidos no regime próprio do servidor efetivo por ato normativo específico expedido anteriormente pelo Executivo.

§ 1º. Permanecem submetidas ao Regime Próprio de Previdência Social do Município de São Paulo as aposentadorias e pensões relativas aos servidores especificados neste artigo, concedidos anteriormente à data desta lei.

§ 2º. O disposto neste artigo aplica-se a partir de 15 de dezembro de 1998, data da promulgação da Emenda Constitucional nº 20.

Art. 2º. O disposto nesta lei aplica-se aos servidores, aposentados e pensionistas da Câmara Municipal e do Tribunal de Contas do Município de São Paulo.

(...)

Art. 4º. Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, retroagindo seus efeitos a 15 de dezembro de 1998, quanto ao disposto no seu art. 1º” (fl. 441).

4.                E em 06 de julho de 2011 foi editada a Lei n. 15.391, de 06 de julho de 2011, com o seguinte teor:

“Art. 1º. O ‘caput’ do art. 1º da Lei nº 14.651, de 20 de dezembro de 2007, passa a vigorar acrescido de inciso IV, com a seguinte redação:

‘Art. 1º. ...............................................................................

IV – titulares de cargos em comissão, exclusivamente, que ingressaram na Prefeitura do Município de São Paulo até 31 de dezembro de 2008, e que, em razão da natureza específica das funções por eles desempenhadas, não pertinentes a fidúcia, já foram admitidos no regime próprio do servidor efetivo.’ (NR)

Art. 2º. Permanecem submetidas ao Regime Próprio de Previdência Social do Município de São Paulo – RPPS as aposentadorias e pensões relativas aos servidores especificados no inciso IV do art. 1º da Lei nº 14.651, de 2007, ora acrescido a referido diploma legal, concedidas anteriormente à data de publicação desta lei.

(...)

Art. 4º. Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, retroagindo a 15 de dezembro de 1998 os efeitos das disposições constantes de seus arts. 1º e 2º” (fl. 442).

5.                Essas normas revogaram a Portaria n. 226, de 18 de setembro de 2001, editada pelo Chefe do Poder Executivo, que subordinava ao regime geral de previdência social os “servidores municipais da administração direta e indireta ocupantes exclusivamente de cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração, bem como aos servidores temporários, contratados por meio da Lei 10.793, de 21 de dezembro de 1989, regulamentada pelo Dec. 28.705, de 23 de maio de 1990” (fl. 471), complementada pelo Comunicado n. 1/02 que, no entanto, declarou que “os comissionados de referência QPE e de referência AA e os servidores admitidos estáveis e não estáveis permanecerão vinculados ao Regime Previdenciário Próprio dos Servidores Municipais” (fl. 472).

II – O parâmetro da fiscalização abstrata de constitucionalidade

6.                O art. 35 da Lei n. 13.973, de 12 de maio de 2005, e o art. 25 do Decreto n. 46.860, de 27 de dezembro de 2005, os arts. 1º, 2º e 4º da Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007, e os arts. 1º, 2º e 4º da Lei n. 15.391, de 06 de julho de 2011, do Município de São Paulo, contrariam frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo, à qual está subordinada a produção normativa municipal ante a previsão dos arts. 1º, 18, 29 e 31 da Constituição Federal.

7.                Os preceitos da Constituição Federal e da Constituição Estadual são aplicáveis aos Municípios não só pelo art. 29 da Constituição da República, mas, também, por força do art. 144 da Constituição do Estado que assim estabelece:

“Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por lei orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição”.

8.                As normas contestadas são incompatíveis com os seguintes preceitos da Constituição Estadual:

“Artigo 126 - Aos servidores titulares de cargos efetivos do Estado, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.

(...)

§ 13 - Ao servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração bem como de outro cargo temporário ou de emprego público, aplica-se o regime geral de previdência social”.

9.                Esses preceitos reproduzem o quanto disposto nos arts. 40, caput, e § 13, da Constituição Federal, sendo irrelevante sua introdução na Constituição Estadual pela Emenda n. 21, de 14 de fevereiro de 2006, porque essas disposições da Constituição Federal de observância obrigatória para Estados, Distrito Federal e Municípios decorrentes da Emenda Constitucional n. 20, de 15 de dezembro de 1998, já eram aplicáveis na órbita estadual e municipal por força do caráter remissivo do mencionado art. 144 da Constituição Estadual.

10.              Apenas para o devido registro, é cabível o contraste da lei local com a Constituição Federal a partir da norma remissiva contida no art. 144 da Constituição Estadual - que reproduz o art. 29 caput da Constituição Federal – e que determina a observância na esfera municipal, além das regras da Constituição Estadual, dos princípios da Constituição Federal, sendo denominado “norma estadual de caráter remissivo, na medida em que, para a disciplina dos limites da autonomia municipal, remete para as disposições constantes da Constituição Federal”, como averbou o Supremo Tribunal Federal ao credenciar o controle concentrado de constitucionalidade de lei municipal por esse ângulo (STF, Rcl 10.406-GO, Rel. Min. Gilmar Mendes, 31-08-2010, DJe 06-09-2010; STF, Rcl 10.500-SP, Rel. Min. Celso de Mello, 18-10-2010, DJe 26-10-2010).

11.              Daí resulta a possibilidade de contraste da lei local com o art. 144 da Constituição Estadual, por sua remissão à Constituição Federal e, em especial, ao art. 40, caput, e § 13.

12.              Neste sentido, foi decidido que:

“(...) É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que as normas constitucionais federais que dispõem a respeito da aposentadoria dos servidores públicos são de absorção obrigatória pelas Constituições dos Estados (...)” (STF, ADI-MC 4.696-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 01-12-2011, v.u., DJe 16-03-2012).

“I. Ação direta de inconstitucionalidade: seu cabimento - sedimentado na jurisprudência do Tribunal - para questionar a compatibilidade de emenda constitucional com os limites formais ou materiais impostos pela Constituição ao poder constituinte derivado: precedentes. II. Previdência social (CF, art. 40, § 13, cf. EC 20/98): submissão dos ocupantes exclusivamente de cargos em comissão, assim como os de outro cargo temporário ou de emprego público ao regime geral da previdência social: argüição de inconstitucionalidade do preceito por tendente a abolir a ‘forma federativa do Estado’ (CF, art. 60, § 4º, I): improcedência. 1. A ‘forma federativa de Estado’ - elevado a princípio intangível por todas as Constituições da República - não pode ser conceituada a partir de um modelo ideal e apriorístico de Federação, mas, sim, daquele que o constituinte originário concretamente adotou e, como o adotou, erigiu em limite material imposto às futuras emendas à Constituição; de resto as limitações materiais ao poder constituinte de reforma, que o art. 60, § 4º, da Lei Fundamental enumera, não significam a intangibilidade literal da respectiva disciplina na Constituição originária, mas apenas a proteção do núcleo essencial dos princípios e institutos cuja preservação nelas se protege. 2. À vista do modelo ainda acentuadamente centralizado do federalismo adotado pela versão originária da Constituição de 1988, o preceito questionado da EC 20/98 nem tende a aboli-lo, nem sequer a afetá-lo. 3. Já assentou o Tribunal (MS 23047-MC, Pertence), que no novo art. 40 e seus parágrafos da Constituição (cf. EC 20/98), nela, pouco inovou ‘sob a perspectiva da Federação, a explicitação de que aos servidores efetivos dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, ‘é assegurado regime de previdência de caráter contributivo, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial’, assim como as normas relativas às respectivas aposentadorias e pensões, objeto dos seus numerosos parágrafos: afinal, toda a disciplina constitucional originária do regime dos servidores públicos - inclusive a do seu regime previdenciário - já abrangia os três níveis da organização federativa, impondo-se à observância de todas as unidades federadas, ainda quando - com base no art. 149, parág. único - que a proposta não altera - organizem sistema previdenciário próprio para os seus servidores’: análise da evolução do tema, do texto constitucional de 1988, passando pela EC 3/93, até a recente reforma previdenciária. 4. A matéria da disposição discutida é previdenciária e, por sua natureza, comporta norma geral de âmbito nacional de validade, que à União se facultava editar, sem prejuízo da legislação estadual suplementar ou plena, na falta de lei federal (CF 88, arts. 24, XII, e 40, § 2º): se já o podia ter feito a lei federal, com base nos preceitos recordados do texto constitucional originário, obviamente não afeta ou, menos ainda, tende a abolir a autonomia dos Estados-membros que assim agora tenha prescrito diretamente a norma constitucional sobrevinda. 5. É da jurisprudência do Supremo Tribunal que o princípio da imunidade tributária recíproca (CF, art. 150, VI, a) - ainda que se discuta a sua aplicabilidade a outros tributos, que não os impostos - não pode ser invocado na hipótese de contribuições previdenciárias. 6. A auto-aplicabilidade do novo art. 40, § 13 é questão estranha à constitucionalidade do preceito e, portanto, ao âmbito próprio da ação direta” (STF, ADI 2.024-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 03-05-2007, v.u., DJe 22-06-2007).

13.              A Constituição de 1988 na redação original previa no art. 40, § 2º, que “a lei disporá sobre a aposentadoria em cargos ou empregos temporários”.

14.              A Emenda n. 20/98 alterou essa concepção instituindo, com o aperfeiçoamento ulterior da Emenda n. 41/03, o regime próprio de previdência social dos servidores públicos, limitando-o aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações em dois preceitos.

15.              O primeiro está na regra inclusiva do caput do art. 40 ao se referir taxativa e expressamente aos “servidores titulares de cargos efetivos”.

16.              O segundo no § 13 desse art. 40 ao estabelecer que “ao servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração bem como de outro cargo temporário ou de emprego público, aplica-se o regime geral de previdência social”, tendo em vista que o § 2º passou a albergar outro conteúdo (“os proventos de aposentadoria e as pensões, por ocasião de sua concessão, não poderão exceder a remuneração do respectivo servidor, no cargo efetivo em que se deu a aposentadoria ou que serviu de referência para a concessão da pensão”).

17.             Por esse processo também transitou a Constituição Estadual.

18.              Antes da Emenda n. 21/06 o § 2º do art. 126 previa que

a lei disporá sobre a aposentadoria em cargos, funções ou empregos temporários”. A inovação promovida pela emenda reproduziu no caput desse art. 126 o conteúdo do art. 40 caput da Constituição Federal na redação da Emenda n. 20/98 e adotou preceitos semelhantes aos dos §§ 2º e 13 do art. 40 nos §§ 2º e 13 de seu art. 126.

19.              Aliás, antes da Emenda n. 21/06 o § 8º do art. 126, acrescentado à Constituição Estadual pela Emenda n. 01, de 20 de dezembro de 1990, estabelecendo que “ao ocupante de cargo em comissão fica assegurado o direito à aposentadoria em igualdade de condições com os demais servidores” foi julgado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em acórdão assim ementado:

“Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Constituição do Estado de São Paulo, § 8º do art. 126, introduzido pela Emenda Constitucional nº 1, de 20/12/1990. Direito de aposentadoria aos ocupantes de cargos em comissão, em igualdade de condições com os demais servidores. 3. Cerceamento da competência do Poder Executivo para enviar projetos de lei que versem sobre regime jurídico de servidores, estabilidade e aposentadoria. 4. Incabível, por emenda constitucional, nos Estados-membros, dispor o Poder Legislativo sobre espécie reservada à iniciativa privativa do Poder Executivo, a teor do disposto no art. 61, § 1º, II, letra ‘c’, da Constituição Federal. 5. Ação direta de constitucionalidade julgada procedente. Declarada a inconstitucionalidade do § 8º do art. 126, da Constituição do Estado de São Paulo, introduzido pela Emenda Constitucional nº 1, de 20.12.1990” (STF, ADI 582-SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Néri da Silveira, 17-06-1999, v.u., DJ 11-02-2000, p. 20).

20.              Portanto, é absolutamente seguro concluir que após a Emenda Constitucional n. 20/98 os servidores temporários e os ocupantes de cargos de provimento em comissão exclusivamente não estão sujeitos ao regime próprio de previdência social restrito aos servidores públicos titulares de cargos de provimento efetivo e que são neles investidos mediante aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos.

21.              Essa premissa permite assentar que: (a) servidores públicos investidos para além de cargos de provimento efetivo após a promulgação da Emenda Constitucional n. 20/98 não podem ser submetidos ao regime próprio de previdência dos servidores públicos, estando sujeitos ao regime geral de previdência social; (b) servidores temporários ou comissionados não podem se aposentar após a Emenda Constitucional n. 20/98 sob o regime próprio de previdência dos servidores públicos, nem ser concedidas pensões a seus dependentes em momento posterior a esse marco temporal, estando sujeitos ao regime geral de previdência social.

22.              A incompatibilidade com o art. 126, caput, e § 13, da Constituição Estadual, se manifesta quando o regime próprio de previdência social dos servidores públicos é estendido pela legislação municipal aos servidores ativos e inativos admitidos para o exercício de função permanente, inclusive de natureza técnica, na Administração direta e autárquica, equiparando-os aos titulares de cargos de provimento efetivo (art. 1º, caput, Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007), porque o regime próprio de previdência dos servidores públicos é limitado aos servidores públicos titulares de cargos de provimento efetivo e que são neles investidos mediante aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, não podendo contemplar outras espécies de agentes públicos.

23.              Em outras palavras, se o agente não é titular de cargo público de provimento efetivo a sua inclusão no regime previdenciário próprio é mais vantajosa que a do servidor público investido em cargo de provimento efetivo cuja aposentadoria voluntária exige o mínimo de 05 (cinco) anos de efetivo exercício no cargo.

24.              A lógica constitucional é conducente à assertiva de exclusão do regime próprio de previdência dos servidores públicos de tantos quantos não sejam titulares de cargos de provimento efetivo e de inclusão destes no regime geral de previdência social.

25.              A incompatibilidade com o art. 126, caput, e § 13, da Constituição Estadual, se manifesta quando o regime próprio de previdência social dos servidores públicos é estendido pela legislação municipal aos servidores temporários, admitidos pelas Leis n. 9.160/80 e n. 10.793/89 e suas alterações (art. 35, I, Lei n. 13.973/05; art. 25, I, Decreto n. 46.680/05; art. 1º, I, Lei n. 14.651/07), após a promulgação da Emenda Constitucional n. 20/98. Neste sentido, há decisões estampando que:

“(...) I - Ao servidor contratado por prazo determinado aplica-se o regime geral da previdência social, nos termos do art. 40, § 13 da Constituição Federal, não podendo cogitar-se em aposentadoria estatutária a servidor temporário. (...)” (STJ, RMS 18.774-MG, 5ª Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, 03-03-2005, v.u., DJ 28-03-2005, p. 295).

“(...) IV - O regime próprio de previdência é aplicável apenas aos servidores ocupantes de cargos efetivos. Ao servidor contratado por prazo determinado aplica-se o regime geral da previdência social, nos termos do art. 40, § 13, da Constituição. (...)”. (STJ, RMS 29.462-PA, 5ª Turma, Rel. Min. Felix Fischer, 20-08-2009, v.u., DJe 14-09-2009).

26.              Norma infraconstitucional que disponha em sentido contrário, submetendo os servidores temporários ao regime próprio de previdência social dos servidores públicos stricto sensu, foi revogada pelo art. 40, § 13 da Constituição Federal e pelo art. 126, § 13, da Constituição Estadual, se anterior, e é inconstitucional se posterior.

27.              A incompatibilidade com o art. 126, caput, e § 13, da Constituição Estadual, se manifesta quando o regime próprio de previdência social dos servidores públicos é estendido pela legislação municipal aos ocupantes de cargos de provimento em comissão, exclusivamente, considerados estáveis segundo o art. 19 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal, e na conformidade do disposto em lei municipal ou ato administrativo ou normativo específico ou próprio (art. 35, II, Lei n. 13.973/05; art. 25, II, Decreto n. 46.680/05; art. 1º, II, Lei n. 14.651/07).

28.              E isto porque, tout court, é juridicamente impossível a outorga de estabilidade anômala (excepcional ou especial), prevista no art. 19 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal, aos ocupantes de cargos de provimento em comissão exclusivamente porque o § 2º do citado art. 19 expressamente a proíbe, verbis:

“Art. 19. Os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercício na data da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não tenham sido admitidos na forma regulada no art. 37, da Constituição, são considerados estáveis no serviço público.

(...)

§ 2º. O disposto neste artigo não se aplica aos ocupantes de cargos, funções e empregos de confiança ou em comissão, nem aos que a lei declare de livre exoneração, cujo tempo de serviço não será computado para os fins do caput deste artigo, exceto se se tratar de servidor”.

29.              Não é demasia frisar que o preceito transitório não significa nem possibilita investidura daqueles nele contemplados em cargo de provimento efetivo, cingindo-se, tão somente, à outorga de estabilidade no serviço.  Esses servidores públicos não se tornaram titulares de cargos públicos. Neste sentido:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. FUNCIONÁRIO PÚBLICO ESTADUAL ADMITIDO SEM CONCURSO PÚBLICO E REDISTRIBUÍDO PARA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO. EFETIVAÇÃO POR RESOLUÇÃO DA MESA. FORMA DERIVADA DE INVESTIDURA EM CARGO PÚBLICO. DESFAZIMENTO DO ATO ADMINISTRATIVO PELA MESA DIRETORA DA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. ILEGALIDADE DO ATO QUE DECLAROU A NULIDADE DA INVESTIDURA DO SERVIDOR. IMPROCEDÊNCIA. EFETIVIDADE E ESTABILIDADE. 1. Servidor contratado para o cargo de carreira integrante do Poder Executivo estadual e redistribuído para a Assembléia Legislativa do Estado. Efetivação por ato da Mesa Legislativa. Forma derivada de investidura em cargo público. Inobservância ao artigo 37, II, da Constituição Federal. 1.1. O critério do mérito aferível por concurso público de provas ou de provas e títulos é, no atual sistema constitucional, indispensável para o cargo ou emprego isolado ou de carreira. Para o isolado, em qualquer hipótese; para o de carreira, só se fará na classe inicial e pelo concurso público de provas ou de provas e títulos, não o sendo, porém, para os cargos subsequentes que nela se escalonam até seu final, pois, para estes, a investidura se dará pela forma de provimento que é a ‘promoção’. 1.2. Estão banidas, pois, as formas de investidura antes admitidas - ascensão e transferência -, que são formas de ingresso em carreira diversa daquela para a qual o servidor público ingressou por concurso. 1.3. O preceito constitucional inserto no art. 37, II, não permite o ‘aproveitamento’, uma vez que, nesse caso, há igualmente o ingresso em outra carreira, sem o concurso público exigido. Precedente. 2.Efetividade e estabilidade. Não há que confundir efetividade com estabilidade. Aquela é atributo do cargo, designando o funcionário desde o instante da nomeação; a estabilidade é aderência, é integração no serviço público, depois de preenchidas determinadas condições fixadas em lei, e adquirida pelo decurso de tempo. 3. Estabilidade: artigos 41 da Constituição Federal e 19 do ADCT. A vigente Constituição estipulou duas modalidades de estabilidade no serviço público: a primeira, prevista no art. 41, é pressuposto inarredável à efetividade. A nomeação em caráter efetivo constitui-se em condição primordial para a aquisição da estabilidade, que é conferida ao funcionário público investido em cargo, para o qual foi nomeado em virtude de concurso público. A segunda, prevista no art. 19 do ADCT, é um favor constitucional conferido àquele servidor admitido sem concurso público há pelo menos cinco anos antes da promulgação da Constituição. Preenchidas as condições insertas no preceito transitório, o servidor é estável, mas não é efetivo, e possui somente o direito de permanência no serviço público no cargo em que fora admitido, todavia sem incorporação na carreira, não tendo direito a progressão funcional nela, ou a desfrutar de benefícios que sejam privativos de seus integrantes. 3.1. O servidor que preenchera as condições exigidas pelo art. 19 do ADCT-CF/88 é estável no cargo para o qual fora contratado pela Administração Pública, mas não é efetivo. Não é titular do cargo que ocupa, não integra a carreira e goza apenas de uma estabilidade especial no serviço público, que não se confunde com aquela estabilidade regular disciplinada pelo art. 41 da Constituição Federal. Não tem direito a efetivação, a não ser que se submeta a concurso público, quando, aprovado e nomeado, fará jus à contagem do tempo de serviço prestado no período de estabilidade excepcional, como título. 4. Servidor estável ‘ex vi’ do art. 19 do ADCT, redistribuído para Assembléia Legislativa e efetivado na carreira por ato da Mesa Legislativa. Anulação. Ilegalidade e existência de direito adquirido. Alegação improcedente. Súmula 473/STF. 4.1. O ato de ‘redistribuição’ ou ‘enquadramento’, assim como o de ‘transferência’ ou ‘aproveitamento’, que propiciou o ingresso do servidor na carreira, sem concurso público, quando esse era excepcionalmente estável no cargo para o qual fora contratado inicialmente (art. 19, ADCT), é nulo, por inobservância ao art. 37, II, da Constituição Federal. Legítimo é o ato administrativo que declarou a nulidade da Resolução da Mesa da Assembléia Legislativa, que efetivou o agente público, pois a Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos (Súmula 473). A Constituição Federal não permite o ingresso em cargo público - sem concurso. Recurso extraordinário conhecido e provido, para cassar a segurança concedida” (STF, RE 167.635-PA, 2ª Turma, Rel. Min. Maurício Corrêa, 17-09-1996, v.u., DJ 07-02-1997, p. 1.355).

30.              E não é lícito à norma infraconstitucional dilatar a estabilidade excepcional, conforme já deliberado:

“(...) A jurisprudência desta Corte tem considerado inconstitucionais normas estaduais que ampliam a exceção à regra da exigência de concurso para o ingresso no serviço público já estabelecida no ADCT Federal. Precedentes: ADI 498, rel. Min. Carlos Velloso (DJ de 09/08/1996) e ADI 208, rel. Min. Moreira Alves (DJ de 19/12/2002), entre outros. (...)” (RTJ 192/763).

“I. Servidor Público: estabilidade extraordinária (ADCT/CF/88, art. 19). O Tribunal tem afirmado a sujeição dos Estados-membros às disposições da Constituição Federal relativas aos servidores públicos, não lhes sendo dado, em particular, restringir ou ampliar os limites da estabilidade excepcional conferida no artigo 19 do ato federal das disposições transitórias. II. Estabilidade excepcional (Art. 19 ADCT): não implica efetividade no cargo, para a qual é imprescindível o concurso público (v.g. RE 181.883, 2ª T., Corrêa, DJ 27.02.98; ADIns. 88-MG, Moreira, DJ 08.09.00; 186-PR, Rezek, DJ 15.09.95; 2433-MC, Corrêa, DJ 24.8.01). III. Concurso público: exigência incontornável para que o servidor seja investido em cargo de carreira diversa. 1. Reputa-se ofensiva ao art. 37, II, CF, toda modalidade de ascensão de cargo de uma carreira ao de outra, a exemplo do ‘aproveitamento’ de que cogita a norma impugnada. 2. Incidência da Súmula/STF 685 (‘É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido’). IV. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 25, 26, 29 e 30 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado do Ceará” (STF, ADI 289-CE, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 09-02-2007, v.u., DJ 16-03-2007, p. 19).

31.              De qualquer modo, ainda assim a inconstitucionalidade se evidencia, na espécie, porque as regras locais não subtraem a aplicabilidade a situações posteriores à Emenda Constitucional n. 20/98.

32.              Quanto a isso, é incontroversa a jurisprudência. Negando ofensa ao princípio federativo na norma do art. 40, § 13, da Constituição Federal (STF, ADI 2.024-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 03-05-2007, v.u., DJe 22-06-2007), ela tem enunciado que “não tem direito à aposentadoria estatutária o servidor detentor de cargo em comissão aposentado após a Emenda Constitucional nº 20, de 16 de dezembro de 1998” (STF, AgR-AI 578.458-SP, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, 14-08-2007, v.u., DJe 14-09-2007), bem como que:

“ADMINITRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. CARGO EM COMISSÃO. APOSENTADORIA. LEI 8.647/1993. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE APOSENTADORIA PRÓPRIA DOS SERVIDORES OCUPANTES DE CARGO EFETIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA DESPROVIDO. O sistema previdenciário dos ocupantes de cargos comissionados foi regulado pela lei 8.647/1993. Posteriormente, com a Emenda Constitucional 20/1998, o art. 40, § 13 da Constituição Federal determinou a filiação obrigatória dos servidores sem vínculo efetivo ao Regime Geral de Previdência. Como os detentores de cargos comissionados desempenham função pública a título precário, sua situação é incompatível com o gozo de quaisquer benefícios que lhes confira vínculo de caráter permanente, como é o caso da aposentadoria. Inadmissível, ainda, o entendimento segundo o qual, à míngua de previsão legal, não se deva exigir o preenchimento de requisito algum para a fruição da aposentadoria por parte daqueles que desempenham a função pública a título precário, ao passo que, para os que mantêm vínculo efetivo com a Administração, exige-se o efetivo exercício no cargo por cinco anos ininterruptos ou dez intercalados (art. 193 da Lei 8.112/1990). Recurso ordinário a que se nega provimento” (STF, RMS 25.039-DF, 2ª Turma, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 14-02-2006, v.u., DJe 18-04-2008).

“Agravo regimental no recurso extraordinário. Administrativo. Ocupantes de cargo em comissão. Filiação ao Regime Geral de Previdência Social. Advento da EC nº 20/98. Direito adquirido a regime jurídico previdenciário. Inexistência. Precedentes. 1. Os ocupantes de cargo em comissão de forma exclusiva estão sujeitos ao regime geral de previdência social. 2. É pacífica a jurisprudência desta Corte de que não há direito adquirido a regime jurídico, inclusive o previdenciário. 3. Aplica-se à aposentadoria a norma vigente à época do preenchimento dos requisitos para a sua concessão. 4. Agravo regimental não provido” (STF, AgR-RE 409.295-RS, 1ª Turma, Rel. Min. Dias Toffoli, 03-05-2011, v.u., DJe 01-08-2011).

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PREVIDENCIÁRIO. CARGO EM COMISSÃO. APOSENTADORIA APÓS A EMENDA CONSTITUCIONAL N. 20/98. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO A REGIME JURÍDICO. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO” (STF, AgR-RE 461.196-RS, 1ª Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, 08-02-2011, v.u., DJe 03-03-2011).

33.              A incompatibilidade com o art. 126, caput, e § 13, da Constituição Estadual, se manifesta quando o regime próprio de previdência social dos servidores públicos é estendido pela legislação municipal aos ocupantes de cargos de provimento em comissão, exclusivamente, que ingressaram na Prefeitura de São Paulo até a Emenda n. 20/98, e que, em razão da natureza específica das funções desempenhadas, não pertinentes à fidúcia, já foram admitidos no regime próprio do servidor efetivo por ato normativo próprio (art. 35, III, Lei n. 13.973/05; art. 25, III, Decreto n. 46.680/05; art. 1º, III, Lei n. 14.651/07).

34.              Esses preceitos denotam estranha figura de cargo comissionado cujo ocupante passou a desempenhar funções alheias à relação de confiança. Os dispositivos só podem estar se referindo a outra forma de admissão a cargo público de provimento efetivo que não revela comissionamento, não se enquadra na contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público, e nem na estabilidade excepcional ou anômala - como pode ocorrer com cargos de provimento em comissão inconstitucionalmente instituídos para atribuições à margem de assessoramento, chefia ou direção ou, ainda, admissão sem subordinação ao prévio concurso público em função pública desprovida da possibilidade de estabilidade anômala ou excepcional (como aqueles admitidos após 05 de outubro de 1983).

35.              De qualquer modo, apesar de impressionar o corte promovido ao eleger como limite à promulgação da Emenda Constitucional n. 20/98, a inclusão no regime próprio de previdência é inconstitucional por não se tratar de servidor público titular de cargo de provimento efetivo admitido após aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, o que não é admissível desde 05 de outubro de 1988 com a promulgação da Constituição da República contendo a regra do art. 37, II, reproduzida no art. 115, II, da Constituição do Estado.

36.              Ora, se o agente não é titular de cargo público de provimento efetivo a sua inclusão no regime previdenciário próprio é mais vantajosa que a do servidor público investido em cargo de provimento efetivo cuja aposentadoria voluntária exige o mínimo de 05 (cinco) anos de efetivo exercício no cargo. E se sua admissão é discrepante do art. 37, II, da Constituição da República e do art. 115, II, da Constituição do Estado, não parece que seja juridicamente possível assegurar-lhe a inclusão no regime de previdência próprio dos servidores públicos, sendo irrelevante sua antecedência à Emenda Constitucional n. 20/98 porque, no regime constitucional a ela precedente, não se permitia a incorporação de servidores irregularmente admitidos – salvo os que ingressaram até a Constituição de 1988 – no regime de previdência dos servidores públicos na medida em que abrangia servidores públicos efetivos, comissionados e temporários, e não irregulares.

37.              Não bastasse, o § 1º do art. 1º da Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007, implanta exceção ao marco temporal do inciso III. De fato, o § 1º assegura a permanência no regime próprio de aposentadorias e pensões relativas aos servidores indicados nos incisos do art. 1º concedidas anteriormente à lei. Em outras palavras, aposentadorias, proventos e pensões de agentes referidos no inciso III, concedidos após a Emenda Constitucional n. 20/98 e até 20 de dezembro de 2007, não serão tangidos.

38.              Para agravar, a incompatibilidade com o art. 126, caput, e § 13, da Constituição Estadual, se manifesta quando o regime próprio de previdência social dos servidores públicos é estendido pela legislação municipal aos ocupantes de cargos de provimento em comissão, exclusivamente, que ingressaram na Prefeitura de São Paulo até 31 de dezembro de 2008, e que, em razão da natureza específica das funções desempenhadas, não pertinentes à fidúcia, já foram admitidos no regime próprio do servidor efetivo (art. 1º, IV, Lei n. 14.651/07, na redação do art. 1º da Lei n. 15.391, de 06 de julho de 2011), pelas razões já estampadas adicionadas à sua completa infringência ao art. 126, caput e § 13, da Constituição Estadual, que não permite a inserção no regime próprio de previdência por não se tratar de servidor público titular de cargo de provimento efetivo admitido após aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos.

39.              Também são inconstitucionais, por incompatibilidade ao art. 126, caput e § 13, da Constituição Estadual, os dispositivos que preservam no regime próprio de previdência social dos servidores públicos municipais aposentadorias e pensões relativas aos servidores referidos no art. 1º da Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007, concedidas anteriormente ao seu advento e, ainda, ao da Lei n. 15.391, de 06 de julho de 2011 (art. 1º, § 1º, Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007; art. 2º, Lei n. 15.391, de 06 de julho de 2011).

40.              Como já discorrido, “não tem direito à aposentadoria estatutária o servidor detentor de cargo em comissão aposentado após a Emenda Constitucional nº 20, de 16 de dezembro de 1998” (STF, AgR-AI 578.458-SP, 2ª Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, 14-08-2007, v.u., DJe 14-09-2007).

41.              O marco temporal para concessão de aposentadorias e pensões sob o regime próprio – e se admitido em lei local vigente antes de 15 de dezembro de 1998 – é a promulgação da Emenda Constitucional n. 20/98.

42.              Também padece de idêntica causa de inconstitucionalidade – ofensa ao art. 126, caput e § 13, da Constituição Estadual – o art. 2º da Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007, que estende as disposições dessa lei aos servidores, inativos e pensionistas da Câmara Municipal e do Tribunal de Contas do Município, em identidade de situações as do seu art. 1º.

43.              A inconstitucionalidade ainda se verifica – por violação ao art. 126, caput e § 13, da Constituição Estadual – no art. 1º, § 2º, da Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007. O preceito estabelece a aplicação do caput “a partir de 15 de dezembro de 1998, data da promulgação da Emenda Constitucional nº 20”, projetando-se para o futuro, e não para o passado, como deveria ser em relação à inclusão no regime e à concessão de aposentadoria e pensão. Padecem do mesmo vício os preceitos do art. 4º da Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007, e do art. 4º da Lei n. 15.391, de 06 de julho de 2011, por retroagirem à data da promulgação da Emenda Constitucional n. 20/98 a extensão inconstitucional, permitindo que aposentadorias e pensões concedidas após essa emenda constitucional sejam aparentemente legítimas, não bastasse o arrastamento em virtude de sua relação de acessoriedade.  

44.              Sendo inconstitucionais as leis municipais, em especial o art. 35 da Lei n. 13.973, de 12 de maio de 2005, o art. 25 do Decreto n. 46.860, de 27 de dezembro de 2005, que o regulamenta, é acoimado de idêntico vício em relação de sua dependência, como já decidido (RTJ 219/143; RTJ 194/533), à luz da inconstitucionalidade consequencial ou por arrastamento, razão pela qual também deve ser declarada, na conformidade da explicação doutrinal:

“se em determinado processo de controle concentrado de constitucionalidade for julgada inconstitucional a norma principal, em futuro processo, outra norma dependente daquela que foi declarada inconstitucional em processo anterior - tendo em vista a relação de instrumentalidade que entre elas existe - também estará eivada pelo vício da inconstitucionalidade ‘conseqüente’, ou por ‘arrastamento’ ou por ‘atração’.” (Pedro Lenza. Direito Constitucional Esquematizado, São Paulo: Saraiva, 13ª ed., p. 208).

III - Pedido liminar

45.              À saciedade demonstrado o fumus boni iuris, pela ponderabilidade do direito alegado, soma-se a ele o periculum in mora. A atual tessitura dos preceitos normativos municipais apontados como violadores de princípios e regras da Constituição do Estado de São Paulo é sinal, de per si, para suspensão de sua eficácia até final julgamento desta ação, evitando-se atuação desconforme o ordenamento jurídico, criadora de lesão irreparável ou de difícil reparação e que onera substancialmente o erário e o regime próprio de previdência dos servidores públicos do Município de São Paulo, expondo, ainda, à insegurança jurídica pessoal que está sujeito ao regime geral de previdência social.

46.              Ainda que não houvesse essa singular situação de risco, restaria, ao menos, a excepcional conveniência da medida. Com efeito, no contexto das ações diretas e da outorga de provimentos cautelares para defesa da Constituição, o juízo de conveniência é um critério relevante, que vem condicionando os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal, preordenados à suspensão liminar de leis aparentemente inconstitucionais (RTJ 138/64; RTJ 142/52).

47.              À luz deste perfil, requer a concessão de liminar para suspensão da eficácia, até final e definitivo julgamento desta ação, do art. 35 da Lei n. 13.973, de 12 de maio de 2005, dos arts. 1º, 2º e 4º da Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007, e dos arts. 1º, 2º e 4º da Lei n. 15.391, de 06 de julho de 2011, e do art. 25 do Decreto n. 46.860, de 27 de dezembro de 2005, do Município de São Paulo.

IV - PEDIDO

48.              Face ao exposto, requerendo o recebimento e o processamento da presente ação para que, ao final, seja julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade do art. 35 da Lei n. 13.973, de 12 de maio de 2005, dos arts. 1º, 2º e 4º da Lei n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007, e dos arts. 1º, 2º e 4º da Lei n. 15.391, de 06 de julho de 2011, e por arrastamento (ou dependência), do art. 25 do Decreto n. 46.860, de 27 de dezembro de 2005, do Município de São Paulo.

49.              Requer-se ainda sejam requisitadas informações à Câmara Municipal e ao Prefeito Municipal de São Paulo, bem como posteriormente citado o Procurador-Geral do Estado para se manifestar sobre as normas impugnadas, protestando por nova vista, posteriormente, para manifestação final.

                   Termos em que, pede deferimento.

                   São Paulo, 21 de novembro de 2012.

 

 

 

 

         Márcio Fernando Elias Rosa

         Procurador-Geral de Justiça

wpmj

 

 

 

Protocolado n. 114.182/12

Interessado:  Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social

Assunto: Inconstitucionalidade das leis n. 13.973, de 12 de maio de 2005 (art. 35), n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007 (Arts. 1º, 2º e 4º) e n. 15.391, de 06 de julho de 2011 (Arts. 1º, 2º e 4º) e Decreto n. 46.860, de 27 de dezembro de 2005 (art. 25), do Município de São Paulo

 

 

 

 

1.     Distribua-se a petição inicial da ação direta de inconstitucionalidade, em face das leis n. 13.973, de 12 de maio de 2005 (art. 35), n. 14.651, de 20 de dezembro de 2007 (Arts. 1º, 2º e 4º) e n. 15.391, de 06 de julho de 2011 (Arts. 1º, 2º e 4º) e Decreto n. 46.860, de 27 de dezembro de 2005 (art. 25), do Município de São Paulo, junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

2.     Oficie-se ao interessado, informando-lhe a propositura da ação, com cópia da petição inicial.

 

São Paulo, 21 de novembro de 2012.

 

 

 

         Márcio Fernando Elias Rosa

         Procurador-Geral de Justiça

eaa